Acórdão nº 00708/11.5BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução15 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte: I. RELATÓRIO 1.1 .S., casada, docente do ensino superior, residente na Urbanização (…), em (…), moveu ação administrativa especial, nos termos dos artigos 46.º e seguintes do CPTA, contra a Universidade de Coimbra, com sede no Palácio (…), em Coimbra, para condenação à contratação da Autora como professora auxiliar de carreira, em regime de contrato de trabalho em funções públicas, por tempo indeterminado e em exclusividade/tempo integral, com efeitos reportados a 27 de janeiro de 2011 e, subsidiariamente, peticionou a anulação do despacho reitoral de 29 de agosto de 2011, no segmento em que não determina a contratação da Autora como professora auxiliar de carreira, em regime de contrato de trabalho em funções públicas por tempo indeterminado e em tempo integral/exclusividade.

Alegou, para tanto, em síntese, que é docente universitária, tendo sido contratada em regime de contrato administrativo de provimento como Assistente da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, por contrato válido por seis anos.

Concluiu o seu doutoramento em 27 de janeiro numa área em que a Faculdade de Direito não concede doutoramentos mas no domínio da Administração Pública e com interesse relevante para a licenciatura em Administração Pública ministrada pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra.

Em 09/02/2011 manifestou junto do Conselho Cientifico da Faculdade de Direito a sua vontade de ser contratada por tempo indeterminado como professora auxiliar, em virtude de estar abrangida pela previsão do n. º5 do art.º 10.º do regime transitório aprovado pelo DL 205/2009, de 31/08.

Até á presente data não foi notificada de qualquer decisão, pelo que presume que o seu requerimento tenha sido tacitamente indeferido, representado uma omissão ilegal da prática de ato devido.

Mais alega que nos termos do artigo 11.º, n. º2 e 26.º, n. º4 do ECDU, na redação anterior a 01 de setembro de 2009, os assistentes que terminassem o doutoramento tinham o direito automático a ser contratados como professores auxiliares, possuindo um direito subjetivo à contratação.

Com a entrada em vigor do novo ECDU, em 01 de setembro de 2009, o artigo 10.º, n. º5 das disposições transitórias assegurou que quem estivesse provido como assistente mantinha, desde que viesse a concluir o doutoramento até igual data de 2015 o direito a ser contratado como professor auxiliar.

A circunstância do seu doutoramento não ter sido efetuado na Faculdade de Direito não constitui fundamento válido e impeditivo da contratação da A. como Professora auxiliar de carreira.

1.2.

Regularmente citada, a Entidade Demandada apresentou contestação, defendendo-se por impugnação e por exceção. Por exceção invocou a caducidade do direito de ação e por impugnação pugnou pela improcedência do peticionado pela Autora, alegando, em síntese, que a contratação como professor auxiliar ao abrigo dos artigos 10.º, n. º5 do ECDU e dos artigos 11.º, n. º2 e 26.º, n. º4 do anterior ECDU, não é nem pode ser automática em todas as situações em que o assistente tenha vínculo à escola durante 5 anos e obtenha um qualquer doutoramento ou equivalente.

Tal direito, apenas pode existir quando se verifique o pressuposto sobre o qual a norma assenta que é a efetiva participação prévia da Instituição em que o assistente leciona na escolha do doutoramento a realizar que lhe permitirá ser contratado como professor auxiliar.

1.3.

A Autora respondeu à matéria de exceção invocada pela Entidade Demandada, pugnando pela improcedência da exceção invocada.

1.4.

A fls. 121 e 122 dos autos foi proferido despacho saneador, no qual se julgou improcedente a exceção de caducidade do direito de ação e ordenou-se a notificação das partes para alegarem.

1.5.

As partes apresentaram alegações, tendo mantido as posições vertidas nos articulados.

1.6.

Em 31 de maio de 2014, o TAF de Coimbra proferiu sentença que julgou a ação procedente, a qual consta do seguinte segmento decisório: «Nestes termos e com os fundamentos supra exarados, julgo a presente ação totalmente procedente e, em consequência condeno a Entidade Demandada a contratar a Autora como Professora Auxiliar de carreira, nos termos requeridos, com efeitos a 1 de abril de 2011.

Custas pela Entidade Demandada, nos termos do artigo 527.º do CPC ex vi art.º 1.º do CPTA.

Registe e notifique.».

1.7.

Inconformada com o decidido, a Ré/Apelante interpôs o presente recurso jurisdicional, em que apresenta as seguintes conclusões: « 1.

Atendendo aos factos invocados na contestação, aos documentos que constam dos autos (nomeadamente, os constantes do PA), aos documentos ora juntos, considera-se provada a factualidade com interesse para a decisão da causa reproduzida em II / III / IV e V destas Alegações de Recurso.

