Acórdão nº 00960/13.3BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Novembro de 2020
Magistrado Responsável | Ana Patrocínio |
Data da Resolução | 19 de Novembro de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório J.
, contribuinte fiscal n.º (...), residente na Fonte (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em 13/05/2014, que julgou improcedente a Oposição deduzida contra a execução fiscal n.º 04002005010362761 e apensos, instaurada pelo Serviço de Finanças de Fafe originariamente contra a sociedade “J., Lda.
”, por dívidas relativas a IVA e IRC dos anos de 2004, 2005 e 2006, no montante global de €19.658,57, e contra si revertida.
A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “1 – A sentença recorrida considerou a oposição totalmente improcedente, por entender que a recorrente não logrou carrear para os Autos elementos comprovativos de que à data da sua renúncia à gerência a sociedade dispunha de património suficiente para a liquidação das dívidas fiscais, nem que até 2003 a devedora originária tinha a sua situação fiscal regularizada; 2 - De acordo, com o disposto no art. 24º da LGT a responsabilidade subsidiária depende, antes de mais, do efectivo exercício da gerência ou administração, ainda que somente de facto; 3 – In casu, a recorrente alegou que renunciou à gerência em 05/01/2004, pelo que findo o exercício económico de 2003, não mais exerceu qualquer função na sociedade originária devedora como gerente, referindo-se as dívidas exequendas aos anos de 2004, 2005 e 2006.
4 - Ao abrigo do art. 24.º da LGT, a lei exige para a responsabilização a gerência efectiva ou de facto, o efectivo exercício de funções de gerência, não se bastando com a mera titularidade do cargo, a gerência nominal ou de direito.
5 - Neste sentido, é à AT, enquanto exequente, que compete demonstrar a verificação dos pressupostos que lhe permitam reverter a execução fiscal contra o gerente da sociedade devedora originária e, entre eles, os respeitantes à existência da gestão de facto (de acordo com a regra geral de quem invoca um direito tem que provar os respectivos factos constitutivos – cf. art. 342.º, n.º 1, do CC e art. 74.º, n.º 1, da LGT).
6 - Por isso, na ausência de quaisquer outros elementos que, conjugados com a gerência de direito, permitam ao julgador inferir a gerência de facto nem sequer interessa apurar se a oponente pode ou não opor à Fazenda Pública a sua renúncia à gerência e mesmo admitindo-se a inoponibilidade à Fazenda Pública da renúncia à gerência, nunca poderia concluir-se que a Oponente foi gerente de facto da sociedade originária devedora.
7 - Era à Fazenda Pública que competia alegar a factualidade que permitisse concluir que a recorrente exerceu efectivas funções como gerente no período a considerar, o que não fez; 8 - Se é certo que o Tribunal com competência para o julgamento da matéria de facto pode inferir a gerência de facto da gerência de direito, trata-se de uma presunção judicial que só pode ser usada pelo Tribunal e em sede do julgamento da matéria de facto.
Não pode é pretender-se que, ao abrigo dessa possibilidade concedida ao julgador no julgamento da matéria de facto (uso de regras de experiência), não recaia sobre a Fazenda Pública o ónus da prova da gerência de facto. Muito menos se pode pretender que a Fazenda, ao abrigo dessa possibilidade, fique dispensada de alegar essa gerência efectiva, o efectivo exercício de funções de gerência, como requisito para reverter a execução ao abrigo do art. 24.º da LGT.
(sublinhado nosso) 9 - A douta sentença recorrida incorreu, pois, em erro de julgamento ao fazer errada interpretação e aplicação, entre outros, do disposto no art. 24º da LGT.
Nestes termos, e nos melhores de direito que Vas. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente e consequentemente ser alterada a sentença recorrida por outra que julgue a oposição totalmente procedente.
Assim decidindo, farão V.Exas., Venerandos Conselheiros, a habitual JUSTIÇA.”****Não houve contra-alegações.
****O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.
****Com dispensa dos vistos legais, tendo-se obtido a concordância dos Meritíssimos Juízes-adjuntos, nos termos do artigo 657.º, n.º 4 do CPC; cumpre apreciar e decidir.
****II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao considerar verificado o requisito da gerência de facto para reverter a execução ao abrigo do artigo 24.º da Lei Geral Tributária (LGT).
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Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de facto com o seguinte teor: “Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos: 1. Foram designados em 23.01.1998 gerentes da sociedade J., Lda., F. e a aqui Oponente, obrigando-se a sociedade pela assinatura conjunta dos dois gerentes – cfr. fls. 28 a 32 do processo de execução fiscal (PEF) junto aos autos.
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Em 5.01.2004 foi lavrada a acta n.º 8 em Assembleia Geral Extraordinária da sociedade J., Lda., de onde decorre o seguinte: “(…) com a seguinte ordem de trabalhos: Cessação de Quotas de J. e F.; Renúncia à Gerência de J. e F.; Nomeação de Gerência.
Aberta a sessão os sócios (…) declararam que cedem as suas quotas a A. (…) Os sócios J. e F. declaram que renunciam à gerência.
O agora sócio (…) fica desde já nomeado gerente da respectiva sociedade. (…)” – cfr. fls. 10 dos autos.
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O Serviço de Finanças de Fafe instaurou em 4.08.2005 o processo de execução fiscal nº 0400200501036726, respeitante a dívidas de IRS do ano de 2004, em nome de J., Lda., NIPC (…), no montante de €34,00 - cfr. fls. 1 e 2 do PEF junto aos autos.
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Em 25.05.2006 foi emitida informação pela Brigada Fiscal do Porto nos seguintes termos: “(…) levamos a efeito uma diligência à fábrica de costura e bordados – J. Lda NIF (…) sita em (…), da qual resultaram os seguintes factos: I São sócios da referida fábrica J., Divorciada, nascida aos 02/08/1971, (…) e F., Divorciado (…) III Na residência dos sócios da referida fábrica, foram apreendidos diversos polos, sacos de plástico e outros componentes. (…) X Na parte final da busca aos dois locais, os visados começaram por dizer que até nada tinham haver com os bens apreendidos, pois a fábrica encontrava-se em nome de F. (…), mantendo os mesmos apenas a responsabilidades perante as Finanças, pois tinham efectuado um trespasse da fábrica em 2/11/2005.
XI É de salientar que já aos 18 dias do mês de Abril de 2005 foi levado a efeito por este Destacamento Fiscal uma busca à já acima referida fábrica tendo nessa data apreendido que na dependência da fábrica 1.170 pólos de diversas marcas e aproximadamente 1.675 gramas de botões de diversas marcas. (…)” – cfr. fls. 79 a 89 dos autos.
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Em 13.03.2007 foi emitido pela J., Lda., recibo de vencimentos em nome da aqui Oponente relativamente a Março de 2007 de onde consta designada na categoria “sócio-gerente” – cfr. fls. 52 dos autos.
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Em 10.11.2009 foi proferido despacho para audição...
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