Acórdão nº 00512/11.0BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Outubro de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução02 de Outubro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.RELATÓRIO 1.1. G.

, moveu contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL,I.P.

, a presente ação administrativa especial de impugnação do ato administrativo que indeferiu a concessão do subsídio de desemprego ao Autor, pedindo a anulação do ato impugnado e que o Réu seja condenado à “prática de todos os atos materiais e jurídicos indispensáveis a repor a situação que existiria se não tivesse sido praticado o ato ilícito, designadamente o pagamento de todas as prestações devidas até ao presente momento, nomeadamente o deferimento da concessão do subsídio de desemprego, o pagamento de todas as prestações desde a data da apresentação do requerimento até à presente data acrescidos de juros de mora à taxa legal desde a data do respetivo vencimento normal até integral pagamento”.

Alegou, para tanto, em síntese, que exerceu a sua atividade profissional na O. (Europa) GmbH e na O-. Lda. que integram a O. Europa Holding GmbH, durante 32 anos; Iniciou em 1979, na Alemanha, onde celebrou o respetivo contrato individual de trabalho com a empresa O. Co. (Europa) GmbH; Foi transferido para Portugal com um contrato denominado Managing Director Contract, no âmbito do qual prestava a sua atividade de forma permanente e em execução duradoura em absoluta exclusividade; Na segurança social, estava inscrito como trabalhador por conta de outrem; Os montantes que lhe eram pagos eram-no como remunerações de caráter permanente; Recebia subsídios de férias, sendo a respetiva marcação autorizada pelo superior hierárquico, e estava inserido numa determinada hierarquia, seguindo ordens e instruções; Não era nem nunca foi sócio da empresa; O seu vínculo laboral detinha todas as características de um contrato individual de trabalho; A natureza do seu vínculo foi objeto de ação intentada no Tribunal do Trabalho de Coimbra, após o seu despedimento; Requereu o subsídio de desemprego que lhe foi negado pela Entidade Demandada com os seguintes fundamentos: não ter estado vinculado por contrato de trabalho ou não estar enquadrado em regime que confira direito a proteção no desemprego e não terem sido apresentados todos os documentos obrigatórios, mormente a Declaração de Situação de Desemprego (a qual foi por si solicitada à entidade patronal e à ACT e nunca disponibilizada); Invoca que cabe à Entidade Demandada conceder o subsídio de desemprego aos trabalhadores por conta de outrem, não podendo ser parcial na sua apreciação, sendo ilegítimo e inconstitucional que aquela pretenda vedar o direito ao apoio social a um cidadão que sempre foi abrangido pelo regime laboral privado; Os artigos 18.º e 19.º do Decreto-Lei n.º 220/2006 na interpretação conferida pela Entidade Demandada violam os artigos 59.º e 61.º da CRP; Deve ser entendido que, de forma análoga, no caso de impugnação de despedimento ilícito se está perante uma situação de desemprego involuntário; Conclui, que o ato de indeferimento do subsídio de desemprego está ferido de nulidade, ou pelo menos, de anulabilidade por força do artigo 133.º, n.º 2, alínea d) ou 135.º do CPA.

Juntou procuração forense, documentos e indicou prova testemunhal.

1.2.

Citado, o Réu contestou, defendendo-se por impugnação.

Invocou, em síntese, que o Autor não estava inscrito na Segurança Social como trabalhador por conta de outrem, mas como membro de órgão estatutário; Em 23 de maio de 2003 a empresa O-., Lda. entregou o modelo RV1011 – DGSSS de alteração de elementos com a designação de um novo gerente (o Autor) com base na inscrição constante da Certidão da conservatória do Registo Comercial; A empresa enviou regularmente de 2003 a 2010 as quotizações e contribuições relativas ao Autor com referência ao regime dos membros de órgãos estatutários e a taxa social única declarada pela entidade empregadora foi sempre o valor da taxa de membro de órgão estatutário; É irrelevante a natureza do vínculo do Autor, sendo antes fundamental para se ter acesso ao subsídio de desemprego que o beneficiário esteja enquadrado num regime legal contributivo que conceda proteção nessa eventualidade; O artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 327/93, de 25 de setembro exclui a eventualidade de desemprego, exclusão mantida pelo artigo 65.º do Código dos Regimes Contributivos da Segurança social; Ninguém pode exigir apenas com base na CRP a concessão de prestações sociais, tanto que neste caso não pode a Administração desaplicar a lei; Ademais, é necessário que se verifiquem os requisitos exigidos pelo Decreto-Lei n.º 220/2006, de 3 de novembro e no caso do Autor, este não apresentou a Declaração de Situação de Desemprego.

Conclui pela improcedência da ação.

Juntou procuração forense e processo administrativo.

*1.3.

Proferiu-se despacho saneador, em que se julgou inadmissível o articulado apresentado pelo Autor (fls 152 dos autos), fixou-se o valor da causa em €30.000,01, considerou-se inexistir matéria de facto controvertida relevante para a decisão da causa e ordenou-se a notificação das partes para apresentarem alegações escritas.

