Acórdão nº 00306/18.2BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Maio de 2020
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 15 de Maio de 2020 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte: I – RELATÓRIO: 1.1.A.
, residente na Rua (…), (…), moveu ação administrativa contra o MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA, com sede na Avenida (…), (…), pedindo que o R. seja condenado a ordenar à Direção da Escola Secundária (...) que introduza na ata da reunião do Conselho de Turma do 10.º 2, realizada em 27/10/2017, a menção de que a mesma foi lida e aprovada em 05/12/2017, com quatro votos a favor e um contra, bem como a proceder ao registo, na íntegra, na referida ata, do conteúdo da declaração de voto apresentada pela A. em 05/12/2017.
Alegou, para tanto, em síntese, que na qualidade de representante dos pais e encarregados de educação da turma 2 do 10.º ano da Escola Secundária (...), em (…), participou na primeira parte da reunião do Conselho de Turma realizada em 27/10/2017; Em exposição datada de 23/11/2017, relatou à Delegada Regional de Educação do Centro que a ata da reunião do Conselho de Turma de 27/10/2017 não reproduzia com rigor o que aí aconteceu e aparecia aprovada sem que tivesse sido lida e votada pelos participantes no Conselho; Após tomar conhecimento da exposição, o Diretor da Escola Secundária (...) convocou uma reunião extraordinária do Conselho de Turma para o dia 05/12/2017, tendo como ponto único a leitura e aprovação da ata da reunião realizada em 27/10/2017, tendo esta sido aprovada com quatro votos a favor e um voto contra da própria A., que leu e entregou uma declaração escrita a fundamentar o seu sentido de voto e que se encontra em anexo à ata da reunião de 05/12/2017; Porém, a Direção da Escola Secundária (...) não registou nem anexou a declaração de voto da A. na ata da reunião do Conselho de Turma de 27/10/2017, pelo que não consta desta ata que a mesma foi aprovada com o voto contra da A. e que com este voto foi apresentada uma declaração escrita a fundamentar o sentido de voto, nem a mesma foi ali transcrita ou sequer se encontra a ela anexada; O respeito pelos valores e princípios da legalidade, justiça e imparcialidade, competência, responsabilidade, proporcionalidade, transparência e boa-fé, e, bem assim, o respeito pelo dever de assegurar a participação de todos os intervenientes no processo educativo, nomeadamente dos professores, dos alunos e das famílias, concretiza-se, além do mais, no registo fidedigno das intervenções dos representantes dos pais e encarregados de educação nas atas lavradas das reuniões em que esses participantes possam ter tido intervenção ativa relevante, o que foi violado pela conduta adotada pelo Diretor da Escola Secundária (...); A referida conduta resulta também numa restrição à prossecução plena das competências e atribuições do Conselho de Turma, especificadas no art.º 27.º do Regulamento Interno da Escola; Foi, ainda, violado o disposto nos n.os 1 e 2 do art.º 34.º do CPA, uma vez que é exigível, in casu, que se faça constar da própria ata lavrada da reunião de 27/10/2017 que a mesma foi aprovada em 05/12/2017, com quatro votos a favor e com o voto contra da A., pelos motivos constantes da declaração de voto datada de 05/12/2017, que também deverá fazer parte integrante daquela ata; A omissão sindicada viola igualmente os princípios da administração aberta e da transparência, porquanto dificulta, senão mesmo impossibilita, que, em caso de consulta da ata lavrada da reunião de 27/10/2017, se conheça a discordância manifestada pela A. quanto ao que ocorreu na referida reunião.
*1.2.
Regularmente citado, o R. contestou, defendendo, em suma, que o voto de vencido da A. não foi expresso na reunião de 27/10/2017, nem tão pouco a sua declaração de sentido de voto foi entregue na reunião de 27/10/2017, mas apenas na reunião extraordinária do Conselho de Turma de 05/12/2017, tendo ficado devidamente registado na respetiva ata, a qual espelha o que, e em que momento, efetivamente aconteceu. Conclui, por isso, que não pode ser inserido na ata de uma reunião realizada em 27/10/2017 o que só veio a verificar-se em 05/12/2017, pois tal seria adulterar a ata e, consequentemente, a realidade que esta deve fielmente retratar, em violação do princípio da legalidade. Pugna, assim, pela improcedência do peticionado.
*1.3.
Em 16 de maio de 2019 o TAF de Coimbra proferiu sentença que julgou a ação parcialmente procedente, a qual consta do seguinte segmento decisório: «Pelo exposto, julga-se a presente ação administrativa parcialmente procedente e, em consequência, condena-se o R. a ordenar à Direção da Escola Secundária (...), em (...), que introduza na ata da reunião do Conselho de Turma da turma 2 do 10.º ano, realizada em 27/10/2017, a menção de que a mesma foi lida e aprovada em reunião de 05/12/2017, com quatro votos a favor e um voto contra.
Custas pela A. e pelo R., na proporção do respetivo decaimento, o qual se fixa em 50% para cada uma das partes.
