Acórdão nº 00647/14.8BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução19 de Junho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte: I- RELATÓRIO 1.1.

M.

, moveu a presente ação administrativa comum contra a EP – ESTRADAS DE PORTUGAL, S.A., pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia global de € 25.000,00 (vinte e cinco mil euros), devida a título de indemnização por danos não-patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral e efetivo pagamento.

Alegou, para tanto, em síntese, que desde 1994 que tem tentado junto da Ré, antes JAE (Junta Autónoma das Estradas), que lhe fosse concedida viabilidade de construção de um posto de combustíveis simples, da classe C, na E.N 17-1, ao Km 17+600, em (...), no prédio rústico de que é proprietária, conforme requerimentos designadamente de 19.04.1994, 13.01.1997, o último dos quais em 23.01.2009, que foram sendo indeferidos; Em 03.04.2013, intentou neste tribunal uma ação administrativa comum (proc. nº 223/13.2BECBR), contra a ora Ré e o Ministério da Economia e do Emprego, pedindo que fosse reconhecida a viabilidade de instalação de um posto de abastecimento de combustível no prédio em causa, atenta a sua localização; Nessa ação foi celebrado um acordo extrajudicial, em que a ora Ré reconheceu (finalmente) ser viável a instalação /implantação de um Posto de Abastecimento de Combustíveis (PAC), no prédio da Autora, conforme Informação da Delegação Regional de Coimbra, da EP, SA, datada de 29.04.2013; Foi requerida a extinção da instância por inutilidade superveniente da lide, o que foi decidido por sentença de 22.10.2013; Foram necessários 19 anos para a JAE, agora Ré, reconhecer a viabilidade da instalação/implantação de um PAC no prédio da ora A; Neste intervalo de tempo, foram vários e múltiplos os requerimentos e intervenções da ora A. no sentido que a Ré viesse a reconhecer a sua pretensão; Não existe justificação legal nem de facto, para a ora Ré ao longo de todos estes anos ter indeferido a pretensão da ora A.; Só em 03.12.2003, passados quase 10 anos do Oficio da então JAE que indeferiu pela primeira vez a pretensão da A., é que a Ré notificou a A. da RESOLUÇÃO DE EXPROPRIAR, nos termos do artigo 10º da Lei nº 168/99, de 18 de Setembro (à data em vigor), tendo o processo expropriativo culminado em 31.12.2004, numa parte muito pequena do prédio da A.; Até ao ano de 2003, inexistia qualquer deliberação /resolução formal da Ré em requerer a declaração de utilidade pública; A A. foi arbitrariamente condicionada pela Ré no seu direito de propriedade e na iniciativa e possibilidade de instalar no seu prédio um posto de abastecimento de combustíveis; Sem o parecer positivo de viabilidade de instalação do Posto de Abastecimento de Combustível (PAC) por parte da Ré, a A. ficou sempre impossibilitada de proceder ao estabelecimento, instalação, construção e posterior exploração do mesmo; Como consequência direta e necessária da atuação ilícita e culposa da Ré, por não ter respeitado o DL 13/71, de 23.01, relativo às condições de concessão da referida licença, sofreu danos morais e não patrimoniais pelos quais pretende ser ressarcida; Com a atuação da ora Ré, começou a andar abatida desgastada psicologicamente e triste, sintomas que se vão agudizando com o passar dos anos e que, ainda nos dias que correm se vão amiúde revelando; Em 1997, vendeu mesmo uma loja, cujo produto da venda se destinava, em parte, a custear a instalação e construção do posto de abastecimento de combustíveis; 1.2.

A Ré, EP – Estradas de Portugal, S.A., a fls. 106 e segs., contestou, invocando a exceção da prescrição do direito da Autora, e defendeu-se por impugnação, alegando, em suma, que o prédio onde a ora Autora pretendia instalar o PAC foi expropriado em 31 de dezembro de 2004, pelo que os indeferimentos dados pela ex-JAE à pretensão de instalação de PAC desde 1994 a 2002, estão perfeitamente justificados; Desde 2002 à data atual a A. somente solicitou uma vez- janeiro de 2009-, licença para instalação do PAC; A decisão de indeferimento deste pedido, foi comunicada à A. em outubro de 2009, e dela a autora não reclamou graciosamente nem impugnou contenciosamente; Pediu a procedência da exceção de prescrição ou, caso assim se não viesse a entender, a improcedência da ação.

1.3.

Realizou-se a audiência prévia, conforme ata de fls. 151-153, tendo a autora respondido à exceção peremptória da prescrição, pugnando pela sua improcedência.

1.4.

Proferiu-se despacho saneador-sentença que julgou procedente a exceção da prescrição constando do mesmo a seguinte parte dispositiva: «Com os fundamentos expostos decide-se: julgar procedente a excepção peremptória de prescrição invocada pela Ré, Estradas de Portugal, S.A., absolvendo-a do pedido.

Custas a cargo da Autora, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.

Registe e notifique.» 1.5.

