Acórdão nº 01074/12.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 04 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelPaula Moura Teixeira
Data da Resolução04 de Junho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Seção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO Os Recorrentes, Massa Insolvente de (...), contribuintes n.º (…) e (…), respetivamente, melhor identificados nos autos, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente a pretensão pelos mesmos deduzida na impugnação judicial, relacionada com a liquidação adicional de IRS de 2008, 2009, 2009 e 2010.

Os Recorrentes interpuseram o presente recurso, formulando nas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: “(…) .

  1. Quanto à impugnação da decisão de facto: 1ª - A sentença recorrida incorreu em erro na apreciação da matéria de facto, pelo que há que analisar em primeiro lugar o erro na apreciação da matéria de facto dada como provada e não provada, cuja alteração se afigura necessária, e que influenciou decisivamente a decisão de direito proferida. A questão decidenda, fulcral nos presentes autos, é a de saber se a determinação da matéria coletável, que deu origem às liquidações de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), resultante de prévio procedimento de inspeção tributária, ocorreu por mera correção aritmética como alega a IT e a recorrida Administração Tributária e Aduaneira (ATA), com respeito pelos pressupostos de facto e de direito previstos legalmente para este método de determinação da matéria coletável. Os recorrentes entendem que não, que sob a designação de correções aritméticas a AT aplicou, isso sim, presunções, recorrendo a amostragens aleatórias e outros métodos indiretos e que, por via disso as liquidações enfermam de manifesta ilegalidade. Associada a esta questão colocam-se outras questões de direito relacionadas com os vícios formais do procedimento inspetivo e do próprio procedimento de determinação da matéria coletável e, ainda, da caducidade do direito à liquidação do IRS referente ao ano de 2008.

    1. - Não foi esse o entendimento o Tribunal a quo, o qual considerou desde logo como provado que a matéria coletável foi determinada por correção meramente aritmética (objetiva) e que as liquidações de imposto se afiguram conformes à lei. Funda-se a douta decisão recorrida na convicção do M. Juiz a quo de que a “Autoridade Tributária procedeu a correções de natureza meramente aritmética, além do mais, à matéria tributável de IRS dos anos de 2008, 2009 e 2010, no valor de €268.735,46, €277.414,25 e €276.481,64, respetivamente – matéria de facto dada como provada em E) e F), a páginas 6 da sentença recorrida.

    2. - No que respeita aos factos não provados, entendeu o M. Juiz a quo que a prova produzida pelos impugnantes, nomeadamente a testemunhal, não logrou provar que as falhas de numeração dos talões de venda são devidas a “erro humano” dos funcionários das lojas da impugnante (1), bem assim como todos os factos contidos nos itens seguintes (2 a 4 dos factos não provados) e que aqui se dão por integralmente reproduzidos. Acresce que, da matéria de facto considerada provada, faltam alguns factos de importância fundamental, para a decisão final, porquanto é a partir destes factos que o Tribunal estará, então sim, em condições de poder decidir qual o método usado pela IT/AT para chegar à determinação da matéria coletável e, em função disso, estar em condições de aferir sobre a legalidade ou ilegalidade das liquidações.

    3. - Contudo de toda a prova testemunhal produzida, apresentada pelas partes, dos depoimentos das testemunhas da própria AT, transcritos nas presentes alegações, bem assim como do teor dos documentos apresentados pelas partes nos autos, impõe diferente decisão sobre a matéria de facto. Assim, a conclusão contida na alínea E) da matéria de facto considerada provada incorpora uma conclusão de direito que deve ser excluída, pelo que deve ser alterada, propondo-se a seguinte redação: “Na sequência da inspeção acima mencionada, a Autoridade Tributária fixou matéria tributável de IRS, dos anos de 2008, 2009 e 2010, no valor de €268.735,46, €277.414,25 e €276.481,64, respetivamente.” 5ª - Não se afigura aceitável dar por reproduzido o que consta no Relatório a fls 33 a 66, e a afirmação do M. Juiz em considerar que o recurso a margens de lucro, amostragens e outros indícios serviram apenas para constituir meros indícios para a realização da inspeção (fls. 25 da sentença recorrida). Ora, resulta dos autos que assim não foi. Ou seja, o momento em que a IT se serve, utiliza e recorre à aplicação desses indícios não antecedeu a inspeção mas sim ocorreu durante a inspeção e servem de fundamento, isso sim, para a correção da matéria coletável. Isto resulta com total evidência do relatório de Inspeção, incluindo a matéria nele vertida a páginas 33 a 66 dadas como provadas na alínea F) da matéria de facto provada. A conclusão do M. Juiz quanto a este ponto é incongruente com o que ele próprio considera como provado. É que, a fls 33 a 66 do Relatório constam, precisamente, os métodos utilizados pela Sra. Inspetora para chegar à matéria coletável que veio a determinar. Não se trata de justificar a realização da Inspeção (como considerou o M. Juiz a quo), a qual foi ordenada muito antes da elaboração do Relatório, mas sim, efetivamente, de tentar justificar o percurso que conduziu à fixação da matéria coletável, donde resulta não estarmos perante meras correções aritméticas mas antes perante a aplicação de métodos indiciários, ou, de um método misto, diferente de qualquer dos dois previstos na lei (vd. artigos 81º a 85º da LGT), o que se afigura manifestamente ilegal.