Ao abrigo das disposições conjugadas dos art.ºs 31.º, n.º 1, e 34.º, n.ºs 1 e 2, do CPTA, do art.º 6.º, n.º 4, do ETAF, e dos art.ºs 305.º, n.º 4, e 306.º, n.º 2, do CPC (aplicáveis ex vi art.ºs 1.º e 31.º, n.º 4, do CPTA), fixa-se à presente ação o valor de € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo).
Registe e notifique.» 1.4.
Inconformada com esta decisão, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, pedindo que a decisão recorrida seja revogada no segmento recorrido. Concluiu as suas alegações da seguinte forma: «1.º Vem o presente recurso jurisdicional interposto da sentença proferida a 16.05.2019, no segmento em que julgou improcedente o pedido formulado pela Autora, de que o Ministério demandado ordenasse à Escola Secundária (...) que procedesse ao registo na íntegra, na acta da reunião realizada a 27.10.2017, do conteúdo da declaração de voto apresentada pela Autora na reunião de aprovação daquela acta, realizada a 05.12.2017, porquanto ao decidir nestes termos o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento de direito por errada interpretação e violação das disposições e princípios legais aplicáveis – arts. 34.º n.º 1 e 35.º n.º 1 do CPA, e princípios da igualdade, da participação, da administração aberta, da transparência e da boa-fé, consagrados nos arts. 3.º e 5.º da Lei n.º 75/2008, de 22 de Abril e nos arts. 6.º, 10.º, 12.º e 17.º do CPA.
-
A Recorrente não aceita o entendimento plasmado no aresto recorrido: - de que face ao disposto no n.º 2 do art. 34.º do CPA, não é necessário nem exigível, sendo além do mais excessivo exigir o registo na acta da reunião de 27/10/2017, do teor da declaração de sentido de voto relativa à aprovação da acta dessa acta, por não ter a mesma sido tomada a 27/10/2017 mas apenas a 05.12.2017; e de que - quando o art.º 35.º, n.º 1, do CPA determina que os membros do órgão colegial podem fazer constar da ata o seu voto de vencido, a referência a “ata” se reporta à a ata da reunião do Conselho de Turma Extraordinário realizada em 05/12/2017, concluindo que, constando dessa acta a referência expressa à Declaração de voto da Sra. Representante dos Pais e Encarregados de Educação, se acha cumprida a exigência legal do n.º 1 do art. 35.º do CPA.
-
De acordo com o teor da declaração de voto apresentada pela Autora na reunião do Conselho de Turma extraordinária realizada a 05.12.2017, que teve como único propósito aprovar a acta da reunião do Conselho de Turma intercalar de 27.10.2017, esta última não espelha de forma fidedigna o que efectivamente ocorreu na reunião daquela data. Por esse motivo, a Autora não aprovou a referida acta votada na reunião de 05.12.2017, votando contra a sua aprovação.
-
Como determina o n.º 1 do art. 35.º do CPA, os membros do órgão colegial podem fazer constar da ata o seu voto de vencido, enunciando as razões que o justifiquem, o que no caso concreto não se verificou, não constando da acta da reunião de 27.10.2017 o voto de vencido apresentado pela Autora e as razões que lhe estão subjacentes, em violação do referido preceito. (destaque nosso) 5.º Não há qualquer expressão na sobredita disposição legal da qual se possa inferir que a acta a que ali se alude é a acta de aprovação e não a acta que está em discussão e aprovação, nem a M. Juiz fundamenta legalmente o seu entendimento, bastando-se com a interpretação de que a referência a “ata” reportar-se-á, neste caso, à ata da reunião onde foi tomada a deliberação, que não é de todo suficiente para sustentar a decisão tomada.
A acta a que se refere o n.º 1 do art. 35.º do CPA só pode reportar-se, neste caso, e contrariamente do decidido pelo aresto recorrido, à acta da reunião de 27.10.2017.
-
Tendo a sentença determinado que o resultado da votação da aprovação da acta da reunião de 27.10.2017, que ocorreu a 05.12.2017, deve constar da acta da reunião de 27.10.2017, também a declaração de voto de vencido da Autora, que foi apresentada no mesmo dia e na reunião de 05.12.2017 deve ser espelhada, mediante transcrição integral, na acta daquela reunião de 27.10.2017, sob pena de se utilizarem dois critérios distintos, como fez o Tribunal a quo, sem fundamentar devidamente o seu entendimento e em errada interpretação do n.º 1 do art. 35.º do CPA.
-
A sufragar-se o entendimento do Tribunal a quo, teríamos, no limite, que considerar e admitir, mesmo sem qualquer sustentação legal, que seria possível que, para a mesma reunião de 27.10.2017 e para a respectiva acta, pudessem existir dois documentos diferentes consoante a data da sua aprovação: se a acta tivesse sido lida e aprovada na própria reunião, teria em anexo a declaração de voto da Autora/Recorrente; no entanto, como a acta só foi lida, posta a votação e aprovada na reunião seguinte, não tem em anexo a referida declaração de voto! 8.º Uma acta, enquanto documento que descreve o que se passou numa reunião, não pode ser diferente em função da data em que é aprovada! Se assim fosse e se, por absurdo, na reunião de 05.12.2017, a acta de 27.10.2017, posta a votação, tivesse tido um voto a favor e quatro votos contra, como se procederia? Não se poderia...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO