Acórdão nº 01737/19.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelCeleste Oliveira
Data da Resolução08 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO A REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 16/02/2020, que concedeu provimento à oposição judicial deduzida por J., devidamente identificado nos autos, no âmbito do processo de execução fiscal nº 1910201601291734, a correr termos no Serviço de Finanças de (...) 1, contra a sociedade “B., Lda.”, por dívidas relativas a IVA dos anos de 2016 a 2018, contra si revertidas.- Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: “CONCLUSÕES A. A douta sentença sob recurso julgou procedente a oposição deduzida por J., na qualidade de revertido no processo de execução fiscal nº 1910201601291734, instaurado pelo Serviço de Finanças de (...) 1, originariamente, contra a sociedade B., Lda., por dívidas de IRC e de IVA, no montante de € 5.936,16, referente aos exercícios de 2016 a 2018.

B. A reversão em causa nos autos, foi efetuada nos termos da al. b) do nº 1 do citado preceito, tendo a oposição sido deduzida com fundamento na ilegitimidade do oponente, decorrente do não exercício de funções de gerências e a inexistência de culpa na insuficiência do património societário, para satisfação das dívidas tributárias, alegando que as funções de gerência eram desempenhadas pelo seu pai.

  1. Tendo sido dispensada a produção de prova testemunhal, a douta sentença recorrida, decidiu no sentido da procedência da oposição, por entender que a AT não demonstrou que o oponente tinha exercido a gerência efetiva da executada originária.

  2. A sentença recorrida considerou como assente a factualidade elencada nos pontos 1. a 18. da “Matéria de facto” - “Factos Provados”, dos quais se destacam, por terem relevância para a discussão, os pontos12. a 18..

E. A convicção do Tribunal a quo alicerçou-se na “análise crítica e conjugada dos documentos juntos aos autos, que não foram impugnados, assim como, na parte dos factos alegados pelas partes que não tendo sido impugnados (…), também são corroborados pelos documentos juntos”.

F. Porém, ressalvado o devido respeito, que é muito, com o que desta forma foi decidido, não se conforma a FP, sendo outro o seu entendimento, como a seguir se argumentará e concluirá.

G. A douta sentença sob recurso baseou a seleção da matéria de facto vertida nos pontos 15. a 18. do probatório, nas declarações de testemunhas, ouvidas pelo OEF, em sede de exercício do direito de audição, testemunhos que considerou sérios, credíveis e consistentes, apesar de dois dos depoentes serem os pais do aqui oponente.

H. Quanto à terceira testemunha, afirma a douta sentença em análise, “que conhece o pai do Oponente há mais de 30 anos, aquilo que disse é perfeitamente consistente com uma relação de amizade de mais de 30 anos”, “de uma forma reputada credível”.

I. Entende, no entanto, a FP, com o respeito devido pelo Tribunal a quo, que a matéria vertida nos referidos pontos 15. a 18. não só não resulta da prova produzida nos autos, como as declarações prestadas pelas testemunhas não têm a virtualidade de asseverar os aludidos factos, por não consubstanciarem prova idónea nem suficiente para os levar ao probatório.

J. É que, nos presentes autos não foi produzida prova testemunhal sobre a matéria controvertida, sendo que os testemunhos valorados pelo Tribunal a quo (o pai do oponente, a mãe do oponente e um antigo colega de trabalho do pai do oponente) resultaram da prova produzida em sede de direito de audição, no âmbito da reversão ora em causa.

K. Logo à partida, resulta claro que o testemunho de todos os depoentes não pode considerar-se isento nem credível, dado o manifesto interesse económico e/ou pessoal no desfecho da presente oposição, concluindo-se, tal como concluiu, a final, o OEF, que os seus depoimentos não se revelam suficientes para infirmar a convicção do OEF, no sentido da concretização da reversão contra o oponente.

L. Tais testemunhos foram registados em ata pelo Serviço de Finanças competente, que os ouviu, e os analisou aprofundada e fundamentadamente, aquando da decisão que concretiza a reversão contra o ora oponente, concluindo pela frágil credibilidade do depoimento das duas primeiras testemunhas, resultante, designadamente, dos laços familiares próximos, tratando-se, de um modo geral, de depoimentos vagos e visivelmente coincidentes com a versão dos factos invocados pelo oponente, revelando-se frágeis e inconclusivos, desapoiados de elementos documentais que os suportem, não revelando o necessário distanciamento e imparcialidade que lhes atribuíssem credibilidade.

M. Quanto ao depoimento da terceira testemunha, concluiu o OEF que o mesmo não cabe no conceito de prova, por não se afigurar minimamente consistente, tratando-se de um testemunho de “ouvir dizer”, tendo um conhecimento indireto de factos relatados, que não presenciou pessoalmente e que diz que lhe advêm do facto de conhecer o pai do oponente, com quem trabalhou.