    4. - Face ao disposto na lei, salvo melhor opinião, a AT não pode sobre a capa de estar a recorrer à aplicação de meras correções aritméticas aplicar métodos indiretos, apenas para violar o procedimento e as garantias que estão associadas à determinação da matéria colectável por recurso a métodos indiretos. Foi precisamente isso que sucedeu no caso em apreço, sendo certo que o M. Juiz a quo não entendeu assim. Acresce que, a prova não se pode bastar com o recurso aos elementos vertidos no Relatório de Inspeção, pois que são esses mesmos que se encontram em discussão nos presentes autos, logo é matéria controvertida. Todavia, o M. Juiz a quo ao dar como provada a matéria contida a fls. 33 a 66 do Relatório, reconhece como provado que a forma que a IT/AT escolheu para chegar à fixação da matéria colectável assentou em recurso a amostragens, indícios e extrapolações incompatíveis com o método definido na lei como “correções meramente aritméticas”, o qual pressupõe objetividade absoluta nas correções efetuadas a partir dos elementos da contabilidade do Sujeito Passivo (SP), sem necessidade de recurso a métodos indiciários, assentes em amostragens ou outros, dos quais se procede á “extrapolação global”, como reconhece a Sra. Inspetora no seu depoimento. Nesta conformidade as conclusões que o Mº Juiz a quo retira da prova produzida nos autos e que descreve, a fls. 5 a 21 e 21 a 26 da sentença recorrida, não se afiguram corretas face aos depoimentos prestados pelas testemunhas inquiridas.

    5. - Impõe-se extrair da prova testemunhal produzida (bem assim como do que vem descrito no Relatório) quais os métodos aplicados e a partir dos quais a IT/AT chegou aos valores de IRS fixados. Resulta da sentença recorrida, que o M. Juiz a quo desvalorizou totalmente os depoimentos das testemunhas indicadas pela Requerente. A fundamentação que apresenta para tal desvalorização não é aceitável, porquanto, se é verdade que algumas das testemunhas indicadas pelos impugnantes eram e são seus funcionários, não é menos verdade que a Sra. Inspetora e Sr. Inspetor perito informático indicados pela AT também são funcionários da Requerida. Não se afigura justo, desvalorizar os depoimentos dos primeiros por essa razão e não aplicar o mesmo critério de valoração aos segundos, quando razão idêntica os caracteriza.

    6. - Acresce que, na opinião do M. Juiz a quo, mesmo o depoimento do TOC não se afigura credível porquanto se trata de uma testemunha com relações profissionais com os impugnantes. A ponderação realizada pelo M. Juiz a quo sobre a fiabilidade dos depoimentos não é justa nem isenta. Note-se que, no caso, as testemunhas da AT são seus funcionários, sujeitos a ordens de serviço impostas pela hierarquia enquanto das testemunhas indicadas pelos impugnantes duas são seus funcionários e sabem bem (só eles sabem) como funcionam as lojas e o sistema informático e quais as falhas e dificuldades que encontravam, as outras duas são totalmente alheias à atividade dos impugnantes, embora a conheçam por razões de auditorias regularmente realizadas (não se vê qual a razão de ciência para a sua não credibilidade) e por fim, o TOC é um profissional independente, sujeito a um código deontológico exigente e a responsabilidades pessoais por eventuais falhas contabilísticas, bem assim como Informático pelas falhas que lhe possam ser imputadas pelo funcionamento do sistema informático. Perante isto é inaceitável, mormente à luz do princípio da igualdade das partes processuais, o juízo de valor vertido na Sentença sobre a credibilidade das testemunhas de uma e da outra parte. Tal considerando, subjacente à análise e fundamentação da matéria de facto considerada provada e não provada configura uma clara violação dos princípios jurídico-processuais da igualdade das partes e do contraditório, justo e isento.

    7. - Não obstante as observações supra expostas, em sede de impugnação da restante matéria de facto vertida na sentença como provada e não provada vamos atender, predominantemente, aos depoimentos das testemunhas da AT (Sra. Inspetora e Sr. Informático) e ao resultante da acareação entre os informáticos da requerente e da requerida, cujos depoimentos se transcrevem nas presentes alegações, nos artigos 26º a 37º, que se dão por integralmente reproduzidos.

    8. - Assim, atendendo ao depoimento da testemunha G., identificada nos autos, Inspetora tributária...

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