Acórdão nº 00633/12.2.BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Fevereiro de 2020

Magistrado ResponsávelNuno Coutinho
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório J.P.S.

, intentou acção administrativa especial contra o Município de (...) tendo peticionado a anulação do acto praticado por Vereador da Câmara Municipal de (...), ao abrigo de competência delegada, notificado através de ofício datado de 11 de Maio de 2012, nos termos do qual foi ordenada a demolição de obras levadas a cabo sem licenciamento.

Por sentença proferida pelo T.A.F. de Aveiro foi julgada improcedente a acção Não concordando com o decidido, interpôs recurso o A. sintetizado nas seguintes conclusões: “1.ª / O tribunal recorrido cometeu erro de julgamento ao não dar como provados os factos alegados nos artigos 4.º, 5.º, 6.º e 42.º da P.I. e no artigo 2.º da resposta às excepções, os quais são essenciais para a boa decisão da causa, não foram impugnados e estão provados por documentos.

  1. / Tais factos provam os vícios de violação de lei, de desvio de poder e de usurpação de poder, na medida em que o ato administrativo proferido em 11 de maio de 2012, de demolição, impugnado nos autos, incide sobre obras executadas há mais de 20 anos e apenas foi determinado por impulso do contra interessado após perder acção judicial de reivindicação de uma servidão de passagem e querer que o Réu, no uso do seu poder de autoridade administrativa, obrigue o autor a garantir aquela servidão que não conseguiu por via judicial.

  2. / Está provado que a Rua prevista na planta do loteamento n.º 19/82 nunca foi executada, durante mais de 30 anos, desde a emissão do alvará, pelos loteadores, nem pelo Réu, a qual ocupava o trajecto de um caminho existente que servia o prédio loteado.

  3. / Não está alegado, nem provado, que a abertura daquela estrada era necessária para o acesso aos lotes, nem que os adquirentes dos lotes, entre estes o autor e o contra interessado, não tenham acesso àqueles.

  4. / Está provado que as obras de construção de 36 m2 a mais daqueles que foram autorizados, assim como o muro de divisão, foram executados há mais de 20 anos (desde 1995 que o Réu tem conhecimento das mesmas), tempo durante o qual o Réu renunciou ao exercício do seu poder de tutela da legalidade urbanística, criando no autor a certeza jurídica da conformidade das mesmas com a lei e o direito.

  5. / O tribunal recorrido, ao ignorar o efeito do decurso daquele prazo na esfera jurídica do autor enquanto titular do seu direito de propriedade e dentro do qual o Réu não exerceu o seu direito de autoridade à reposição da legalidade urbanística fez incorrecta aplicação da lei e do direito, decidindo contra a jurisprudência dos tribunais superiores na interpretação e aplicação das normas jurídicas previstas no artigo 69.º n.º 3 do RJUE aprovado pelo D.L. 555/99 e nos artigos 6.º e 134.º n.º 3 ambos do CPA.

  6. / E mutatis mutandis, no que se refere ao direito do réu fiscalizar as obras executadas sem o procedimento de comunicação prévia, em que caducou o seu direito de exercer o seu poder de autoridade para promover as medidas de tutela da legalidade urbanística, como é o da demolição, pelo decurso do prazo de 10 anos previsto no artigo 35.º n.º 9 do RJUE, aplicável ao caso, nos termos do artigo 12.º n.º 2 do C.C.

  7. / O direito do autor construir no seu lote derivou da emissão do alvará de loteamento e não da licença de construção naquele lote, sendo que esta autorização de construir apenas visa verificar a conformidade daquilo que o titular do direito de propriedade do lote pretende construir está de acordo com as disposições daquele alvará e não sobre se pode construir no prédio rústico loteado.

  8. / Donde decorre que, não fixando o alvará o índice de construção ou de ocupação, a ordem de demolição dos 36 m2 construídos a mais do autorizado, assim como o muro de vedação, devia ser precedida de uma avaliação sobre a possibilidade da sua legalização e só, em ultima ratio, determinar aquela, como impõe o princípio da proporcionalidade da actuação da administração.

  9. / Não está provado, nem foi alegado, que aquelas obras são proibidas pelo alvará de loteamento, nem pode ser fundamento para a sua não legalização estarem a confinar com a estrada prevista na planta do loteamento que nunca foi aberta pelos loteadores, nem pelo Réu e nenhum dos donos dos lotes alguma vez solicitou a sua abertura.

  10. / A construção de 36 m2 a mais do autorizado de um anexo num lote e um muro de vedação, cujo alvará de loteamento não as proíbe, é uma obra de escassa relevância urbanística isenta de licença.

  11. / O tribunal recorrido ao não ter esse entendimento fez incorrecta aplicação da lei e do direito, nomeadamente, as normas dos artigos 6.º n.º 1 alínea e) do RJUE na redacção da Lei 60/2007 e na redacção dada pelo D.L. alínea c)) e artigo 6.º - A do mesmo regime.

  12. / A rejeição da comunicação prévia prevista no RJUE não tem como consequência o indeferimento do pedido de construção ou negação do direito a construir, mas sim indeferimento dum procedimento indevido por a operação urbanística estar sujeita ao procedimento de licenciamento.

  13. / O tribunal ao ter entendimento diverso deste fez incorrecta aplicação da lei e do direito, nomeadamente, das normas dos artigos 4.º n.º 4 e 6, do RJUE.

  14. / O ato de demolição ao considerar que o muro e anexo confronta com a estrada que nunca foi executada, quando o muro e anexo está a confrontar com o lote do prédio do contra interessado, errou nos pressupostos que determinam a vontade do seu autor, enferma de ilegalidade, pois no caso de estarem a confrontar com prédio não é exigida licença de construção.

  15. / O ato de demolição carece de fundamentação, por ser contraditório o seu texto, na medida em que não consta do mesmo, nem das informações que o antecedem, que as obras executadas não são susceptíveis de legalizar por violar as disposições do alvará de loteamento.

  16. / O ato de demolição só foi proferido porque o contra interessado pediu ao Réu que, no exercício dos seus poderes de autoridade de garantia da legalidade urbanística, através da demolição do muro e do anexo, lhe garantisse o seu direito de servidão de passagem sobre o prédio do autor, direito este que lhe havia sido negado por decisão judicial.

  17. / Assim, o réu ao proferir o acto de demolição fê-lo para satisfazer um fim privado do contra interessado e através disso garantir um direito de servidão que os tribunais não lho reconheceram.

  18. / E nem se diga que o ato de demolição visou garantir a legalidade urbanística derivada do alvará de loteamento pois se o quisesse tinha ordenado aos loteadores a execução da infra-estrutura dita de estrada ou tinha ele próprio executado a mesma.

  19. / Razão pela qual o tribunal ao não reconhecer ao ato a ilegalidade derivada dos vícios de desvio de poder e de usurpação de poder...

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