Acórdão nº 02270/19.1BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução18 de Junho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Representante da Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga em 11.02.2020, pela qual foi julgada procedente a reclamação deduzida, nos termos do artigo 276.º do CPPT, contra o Despacho proferido pela Senhora Diretora da Direção de Finanças de (...), datado de 10/09/2019, que indeferiu os pedidos de suspensão dos processos de execução fiscal, em virtude da insuficiência da garantia prestada, e de dispensa de prestação de garantia quanto ao remanescente, pelo facto de não estarem preenchidos os respetivos pressupostos.

1.2. A Recorrente Fazenda Pública terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: “A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de atos do órgão de execução fiscal interposta, nos termos do disposto no art.º 276º do CPPT, do despacho proferido em 10.09.2019, pela Senhora Diretora da Direção de Finanças de (...), pelo qual, foi indeferido o pedido de suspensão dos processos de execução fiscal, em virtude da insuficiência da garantia prestada, bem como foi indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia respeitante ao remanescente por não estarem preenchidos os respetivos pressupostos, no âmbito dos processos de execução fiscal n.ºs 3476201901063952 e aps., 3476201901099884, 3476201901099914, e 3476201601099876.

B. Considerou a douta sentença que decidida que está a procedência do vício de violação de lei, pelo facto de o ato reclamado violar o disposto no n.º 3 do art.º 214.º do CPPT fica, em face do exposto, prejudicado o conhecimento dos restantes vícios por força do preceituado no art.º 608.º, n.º 2 do CPC, devendo, sem mais considerandos, conceder-se provimento à presente reclamação, anulando-se o ato ora sindicado.

C. Com a ressalva do sempre devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o assim doutamente decidido, porquanto considera existir erro de julgamento quanto à matéria de facto e de direito, nos termos dos artºs 615º e 662º do CPC e 125º CPPT.

D. A douta sentença considerou como assente a factualidade elencada no ponto III. 1.1) Pontos 1) a 15) do probatório.

E. Porém, de molde a subsumir a situação real respigada dos autos à boa decisão da causa, o Probatório deverá ser corrigido de acordo com a verdade factual, ao abrigo do disposto no art.º 662º do CPC, contemplando os seguintes factos: i. 16) O valor da divida exequenda nos processos executivos com os nºos 3476201901063952 e aps., e 3476201901064452 e aps., instaurados para cobrança coerciva de dividas de IVA dos períodos de 2014, 2015 e 2016, totalizava à data da apresentação do pedido o valor de €1.169.925,83, cf. doc. 2 junto com a petição inicial; ii. 17) No âmbito do processo de arresto não foi a Fazenda Pública autorizada a proceder aos atos ou diligências necessárias à concretização daquela providência, designadamente á conversão do arresto em penhora; iii. 18) O aqui Reclamante pede no recurso de arresto a anulação do mesmo; iv. 19) O recurso de arresto não foi objeto de admissão, e, por conseguinte, ainda não houve pronúncia quanto aos efeitos a atribuir àquele recurso.

F. Neste contexto, a douta sentença padece de erro de julgamento de facto que determinou a errada aplicação do direito, entendendo a FP que, não se verificando nenhuma imposição para que a AT proceda a atos de concretização do arresto, mormente, conversão da penhora nos termos prescritos no nº 3 do artº. 214º do CPPT, nesta fase, em que a decisão de arresto não se tornou definitiva, na ausência de determinação por parte do Tribunal para que a AT aja nessa conformidade, não tendo sido admitido e atribuído o efeito do recurso de arresto, quer porque tais atos poderiam comprometer o efeito útil do recurso e acarretar prejuízos para a AT, designadamente com os registos da penhora e eventual cancelamento, quer porque as pretensões da Reclamante são contraditórias e inadmissíveis, configurando, assim, a locução venire contra factum proprium, não devendo, por isso ser atendível o pedido de conversão.

Sem prescindir, ainda, que assim não se entenda, o que não se concebe, G. Acresce que, a douta sentença, não teve em conta que o facto de a AT não ter convertido o arresto em penhora, em nada altera o sentido do indeferimento do pedido de prestação de garantia com vista à suspensão da execução, e muito menos altera os pressupostos de indeferimento no tocante ao pedido de dispensa da garantia quanto ao remanescente porquanto o elemento determinante no pedido de prestação de garantia não era o bem arrestado mas o estabelecimento comercial oferecido como garantia, atento os valores em causa, uma vez que àquele bem arrestado foi atribuído o valor de €121.993,32, enquanto que, ao estabelecimento comercial foi atribuído pelo Reclamante o valor de €1.653.814,38, tendo resultado numa avaliação negativa de €60.371,45 pela AT, e por conseguinte, ainda que o bem arrestado fosse convertido em penhora para que o mesmo pudesse servir de garantia, sempre haveria de se concluir que as garantias prestadas pela Reclamante para efeitos de suspensão da execução não seriam suficientes nem idóneas para cobrir a dívida exequenda referente àqueles PEF´s no valor de €1.169.925,83, impondo-se, por isso, que fosse analisada a questão da avaliação do estabelecimento comercial.

