Acórdão nº 00204/11.0BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução02 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO A., com domicílio na Rua (…), instaurou acção administrativa especial contra o Município de (...), com sede no Parque (…), impugnando a deliberação do executivo municipal de 16/11/2010, que, concordando com os termos do relatório final de processo disciplinar que contra si decorreu, lhe aplicou uma pena de multa correspondente ao valor de duas remunerações base diárias, no valor total de € 162,48.

Por decisão proferida pelo TAF de Penafiel foi julgada improcedente a acção e absolvido o Réu do pedido.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: a. Na presente acção, o A., ora recorrente, veio impugnar o processo disciplinar que lhe foi movido pela sua entidade empregadora pública – o Município de (...) – e que lhe aplicou uma pena de multa, correspondente ao valor de duas remunerações base diárias (€168,48).

b. O Tribunal julgou a acção totalmente improcedente e absolveu o R. do pedido, discordando-se do julgamento da matéria de facto e de direito.

c. No que toca à decisão sobre a matéria de facto, o recorrente entende que deveria constar como facto provado (por acordo das partes) o seguinte: “Não foram extraídas as certidões enumeradas em O)”.

d. Este facto é relevante, na medida em que são retiradas consequências de direito à não junção dessas mesmas certidões, em virtude da invocação pelo A. de nulidade insuprível, por omissão de diligências essenciais para a descoberta da verdade.

e. Relativamente à matéria de direito, o recorrente discorda globalmente do enquadramento jurídico feito na sentença recorrida.

f. O recorrente arguiu a nulidade do despacho de abertura do processo disciplinar, por falta de fundamentação e de objecto.

g. Do despacho não consta o objecto da decisão, pois manda-se instaurar processo disciplinar, sem se dizer a quem, sendo certo que o objecto tem de estar determinado, para que se possa identificá-lo e delimitá-lo.

h. Do despacho de abertura do processo não consta que há indícios da prática de infracção disciplinar por parte do A. e que contra ele deverá ser aberto processo disciplinar.

i. Nos termos do n.º 1 do art. 40º do Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro (doravante, ED), a participação ou queixa faz-se quando se tenha conhecimento de que um trabalhador em particular praticou uma infracção.

j. Apesar de o Exmo. Senhor Vereador ser sempre tratado no processo disciplinar como o participante, nunca refere, no seu ofício ao Sr. Presidente da Câmara, que sabe do cometimento de qualquer infracção disciplinar por qualquer trabalhador.

k. Nos autos de processo disciplinar a informação do Exmo. Senhor Vereador não reveste a natureza de participação ou queixa tal como ela vem definida na Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro.

l. A própria informação do Exmo. Senhor Director do DFM diz que existem alguns atrasos nas respostas às informações e/ou processos vindos do DPU, nomeadamente dos encaminhados ao aqui A., sem nunca dizer que só há atrasos nos processos do A. nem que a responsabilidade desses lhe é imputável.

m. O despacho de abertura do processo disciplinar carece de fundamentação, nos termos dos artigos 124º n.º 1 a) e 125º do CPA e de objecto, nos termos do art. 123º do CPA e é, por conseguinte, nulo, por ser essa a cominação imposta pelo art. 133º n.º 1 do CPA.

n. O Tribunal a quo considerou improcedente esta nulidade, por a decisão de instauração dum processo disciplinar se bastar com um despacho liminar, nos termos do art. 42º do ED e que, no caso dos autos, este contém a informação mínima legalmente exigida.

o. A Mma. Juiz a quo diz que o Vereador responsável pelo Departamento de Fomento Municipal procedeu à identificação dos processos em atraso e à identificação do técnico a quem os mesmos estavam confiados, mas labora em erro.

p. O Sr. Director de Fomento Municipal usou o advérbio “nomeadamente”, pelo que não se pode concluir por essa informação que tenha designado de forma exaustiva e taxativa os processos atrasados e respectivos técnicos.

q. Ao contrário do decidido na sentença recorrida, o despacho limitar não cumpriu as determinações decorrentes dos artigos 40º e seguintes do ED, pois decorre textualmente da lei que para existir participação ou queixa tem de existir o conhecimento da prática duma infracção disciplinar e da sua autoria.

r. Ora, nem a informação do Sr. Vereador nem a do Sr. Director preenchem os requisitos de uma participação, nos termos do n.º 1 do art. 40º do ED. Sem esses elementos, não pode considerar-se bastante o despacho liminar proferido pelo Sr. Presidente da Câmara.

s. A Mma. Juiz a quo ainda rejeita a aplicação dos artigos 123º e seguintes do CPA, porque, sendo subsidiariamente aplicáveis, são afastados pela aplicação de normas especiais.

t. Salvo melhor opinião, pese embora a existência dos artigos 40º e 41º do ED, o n.º 5 do art. 2º do CPA impõe a aplicação das normas que concretizam preceitos constitucionais a toda e qualquer actuação da Administração pública.

