Acórdão nº 01306/09.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelCristina da Nova
Data da Resolução19 de Novembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:*1.RELATÓRIO.

A Fazenda Pública e L., SA, sociedade comercial com sede na Zona Industrial, (…), interpuseram recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, proferida em 31/01/2017, que julgou parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o indeferimento da reclamação graciosa, referente às liquidações adicionais do IRC e respectivos juros compensatórios, referentes ao exercício económico do ano 2004.

Formula a Fazenda Pública, nas respetivas alegações, (cfr. fls. 968-973) as seguintes conclusões que se reproduzem: A - Incide o presente recurso sobre dois dos três segmentos relativos ao erro nos pressupostos nas correções aritméticas (desconsideração, como custo fiscal, de certas despesas contabilizadas pela impugnante no exercício de 2004) consideradas procedentes pela douta sentença que julgou parcialmente procedente a impugnação, a saber: existências adquiridas no exterior e trabalhos especializados – Banco E..

B - Quanto às existências adquiridas no exterior (a que se reporta o nº 3 do item V.

FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA, a fls. 66 e seguintes da sentença): por referência ao quadro constante de fls. 66 da sentença e a uma correção proposta de € 297.182,72; considerou a Meritíssima Juíza a quo que a impugnante conseguiu provar que os eventos, fins-de-semana convívio, com ofertas de livros e vinhos a médicos, enfermeiros, administradores hospitalares e farmacêuticos, tinham como intuito dar a conhecer o laboratório da L., com o intuito dos médicos ficarem com uma boa opinião sobre os medicamentos genéricos e começarem a prescreve-los no âmbito da sua atividade, ou seja, que a impugnante justificou que aqueles custos (e somente aqueles – identificados no quadro supra referenciado como c)) foram incorridos como estratégia de marketing e publicidade.

C - Mas, assim sendo, e para que a decisão de procedência proferida nesta sede fosse cabal, teríamos de expurgar do referido quadro os custos descritos como a) e b): os primeiros, referentes a donativos em dinheiro ou em espécie efetuados pela L. a diversos hospitais S.A. (situação devidamente analisada no nº 2.2. Donativos concedidos a hospitais S.A. do item V. FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA, a fls. 60 e seguintes), tendo merecido decisão de improcedência; os segundos, referentes ao fornecimento de vinhos que se destinaram a ser consumidos e ofertados a funcionários na festa de Natal da L., os quais, por força da aceitação da decisão de procedência relativa ao item 1.

Realizações de Utilidade Social, terão que ter-se como tal.

D - Como teríamos que expurgar a correção proposta (de € 297.182,72), do valor global de € 282.981,15 (€ 274.451,65 de donativos + € 8.529,50 relativos a consumo festa Natal); permanecendo os custos com marketing e publicidade por € 14.201,57.

E - Não o tendo feito, a decisão a proferir, em sede de existências adquiridas no exterior, tal como se mostra delineada na sentença ora em apreço, seria, apenas, de procedência parcial.

F - No que aos trabalhos especializados – Banco E., concerne (nº 5 do item V. FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA, a fls. 70 e seguintes): considerou a Meritíssima Juíza a quo, por referência aos factos provados 8 a 11, que a impugnante logrou provar a indispensabilidade dos custos, procedendo, nesta parte, a impugnação.

G – O que evidencia grosseiro erro e julgamento, posto que a prova junta aos autos não permite dar como provada factualidade que o foi, e muito menos, concluir como se concluiu na sentença a quo, senão vejamos: H - Do probatório: 8.

Em 30.08.2004, a Impugnante assinou o protocolo de intenção de aquisição da sociedade comercial denominada “J., SA” com o BES – Investimento, S.A., que representava a Shareholders do capital daquela sociedade, naquelas negociações. – Cfr. fls. 511/513 do PF, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido – ora, salvo melhor opinião, o documento para o qual se remete, cujo corpo se encontra em língua inglesa (à revelia, aliás, do art. 134º do CPC) não permite estabelecer qualquer relação da L. com a empresa J. (a qual não é, sequer, mencionada em tal documento).

I - A única razão para o designar como protocolo de intenção de aquisição daquela sociedade é a afirmação produzida no articulado 152º da PI, nada mais. A este propósito, o relatório da ação inspectiva (pág. 14) dá nota da análise dos custos apresentados no relatório de contas do ano de 2004, em que relativamente ao valor elevado da conta 622 – FSE (Fornecimentos e serviços externos), onde se encontram registadas as faturas do banco E., se afirma que “…o incremento verificado na rubrica de trabalhos especializados têm um carácter extraordinário e está basicamente justificado pela consultoria financeira contratada no âmbito das negociações de reestruturação acionista”.

J - 9.