H. Acresce que, a avaliação da garantia efectuada pela AT obedeceu aos normativos legais, não merecendo qualquer censura, determinando o art.º 199.º -A do CPPT que se aplique os art.º 13.º a 17.º do CIS, e, sendo o garante uma sociedade, o valor do seu património corresponde ao valor da totalidade dos títulos representativos do seu capital, determinado nos termos do art.º 15.º do CIS, corrigido nos termos do n.º 4 do art.º 199.º - A do CPPT, afastando-se a aplicabilidade do n.º 1 do art.º 16.º do CIS, ao caso em concreto, uma vez que a reclamante/requerida é se encontra obrigada a possuir contabilidade organizada, nem tampouco se aplica a avaliação indireta por a Reclamante não ser uma pessoa singular.

I. A avaliação do estabelecimento comercial em conformidade com os normativos descritos, com as correções relativas aos contingentes, e tendo por referência a IES do ano 2018, com as ressalvas que constam da avaliação constante no despacho reclamado, resultou num valor atribuído negativo de €60.371,45, e, por conseguinte, reitera-se que para efeitos de suspensão da execução, nunca seria suficiente e idónea a garantia prestada pela Reclamante.

Sem prescindir, J. Reforça-se que, tal como refere a douta sentença que o Reclamante apresentou dois pedidos: um relativo à suspensão das execuções fiscais relativas aos PEF½s referentes às dividas de IVA, oferendo dois imóveis para prestação de penhora sobre imóvel com o artigo matricial 997.º - fração B, afeto a uso comercial, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de (...), concelho de (...), com valor patrimonial tributário de € 121.993,32, objeto de arresto no âmbito do processo cautelar a correr termos neste Tribunal sob o n.º 2583/18.0BEBRG, instaurado pela AT contra a aqui reclamante e a penhora do estabelecimento comercial, no valor de € 1.653.814,38; e o outro pedido referente aos PEF´s de dívidas de IRC, a dispensa de prestação de garantia quanto ao remanescente.

K. Deste modo, afigura-se-nos que a douta sentença, violou o princípio do aproveitamento dos actos administrativos ou tributários, o qual em conformidade o acórdão do STA de 12 de Abril de 2012, proferido no rec. nº 896/11, se refere que aquele principio não tem expressão legal própria no nosso Direito, mas tem sido acolhido pela doutrina e pela jurisprudência, por razões de economia jurídica (...) Trata-se, pois, de reconhecer ao tribunal o poder de não anular um acto inválido quando for seguro que a decisão administrativa não podia ser outra, uma vez que em execução do efeito repristinatório da sentença não existe “alternativa juridicamente válida” que não seja a de renovar o acto inválido, embora sem o vício que determinou a anulação.

L. Com efeito a questão de saber se o alegado vicio que padece um dos pedidos afeta o outro pedido ou se esse outro pedido pode ser aproveitado, reconduz-se, no caso, à questão da cindibilidade dos actos tributários e da possibilidade da sua anulação parcial, não sendo impeditivo da anulação parcial do acto a necessidade de um ulterior acertamento por parte da AT, de modo a conformar a parte remanescente do acto com os termos da decisão judicial anulatória, como o impõe no caso a consideração do valor do bem arrestado para efeitos de prestação de garantia que mantendo-se a ilegalidade, não obsta que se mantenha o outro ato referente à dispensa da prestação da garantia quanto ao remanescente, que se mostra autonomizado, tanto no pedido, quanto na sua apreciação vertido no despacho reclamado, bem como nos seus efeitos, que sempre haveria remanescente em todas as hipóteses equacionáveis.

M. Ora, no caso sub judice os atos estão perfeitamente identificados, sendo naturalmente divisíveis, sendo-o também juridicamente, por a lei prever a possibilidade de anulação parcial dos mesmos à semelhança dos atos de liquidação (art.º 100º da LGT e, anteriormente, o artº. 145º do CPT) - cf. entre outros, os acórdãos proferidos em 9/07/1997, no processo n.º 5874; em 22/09/1999, no processo n.º 24101; em 16/05/2001, no processo n.º 25532; em 26/03/2003, no processo n.º 1973/02; em 27/09/2005, no processo n.º 287/05; em 12/01/2011, no processo n.º 583/10 e especial o recente Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário 10/04/2013, proferido no processo 298/12.

N. Aliás, naquele último aresto do Pleno da Secção de Contencioso Tributário defende-se que «se o juiz reconhecer que o acto tributário está inquinado de ilegalidade que só em parte o invalida, deve anulá-lo apenas nessa parte, deixando-o...

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