Acórdão nº 02012/10.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Maio de 2020

Data29 Maio 2020
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO A., residente em Rue (…), França, instaurou acção administrativa especial contra o Município de (...), com sede na Rua (…), visando a declaração de nulidade ou anulação do despacho do Vereador do Planeamento e Gestão Urbanística, proferido no processo de obras n.º DJ/SPO n.º 468/85, que ordenou a demolição voluntária das obras sitas na Rua (...), (...), (…), e determinou a tomada de posse administrativa do imóvel e do despacho de 11.10.2010 que indeferiu liminarmente o pedido de licenciamento da obra.

Por decisão proferida pelo TAF de Braga foi julgada improcedente a acção.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Autor formulou as seguintes conclusões: 1- No prédio do Recorrente existiam construções há varias dezenas de anos, construções anteriores à RAN.

2- O A. remodelou as construções existentes de forma a que o referido anexo passou a dispor de cozinha, duas casas de banho e dois quartos em estrutura pré-fabricada de madeira.

3- Da eira colocou uma cobertura de madeira revestida com telha cerâmica sustentada em pilares de granito.

4- Fez as referidas obras sem licença municipal, pela necessidade de um seu neto, que vive consigo, ter profundas limitações motoras pois faz-se transportar em cadeira de rodas.

5- a demolição de obras não licenciadas só deve ser ordenada como ultima e indeclinável medida sancionatória da ilegalidade cometida, por força dos princípios da necessidade, adequação e indispensabilidade ou menor ingerência possível, decorrentes do principio da proporcionalidade.

6- o exercício administrativo do poder de demolição está condicionado pelo necessário respeito do principio da proporcionalidade, constitucionalmente consagrado- art. 18º da Constituição da Republica Portuguesa 7- A possibilidade de obtenção de parecer favorável depende da verificação dos seguintes pressupostos (i) a realização de obras com finalidade exclusivamente agrícola, (ii) de habitação para fixação de regime de residência habitual dos agricultores em explorações agrícolas viáveis e desde que não existam alternativas validas de localização em solos não incluídos na RAN ou (iii) de habitação para utilização própria e exclusiva dos seus proprietários e respectivos agregados familiares, quando se encontrem em situação de extrema necessidade sem alternativa viável para a obtenção de habitação condigna.

8- As obras de remodelação levadas a cabo pelo A. eram necessárias porquanto o seu neto, que consigo reside, ter profundas limitações motoras.

9- No entanto, que o tribunal a quo não se pronunciou quanto a tais factos alegados pelo A., nem no seu despacho saneador, nem tao pouco na sua douta sentença.

10- Ora, tivesse o A. tido oportunidade de provar este facto, teria sido outro certamente o sentido da decisão do tribunal a quo, pois estavam assim reunidos os pressupostos para a obtenção de parecer favorável pela entidade regional da RAN, o que em ultima analise seria igualmente determinante para que o tribunal decidisse, ao invés do decido, pela obrigatoriedade de suspensão do procedimento administrativo até à decisão da entidade regional da RAN.

11- A omissão de pronúncia no caso em apreço constitui uma nulidade, nulidade essa que expressamente se invoca.

12- O tribunal a quo conclui, referindo: “Assim, nem à data da prática do acto de demolição, nem hoje, a obra do A. não é legalizável, pois que da conjugação dos artigos enunciados e especificamente do 34º do DL 196/89 ( e hoje do art. 38º do DL 73/2009) e do art. 68º al. a) do DL 555/99, resulta claramente a nulidade do acto administrativo de licenciamento de uma obra de construção que viole o regime jurídico da RAN.

13- No que respeita à decisão de não suspensão do procedimento administrativo até à decisão da entidade regional da RAN, alegou o A. no seu art. 20º da petição inicial:“ Ora, a decisão notificada ao A. de indeferimento liminar e de demolição das obras com tomada de posse administrativa em causa não pode subsistir porque as obras realizadas pela A. estão pendentes do pedido de legalização dessas obras não pode ser ordenada a demolição enquanto tal processo não estiver concluído, sendo que mesmo que tal processo não estivesse em curso sempre seria de todo evitada a demolição desde que as obras em causa fossem legalizáveis”, remetendo ainda o A. para o douto Acórdão do STA proferido no âmbito do processo 633/04, de 02/02/2005.

