Acórdão nº 00746/19.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução19 de Junho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* *I – RELATÓRIO H., SAS, com os sinais dos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL do despacho saneador-sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, de 02.03.2020, promanado no âmbito da Ação de Contencioso Pré-Contratual que a Recorrente intentou contra o CENTRO HOSPITALAR E UNIVERSITÁRIO DE (...), E.P.E., também com os sinais dos autos, que julgou improcedente a presente ação de contencioso pré-contratual e, em consequência, absolveu o Réu, aqui Recorrido do pedido.

Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) 1. Vem o presente recurso interposto da douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que absolveu a R. do pedido formulado pela a A. no âmbito do processo de contencioso pré-contratual e no qual julgou improcedente a anulação do ato de adjudicação levado a cabo pela R. em virtude de violação de regras procedimentais.

  1. A Douta sentença recorrida considerou provada, a matéria provada acima elencada.

  2. Contudo, considera a ora Recorrente, salvo o devido respeito, que os factos constantes nos números 12) e 14) foram incorretamente dados como provados e em consequência, incorretamente julgados.

  3. De acordo com a cronologia dos factos, a Recorrente, em 31 de julho de 2018, candidatou-se ao concurso publico promovido pela Recorrida CENTRO HOSPITALAR E UNIVERSITÁRIO DE (...), E.P.E- Concurso Publico é o N° 010000122018- Lote 4. Tendo sido notificada em 31 de agosto de 2018 do relatório preliminar elaborado pela Recorrida.

  4. Face ao teor do referido relatório, a Recorrente deduziu ao abrigo do disposto nos art.° 147° e art.° 123° do Código dos Contratos Públicos, pronuncia tendo sido notificada do respectivo relatório final em 9 de outubro de 2018.

  5. Em dezembro de 2018, concretamente, no dia 11 de novembro, a Recorrente é notificada do Relatório Final - Ata n° 4, já junto aos autos e no qual a Recorrida comunica a sua pretensão de excluir aquela e adjudicar a proposta a uma outra candidata.

  6. Na sequência deste relatório final, consubstanciado na Ata n° 4 e não se conformando com o teor do mesmo, a Recorrente requereu ao abrigo do disposto no art.° 147° do CCP, Audiência Previa e Escrita.

  7. Não tendo obtido qualquer resposta ou despacho relativamente aquela pronúncia exarada no âmbito do direito de audiência previa.

  8. Face à total ausência de resposta, a ora Recorrente em 3 de outubro de 2019, elaborou na plataforma eletrónica dos Contratos Públicos e junto da entidade competente, pedido de informação sobre o processo concursal em curso.

  9. Não obstante a Recorrida estar legalmente vinculada a responder ao abrigo do disposto nos arts. 65° do C.P.A e 266° e 268° da C.R.P, não o fez.

  10. Tal conduta, forçou inevitavelmente o recurso à via judicial com vista à obtenção de informação procedimental através de uma intimação judicial para prestação de informações.

  11. A Recorrida veio a confessar, que por lapso, não procedeu à notificação da ora Recorrente da decisão de adjudicação.

  12. Não se vislumbra aqui, ao contrário do que refere o Tribunal a quo, o acordo quanto à existência do lapso. Tal facto, não foi nunca alegado pelas partes processuais como tendo sido acordada.

  13. O lapso que ocorreu no decurso do procedimento concursal resultou da confissão expressa da ora recorrida prestada de forma coerciva no âmbito do processo de intimação judicial para prestação de informação.

  14. Tanto mais, que a Recorrida só após a sua citação na supra referenciada ação de intimação administrativa para prestação de informação em 13. 11. 2019 veio em 25 de novembro de 2019, conforme resulta do elenco dos factos provados - vide ponto 14) a notificar a ora Recorrente do ato de adjudicação.

  15. Assim não se compreende que a Mma Juiz a quo tenha considerado o facto constante no número 12) do supra referenciado elenco como provado por acordo e que, a Recorrida, em conformidade com o constante no numero 14) dos factos dados como provados, detetado o lapso, tenha procedido através da plataforma eletrónica à notificação da adjudicação à ora Recorrente de acordo com a lei.

  16. Efetivamente este normativo - art° 85 n° 1 do CCP, dispõe que o órgão competente para a decisão de contratar notifica em simultâneo todos os concorrentes da apresentação dos documentos de habilitação pelo adjudicatário, indicando o dia em que ocorreu apresentação.

  17. É, pois, uma formalidade essencial (cfr. Jorge Andrade da Silva, ob. cit. Pag. 331) que foi preterida. (sublinhado nosso) 19. O dever de notificação dos atos da administração pública com eficácia externa é uma das manifestações do princípio da transparência e é um dever que está constitucionalmente consagrado e que merece igualmente confirmação no art.° 98° do novo CPA.