N. Não obstante, concluiu a douta sentença em análise que “aquilo que disse é perfeitamente consistente com uma relação de amizade de mais de 30 anos”, e que “de uma forma reputada credível por este tribunal sabe o que é aceitável que um amigo de alguém saiba”, questionando-se, no entanto, a FP como concluiu o Tribunal a quo pela relação de amizade de mais de 30 anos do depoente com o pai do aqui oponente, quando do seu depoimento resulta apenas que se conhecem há cerca de 30 anos, porque trabalharam juntos nos STCP.

O. O Tribunal a quo, optando por não ouvir novamente aquelas testemunhas, concluiu que as mesmas “prestaram depoimentos credíveis e consistentes”, explicando, “de forma lógica e sólida, que era (…) o pai, quem assumia a direcção da sociedade”, valorando esta prova em detrimento da demais e dando-lhe credibilidade que não foi dada por quem a ouviu, deu como provados os factos levados ao probatório nos pontos 15. a 18..

P. Por outro lado, questiona-se ainda a FP e sempre com o devido respeito pelo Tribunal a quo, como pode retirar-se de depoimentos escritos, sem que se tenha confrontado e inquirido pessoalmente as testemunhas, as ilações que constam da douta sentença recorrida – designadamente, reputando-os de sérios e credíveis – e ainda, como podem tais depoimentos ser suficientes para levar ao probatório os referidos factos (pontos 15. a 18.).

Q. É que, na avaliação da credibilidade de um depoimento imperam os princípios da oralidade e imediação e, existem aspetos comportamentais ou reações dos depoentes que apenas podem ser percecionados ou valorizados por quem os presenciou e que escapam à sua redução a escrito, ou seja, a valoração lógica e crítica dos depoimentos das testemunhas, deverá ter em consideração fatores só apreensíveis com a oralidade e a imediação, não podendo o Tribunal a quo valorar, como valorou, os depoimentos prestados perante o OEF e lavrados em ata, concluindo pela credibilidade e seriedade dos testemunhos e valorando a prova assim produzida, sem que ouvisse os mesmos em sede de inquirição de testemunhas no âmbito dos presentes autos.

R. Ademais, entendendo o Tribunal a quo, como entendeu, serem relevantes os depoimentos em causa, deveria validar devidamente os depoimentos das testemunhas em causa, arroladas nos presentes autos, ouvindo-as em audiência de inquirição de testemunhas, por forma a poder valorá-los no sentido de levar (ou não) ao probatório os factos pretendidos, o que não fez, uma vez que a prestação dos depoimentos em causa perante a Mmª Juiz, poderia determinar uma diferente avaliação da credibilidade das testemunhas e, consequentemente, uma distinta valoração da prova efetuada.

S. É que, a atividade instrutória pertinente para apurar a veracidade dos factos compete também ao Tribunal, que deve realizar ou ordenar todas as diligências que considerar úteis ao apuramento da verdade material (artºs 13º, nº 1 do CPPT e 99º, nº 1 da LGT), sendo que o processo judicial tributário é regulado pelo princípio do inquisitório, o que determina que o Tribunal esteja onerado com a obrigação legal de ordenar a realização de provas adicionais (artº 114º do CPPT), não se limitando às provas que as partes apresentarem.

T. Continuando, não pode, também, a FP conformar-se, com o respeito devido pela douta sentença em análise, com a apreciação e valoração efetuada no que respeita aos documentos constantes dos autos, conforme se passa a explanar.

U. Dos autos constam, designadamente, o parecer do Administrador de Insolvência, proferido no âmbito do processo de insolvência nº 3475/16.2T8STS, o parecer do Ministério Público, proferido no incidente de qualificação do processo de insolvência da devedora originária como culposo (processo nº 3475/16.2T8STS-B) e ainda a oposição do oponente a este incidente.

V. Em sede de oposição à qualificação do processo de insolvência da devedora originária como culposo, o aqui recorrido junta as declarações de venda de viaturas automóveis, propriedade da devedora originária, tituladas pelas faturas nºs 50 e 53, juntas aos autos com o parecer do Administrador de Insolvência, e não só confirma ter procedido a essas vendas, como se afirma gerente da originária devedora e que as declarações de venda se encontram por si assinadas na qualidade de “gerente da sociedade Insolvente”.

W. Ora, analisado o probatório, constata-se que dele constam factos decorrente daqueles documentos, tidos nos pontos 12. a 14. dos factos provados, mas nada é dito quanto à assunção, pelo oponente, da venda das viaturas da sociedade devedora originária, nem quanto às declarações de venda das mesmas, assinadas pelo oponente, na qualidade de gerente, factos estes que, não sendo levados ao probatório, também não foram devidamente valorados.

X. Resultando, apenas, do ponto 14. dos factos provados, que “o Oponente opôs-se à qualificação como dolosa onde, além do mais alega nunca ter praticado actos em...

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