u. Ora, o dever de fundamentação, consagrado no Código do Procedimento Administrativo concretiza um preceito constitucional, vertido no art. 268º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, pelo que é aplicável a toda e qualquer actuação da Administração Pública, nos termos do disposto no n.º 5 do art. 2º do CPA.

v. Ante o exposto, o Tribunal a quo deveria ter dado provimento ao apontado vício de nulidade do despacho de abertura.

w. O recorrente invocou a ilegalidade da acusação, por não se encontrar verificado o prejuízo para o interesse público, que é condição necessária à verificação da infracção disciplinar, nos termos do art. 271º n.º 1 da CRP, à luz do qual deve ser interpretado o art. 3º do ED.

x. Entende o Tribunal a quo que resultaram prejuízos efectivos para os serviços municipais, quando o Réu não os menciona.

y. Bem pelo contrário, o relatório final, a fls. 147 do processo administrativo, refere que o comportamento do A. não produziu consequências graves, nem para os titulares dos processos, nem para o Município.

z. O A. alegou e provou na sua defesa e nos documentos a ela juntos que muitos atrasos havia no DFM e na própria Câmara Municipal de (...), sem que se tenha instaurado processos disciplinares semelhantes – situação que até foi admitida no relatório final – vide al. U) da matéria de facto dada como provada.

aa. O A. alegou e provou que não foi alvo de avaliação de desempenho, sem a consequente definição de objectivos e monitorização de resultados.

bb. Como professa Paulo Veiga e Moura, “os únicos conhecimentos e capacidades que podem ser exigidas são aquelas que no início de cada ciclo anual da avaliação de desempenho tenham sido consideradas como adequadas para a prossecução dos objectivos de serviço, pelo que não pode ser punido por violação do dever de zelo o trabalhador que não cumpriu objectivos que nunca lhe foram transmitidos ou que não revelou competências que não tenham sido fixadas nem registadas na ficha anual de avaliação do desempenho.

” cc. Poe outro lado, não foram definidos prazos para o cumprimento das informações técnicas a que se refere este processo disciplinar.

dd. O Tribunal a quo desvalorizou os argumentos do A., dizendo que decorre do interesse público o dever de decidir, bem como a imposição dum plano de celeridade razoável.

ee. Mais afirmou a Mma. Juiz que foram provados os atrasos do recorrente, contudo não resulta de documento algum do processo disciplinar qual era o prazo fixado ou, na sua falta, qual o prazo razoável para produzir o trabalho distribuído ao recorrente.

ff. O recorrido nunca o fez, pelo que, sem se saber qual o prazo adequado, não pode aferir-se se houve ou não atrasos.

gg. E nem se pode dizer, como se diz na sentença recorrida, que o recorrente não pôs em causa que “incorreu em inadequada instrução de processos, atrasos e ausência de resposta final oportuna relativamente aos mesmos”, quando contradizem esta afirmação os artigos 51, 52, 54 e 55 da petição inicial.

hh. O recorrente ainda alegou na sua petição inicial que a 28 Junho de 2010, em pleno decurso do processo disciplinar, o Exmo. Senhor Presidente da Câmara mandou afectar o A. à Divisão de Projectos Municipais, “com o intuito de tirar maior rendimento das capacidades técnicas que detém”, passando assim a acumular as tarefas que já lhe estavam destinadas com a elaboração de projectos de especialidade.

ii. Mal se compreendia, pois, que distribuíssem uma tarefa acrescida ao A. da envergadura da elaboração de projectos de especialidade, se o A. não estivesse a assegurar e a cumprir as demais tarefas que lhe estavam, ao tempo, adstritas.

jj. Era ao R. que incumbia fazer prova dos factos integradores da infracção, porquanto o ónus da prova cabe ao titular do poder disciplinar.

kk. Ao não o fazer de forma cabal o réu, não deve o Tribunal acrescentar argumentos não utilizados na acusação nem no relatório final, sob pena de violação do princípio de presunção de inocência do arguido, consagrado no art. 32º n.º 2 da CRP.

ll. Na sua defesa, o A. requereu a audição de sete testemunhas, tendo o Sr. Instrutor prescindido de uma delas.

mm. Mais requereu a extracção de certidão dos seguintes documentos: Proc. 426/2003, Proc. 1011/97 P, Proc. 366/04, Proc. 512/2002, Proc. 180/04, Req. 2250/2010 e Req. 2245/2010, Proc. 6/08 L, Req. 48136/09 e Inf. da Polícia Municipal n.º 175/PM/2009, Processos 3189/09 e 6858/09, para prova da toda a matéria da defesa.

nn. Essa junção nunca foi efectuada, nem sequer foi proferido despacho que indeferisse este meio de prova.

oo. Os processos cuja certidão se requereu correspondem à listagem fornecida pelo Exmo. Senhor Director do DFM como o rol de processos não informados ou com informações atrasadas, alegadamente da responsabilidade do A..

pp. O Tribunal aderiu à posição do recorrido que, em sede de...

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