  1. A contratação como professor auxiliar ao abrigo dos normativos invocados e transcritos não é, nem pode ser, automática em todas as situações em que o assistente tenha vínculo à escola durante 5 anos e obtenha um qualquer doutoramento ou equivalente.

  2. E tal decorre do disposto no nº2 do artigo 11º e no nº4 do art. 26º do ECDU na redacção anterior ao Decreto-Lei 205/2009 (aplicável ao abrigo do nº 5 do artigo 10º deste ultimo diploma legal), caso os mesmos sejam interpretados em conformidade com o artigo 9º nº3 do CC e em respeito da constitucionalmente imposta autonomia universitária.

  3. O legislador, quando se referiu nos referidos normativos à obtenção de doutoramento, naturalmente que estaria a pressupor e a regular aquelas situações, normais e comuns, em que o doutoramento é obtido na própria Faculdade em que o Assistente lecciona pois só assim estaria garantida a adequação às necessidades da própria instituição.

  4. No limite o legislador teria concebido que o Assistente - que pretende progredir na sua carreira universitária no âmbito de uma concreta instituição que o acolhe - tivesse previamente discutido as suas opções de formação com essa instituição para tomar uma opção também em função do que seria mais adequado para a continuação da sua ligação à instituição universitária que o acolheu.

  5. Tais normas não podem ter uma aplicação automática às situações em que o assistente realiza unicamente uma escolha individual de doutoramento sem qualquer participação da instituição onde pretende vir a beneficiar do grau obtido para progredir na carreira.

  6. Não podem ser completamente subalternizados os interesses e necessidades de uma Faculdade e as perspectivas de evolução dos cursos leccionados a médio e longo prazo em função de escolhas individuais de cada docente.

  7. Pelo nível científico actual e futuro de uma Faculdade e pelos cursos leccionados o Conselho Científico é, nos termos da Lei 62/2007 (cfr. Artigos 102º a 103º) o principal órgão responsável pela definição e controlo de um recrutamento de docentes.

  8. A intervenção de tal órgão no recrutamento de docentes nunca pode passar pela mera verificação da existência de um doutoramento sem qualquer consideração sobre o conteúdo do mesmo e sobre a situação actual e futura da instituição e cursos cuja qualidade e constante evolução está legalmente obrigada a garantir.

  9. A interpretação sufragada pela Autora e considerada na Sentença ora recorrida redundaria na aceitação de que o assistente poderia obter um doutoramento em qualquer área do saber e em qualquer local, sem qualquer tipo de controlo pela instituição em que leccionava e, ainda assim, ter que ser contratado por esta como Professor Auxiliar! 11. A existir um direito automático a contratação resultante daqueles normativos, o mesmo apenas poderia ocorrer quando se verifica o pressuposto sobre o qual a norma assenta: a efectiva participação prévia da Instituição em que o assistente lecciona na escolha do doutoramento a realizar (aumento de formação) e que lhe permitirá ser contratado como professor auxiliar.

  10. Outras leituras e interpretação significariam retirar às instituições o efectivo controlo sob o recrutamento do seu corpo docente e o controlo da organização e qualidade dos cursos leccionados, em clara violação da autonomia universitária constitucionalmente consagrada (art. 76º nº2 da CRP).

  11. A interpretação sufragada pela Autora e aceite como ‘legal’ pelo Tribunal ora recorrido passaria tal controlo para as escolhas individuais e egoístas de cada pessoa em detrimento dos interesses da instituição em clara e evidente violação da autonomia universitária consagrada na Constituição.

  12. No sentido que se sustenta há que atentar no acórdão do TCA Sul de 25/11/2009 (Proc. 03128/07), no sumário em que se pode ler: «Em face do princípio da autonomia universitária, na sua vertente científica e pedagógica, não pode ser imposta a uma Faculdade a contratação imediata e automática de um Assistente Estagiário que optou por efectuar o curso de mestrado noutra instituição.» 15. Acresce que a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, que sempre entendeu e aplicou o referido normativo com a interpretação que ora aplicou, em 13/3/2008 (vide supra ponto 9 do item III) inclusive publicitou o seu entendimento na comunidade universitária de Coimbra, nomeadamente a de Direito: «2. Tomar público que, no seu entendimento, o disposto no art. 11.°, n.º 2, do Estatuto da Carreira Docente Universitária, aprovado pelo Decreto-Lei n." 448/79, de 13 de Novembro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 19/80, de 16 de Julho, somente se aplica aos assistentes, assistentes convidados, professores auxiliares convidados e às individualidades que tenham sido assistentes ou assistentes convidados há menos de cinco anos na Faculdade de Direito de Coimbra e ela vinculados durante, pelo menos, cinco anos, se fizerem o seu doutoramento na Universidade de Coimbra ou noutra Universidade com o patrocínio da Faculdade de Direito de Coimbra. Este entendimento resulta da interpretação daquela norma jurídica baseada, fundamentalmente, nos elementos lógicos (histórico, teleológico e sistemático) da...

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