  18. Por isso, na concretização desse imperativo constitucional, o art.° 66° do CPA estabelece que devem ser notificados aos interessados os atos administrativos que decidam sobre quaisquer pretensões por eles formuladas, que imponham deveres, sujeições ou sanções, ou causem prejuízos, ou que criem, extingam, aumentem ou diminuam direitos ou interesses legalmente protegidos, ou afetem as condições do seu exercício 21. Deste modo, viola o princípio da concorrência e da transparência o ato de adjudicação praticado nas circunstâncias supra descritas.

  19. Atendendo aos valores da transparência, igualdade e concorrência, que devem estar presentes nos concursos públicos, não devem ser aceites condutas como as que foram levadas a cabo pela Recorrida, mesmo que tal, o que não se concede, se tenha verificado por lapso. (sublinhado nosso) 23. Acresce que à omissão do ato de adjudicação, a Recorrida, no decurso do procedimento concursal não deduziu resposta à pronúncia apresentada pela Recorrente em sede da audiência previa de interessados.

  20. Relativamente a esta matéria, considerou a douta sentença do Tribunal a quo, considerou que as exigências decorrentes do direito de audição, no que respeita a ponderação e apreciação, no terceiro Relatório Final, das pronúncias dos concorrentes sobre o teor do segundo Relatório Final (mormente, a pronúncia da A., teriam sido plenamente cumpridas pela Recorrida.

  21. Com efeito, a audiência de interessados como figura geral do procedimento administrativo decisório de 1° grau, representa o cumprimento da diretiva constitucional de participação dos cidadãos na formação das decisões sou deliberações que lhes disserem respeito” - Cf. art.° 267 n° 5 da CRP, arts. ° 7 e 100° do C.P. A.

  22. Esta garantia constitucional não estaria assegurada se vedássemos, cerceássemos a intervenção dos particulares, neste caso, dos concorrentes no procedimento “sub judice” o que se verificou” in casu” 27. Ressalve-se que no caso em apreço, a Recorrente na data de 14 de dezembro de 2018, apresentou pronuncia ao Segundo relatório final - Ata n° 4- já junta aos autos na sequência de uma nova e diferente argumentação por parte do júri do concurso.

  23. Tendo a Recorrida alterado o reposicionamento dos concorrentes no concurso, ou seja, este ato administrativo consubstancia uma verdadeira reclassificação.

  24. Tal circunstância de facto, a qual se encontra documentalmente provada nos autos, não foi atendida pelo Tribunal a quo quando decidiu, em concreto, nos termos acima consignados.

  25. Neste enquadramento, impunha-se que a Recorrida, respondesse à pronúncia exercida no âmbito da Audiência Previa antes da decisão final de adjudicação.

  26. Porquanto os fundamentos da reclamação/pronúncia e a falta de apreciação dos desta poderia conduzir a uma reordenação do resultado incumprindo deste modo, a ora recorrida, uma formalidade essencial prevista na lei - arts. 82°, 83° e 84° do CPA.

  27. A deliberação de adjudicação levada a cabo pela Recorrida, padece deste apontado vício de forma e igualmente do vício de violação de lei, por desrespeito das normas dos arts. 147.° e 123.° CCP, nos arts. 100.° a 104.° CPA, art° 267.° e n.° 4 CRP.

  28. Considerando os vícios de natureza formal em que incorre o ato de adjudicação, por falta de fundamentação e preterição de audiência prévia, deverá a Douta sentença ser revogada considerando-se procedente e em consequência anulando o ato sub judice.

(…)”.

*Notificado que foi para o efeito, o Recorrido não contra-alegou.

*O Tribunal a quo proferiu despacho de admissão do recurso, fixando os seus efeitos e o modo de subida.

*O/A Digno[a] Magistrado[a] do Ministério Público junto deste Tribunal Superior não emitiu o parecer a que se alude no nº.1 do artigo 146º do CPTA.

**Com dispensa de vistos prévios, cumpre, pois, apreciar e decidir, já que nada a tal obsta.

* *II - DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A DECIDIR O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, de acordo com o disposto nos artigos 144.º n.º 2 e 146.º n.º 4 do C.P.T.A. e dos artigos 5.º, 608.º n.º 2, 635.º n.ºs 4 e 5 e 639.º do novo CPC ex vi dos artigos 1.º e 140.º do CPTA.

Neste pressuposto, as questões essenciais a dirimir resumem-se a saber se o despacho saneador-sentença recorrido, ao julgar nos termos descritos no ponto I) do presente acórdão, incorreu em (i) erro de julgamento de facto, bem como em (ii) erro de julgamento de direito.

Assim sendo, estas serão, por razões de precedência lógica, as questões a apreciar e decidir.

* *III – FUNDAMENTAÇÃO III – DE FACTO O quadro fáctico [positivo e negativo e respetiva...

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