Inconformada com o assim decidido, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: «1 - Vem o presente recurso interposto da Sentença/Despacho saneador proferida no âmbito dos presentes Autos que julgou procedente a invocada excepção peremptória de prescrição, e, em consequência, absolveu a Ré do Pedido.

2 - Considerou o Tribunal “a quo”, na decisão recorrida, que à data da citação da Ré já havia decorrido o prazo prescricional ordinário de 20 anos, nos termos do artigo 309º do CC, bem como (em 2014) havia decorrido o prazo prescricional de 3 anos, previsto no artigo 498º, nº 1, do CC, pelo menos desde o último acto de indeferimento notificado à A. em 2009.

3 - A A., ora Recorrente, configura a Acção, tal como avulta da PI, fundando-a no instituto da responsabilidade civil extracontratual.

4 – Salvo outra e melhor opinião, a decisão recorrida (contrariamente ao que fez) devia ter atendido apenas ao prazo especial de prescrição fixado no artigo 498º do CC, que vigora só para a responsabilidade extracontratual, sendo que à responsabilidade obrigacional aplica-se o prazo de prescrição ordinária (de 20 anos).

5 – Com efeito, verifica-se que a Ré, na sua Contestação, veio arrazoar que entre o último indeferimento do pedido de instalação de um Posto de Abastecimento de Combustíveis (datado de 27/10/2009) e a data de entrada da presente Acção decorreram praticamente 5 anos, pelo que invoca a excepção peremptória de prescrição, alicerçando-se no preceituado do nº 1 do artigo 498º do CC.

6 - Dispõe nº 1 do artigo 498º do CC que “O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete...”.

7 - Isto é, o prazo de três anos inicia-se com o conhecimento do “direito que lhe compete”, isto é, do conhecimento, em concreto, dos pressupostos da responsabilidade civil (conduta lesiva, a respectiva ilicitude, a culpa do agente, e o dano), que se pretende exigir.

8 - A verdade é que a Ré quando invoca no seu articulado a excepção ora em causa, nem sequer alega e demonstra que a aqui A. conhecia a verificação, à data do último indeferimento do pedido de viabilidade, dos pressupostos que condicionam a responsabilidade, de forma a iniciar-se a contagem o prazo de prescrição de 3 anos, sendo que, na senda do plasmado no nº 2 do artigo 342º do CC, não nos podemos alhear que a prescrição configura um facto impeditivo do direito da A., que à Ré competia, pois, alegar e provar.

9 - ORA, no caso em apreço, à data do último indeferimento, a A. não conhecia do direito que lhe competia, uma vez que ainda que conhecesse o facto em si, desconhecia sempre e pelo menos a ILICUTUDE DO FACTO.

10 - Aliás, tal facto parece-nos tão evidente, uma vez que a A. veio mesmo interpor em 03/04/2013 uma Acção Administrativa Comum, nomeadamente contra a ora Ré, pedindo que lhe fosse reconhecido ser viável instalar-se um posto de abastecimento de combustíveis no prédio objecto dos presentes Autos, e condenando ainda e designadamente a Ré a tal reconhecer.

11 - Na verdade, apenas com a Informação, datada de 29/04/2013, e Despacho favorável (Vide designadamente a factualidade dada como assente 21º da sentença recorrida) e respectivo conhecimento do mesmo, a A “teve conhecimento do direito que lhe compete”, ou seja, conhecimento que tem um direito a ser indemnizada.

12 - Pelo que, só com o conhecimento da mencionada Informação/Despacho, se iniciou a contagem do prazo prescricional a que alude o nº 1 do artigo 498º do CC, interrompida com a entrada/citação da Acção a que respeitam os presentes Autos.

13 - Quanto a nós o Tribunal “a quo” não levou em consideração, como devia, a factualidade ora alegada, nem, por outro lado, existem elementos nos Autos (nem sequer invocados pela Ré) que permitam desde já um desfecho dos Autos, no sentido de chegar a um juízo conclusivo que a A. conhecia a “ilicitude” da actuação da Ré pelo menos desde a data do último indeferimento.

14 – Normas jurídicas violadas com a decisão recorrida: artigos 498º, nº 1, e 342º, nº 2, todos do CC.

Termos em que, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em sua consequência, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra na medida do presente recurso».

1.6.

O apelado contra-alegou pugnando pela improcedência da apelação e concluindo as suas contra-alegações nos seguintes termos: «1.O recurso interposto alicerça-se na discordância da convicção do tribunal a quo dos factos provados.

  1. Ora, a Recorrente não fundamenta as suas alegações com o rigor que se mostra necessário, para que o tribunal a quo, mude, agora, os factos dados como provados.

  2. A Recorrente demandou a Recorrida, com fundamento no Instituto de responsabilidade civil — artigo 483º do CC, sendo que a responsabilidade em causa e a correlativa obrigação de indemnizar por parte da Recorrida, só ocorre, 4.Verificando-se os pressupostos cumulativos enunciados no n.º 1 do artigo 2º do citado Decreto-Lei n.º 48051, de 21.11.67 (diploma então aplicável), e no artigo 483º, n.º 1, do CC, relativos à responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas...

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