Acórdão nº 03466/14.8BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 22 de Outubro de 2020

Data22 Outubro 2020
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. C., Lda.

, devidamente identificada nos autos, e o Representante da Fazenda Pública vêm recorrer da sentença proferida do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 05.07.2019, pela qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação judicial da liquidação de IRC do ano de 2010, na parte em que desconsiderou gastos no valor de € 92.037,00.

1.2. A Recorrente C., Lda.

terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: “A. Vem o presente Recurso interposto da Sentença que julgou parcialmente procedente a Impugnação Judicial do ato tributário de liquidação adicional de IRC e respetivos juros compensatórios, referente ao período de tributação de 2010, no valor global de € 41.063,45, pronunciando-se, em consequência, pela manutenção parcial do ato tributário objeto de impugnação.

B. Na perspetiva da Recorrente, a decisão a quo incorre em erro de julgamento, por incorreta apreciação e valoração da prova produzida, com a consequente errada aplicação do direito.

C. No que ao incumprimento do ónus da prova pela Administração Tributária concerne, o Tribunal a quo decidiu julgar a Impugnação Judicial parcialmente procedente, concluindo que “(...) Tem razão a Fazenda Pública quando diz que cumpriu o ónus da prova previsto no artigo 74.º da LGT, pois tendo em conta o facto provado número 3 a Administração Fiscal conseguiu provar os factos constitutivos do seu direito, que se traduzem in casu na reunião de indícios sérios de possível falsidade das operações, cabendo por isso à Impugnante, aliás, neste processo impugnatório a prova dos pressupostos de que depende o seu direito à dedução. Termos em que não houve violação do ónus da prova da Administração Tributária previsto no artigo 74.º, n.º 1 da LGT.” - pg. 13 da sentença.

D.

relativamente à invocada ausência dos pressupostos do negócio simulado e erro na quantificação da matéria coletável, o Tribunal a quo entendeu que “(...) Embora, como vimos, a Fazenda Pública tenha conseguido apresentar indícios sérios de que a facturação de A. à Impugnante poderia ser falsa, a Impugnante, como lhe competia (cfr. Acórdãos do STA de 16-03-2016, in processo n.º 0587/15, e 7-5-2003, in processo n.º 01026/02) logrou provar a materialidade de parte das operações em causa, conforme resulta dos factos provados, dado que apresentou documentos relativos aos serviços prestados por A. a título de vendas de serviços V.Casa e respetivos pagamentos, que demonstram a realidade das operações relativas às facturas n.ºs 41, 47 e 49 relativas a comissões de venda, assim como as testemunhas inquiridas conseguiram demonstrar em Tribunal a veracidade de tais operações, operações que se traduziram em prestações de serviços reais, que configuram um custo que pode ser deduzido.” - pg. 17 e 18 da sentença.

E.

Assim, as questões decidendas, mesmo em face dos factos dados como provados e não provados e da motivação supra descrita, serão: (i) do não cumprimento do ónus da prova que competia à Administração Fiscal e da violação do princípio da verdade material; (ii) da ausência dos pressupostos do negócio simulado e do erro na quantificação da matéria coletável.

F.

Pese embora o raciocínio cognoscitivo sobre a determinação do ónus da prova não mereça qualquer censura, o Tribunal a quo não subsumiu corretamente os factos às orientações legais da repartição do ónus.

G. Por um lado, o Tribunal a quo parte do errado pressuposto de a A.T. cumpriu o ónus da prova que lhe competia, alegando em suma que “ (...) a Administração Fiscal conseguiu provar os factos constitutivos do seu direito, que se traduzem in casu na reunião de indícios sérios de possível falsidade das operações (...)”.E, por outro lado e em consequência da errónea convicção anteriormente formulada, ao considerar que “(...) cabendo por isso à Impugnante, aliás, neste processo impugnatório a prova dos pressupostos de que depende o seu direito à dedução.” H. A prova da verificação dos referidos indícios, ainda que sérios e objetivos, não pode bastar-se com a sua meramente enunciação formal no Relatório de Inspeção, pelo que, ao contrário de quanto considerou o Tribunal a quo, no que às correções aritméticas diz respeito, percorrendo o raciocínio feito pela A.T., não encontramos nada mais do que conclusões precipitadas e intuitivas no sentido de imputar à Recorrente um acordo simulatório com o propósito de defraudar os interesses da A.T..

I. Estando plenamente justificada a atuação da Recorrente e o modus operandi da sua atividade comercial, designadamente, com o sujeito passivo A., crê-se que os argumentos em escrutínio, foram ponderados pela A.T. de forma tendenciosa, de modo que, não poderão ser considerados como indícios suscetíveis de pôr em causa a presunção de veracidade das faturas em causa.

J. Em face da prova produzida, quer documental, quer testemunhal não poderá o Tribunal ad quem deixar de concluir pela materialidade das operações e, em consequência revogar a sentença recorrida.