*1.4.

Apenas o Autor apresentou alegações escritas.

*1.5.

Por despacho de fls. 199 dos autos, a instância foi suspensa a instância, ficando a aguardar pelo desfecho da ação judicial a correr termos na Instância Central Cível de Coimbra, 1.ª Secção do Trabalho, Juiz 1, sob o n.º 51/11.0TTCBR intentada pelo ora Autor contra a O-.” onde se discutia a natureza do vínculo laboral daquele.

*1.6.

Foi junto aos autos o termo de transação e respetiva sentença homologatória, relativa ao processo supra identificado, e notificadas as partes.

*1.7.

Na sua resposta, o Autor considerou estarem reunidos todos os pressupostos para a atribuição do subsídio de desemprego.

*1.8.

O Réu pronunciou-se sustentando que a dita transação não altera, por si só, a situação de modo a permitir a concessão do subsídio de desemprego, porquanto as remunerações no período de 2002-06-17 a 2010-06-15 continuam no regime dos membros de órgão estatutário que não abrange a eventualidade no desemprego. Que continua em falta a Declaração de Situação de Desemprego emitida pela entidade empregadora, não resultando com clareza da transação qual o motivo da cessação do contrato. Mais refere, que na sequência da comunicação efetuada pelo Réu desse facto à Entidade Empregadora, esta confirmou que o Autor era seu trabalhador, mas não retificou as declarações de remunerações enviadas nem pagou as diferenças contributivas, não tendo igualmente enviado a Declaração da Situação de Desemprego.

*1.9.

Notificado do requerimento do Réu, em que junta a resposta da entidade empregadora, o Autor reiterou estarem preenchidos todos os requisitos para a concessão do subsídio de desemprego.

*1.10.

Proferiu-se sentença que julgou a ação improcedente da qual consta o seguinte segmento dispositivo: «Pelo exposto, em face da argumentação expendida e disposições legais citadas, na presente ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido, decide este Tribunal em julgar totalmente improcedente a presente ação intentada pelo Autor, absolvendo-se a Entidade Demandada, Instituto da Segurança Social, IP, dos pedidos contra si formulados.

Custas a suportar pelo Autor.

Registe e notifique. Após trânsito devolva o processo administrativo apenso.»*1.9.

Inconformado com a sentença proferida pelo TAF de Coimbra, o Apelante interpôs recurso jurisdicional contra a mesma, formulando as seguintes conclusões: «a) Vem o presente recurso de apelação interposto pelo A. da sentença que decidiu: “Pelo exposto, em face da argumentação expendida e disposições legais citadas, na presente ação administrativa especial de condenação à prática de ato devido, decide este Tribunal em julgar totalmente improcedente a presente ação intentada pelo Autor, absolvendo-se a Entidade Demandada, instituto da Segurança Social, I.P., dos pedidos contra si formulados.” b) O Tribunal a quo desconsiderou os vícios imputados ao despacho impugnado.

c) Concluiu que o Autor, apesar de ter sido reconhecida a existência de um contrato de trabalho, manteve-se enquadrado para efeitos de segurança social no regime dos membros de órgão estatutário, tendo as contribuições por base a taxa aplicável nesse mesmo regime.

d) Para além da falta de retificação das declarações e do pagamento dos diferenciais das contribuições, o Autor não procedeu à entrega da declaração da situação de desemprego para efeitos dos artigos 9º, 43º e 73º do Decreto-Lei nº 220/2006, de 3 de novembro.

e) Para que seja reconhecido o direito às prestações requeridas é necessário que a situação de desemprego seja involuntária, ou seja, que não tenha sido criada de forma consciente e propositada pelo interessado, como sucede no caso de o próprio trabalhador pretender despedir-se, salvo nos casos de denúncia do contrato pelo trabalhador com justa causa, só assim se preenchendo o requisito previsto no artigo 9º do Decreto-Lei nº 220/2006 de 3 de novembro.

f) A presente ação judicial foi intentada a 22.07.2011 e estava desde, pelo menos, 2015 suspensa até que houvesse decisão na ação judicial que o A. também intentou no Juízo do Trabalho do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra – Juiz 1, Proc. nº 51/11.0TTCBR.

g) Para proferir a decisão de que ora se recorre, o Tribunal não carecia de qualquer espera, na medida em que decidiria, como decidiu, estritamente com base nos elementos já existentes nos autos.

h) Assim, o recorrente não viu a sua causa ser examinada, equitativa e publicamente, num prazo razoável por um tribunal independente e imparcial, estabelecido pela lei.

i) E pior, tal espera nem sequer foi relevante para a decisão proferida.

j) Assim, entende o A. ter sido manifestamente violado o art. 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e que tal morosidade da justiça poderá mesmo ter causado ao A. enormes danos, na medida em que poderá já ter prescrito o prazo para que a entidade empregadora venha retificar as contribuições...

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