Acórdão nº 00017/01.8BTPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Junho de 2020

Data18 Junho 2020
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. O Representante da Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 28.02.2019, pela qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação judicial que F., S.A., atualmente designada M., S.A., apresentou contra as liquidações de IRC dos exercícios de 1997 e 1998.

1.2. O Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: “A. Na questão aqui a dirimir relativa aos Instrumentos financeiros derivados, está em causa a não aceitação da dedução ao LT (lucro tributável), do exercício de 1998, do montante de Esc. 75 391 021$00 de juros a receber do instrumento financeiro denominado de “Swaps de taxa de juro”, dedução esta efetuada pelo sujeito passivo no Quadro 06, à data, da declaração de rendimentos do Mod.22, do IRC.

B. Os produtos em causa (SWAPS) são transacionados em mercados não organizados (fora de bolsa) e aplica-se, para efeitos fiscais, a regra do “princípio da realização”. Tratando-se de Swaps de Taxa de Juro, os fluxos intermédios gerados são assimilados a juros que deverão ser reconhecidos como proveito/custo no exercício em que se vencem, quando a periodização numa base diária não possa ser aplicada.

C. No caso em questão, o proveito (custo) é o juro que resulta, não da indisponibilidade temporária de um determinado montante de capital, mas de um contrato celebrado entre duas partes, em que os juros são considerados proveitos realizados ou custos suportados quando o direito ao seu recebimento ou a obrigatoriedade de pagamento possa considerar-se certa relativamente ao período já decorrido e à taxa praticada.

D. No tocante aos três SWAPS em questão (FNB Wall Street, FNB Nikei 2001 e Certificados de Depósito), o pagamento de juros é semestral, à taxa Lisbor em vigor no início de cada semestre, sendo a periodificação em 31/12/1998 efetuada numa base diária certa quanto à obrigatoriedade de pagamento, considerando-se, assim, um custo suportado.

E. Já o recebimento de juros, embora ocorra no final do período de contratação, é periodificado numa base diária certa, quanto ao direito ao seu recebimento, pois, no final de cada período de tributação, a taxa utilizável resulta: (a) Do valor de um determinado índice (Dow Jones para o FNB Wall Street, Nikei para o FNB Nikei 2001 e PSI – 20 para os Certificados de Depósito) ocorrido no dia da contratação; e (b) Da média aritmética dos valores mensais dos mesmos índices, verificados em determinado dia do mês (25, nos FNB Wall Street e Nikei 2001, e 03, nos Certificados), também eles certos e irreversíveis.

F. Assim, atendendo às características dos contratos, no que respeita às taxas utilizadas para cálculo da periodificação dos juros a pagar e a receber, sendo efetuada numa base diária certa, o direito ao recebimento e a obrigação de pagamento consubstanciam factos certos, sendo que, quer os proveitos, quer os custos desta periodificação, devem considerar-se realizados e suportados e concorrer para o LT do exercício de 1998.

G. Não deixa de ser verdade o desconhecimento inicial do desenvolvimento das taxas, que vierem a verificar-se durante o período de contratação, mas o seu cálculo, em 31/12, é factual e concretamente possível, face às regras de cálculo que vigoram para estes instrumentos financeiros, que preveem, por exemplo, 36 observações, a 25 de cada mês, entre 25/03/1998 e 25/02/2001, no caso do FNB Wall Street.

H. Portanto, o relatório pericial, não errando quanto ao desconhecimento inicial do desenvolvimento das taxas, também não desmente nem compromete – em suma, não contraria - o facto de o seu cálculo ser possível, como efectivamente o foi, e vem plenamente demonstrado na informação de 26/07/2002 da DSPIT, junta aos autos. Tal como o não contraria a própria impugnante.

I. O relatório pericial não tem a virtualidade, em face do seu próprio teor, de contrariar a fundamentada demonstração (cálculo) efectuada pela AT justificadora da liquidação/correcção aqui controvertida, e que, como tal, deve manter-se estável na ordem jurídica. Demonstração/cálculo que, também, não vem em si mesmo contrariado pela própria impugnante.

J. O relatório pericial (p. 3) afirma que, “... embora o F., S.A. tenha fixado as taxas de juro no início de cada período de fluxos intermédio que iria pagar no final desses mesmos fluxos intermédios, não foram fixadas taxas de juro a receber pelo F., S.A. no início dos fluxos intermédios, pelo que os ganhos potenciais da evolução da cotação dos índices bolsistas subjacentes eram reversíveis no final de cada exercício.” K. Mas, a verdade é que, o que assim fica dito, quanto às regras de pagamento e recebimento, é irrelevante, porque, por um lado, estamos a falar de instrumentos financeiros de risco, que, por natureza, não podem ter a taxa fixada no início, e, por outro, se o que fica dito quanto ao momento inicial (que “não foram fixadas taxas de juro a receber no início dos fluxos”) pode ser verdade, não é menos verdade que, a posteriori, o cálculo dessas taxas de juro a receber é perfeitamente possível e realizável.