K. Com efeito, demonstrando-se que as faturas colocadas em crise pela A.T. contêm todos os elementos necessários para que operasse a presunção de veracidade das mesmas, e para que fossem considerados os respetivos gastos, nos termos do artigo 23.º do CIRC, seria essencial para o sucesso da A.T., nesta demanda, na sua decisão de não aceitar as faturas apresentadas pela Recorrente, que provasse inequívoca e objetivamente, estar perante operações inexistentes e simuladas, afastando consequentemente a presunção de veracidade que sobre as mesmas impende.

L. Efetivamente, não foi produzida qualquer prova sobre os alegados indícios da inexistência das operações subjacentes às referidas faturas, pelo contrário, a Recorrente, em sede de impugnação judicial, sindicou todos os alegados indícios recolhidos pela A.T. e demonstrou, nos presentes autos, que as ilações da A.T. resultavam de uma análise precipitada da realidade da Recorrente.

M.

Consequentemente, deve prevalecer a presunção de verdade e boa-fé, prevista no art.º 75.º, n.º 1 da LGT, quanto aos gastos a que respeitam as faturas de aquisição apresentadas pela Recorrente.

N. E, ao contrário do que entendeu Tribunal a quo, era o quanto bastaria para, perante a referida ausência de provas concretas carreadas pela A.T. sobre alegada simulação das operações, demonstrar a ilegalidade das liquidações in questio.

O. Pelo que, ao perfilhar a fundamentação e correção à matéria tributável apresentada pela A.T. no RIT, na decisão de reclamação graciosa e no recurso hierárquico, o tribunal a quo cometeu um erro sobre os pressupostos de direito, violando igualmente o princípio da presunção das declarações dos contribuintes constantes do art.º. 75º da LGT, violando por isso, o princípio da legalidade da atuação administrativa, princípio da justiça e da boa fé.

P. Assim sendo, tendo em conta que, pelos referidos motivos, a A.T. não logrou abalar a presunção de veracidade da contabilidade da Recorrente, nos termos do artigo 75.º da LGT, deveria o Tribunal a quo ter concluído pela aplicação do artigo 100.º do CPPT, e anular os atos tributários de liquidação impugnados.

Q. Ao concluir como concluiu, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, e consequentemente na errada aplicação do direito, violando, assim, as disposições legais dos artigos 74.º e 75.º da LGT, artigo 100.º do CPPT e 23.º, n.º 1 do CIRC.

R. No que concerne à ausência dos pressupostos do negócio simulado e do erro na quantificação da matéria coletável, designadamente quanto à prova da materialidade das operações subjacentes às faturas n.º 40, 50 e 51, referentes a instalações de serviços de telecomunicações e intervenções técnicas, a testemunha H.

, [01:50:47 a 02:46:40 registado no sistema de gravação do SITAF] funcionária da Recorrente no período em causa, esclareceu o seguinte: 02:20:25 Advogada da Recorrente: Sr. Doutor agora aqui só por amostragem, este é o documento n.º 5. Este documento n.º 5 tem a mesma leitura que o documento n.º 3 que mostrei anteriormente ? H.: Só há uma diferença, é que nós aqui [no documento n.º 3] tínhamos valores faturados comissões de vendas e depois também tínhamos valor faturado também... às vezes porque havia contratos valor faturado sobre a instalação de telecomunicações. O que é que acontece, eu tenho equipas de instalações, nós solicitávamos ao parceiro que fizesse acompanhamento nas instalações, porque o que acontecia muitas das vezes era que as equipas contratadas da V. não faziam as instalações corretamente e nós perdíamos o comissionamento porque os serviços não eram instalados no cliente.

Advogada da Recorrente: Não ficavam efetivos, operacionais? H.: Exatamente.

Meritíssimo Juiz: Para evitar que o cliente desistisse, vocês tinham uma equipa técnica … H.: que acompanhava. Eles próprios faziam. Não é que ele desistisse, mas se batesse à porta...nós na altura se fizéssemos um contrato (...) tínhamos muito essa situação “tenho de falar com o meu marido, ele é que tem de ver”, se nós não fossemos no dia a seguir, esse contrato era diretamente para a V. (...) e eu não ganhava nada. Eu e o comissionista.

Advogada da Recorrente: Portanto, nesta fatura, além das comissões das vendas...

H.: Sim.

Advogada da Recorrente: ...tem ainda uma comissão que articularam sobre a instalação.

H.: Sim.

S. Ora, perante tal depoimento, não pode a Recorrente conformar-se com o entendimento perfilhado pelo Mm.º Juiz a quo, designadamente quando ao segmento da motivação da sentença recorrida que se transcreve: “Relativamente ao facto não provado A), o mesmo foi assim considerado em virtude de não ter sido produzida prova relativamente ao mesmo, já que nenhuma das testemunhas referiu que A., ou alguém em seu nome, efectuava trabalhos técnicos de instalação de equipamentos ou serviços similares, apenas referindo que aquele se dedicava à venda dos pacotes de telecomunicações, gerindo uma equipa...

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