Acórdão nº 01059/08.8.8BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Maio de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução15 de Maio de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte: I – RELATÓRIO 1.1. E., S.A.

, moveu ação administrativa especial contra o MINISTÉRIO DA ECONOMIA E DO EMPREGO, pedindo a « anulação do despacho, assinado por C. em nome do Sr. Director-Geral da Direcção Geral de Energia e Geologia (adiante abreviadamente designada por DGGE) que concedeu à Autora o prazo de 60 dias para proceder à assinatura do contrato de concessão proposto pela DGGE sob pena de “revogação do Alvará e extinção da concessão”, notificado à Autora por ofício registado com AR, datado de 4.04.2008 e recebido em 9.04.2008 (DOC. 1 junto com a p.i.; O reconhecimento do direito da Autora à perpetuidade da concessão, a consagrar no novo contrato a outorgar ou, pelo menos, do direito a um prazo não inferior a 90 anos prorrogáveis por dois períodos sucessivos de 20 anos cada; Assim não se entendendo, a condenação do Réu no pagamento da indemnização devida pela alteração unilateral de um dos elementos essenciais da concessão – o prazo de vigência – em montante a liquidar em sede de execução de sentença.” Para tanto, alegou, em síntese, que o despacho impugnado padece de erro nos pressupostos, por violar as disposições que regem esta matéria, e por violar princípios a que o agir administrativo se encontra vinculado, entre os quais os da legalidade, da proteção da confiança e da boa-fé, uma vez que, é titular de um direito de concessão à exploração das “Termas de (...)”, titulado por alvará que lhe atribuiu licença para essa exploração gratuita e perpetuamente, razão pela qual não podem os DL 90/90 e 86/90 alterar os seus direitos adquiridos, que, aliás, estão salvaguardados por disposições desses diplomas, forçando a autora à outorga de um contrato no qual se prevê a manutenção do seu direito à exploração das referidas “Termas de (...)” mas por um período de 50 anos, renovável por dois períodos de 20 anos cada um. Em seu entender, não resultando dos referidos diplomas nenhuma indicação quanto ao prazo, no mínimo esse prazo devia ser de 90 anos, com duas renovações de 20 anos cada uma, o que corresponderia a perpetuidade da concessão.

Para o caso de assim vier a ser entendido, então tem direito a perceber uma indemnização pelos prejuízos que daí derivam para a sua esfera jurídica.

1.2.

Regularmente citado, o Réu contestou, defendendo-se por impugnação, alegando, em suma, que com a publicação dos D.L. n.ºs 86/90 e 90/90, de 16/03 que vieram proceder à alteração do regime jurídico do aproveitamento dos recursos geológicos e, em especial, das águas minerais naturais, impõe-se à autora a celebração de um contrato de concessão nos termos e condições previstas nos referidos diplomas, ou seja, sujeito à estipulação do prazo inicial de 50 anos para a concessão, renovável por dois períodos de 20 anos cada um, pugnando pela improcedência da ação.

1.3.

Proferiu-se despacho saneador e ordenou-se a notificação das partes para alegarem, querendo.

1.4.

As partes apresentaram alegações, reiterando no essencial a posição já enunciada nos respetivos articulados.

1.5.

Em 09.02.2012 foi proferida sentença pelo juiz relator do TAF de Braga que julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo o réu dos pedidos formulados, e condenado a autora em custas.

1.6.

Inconformada com a referida sentença a autora interpôs recurso jurisdicional da mesma para o TCAN, invocando nas respetivas alegações, em síntese: (A) nulidade da sentença recorrida por (i) total falta de fundamentação, e por (ii) omissão de pronúncia, invocando ainda, (B) errónea interpretação e aplicação dos dispositivos legais e constitucionais aplicáveis ao caso submetido a julgamento 1.7.

Notificado para os termos do recurso, o recorrido apresentou contra-alegações sustentando a inteira correção e legalidade da sentença proferida pelo TAF de Braga.

1.8.

Proferiu-se despacho de admissão do recurso e os autos subiram ao Tribunal Central Administrativo do Norte.

1.9.

Em 14.03.2103 o TCAN proferiu acórdão pelo qual decidiu não tomar conhecimento do recurso jurisdicional e ordenou a baixa dos autos ao tribunal de 1.ª instância a fim do seu objeto ser apreciado, a título de “reclamação” pelo Coletivo de Juízes a quem competiria proceder ao julgamento da matéria de facto e de direito nesta ação administrativa especial.

1.10.

Recebidos os autos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em cumprimento do Acórdão proferido, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 40.º, n.º 3 do ETAF e 92.º do CPTA, foram os autos remetidos a vistos aos Senhores juízes adjuntos que integram o coletivo de juízes, em ordem a apreciar os fundamentos da Reclamação apresentada.

1.11.

Em 28.02.2014 o coletivo de juízes do TAF de Braga julgou a reclamação improcedente, nos seguintes termos: «Pelo exposto, julga-se a Reclamação totalmente improcedente, mantendo-se inteiramente a decisão reclamada.

