Acórdão nº 02931/13.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Julho de 2020

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução03 de Julho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO Nestes autos em que é Autora M. e Réu o Instituto da Segurança Social, IP, ambos neles melhor identificados, foi proferida decisão pelo TAF do Porto que julgou procedente a excepção dilatória de caducidade do direito de acção e absolveu da instância a Entidade Demandada.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Autora concluiu: 1ª - A Mª Juíza julgou procedente a exceção de caducidade do direito da ação, padecendo a sentença recorrida de erro de julgamento na aplicação do disposto no art.º 58º, n.º2, do CPTA.

  1. - A Segurança Social, na contestação, admite que existiram em simultâneo e entrecruzados dois procedimentos: (i) revogação de subsídio de doença (ii) reposição dos valores das prestações sociais.

  2. - Atendendo aos factos dados como provados e os documentos quer do processo administrativo, quer juntos pela autora, agora recorrente, na petição inicial, podemos concluir que estes dois procedimentos tiveram notificações autónomas sucessivas no tempo; (ofício de 08.04.213 – comunicando o despacho de 26.03.2013 de suspensão/cessação e ofício de 31-05-2013 com carimbo dos serviços de 06.06.2013 – restituição de prestações indevidamente pagas).

  3. - Até à data de 26/3/2013, o acto alegado como impugnável pela SS era inexistente, porquanto só foi tornado público em 28 de Maio quando os serviços respondem por mail à mandatária, com a anexação digitalizada do processo.

  4. - O ofício datado de 31/5/2013 na sua configuração e forma, denota e integra dois actos finais: o acto de revogação de atribuição de subsídio de doença - “O Subsídio de doença de 2010-06-25 a 2011-01-16 e de 2011-10-11 a 2012-09-12 foi revogado nos termos da al) c do n.º 1 do artº 24º DL 28/2004 de 04/02 por exercício de actividade profissional em simultâneo com subsídio de doença” e o acto de reposição das prestações pagas- “Assim, mantém-se em dívida o valor indicado na Nota de Reposição, devendo efectuar o respectivo pagamento no prazo de oito dias a contar da recepção deste ofício…”.

  5. - Para a recorrente, esta notificação consagrava a externalização/publicitação final por parte da SS dos dois procedimentos em curso, o que é evidenciado pela indicação de que, caso a reposição não fosse efectuada, procederiam à subsequente execução/cobrança coerciva, sinal evidente de que esta notificação era o acto final dos procedimentos unificados neste último ofício.

  6. - Acresce que para a Autora, a lesão imediata, directa e efectiva, resultava da ordem de reposição das prestações, pois a revogação do acto de atribuição do subsídio de doença estava consumada desde 12-09-2012, momento em que deixou de ser atribuído o subsídio de doença.

  7. - A indicação na notificação dos prazos de impugnação graciosa e contenciosa reforçava a ideia de que esta notificação de 31/5/2013 era do acto final dos procedimentos, quando na notificação de 8/4/2013 nenhuma referência a este respeito (dos prazos de impugnação) era feita.

  8. – É contrário à boa-fé que seja a Recorrente penalizada pelo eventual erro da notificação da Administração Pública, quando é manifesto que a Recorrente tem que beneficiar do prazo para o qual é expressamente notificada.

  9. - E deve ser indiferente, caso esteja ou não a Recorrente patrocinada no processo desde 28 de maio de 2013, pois que à parte é legitimo confiar nos atos praticados pela administração pública, não devendo a lei ser aplicada caso a caso ou consoante as partes estejam ou não patrocinadas por advogado, pois que a notificação é feita à própria parte. (artº 6º-A do C.P.A.) 11ª - Aquela sobreposição / confusão de procedimentos e notificações induziram a Recorrente em erro sobre o acto impugnável.

  10. - Depreende-se do princípio da boa administração que os órgãos, titulares agentes da administração pública nos contactos escritos ou notificações formais de atos que restrinjam, retirem ou recusem direitos ou legítimos interesses dos particulares sejam redigidos de forma clara, com indicações precisas e não conducentes a duplas interpretações.

  11. - A reposição /restituição foi o último acto dum procedimento que se iniciou pela revogação da atribuição do subsídio de doença.

  12. - A Recorrente considerou como acto impugnável aquele contra o qual deveria reagir, aquele que lhe ordena restituir as prestações de subsídio recebidas, ideia reforçada pela forma como o texto é apresentado como também da informação de que a partir daquele ofício começavam a contar os prazos de impugnação graciosa e contenciosa.

  13. - O acto de revogação e o acto de reposição por terem a mesma génese deveriam ter um só procedimento.

  14. - Aquilo que devia ter sido tratado numa sequência procedimental única, foi tratado por notificações separadas, assinadas por assistentes administrativos, sem referência da delegação de competências ou sequer dos autores do acto, umas notificações com indicações de prazos de impugnação e outras notificações sem qualquer referência a esse respeito.

