Acórdão nº 01137/11.6BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelPaula Moura Teixeira
Data da Resolução08 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO A Recorrente, A., LDA., melhor identificada nos autos, interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a impugnação judicial relativa a liquidações de IVA do ano de 2008 identificadas sob os números 11006348, 11006350, 11006354, 11006356, 11006358, 11006360, 11006362, 11006364, 11006366, 11006349, 11006351, 11006353, 11006355, 11006357, 11006359, 11006361, 11006363, 11006365 e 11006367 no valor total de 18.932,98€ referentes aos períodos de tributação 0801, 0802, 0804, 0805, 0806, 0807, 0809, 0810, 0811 e 0812 e respetivos juros no montante de 49 388.99 €.

A Recorrente, formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem: (…) A.

A Recorrente não pode aceitar o entendimento vertido pelo Tribunal a quo na Sentença recorrida, quanto à manutenção dos tributários de liquidação adicional de IVA e juros, relativos aos períodos 0801, 0802, 0804, 0805, 0806, 0807, 0809, 0810, 0811 e 0812.

B.

Entendeu o Tribunal a quo que (i) a Recorrente não concretizou em que é que se materializaram os serviços prestados pela V., Lda. (de ora em diante “V.) antes tendo feito “(…) afirmações vagas, genéricas (…)” quanto aos mesmos, o que não permite fazer qualquer análise acerca do preenchimento dos requisitos conferidores do direito e, por essa razão, não pôde concluir que as despesas tituladas pelas faturas conferem o direito à dedução” e que (ii) “(…) se mostram cumpridas as exigências de fundamentação relativamente às liquidações (…)” em face da “(…) falta de concretização pela Impugnante, tanto por vi documental, como por via oral, dos específicos serviços prestados titulados pelas faturas em causa (…)”.

C. Por aquelas razões, declarou a impugnação judicial improcedente “(…) atenta a matéria de facto apurada e a não provada, não ocorrer nenhuma ilegalidade nas liquidações impugnadas, como por as mesmas não se mostrarem eivadas do vício de falta de fundamentação”.

D. A Sentença objeto de recurso padece, desde logo, de erro de julgamento da matéria de facto, resultante da equívoca apreciação da prova documental e testemunhal produzida, na medida em que da mesma resulta devidamente demonstrado o objeto das prestações de serviços de gestão adquiridas pela Recorrente à sociedade V..

E. Quanto ao depoimento das testemunhas, destacar-se-á o da testemunha R., que concretizou os serviços de gestão que prestou à Recorrente através da V., que incluíram, designadamente, a delineação ex novo da atividade da Recorrente, alterando a forma como era desenvolvida, a melhoria da rentabilidade, a contratação de pessoal, a reestruturação do passivo financeiro e o contacto com instituições bancárias.

F.

Do depoimento da testemunha P. resultam corroboradas as afirmações da testemunha R. quanto ao facto de os serviços prestados pela V. se traduzirem no acompanhamento da gestão interna da Recorrente, na reestruturação da atividade da empresa, na promoção da internacionalização e no incremento das exportações.

G.

Deveria o Tribunal a quo, com base nestes depoimentos, aditar aos factos dados como provados que, os serviços que admitiu terem sido efetivamente prestados pela V. à Recorrente tiveram como objeto, ou seja, materializaram-se (i) na avaliação do modelo de negócio; (ii) na alteração do modelo de negócio do agenciamento para outsourcing; (iii) no melhoramento das margens económicas da Recorrente; (iv) na rentabilização da empresa; (v) na promoção da internacionalização da empresa e a exportação de produtos; (vi) na seleção de mercados; (vii) no recrutamento definição de carreira; (viii) em reuniões, quer nas instalações da Recorrente, quer fora e (xi) na contribuição para o crescimento do negócio.

H. A Sentença objeto de recurso padece igualmente de uma errada interpretação e aplicação do direito.

I. A AT fundamentou os atos tributários de liquidação a partir do conceito de indispensabilidade dos custos constante do artigo 23.º do Código do IRC, J. tendo concluído não serem os serviços de gestão prestados pela V. indispensáveis à obtenção de rendimentos sujeitos a imposto nem à manutenção da fonte produtora, K. e referindo, ainda no Relatório de Inspeção que, nos termos do artigo 20.º, n.º 1 do Código do IVA, o IVA suportado na aquisição dos referidos serviços não se afigura dedutível.

L. A Recorrente, em sede de impugnação judicial, contestou a interpretação dada pela AT ao artigo 20.º, n.º 1 do Código do IVA, uma vez que o mesmo não exige, para que seja dedutível o imposto suportado pelo sujeito passivo, que se estabeleça um juízo de adequação entre as operações a montante e a jusante, com base no critério da indispensabilidade dos custos, M.

pelo que não poderia o artigo 20.º, n.º 1 do Código do IVA, interpretado como foi pela AT, fundamentar os atos tributários de liquidação adicional impugnados.

N.

Não se pronunciou o Tribunal a quo sobre este vício de violação de lei invocado pela Recorrente na petição inicial, O. tendo-se abstido de apreciar da (i)legalidade da interpretação dada pela AT ao artigo 20.º, n.º 1 do Código do IVA para justificar a desconsideração do IVA suportado pela Recorrente na aquisição dos serviços de gestão prestados pela V., ou seja, os verdadeiros fundamentos dos atos sob discussão, P. mais tendo referido que, apesar de a fundamentação das correções apresentadas pela AT não ser muito feliz que, com um razoável esforço, se consegue descortinar que o que a AT quis dizer foi que a não consideração das prestações de serviços se sustenta na falta de concretização pela Recorrente, tanto por via documental, como por via oral, dos específicos serviços prestados titulados pelas faturas em causa.

Q. Ou seja, partiu de um argumento que a AT não invocou no Relatório de Inspeção Tributária – a falta de demonstração do conteúdo dos serviços prestados pela V. à Recorrente – fez referência às regras de distribuição do ónus da prova e, entendendo que a Recorrente não demonstrou os pressupostos de que dependia o exercício do direito à dedução do IVA, concluiu não ser o imposto dedutível nos termos do artigo 20.º, n.º 1 do Código do IVA.

R. Ultrapassou, deste modo, os limites impostos pelo próprio tipo de contencioso em que se insere a presente impugnação judicial: o contencioso de mera anulação, no âmbito do qual o Tribunal deve cingir a sua apreciação aos fundamentos invocados pelo autor do ato objeto de contestação.

S. Por tudo quanto se expôs, deverá a Sentença de que se recorre ser revogada e substituída por Acórdão que anule os atos tributários de liquidação impugnados, os quais padecem de erro nos pressupostos de facto e de direito, sendo anuláveis, nos termos do artigo 135.º do CPA aplicável ex vi artigo 2.º, al. c) da LGT.

T. Caso se entenda que a desconformidade das liquidações adicionais de IVA com o Direito da União Europeia aqui exposta não é suficientemente clara ou pacífica na jurisprudência do Tribunal de Justiça, deverá este Tribunal, sendo a última instância de recurso, fazer uso do mecanismo do reenvio prejudicial, previsto no artigo 267.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, formulando as questões acima formuladas.

Nestes termos e nos mais de Direito, deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado e, consequentemente, revogada a Sentença recorrida e substituída por Acórdão que determine a anulação das liquidações de IVA e respetivos juros compensatórios, identificadas com os n.ºs 11006348, 11006350, 11006352, 11006354, 11006356, 11006358, 11006360, 11006362, 11006364 e 11006366, e das liquidações dos respetivos juros compensatórios n.ºs 11006349, 11006351, 11006353, 11006355, 11006357, 11006359, 11006361, 11006363, 11006365 e 11006367, referentes aos períodos de 0801, 0802, 0804, 0805, 0806, 0807, 0809, 0810, 0811 e 0812, com as demais consequências legais.

A Recorrida não contra alegou.

Foi dada vista ao Exmº. Procurador Geral Adjunto o qual emitiu parecer concluindo pela manutenção da sentença recorrida, uma vez, que fez uma correta interpretação do art.º 20.º n.º 1 alínea a) do CIVA estando conforme com a jurisprudência do TJEU.

Atendendo a que o processo se encontra disponível em suporte informático, no SITAF e atendendo à situação atual de pandemia, dispensa-se os vistos do Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, submetendo-se à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR E DECIDIR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente as quais são delimitadas pelas conclusões das respetivas alegações sendo a de saber se a sentença recorrida padece de erro de julgamento, por erróneo apuramento da matéria de facto dada como provada e por errada interpretação e aplicação do direito aos factos.

  2. JULGAMENTO DE FACTO No Tribunal a quo, o julgamento da matéria de facto foi efetuado nos seguintes termos: 1. A Impugnante é uma sociedade por quotas que se dedica à actividade de comércio por grosso de têxteis cfr. doc. 2 junto com a contestação a fls. 140 a 142 dos presentes autos.

  3. A Impugnante foi alvo de um procedimento inspectivo de natureza externa emergente da Ordem de Serviço n.º OI201002265, a qual possuía como âmbito e extensão o IVA de 2008 relativo a todos os meses do referido ano – cfr. fls. 2 a 4 do processo administrativo junto aos presentes autos.

  4. Foi elaborado projecto de relatório relativo ao procedimento inspectivo referido em 2. – cfr. fls. 7 a 21 dos processo administrativo junto aos presentes autos.

  5. O projecto de relatório referido em 3. apurou um montante de 17.325,00€ em falta relativo a IVA de 2008 – cfr. fls. 8 do processo administrativo junto aos presentes autos.

  6. No projecto de relatório referido em 3. lavrou-se o seguinte: “…. III – Descrição dos factos e fundamentos das correcções meramente aritméticas à matéria tributável… III.1 Facturas de serviços prestados pela empresa V.… No âmbito da análise...

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