Sem custas.» 1.12.

Inconformada com a decisão proferida pelo TAF de Braga, a Autora interpôs recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões: « 1. A decisão recorrida, ao remeter parra o entendimento sufragado no Parecer da Procuradoria-Geral da República, de 1994, sufragou entendimento claramente ilegal por contrário à lei e à Constituição; 2. Note-se, por outro lado, que a Autora, ora Recorrente, juntou nos presentes autos, um Parecer do ilustre Constitucionalista Professor Gomes Canotilho, em sentido contrário ao parecer da Procuradoria, o qual foi, pura e simplesmente, ignorado pelo tribunal recorrido.

3. Sendo certo que, havia já apresentado junto do Réu, outros quatro pareceres jurídicos, de ilustres e reconhecidos administrativistas, que constam igualmente dos autos, a saber os pareceres do Dr.

Mário Esteves de Oliveira, do Dr.

José Osvaldo Gomes, Parecer do Professor Freitas do Amaral e do Dr.

Vítor Alves Coelho, os quais foram totalmente ignorados pelo tribunal recorrido.

4. Da evolução legislativa do regime jurídico das concessões de exploração de águas minero-medicinais resulta que inicialmente previa as águas minero-medicinais e respectivas nascentes eram objecto de propriedade privada; 5. O Código Civil de Seabra admitiu a possibilidade de imposições e restrições de natureza administrativa, prevendo que nesse caso, as restrições aos direitos de natureza privada dariam lugar ao pagamento de indemnizações aos seus titulares; 6. Com o Decreto de 30 de Setembro de 1892, o aproveitamento dos depósitos das substâncias minerais estava dependente de autorização do Governo que assumiria a forma de alvará ou de contrato de concessão consoante se tratasse de águas inseridas no domínio público ou no domínio particular, sendo certo que tal autorização assumia sempre carácter perpétuo; 7. Com a entrada em vigor do Decreto nº 5 787-F, de 10 de Maio de 1919, são integradas no domínio público do Estado as nascentes de águas minero-medicinais cuja exploração podia ser entregue a particulares através de titulo definitivo, tendo-se dado, assim, com o referido Decreto nº 5 787-F, de 10 de Maio de 1919, uma autêntica expropriação dos direitos dos até então proprietários privados das nascentes de águas minerais, devendo entender-se, em nossa opinião, que tal expropriação conferia, por efeito do disposto no artigo 445º do Código de Seabra, direito ao pagamento de indemnização pelos prejuízos resultantes desta regulação administrativa; 8. A generalidade dos diplomas que foram sendo publicados sobre esta matéria previram a salvaguarda dos títulos de concessão anteriormente emitidos; 9. O regime descrito manteve-se, na essência, até à entrada em vigor dos Decretos-lei nºs 86/99 e 90/90, de 16 de Março que vêm estabelecer que a exploração das nascentes de águas minero-medicinais é feita através de contrato de concessão temporalmente limitado; 10. Ao contrário do que sucede para a generalidade das concessões, os diplomas em causa não contêm a imposição de pagamento de uma taxa como contrapartida pela concessão, não obstante preverem a possibilidade de inclusão, no contrato de concessão, como obrigação do concessionário, do pagamento de compensações ao Estado (artigo 20º, al. d), ponto II do Decreto-lei nº 86/90); 11. Os diplomas em causa também não definem um prazo de duração mínimo ou máximo para as concessões; 12. De todo o exposto resultam, como alterações mais significativas decorrentes destes diplomas em relação ao regime anterior à sua vigência: a) a alteração da natureza do título jurídico-administrativo de atribuição da exploração — de licença para contrato de concessão; b) o estabelecimento da duração limitada da concessão por contraposição ao carácter perpétuo resultante dos diplomas anteriores, ainda que sem definição de um prazo máximo para as concessões; c) a previsão da atribuição de compensações ao Estado pelos concessionários ainda que com natureza meramente facultativa; 13. Atenta a existência de múltiplas concessões anteriores à entrada em vigor dos diplomas em análise — algumas delas com mais de um século de existência como a da Autora - o legislador expressamente consagrou um regime transitório aplicável às concessões pré-existentes.

14. O artigo 46º do Decreto-lei nº 90/90 veio dispor que "O regime das concessões existentes passará a ser o previsto neste diploma, devendo ser celebrados os respectivos contratos, sem prejuízo dos direitos adquiridos" e que "será concedido, em casos justificados, o regime de adaptação que se mostre indispensável"; 15. Por seu turno, dispõe o artigo 58º do Decreto-Lei nº 86/90 que: "os titulares dos direitos adquiridos ao abrigo da legislação anterior ao Decreto-lei no 90/90, de 16 de Março, serão notificados pela Direcção-Geral para a celebração dos contratos previstos no mesmo diploma legal" e que "serão respeitados os direitos adquiridos e concedido o período de adaptação que se mostrar justificado pelas circunstâncias de cada caso concreto"; 16. Estas disposições resolvem, assim, directamente, os problemas decorrentes da sucessão de leis, ou seja...

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