Acórdão nº 00035/15.9BUPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 07 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Viseu, proferida em 21/10/2014, que julgou totalmente procedente a impugnação deduzida por C., Lda, contra a liquidação de IRC, Derrama e respetivos juros compensatórios do ano de 1999, cuja matéria coletável foi determinada com recurso a métodos indiretos.

1.2.

A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida em 21/10/2014, que julgou procedente a impugnação da liquidação de IRC relativa ao exercício de 1999, por falta "não estarem reunidos os requisitos para o recurso a métodos indirectos".

B. Na petição inicial são referenciadas diversas figuras tipo de vícios de que um acto tributário pode padecer; contudo, a referência meramente enunciativa dos tipos de vícios não equivale à sua concreta alegação, pois que o objecto do processo é conformado pela indicação dos factos concretos que os consubstanciam.

C. Sendo o direito de conhecimento oficioso e porque a decisão sobre os factos alegados é matéria de direito, bem pode o tribunal qualificá-los de forma distinta.

D. Decorre de fls. 6 da sentença que "Em sede do relatório sintetizamos a argumentação das Partes e, consequentemente, as questões a apreciar'; contudo, a sentença é, neste segmento, ininteligível, por força de ambiguidades nela contidas: se, de uma banda, aparenta pretender solucionar as questões da presunção da veracidade da escrita e de erro na quantificação (concluindo, a fls. 9, que "a AF ilidiu a presunção de veracidade da escrita, mas não resulta claro que apesar das irregularidades verificadas se verifique a impossibilidade de aquela relevar direta e exatamente a totalidade da matéria coletável ...

Por isso ...

diremos não estarem reunidos os requisitos para o recurso aos métodos indiretos"; E. De outra banda, entendendo prejudicada a análise de mais questões, apresenta uma "breves notas" não só sobre os critérios de quantificação, como à preterição de formalidades legais - mas então em que ficamos, ficou ou não prejudicada a análise de outras questões? F. Nos termos do art. 124°, nº 2 a), do CPPT, a apreciação dos vícios é feita atendendo àqueles cuja procedência determine, segundo o prudente critério do julgador, mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos e, atendendo a que os vícios de violação de lei logram precedência sobre os vícios de forma, por determinarem mais estável ou eficaz tutela dos interesses ofendidos (art. 124° do CPPT), em regra devem aqueles ser analisados previamente em relação a estes - com o devido respeito, o Mmo Juiz a quo não só não fundamenta legalmente a sua opção, como não esclarece em que medida ela permite a almejada mais estável ou eficaz tutela dos interesses em causa.

G. As disposições que regem as condições em que a AT pode recorrer à avaliação indiciária são normas de teor substantivo, razão pela qual se aplicam aos factos tributários ocorridos na sua vigência.

H. A sentença, enquanto decisão judicial proferida pelos Tribunais no exercício da sua função jurisdicional que, no caso posto à sua apreciação, dirime um conflito de interesses públicos e privados no âmbito das relações jurídicas administrativo-tributárias; tem por obrigação conhecer do pedido e da causa de pedir, ditando o direito para o caso concreto.

I. E o ditame, que neste caso concreto foi o de se não mostrarem reunidos os requisitos para o recurso a métodos indirectos passaria, nos termos da estatuição do nº 4 do art. 607° do CPC, pela análise critica das provas, pela indicação das ilações tiradas dos factos instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção.

J. Tarefa para a qual preconiza o Meritíssimo Juiz a quo a apreciação conjugada da versão apresentada pela inspeção, pelo Perito Independente e Impugnante.

K. O procedimento de avaliação indiciária da matéria tributável assenta em duas fases: a da qualificação e a da quantificação. A fase da qualificação traduz-se na aferição da existência ou não dos pressupostos do recurso à tributação por métodos indiciários e agrega todo o processo de validação ou invalidação dos dados disponibilizados pelo contribuinte, incluindo a avaliação da qualidade das omissões ou incorrecções verificadas, do ponto de vista da sua importância e extensão e a avaliação da credibilidade da escrita face a tais omissões ou incorrecções e, consequentemente, da sua capacidade de transmitir ou emanar a verdade fiscal daquele contribuinte.

L. Nesta óptica, concluiu o Meritíssimo Juiz a quo pela inquestionável existência de um conjunto de irregularidades contabilísticas e, mesmo considerando as desvalorizadas pelo perito independente, admite que a argumentação deste acaba por atingir resultados muito similares aos apresentados pela AF.

M. Acrescenta que o perito independente também verificou: saldos credores, que na sua relação com os saldos devedores atingem uma percentagem cuja explicação não foi alcançada; variações de saldos de 1998 para 1999 apurando valores divergentes (assinale-se que o âmbito temporal da acção inspetiva foi, apenas, o exercício de 1999, de acordo com o a alínea A) dos factos provados), isto é, mais lançamentos a crédito na faturação do que na contabilidade, que não conseguiu apurar melhor por falta de elementos solicitados à impugnante mas não entregues; explicando ainda a desnecessidade das guias de transporte, face à menção, constante das faturas, de descrição suficientemente clara (os sublinhados são nossos).

N. Não alcançamos, contudo, qual a preponderância probatória de tais considerandos, sobretudo tendo em conta a falta explicação e falta de entrega de elementos pela impugnante (os sublinhados no articulado anterior) - que valoração faz o Meritíssimo Juiz a quo relativamente a esta questão, nomeadamente por contraposição entre o teor do relatório da ação inspetiva levado à alínea B) dos factos provados, da acta da comissão de revisão e da opinião posteriormente emitida pelo perito independente constantes de fls. 128 a 156 dos presentes autos? Desconhecemos.

O. E a que normas jurídicas, em concreto, subsumiria o Mmo juiz a quo a situação em apreço? Desconhecemos em absoluto, pois que nenhuma é convocada.

P. Não desconhece a Fazenda Pública o princípio da livre apreciação da prova; cremos, contudo, que concluir, sem mais, não estarem reunidos os requisitos para o recurso a métodos indiretos é indiciador de erro no julgamento (de direito, como de facto: por falta de apreciação crítica das provas e ausência de legal fundamentação).

Q. Consequentemente, a sentença recorrida enferma de vício de falta de fundamentação (de facto e de direito), a qual implica nulidade da sentença, em conformidade com o preceituado nos art.ºs 123°, nº 2 e 125° do CPPT.

Termos em que, nos melhores de direito e sempre com o mui Douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser dado provimento ao presente recurso, anulando-se a sentença recorrida, com as legais consequências.».

1.3.

Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4.

O EPGA emitiu o parecer de fls. 236 a 237, pronunciando-se no sentido da procedência deste recurso, por considerar que: «(…) 11 - Apreciando o teor de decisão recorrida, parece-nos, que padece de nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto, que abrange também a falta de exame crítico das provas, prevista no art°615° nº1 al.b) do CPC e art° 125º nº1 do CPPT.

12 - Nos termos do disposto nos art°s 123º nº2 do CPPT e 607° nº4 do CPC, o juiz deve fundamentar as suas decisões, " ... analisando criticamente as provas, indicando as ilações tiradas dos factos, instrumentais e especificando os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção ... ".

Deste modo, 13 - A fundamentação da matéria de facto deve conter a indicação dos elementos de prova de que o juiz se soe meu para formar a sua convicção, procedendo a um exame crítico dos mesmos de forma a exteriorizar e dar a conhecer aos interessados as razões por que decidiu em determinado sentido e não noutro.

14 - O exame crítico da, provas, no caso de as provas e elementos divergentes que apontem para sentido diferentes, deve explicitar as razões por que se privilegiaram a credibilidade de umas em detrimento ou desconsideração de outras.

15 - Analisada a sentença recorrida, verifica-se que o Sr. Juiz não descrimina os factos que julga não provados e na motivação da matéria de facto, limita-se a referir que "A convicção do Tribunal formou-se com base nos elementos documentais indicados em cada alínea dos factos provados, na sua apreciação crítica", sem fazer qualquer apreciação crítica ou confronto com esses elementos de prova, não indicando as razões que o levaram a decidir como decidiu ou seja, a concluir que não estão reunidos os requisitos para o recurso ao, métodos indirectos.

16 - ln casu, verifica-se a falta de descriminação dos factos não provados e de apreciação ou exame crítico das provas, pelo que não se pode concluir com segurança quais os elementos de prova que serviram para formar a convicção do juiz, ficando o Tribunal ad quem impedido de sindicar esse julgamento.

17 - A propósito de situação idêntica se pronunciou este TCAN no seu Acórdão de 8.3.12, in Proc. nº 329/05.1BEMDL, a cuja fundamentação se adere e para onde se remete.

(…)».

1.5.

O Meritíssimo Juiz a quo pronunciou-se sobre a nulidade imputada à sentença considerando que apenas à primeira vista ocorre incongruência ou contradição, pois que se concluiu que, não obstante das irregularidades detetadas, não resulta claro que se verifique a impossibilidade de a contabilidade revelar direta e exatamente a totalidade da matéria coletável. Refere também, que a sentença deve ser lida como um todo e do seu conjunto resulta esclarecida a fundamentação de direito...

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