Acórdão nº 00285/18.6BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução30 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Instituto Politécnico (...) (Avª. (…)), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Coimbra, em acção administrativa intentada por S.

(R. (…)), que por sua vez interpõe recurso subordinado A recorrente verte em conclusões: PRIMEIRA – Considerada a matéria constante dos pontos 7. a 10. Dos factos assentes na douta sentença recorrida, resulta que a questão da não afiliação da A. à sua empregadora, aqui Ré, não emerge do libelo acusatório, mas sim da defesa da própria A., sendo a mesma que invocou, enquanto causa alegadamente extintiva da sua culpa no âmbito do tipo de ilícito disciplinar que lhe vinha imputado, a imposição, por parte dos organizadores dos congressos e outros eventos de natureza idêntica, da sobredita não afiliação.

SEGUNDA – Por força do disposto nos arts. 342º a 344º do C.Civil, ex vi art. 414º do C.P.Civil, aplicáveis in casu por força do disposto no art. 1º do C.P.T.A., o ónus da prova de tal imposição, entenda-se, causa extintiva da culpa, impendia sobre a A., sendo inexigível à Ré, por configurar quase uma diabólica probatio, tal contraprova, tendo-se o relatório final do instrutor limitado a evidenciar tal incerteza, o que vale dizer, a não prova desse facto alegadamente extintivo da culpa, pelo que a incerteza na ocorrência de tal circunstância não militará a favor da A., por aplicação do princípio da presunção de inocência, mas antes constitui falta de prova de um facto que lhe seria favorável cujo ónus probandi lhe cabia, e que por isso contra a mesma funcionou.

TERCEIRA – Por consequência, não é aqui aplicável o princípio da presunção de inocência constante do art. 32º nº2 do C.R.P., pelo que violou a douta sentença recorrida tal normativo, uma vez que não ocorrem os necessários pressupostos para o seu funcionamento, violando igualmente o disposto nos arts. 183º e 186º da L.T.F.P.

QUARTA – Atenta a factualidade levada a ponto 12º da matéria considerada assente, por referência ao teor da acusação, conjugada com a agravação especial da responsabilidade da A. nos termos do disposto no nº1 alínea g) e nº4 do art. 191º da L.G.T.F.P., associada à factualidade levada às als. a) a s) do ponto 1 dos factos da acusação aí elencados, resulta de enorme gravidade a atuação da requerente, aí devidamente circunstanciada e evidenciada, objetivada na violação inequívoca e reiterada do dever geral de lealdade e do dever geral de zelo, previstos, entre outros, nos nº1, nº2, alínea g) e nº9 do art.73 da LGTFP, QUINTA – Face às consequências que tais comissões causaram ao R., concretamente o prejudicando ao nível da Agência da Avaliação e Acreditação dos Cursos, e ao nível dos Institutos Politécnicos, no âmbito nacional e, internacional, e tendo ainda em conta a gravidade, ao nível da censura ético-jurídica, da atuação da A., que, além de reiterada, se mostra imbuída de culpa grave, até porque, dado o seu elevado grau de formação académica, não poderia de todo ignorar o desvalor e as nefastas consequências da sua conduta, afigura-se que a sanção que lhe foi concretamente aplicada é proporcional e adequada às exigências de prevenção geral e, particularmente especial, que ao caso concreto respeitam.

SEXTA – Assim, a sanção aplicada à A. não se mostra violadora do princípio da proporcionalidade, antes se mostrando adequada e proporcional à culpa da A. na sua comissão pelo que a douta sentença recorrida, ao considerar desproporcionada tal sanção, violou o disposto no art, 189º da L.G.T.F.P., antes devendo ter considerado proporcional e adequada a pena de 90 dias por cada infração aplicada pela Ré.

SÉTIMA – Por conseguinte, mostrando-se inquinada a douta sentença recorrida dos vícios que supra se elencam, deverá esse colendo Tribunal determinar a sua revogação, mantendo-se a decisão sancionatória, nos seus modus e quantidade, aplicada pela Ré, assim fazendo VOSSAS EXCELÊNCIAS JUSTIÇA.

Sem contra-alegações.

A autora interpôs recurso subordinado, no qual estende sob conclusões: I. Da factualidade provada nos autos resulta que, não obstante os deveres gerais ou especiais impostos não se mostrem consagrados em quaisquer normas legais ou regulamentares, os mesmos correspondem, essencialmente, a orientações verbais dadas pelo Presidente do IPG em julho e em setembro de 2017 que, no entender da ora Recorrente, jamais se poderão traduzir em deveres gerais ou especiais, na aceção do artigo 183º da LGTFP; II. A técnica da cláusula geral com enumeração exemplificativa não impede o exercício do poder disciplinar relativamente a deveres gerais ou especiais inerentes à função desempenhada pelo trabalhador, mas deve ser descrita a conduta que corporiza tal violação; III. As condutas da ora Recorrente puníveis em sede disciplinar serão aquelas que violem os deveres especiais impostos pelas advertências verbais, de julho e setembro de 2017, à falta de norma legal ou regulamentar que os imponha, motivo pelo qual apenas a partir de julho de 2017 a ora Recorrente estava efetivamente adstrita aos mesmos, como «inerentes à função que exerce», nos termos do artigo 183º da LGTFP, pelo que logicamente, as condutas anteriores a essa data não consubstanciam verdadeiras infrações disciplinares, sob pena de violação do princípio da legalidade, o qual vincula o poder discricionário à «qualificação jurídica dos factos reais», cf. o douto Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 20.12.2012 (processo nº 06944/10), incluindo a fonte dos deveres, gerais ou especiais, que impendiam sobre a ora Recorrente; IV. Se é certo que a douta Sentença recorrida considera que a infração corresponde ao facto de «a Autora indicar a sua afiliação no IPG nos congressos e eventos em que participou», não se deverá ignorar que tal indicação terá ocorrido previamente ao estabelecimento dos referidos deveres, i.e., julho de 2017, pelo que ocorre violação do princípio da legalidade; V. Ao contrário do que decorre da douta Sentença recorrida, a ora Recorrente impugnou expressamente que teria sido informada pelo Presidente do IPG de que a afiliação colocaria em causa o próprio IPG junto da Agência de Avaliação e Creditação de Cursos (artigo 44º da petição inicial), pelo que também a este respeito improcede que os alegados deveres fossem do seu conhecimento; VI. A Entidade Demandada nem sequer logrou provar a existência de prejuízos concretos causados pela conduta da ora Recorrente, pelo que, não se mostrando qualquer prejuízo para o interesse público, deverá determinar-se, nesta perspetiva, a inexistência de infração disciplinar e a violação do princípio da legalidade; VII. A douta Sentença recorrida incorre em clara contradição, quando, num primeiro momento, reconhece a existência de uma infração disciplinar decorrente da violação de deveres gerais ou especiais, e, num segundo momento, conclui que não foi possível esclarecer se a ação será imputável à ora Recorrida ou a uma imposição exterior - «imposição dos organizadores dos congressos e eventos da mesma natureza; VIII. Pelo que, ao contrário do que parece ter decidido o Tribunal a quo, a dúvida relativa à autoria da alegada infração disciplinar não se situa no domínio da culpa, mas sim da própria ilicitude, já que apenas os atos (ou omissões) feridos de ilicitude poderão ser objeto do poder disciplinar; IX. Assim, na medida em que não será possível imputar a atuação à ora Recorrente, a maiori, ad minus, jamais se lhe poderá imputar a ilicitude de tal atuação, pelo que também a este respeito se mostra violado o princípio da legalidade previsto no artigo 183º da LGTFP; X. A liberdade de criação intelectual, artística e científica estabelecida no artigo 42º da CRP inclui a liberdade de divulgação, nos termos do nº 2, onde logicamente se inclui a liberdade (e até o dever) de referenciar quaisquer instituições académicas que potenciaram e financiaram a investigação, pelo que, ao vedar esta possibilidade, as orientações verbais dadas pelo Presidente do IPG, com referência a julho e setembro de 2017, afiguram-se atentatórias da liberdade de criação intelectual, artística e científica da ora Recorrente, na modalidade de liberdade de divulgação; XI. Nas palavras da douta Sentença recorrida, «sendo necessário que o dirigente tome conhecimento de tais factos em termos de os poder enquadrar como ilícito disciplinar», face ao que se deixou exposto supra, os factos imputados à Recorrente não podiam ser enquadrados como ilícito disciplinar pelos respetivos superiores hierárquicos; XII. Com efeito, a violação de quaisquer deveres, gerais ou especiais, na aceção do artigo 183º da LGTFP, a verificar-se, apenas ocorreria após o estabelecimento de tais deveres, por determinação verbal do Presidente do IPG de julho de 2017, reiterada em setembro de 2017, motivo pelo qual, logicamente, o conhecimento da infração, por parte da Entidade Demandada, ocorrera posteriormente à própria instauração do procedimento disciplinar; XIII. Mesmo que tal não se entendesse, sempre se diga que a douta Sentença recorrida ignora a circunstância alegada nos artigos 19º e 20º da petição inicial, porquanto decorre da análise à prova documental junta aos autos que as alegadas infrações eram do conhecimento do próprio Presidente do IPG, contrariamente ao alegado pela Entidade Demandada, pelo que se mostra claramente prescrito o direito de instauração do procedimento disciplinar; XIV. A própria Acusação proferida no âmbito do processo disciplinar, nos artigos 9º a 11º, dá conta de factos já objeto de prévia análise por parte do Presidente do IPG, não sendo enquadrável que a avaliação dos docentes, levada a cabo por aquele, não verifique os documentos, artigos científicos e participação em colóquios e conferências, pelo que deverá improceder totalmente a conclusão de que o conhecimento das alegadas infrações apenas terá ocorrido a 10.07.2017; XV. Quanto à prescrição das alegadas infrações, entende a ora Recorrente...

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