O banco E., SA enviou à Impugnante uma proposta de prestação de serviços de assessoria financeira na operação do capital da empresa J.…” Uma proposta, frisamos nós, e não um contrato de mandato financeiro, como pretende a impugnante no articulado 154º da PI; de acordo com a qual “No caso de se vir a concretizar um acordo entre a Empresa (L.) ou seus accionistas – o sublinhado é nosso - (de acordo com o relatório de inspeção, pág. 14, o sr. J. e família – esposa e filhos) e os accionistas do Alvo relativamente a uma Transação, o Banco terá direito a receber uma remuneração de sucesso … cujo valor será apurado através da aplicação de uma percentagem de 1,4% ao “Valor de Transacção … cfr. fls. 514/520 do PF, cujo teor se dá por integralmente reproduzido.” K - Ora, decorre claramente da proposta de prestação de serviços de assessoria financeira que a aquisição da totalidade ou parte das ações representativas do capital da empresa J. ou dos seus ativos foi concebida como possível, quer na esfera da empresa, quer na esfera particular dos respectivos acionistas (que, no caso, não eram nem mais nem menos do que o sr. J., presidente do Conselho de Administração da L., e família); ou seja, não era possível, ab initio, garantir que a dita transação configuraria verdadeiramente, quer custo da empresa, quer custo pessoal dos accionistas, para efeitos da respetiva consideração como um custo da empresa.

L - 10.

No âmbito da prestação de serviços de assessoria financeira referida em 9., foi elaborada uma proposta, da qual consta a Avaliação Financeira da J.…junta a fls. 521/528 do PF, cujo teor aqui se dá por reproduzido.

Pretende a impugnante, (no que parece ser secundado pela douta sentença), que submeteu proposta vinculativa de aquisição do capital da J. junto do referido representante negocial da sociedade alienante. Não obstante, o documento aqui considerado não corporiza qualquer proposta, trata-se, outrossim, de documento que alegadamente a acompanhará, conforme se pode ler a fls. 2 do dito.

M - Refere a impugnante, no articulado 160º da PI e por referência ao documento a ela junto com o nº 11, que no dia 7/12/2004, o Banco E. lhe enviou a última versão do contrato de compra e venda da totalidade das ações representativas do capital da J., é também este o teor do facto provado 11.

Em 07.11.2004, o Banco E. enviou à Impugnante a última versão do contrato de compra e venda da totalidade das ações representativas do capital da J.. – Cfr. fls. 529/533 do PF, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

N - Ocorre, porém, que tal documento não consubstancia qualquer contrato, antes consubstancia “a minha (leia-se: de J.) melhor oferta relativamente aos pontos em aberto no contrato da J.” – note-se que intervém e assina a título individual, não em representação.

O - Da conclusão/decisão: o douto tribunal ao considerar que a impugnante conseguiu provar a indispensabilidade dos custos, errou no seu julgamento, pois, resultam dos autos evidências objetivas e seguras que não infirmam a tese da AT, de acordo com a qual o negócio para cuja conclusão foram contratados os serviços do Banco E. (e que deu origem à emissão das faturas de 06/10/2004, no valor de € 60.000,00 e de 20/01/2005, no montante de € 654.048,00; cujos valores foram, pela AT, desconsiderados como custos fiscais da impugnante) estava, desde o início, pré-configurado para ser celebrado ou pela impugnante ou pelos seus acionistas.

P - Na eminência da venda da L. ao grupo alemão F. (amplamente divulgado na imprensa à época) e pretendendo manter-se ligado à parte farmacêutica, os próprios acionistas da empresa viram na aquisição da J. (cujos termos negociais conheciam de muito perto, em virtude de o acionista maioritário ser também o Presidente do Conselho de Administração e, consequentemente, interlocutor privilegiado nas negociações), uma oportunidade de fazer repercutir custos da sua esfera pessoal na empresa.

Q - Só assim se compreende que a fatura emitida a 20/01/2005, data em que a impugnante já não era detida pela família Coimbra, tivesse sido contabilizada no exercício de 2004, à mais descarada revelia do princípio da especialização dos exercícios.

R - De acordo com a proposta de prestação de serviços de assessoria financeira, pelo Banco E., na operação do capital da empresa J. (doc. 9) a remuneração de sucesso só seria apurada através da aplicação de uma percentagem ao valor da transação. Ora, como antever, a 30/12/2004, o valor efetivo da taxa de sucesso, relativamente a uma operação que apenas se concretizou em 04/01/2005? Nem fantasiando (como faz a impugnante ao longo dos articulados 163º a 180º da PI) no que concerne às alegadas exigências impostas pelo grupo F., relativamente às quais não há, aliás, qualquer evidência documental.

S - A sentença faz uma aplicação do direito aos factos que erra quanto à factualidade que se deveria ter dado por provada, e dos autos, não sobra qualquer dúvida de que todo o circunstancialismo demonstrado pela AT deve orientar o julgador no sentido contrário da decisão tomada...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT