Acórdão nº 01855/07.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução19 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório O Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 16/02/2017, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida na sequência da decisão que revogou a isenção de imposições fiscais, sobre pedido para importação de veículo automóvel, devidas em Imposto Automóvel (IA), IVA e juros compensatórios, concedida por ocasião da transferência de residência do Canadá para Portugal de M., contribuinte n.º (…), residente na Rua (…); tendo a Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo emitido a respectiva liquidação no montante de €26.159,50.

O Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “3.1. O objeto do presente recurso é a douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 16/02/2017, proferida nos autos em epígrafe, ao julgar procedente a impugnação e, consequentemente, ao mandar anular a liquidação impugnada (Imposto Automóvel, IVA, Juros Compensatórios e Impresso) no montante total de € 26.159,50, registada na DVL n.° 2005/2064760; 3.2. Da FUNDAMENTAÇÁO/PROBATÓRIO da douta sentença recorrida constam FACTOS dados como provados sem que os mesmos estejam alicerçados em prova bastante, documental ou outra, constante dos mesmos autos ou, pelo menos, sem que na douta decisão recorrida seja feita referência expressa a essa prova; 3.3. Assim, o impugnante foi objeto de um controlo «a posteriori», levado a cabo pela Alfândega do Freixieiro, em 2007, com vista a averiguar se o mesmo reunia os requisitos que lhe permitissem beneficiar da isenção do Imposto Automóvel, no âmbito do regime legal aprovado pelo DL n.° 471/88, de 22 de Dezembro, de que tinha beneficiado em 2006; 3.4. Do Controlo «a posteriori» concluiu-se que o impugnante não preenchia os requisitos legais para poder beneficiar da isenção do Imposto Automóvel por ocasião da alegada transferência de residência definitiva do Canadá para Portugal; Já que, 3.5. Nomeadamente, não residira no Canadá há pelo menos 24 meses consecutivos antes do regresso ao país, nem exercera no Canadá, a partir de 2002, qualquer atividade profissional remunerada e regressara definitivamente a Portugal em 1991 viajando de vez em quando ao Canadá; 3.6. Está documentalmente demonstrado nos autos que o impugnante não residiu no Canadá há pelo menos 24 meses consecutivos antes do alegado regresso ao país em 2005, que não exerceu no Canadá, a partir de 2002, qualquer atividade profissional remunerada (recebia uma pensão por acidente de trabalho) e que regressou definitivamente a Portugal em 1991, conforme o declarado pelo próprio em Auto de Declarações, de 14/11/2006, perante a GNR da Vila das Aves, 3.7. O impugnante não reunia, em 2005, data da alegada transferência definitiva para Portugal, os requisitos que lhe permitissem beneficiar da isenção do Imposto Automóvel, no âmbito do regime legal, aprovado pelo DL n.° 471/88, de 22 de Dezembro, 3.8. A liquidação feita e a revogação do despacho concedente da isenção limitaram-se a dar cumprimento a normas legais em vigor a que os serviços aduaneiros estão obrigados; 3.9. A liquidação não merece ser censurada por não se mostrar inquinada de vício de violação de lei.

3.10. A douta sentença recorrida ao valorar mais a declaração do Consulado de Portugal em Toronto, mera declaração feita a pedido do interessado sem ter sido confirmada a veracidade da mesma, e desvalorizar as declarações prestadas pelo próprio em Auto de Declarações (declarações formais) e pelos resultados das averiguações in loco, levadas a cabo pela Alfândega do Freixieiro, fez errada apreciação da prova produzida; 3.11. A alegação feita pela douta sentença recorrida de que o ora recorrente terá assinado o Auto de Declarações sem entender o que assinava por não dominar a língua portuguesa, além de não estar sustentada em qualquer prova documental ou outra, não se mostra consistente nem razoável, 3.12. O recorrente foi para o Canadá, já homem adulto, e a língua materna não se esquece do modo como é dado a entender pela douta sentença recorrida: 3.13. A sentença recorrida ao considerar como PROVADO este facto violou o art.° 653.° e 668°, alínea b) do CPC.

NESTES TERMOS deverá a impugnação improceder, Assim se procederá de acordo com a LEI e se fará JUSTIÇA.”****O Recorrido contra-alegou, tendo concluído da seguinte forma: “1. A recorrente censura o veredicto que fez vencimento na instância, porquanto a decisão de revogação do benefício fiscal em causa assenta «em sólida prova, recolhida de forma legal e por forma a poder concluir-se que não houve lugar a uma transferência de residência do Autor, com introdução simultânea do veículo no consumo, para território nacional em 2002, verificando-se ambos os factos em data anterior (2003)»; donde resultaria que não estão preenchidas as condições previstas no artigo 58.º/1 conjugado com o artigo 45.º/a), do CISV (Código de Imposto sobre Veículos), para a manutenção do reconhecimento do benefício fiscal.