  15. - Deveria assim o Tribunal a quo entender que, o acto impugnável era o acto de Março de 2013 (desconhecido da autora até 28/5/2013) e portanto deve-se considerar tempestiva a apresentação da petição nos temos do art. 58º, n.º4 (dentro do prazo de 1 ano), pois o atraso seria desculpável e justificável pela conduta da SS e consequentes dificuldades em saber qual o acto impugnável, devendo ser revogada a douta decisão recorrida.

  16. - A decisão recorrida ao qualificar o ato que ordena a reposição de quantias alegadamente indevidas pagas a título de subsídio de doença um mero ato executório sem autonomia de eficácia jurídica para ser autonomamente sindicado, incorre em erro de Direito.

  17. - A revogação do ato de atribuição do subsídio de doença, não teve com fundamento a invalidade do ato revogado; ou seja, a atribuição do subsídio de doença teve com base, como pressuposto um facto verdadeiro e não posto em causa pelas Recorrida; a Recorrente, estava de facto doente ao momento da atribuição do subsídio de doença.

  18. - A razão da revogação funda-se na alegada verificação a posteriori de que, apesar de doente e de receber SD cumulava com o exercício regular de gerência, portanto a revogação teve como fundamento uma conduta posterior ao ato de atribuição do SD.

  19. - Se a revogação do ato não teve como fundamento a invalidade do ato revogado, então só poderia ter efeitos para o futuro (v. art.º 145º, n.ºs 1 e2 do CPA em vigor ao momento dos factos). E assim foi: foi suspensa/cessada a atribuição do SD a partir de 12/09/2012.

  20. - Contudo, o acto de ordem de reposição tem efeitos retroativos, por natureza: manda repor as quantias alegadamente indevidamente recebidas a título de SD desde o início da sua atribuição até àquela data.

  21. - Considerando, como o fez a douta sentença recorrida, que o ato que ordena a reposição das quantias pagas (SD) é ato de mera execução, a sua carga retroativa excede os limites materiais do ato exequendo (relembre-se que este tinha, só podia ter, meros efeitos para o futuro). Cfr. Art.º 151º , n.º3, do CPA vigente ao tempo.

  22. - Este exceder os limites do ato exequente, por via da retroatividade que o ato exequendo não continha, legitima que o ato exequente possa ser autonomamente impugnado. E assim sendo, ter-se-á que aceitar, que o ato de reposição foi tempestivamente impugnado (na medida em que excede os limites do ato que alegadamente executa), e pelo menos neste concreto ponto a ação deveria proceder, em cumprimento do princípio pro actione , previsto no art.º 7º do CPTA.

  23. - Ao não decidir assim a sentença a quo, não só violou a norma do art.º 151º, n.º 3, do CPA, como o princípio de cariz constitucional do direito do aceso à Justiça plasmado no art.º 7º do CPTA.

********** Termos em que, bem como em todos os mais, de direito aplicáveis, com o suprimento e na procedência do aqui alegado, deve ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogar-se a decisão recorrida, o que se fará por obediência à lei e imperativo da JUSTIÇA.

O Réu juntou contra-alegações, concluindo: 1. A Recorrente M. foi objeto de uma averiguação/fiscalização efetuada pelos serviços do Recorrido, tendo dado origem ao PROAVE (processo de averiguação) n.º 201200018119, tendo-se concluído – cfr. o Relatório final a fls. 1 a 9 do PA – que a beneficiária com o número de identificação da Segurança Social, doravante NISS, 11322265653, acumulou o subsídio de doença com trabalho efetivamente prestado (atividade profissional de gerente), nos períodos de 25.06.2010 a 16.01.2011 e de 11.10.2011 a 12.09.2012, pelo que se entendeu, em 26.03.2013, por despacho da Diretora do Núcleo de Prestações de Doença e Outras, do Centro Distrital do Porto do Recorrido, cessar/revogar a decisão de atribuição de subsídio de doença, nos termos do disposto na alínea c), do n.º 1 do artigo 24.º do Decreto-Lei n.º 28/2004 de 04.02.

  1. Esta decisão/despacho foi notificada(o) à Recorrente por ofício de 08.04.2013.

  2. Assim, é verdade a 4.ª conclusão da Recorrente quando diz que até à data de 26.03.2013 “o acto alegado como impugnável” era inexistente, pois o mesmo só foi praticado nessa data.

  3. Porém, a alegação da Recorrente de que “O alegado acto impugnável de 26/03/2013 só foi tornado público em 28 de Maio, quando os serviços respondem por mail à mandatária, com a anexação digitalizada do processo.

    ”, não corresponde à verdade.

  4. De facto, a Recorrente encontra-se representada, desde 06.05.2013, pela mandatária e, em 13.05.2013, veio aquela, requerer a consulta do processo administrativo dizendo que “Na sequência da V/ notificação de revogação das prestações, por doença atribuídas à minha representada (…)” pelo que fácil é comprovar-se, quanto mais não seja, porque admitido pela mandatária da Recorrente, a agir em nome e no interesse desta, que, em data anterior a 13.05.2013 e nunca a partir de 28.05.2013, foi a Recorrente notificada da cessação/revogação das prestações de doença, portanto do ato...

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