L. Portanto, em face das necessárias regras de pagamento e recebimento, entende a Fazenda Pública, devem concorrer para o resultado fiscal os proveitos e custos periodificados decorrentes dos quatro Swaps, ainda que relativamente aos mesmos não tenham ocorrido os recebimentos e pagamentos, de acordo com as suas características. As características dos pagamentos e recebimentos dos Swaps em questão ficaram plenamente demonstradas no ponto 38 das alegações de recurso, supra.

M.

Perante tal factualidade, verifica-se uma errada aplicação dos preceitos legais convocados na douta sentença para sustentar a anulação (parcial) da liquidação em crise no presente recurso.

N.

Na questão a dirimir relativa aos Benefícios fiscais, o Tribunal a quo limita-se, aqui, a considerar que a interpretação que a Administração Tributária faz da norma viola as regras gerais de interpretação das normas jurídicas e, como tal, deve ser afastada, com o que se impõe a anulação da correcção em causa, considerando que a mesma teve origem nessa interpretação normativa que considera errada.

O.

Considera a Fazenda Pública que o Tribunal a quo faz uma interpretação “absolutamente” literal da norma do art. 31.º do EBF, esquecendo o elemento integrador sistemático que constitui a própria unidade do sistema jurídico, e, em particular, do sistema fiscal.

P.

A sentença não explica, de todo, porque devem ser afastados da interpretação da norma os princípios fundamentais enumerados no âmbito da autorização legislativa dos benefícios fiscais (Lei n.º 8/89, de 22 de Abril), no sentido de que o art. 31º do EBF apenas se aplica a títulos cotados em Bolsas nacionais, conforme alegado pela FP, nem explica porque deve ser afastado dessa interpretação o art. 2.º do EBF, norma integradora relevante, pois define os benefícios fiscais como “medidas de carácter excepcional instituídas para tutela de interesses públicos extrafiscais relevantes que sejam superiores aos da própria tributação que impedem”.

Q.

Erra o Tribunal a quo ao considerar que as razões invocadas pela AT para sustentar que a norma só é aplicada aos títulos cotados na bolsa nacional reconduzem-se a opções de política legislativa que extravasam o âmbito da interpretação da norma.

R.

Isto porque, tratando-se, concretamente, de legislar em questões de política fiscal – há, inclusive, uma Constituição fiscal que a AT tem que saber interpretar de forma sistemática –, o âmbito de interpretação da norma fica também condicionado, naturalmente, à política fiscal do país, e, portanto, nessa equação, tem que se entrar em conta com variadíssimos elementos, como, por exemplo, a soberania fiscal do país, as regras relativas ao imposto, sujeito, território e momento da tributação, e respectiva motivação Orçamental.

S.

Ora, erra o Tribunal ao considerar despiciendo o que assim considera de elemento político na interpretação de uma norma, feita por organismo da Administração directa do Estado, a quem compete interpretar a lei fiscal e aplicá-la num sentido unitário sistemático de evitamento de despesa fiscal contrária ao interesse que a Lei fiscal e Orçamental prescrevem.

T.

O Tribunal a quo erra, portanto, porque não diz em que medida a interpretação feita pela inspeção tributária/AT está errada, de forma concreta, porque é que o art. 31º do EBF não pode ser interpretado em consonância com os princípios enumerados na Lei nº 8/89, de 22 de Abril, e com o art. 2º do EBF, no sentido em que apenas se aplica a títulos cotados em bolsas nacionais.

U.

Há erro de julgamento de facto quando se conclua, da confrontação entre os meios de prova produzidos e os factos dados por provados ou não provados, que o juízo feito está em desconformidade com a prova produzida, independentemente da convicção pessoal do juiz acerca de cada facto; V.

Deste modo, entende a Fazenda Pública que o douto decisório fez uma errada valoração da fundamentação e da prova carreada pela AT e que se encontra vertida no relatório da Inspeção Tributária e demais informações e documentos constantes dos autos, bem como incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de direito, por errada interpretação do disposto no art.º 68º-B, nº 1, al. b) do CIRC, na redacção dada pelo D.L. 257-B/96 de 31/12, e art.º 31º do EBF.

W.

Tudo, na medida em que considerou que “como [a impugnante] não sabia qual o proveito que iria receber (ganhos potenciais da evolução da cotação dos índices bolsistas subjacentes) das outras entidades que assumiram o pagamento de um rendimento variável no futuro (dado que não foram fixadas as taxas de juro a receber pela impugnante no início dos fluxos intermédios), não considerou esse rendimento como proveito fiscal”, X.

Quando, inversamente, ficou...

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