  1. Ao invés, o recorrido defendeu que a transferência da residência para Portugal ocorreu apenas em 2005, passando a residir em território nacional a partir dessa data, pelo que não existe motivo sério e atendível para revogar o benefício fiscal em causa; 3. Salvo melhor, o recurso interposto carece de sustentação fáctica e de direito, não se vislumbrando qualquer vício da sentença passível de censura; aliás, a notória pobreza franciscana das alegações da Fazenda Pública roça a má-fé processual.

  2. Há erro notório na apreciação da prova quando se dão factos como provados que, face às regras da experiência comum e à lógica normal da vida, não se poderiam ter verificado ou são contraditados por documentos que fazem prova plena e que não tenham sido arguidos de falsidade.

  3. Quando está em causa a questão da apreciação da prova não pode deixar de dar-se a devida relevância à perceção que a oralidade e a imediação conferem aos julgadores do Tribunal a quo. Deste modo, quando a atribuição de credibilidade a uma fonte de prova se baseia na opção assente na imediação e na oralidade, o Tribunal de recurso só pode censurá-la se demonstrado ficar que tal opção é de todo em todo inadmissível face às regras da experiência comum.

  4. São os Juízes de 1ª instância quem, de forma direta e “imediata”, podem observar as intransferíveis sensações que derivam das declarações e que se obtêm a partir do que os arguidos e as testemunhas disseram, do que calaram, dos seus gestos, da palidez ou do suor do seu rosto, das suas hesitações. É uma verdade empírica que frente a um mesmo facto diversos testemunhos presenciais, de boa-fé, incorrem em observações distintas.

  5. A congruência dos testemunhos entre si, o grau de coerência com outras provas que existam e com outros factos objetivamente comprováveis, quer dizer, a apreciação conjunta das provas, são elementos fundamentais para dar maior credibilidade a um testemunho que a outro.

  6. Para tal, a convicção do Tribunal tem de ser formada na ponderação de toda a prova produzida, não podendo censurar-se aquele por nesse juízo ter optado por uma versão em detrimento de outra.

  7. Ora, a Fazenda Pública limita-se a perorar que o Tribunal a quo deveria ter desvalorizado os testemunhos prestados em tribunal pelas testemunhas arroladas pelo recorrido, bem como a declaração do Consulado de Portugal, e valorizado as declarações prestadas pelo próprio em Auto de Declarações; aquilo que o tribunal viu, ouviu e analisou nada vale para a recorrente, apenas porque sim! 10. Do cotejo da douta sentença infere-se linearmente que o tribunal apreciou serena e ponderadamente todas as provas, conjugando-as com a “experiência de vida, tendo elaborado a sentença de forma clara e cuidadosamente motivada, tanto de facto como de direito, pelo que deve ser mantida in totum.

  8. No que se refere aos pressupostos da isenção, da análise dos elementos constantes dos autos resulta manifestamente provado que o Impugnante foi emigrante no Canadá durante décadas e que apenas regressou a Portugal em 15/10/2005.

  9. Não são atendíveis os vícios apontados pela Recorrente às declarações proferidas e assinadas pelo próprio em sede de fiscalização, referindo-se a “regresso definitivo”, as quais em nada contendem com a data da efetiva transferência de residência para território nacional exigida pela disposição legal que concede o benefício.

  10. Ainda que tenham surgido dúvidas à Alfandega do Freixieiro e respetivos serviços de fiscalização que motivaram o ato de revogação, ora em crise, do ponto de vista da justiça material não soçobram dúvidas que o objetivo de favorecimento da reintegração económica do cidadão no espaço nacional após um período de emigração, intencionado pelo legislador ao estabelecer a isenção de ISV, se encontra presente no caso dos autos.

  11. In Casu, verifica-se que, até à emissão da declaração de transferência de residência para Portugal, o recorrido tinha o seu centro de vida no Canadá.

  12. Está em causa a subsistência de ato administrativo de anulação (datado de 17.05.2007) do ato de concessão do benefício fiscal de isenção de ISV, pelo que compete à ora recorrente o ónus de demonstração da verificação dos pressupostos do ato administrativo anulatório, ónus que no caso não cumpriu, pois que não está provado que a introdução da viatura em território nacional não tenha sido contemporânea da mudança de residência do recorrido; ao invés, verifica-se que a mudança de residência habitual do recorrido para o território nacional é contemporânea do pedido de regularização fiscal, não se comprovando nos autos a ocorrência de violação dos ónus de intransmissibilidade do veículo, associados à concessão da isenção em apreço (artigo 47.º do CISV).

  13. O ato que determinou a anulação administrativa do ato de concessão...

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