14- No invocado Acórdão pode ler-se:“ (…) a proibição de demolir obras clandestinas que possam ser legalizadas é corolário do princípio constitucional da necessidade, que obsta a que sejam impostas aos particulares restrições desnecessárias (um afloramento desse princípio encontra-se no n.º 2 do art. 18.º da C.R.P.). (…) deve entender-se que a opção camarária pela demolição não pode deixar de ser antecedida de um apreciação da viabilidade de legalização, no próprio momento em que se coloca a questão de decidir dar ou não a ordem de demolição. (Neste sentido, pode ver-se o acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 19-5-98, proferido no recurso n.º 43433, publicado em Cadernos de Justiça Administrativa, n.º 19, página 39.) 15- Ora, atendendo ao exposto, e ao facto de que o A. apresentou pedido de legalização junto da RAN, não se compreende como pode o tribunal a quo decidir pela não suspensão do procedimento administrativo até à decisão da Entidade Regional da RAN e esgotadas todas as vias de legalização do procedimento.

16- É que a pretensão do A. veio de facto a merecer parecer FAVORÁVEL pela entidade Regional da RAN, sendo desafectada a área de 300 m2, e a CMVC veio a aprovar projecto, tudo conforme documentos que se juntam ao abrigo do disposto no art. 425º do CPC, ex vi art. 651º do CPC, cuja junção se requer, porquanto a sua apresentação não foi possível em momento anterior.

17- De facto, por comunicação de 15/02/2017, foi emitido parecer FAVORAVEL, no seguimento da reformulação do processo apresentado pelo A.

18- De facto, não se vislumbra como poderia o tribunal a quo decidir pela não legalização do edificado pelo A., julgando assim válido o despacho que ordenou a demolição e a consequente posse administrativa, sem que houvesse uma decisão definitiva da entidade regional da RAN.

19- Acresce que, ao decidir pela não suspensão do procedimento administrativo até à decisão da entidade regional da RAN, o tribunal a quo ofendeu expressamente os princípios consagrados na Constituição da Republica Portuguesa.

20- Importa ainda acrescentar, fazendo novamente referência ao já mencionado e citado Acórdão do STA proferido no Proc. 633/04: “ (…) não se pode considerar absurdo que tal juízo possa ser formulado sem o impulso processual do interessado, pois não é apenas o interesse dele que releva para decidir pela legalização, nem é mesmo o interesse primacial em grande parte dos casos, sendo antes o interesse público que poderá conduzir à decisão de não demolição. (Pense-se, por exemplo, nas situações de prédios clandestinos já habitados, em que a demolição pode acarretar consequências dramáticas para os moradores, normalmente pessoas de fraquíssimos recursos económicos.

Em situações deste tipo, independentemente da apresentação de projecto, poderá entender-se, com razoabilidade evidente, que se o prédio for susceptível de legalização, com consequente satisfação do interesse público urbanístico, será de evitar os dramas sociais inerentes à demolição.) Termos em que, dando-se provimento ao presente recurso deve revogar-se a sentença recorrida e proferir-se acórdão de acordo com o exposto, COM O QUE SE FARÁ JUSTIÇA! A Entidade demandada juntou contra-alegações, concluindo: I. Salvo o devido respeito, a sentença recorrida não merece qualquer reparo, não padecendo de qualquer vício de omissão de pronúncia.

  1. O motivo alegado pelo Recorrente para justificar a realização das obras ilegais, apesar de sério e grave, não justifica a sua conduta, não transforma as obras ilegais em legais, não isenta o Recorrente de dar entrada do competente processo na CMVC com vista à sua eventual legalização, não constitui fundamento válido para considerar desproporcional a medida de tutela da legalidade urbanística adoptada pelo R., nem tem a virtualidade de permitir ao Tribunal decidir em sentido contrário àquele em que decidiu.

  2. Todos devem respeito à lei, sem excepção, não podendo o Recorrente beneficiar de tratamento jurídico distinto, porquanto legitimar a sua atitude seria injusto para todos quantos os que dão entrada em tempo na CMVC dos processos de licenciamento de obras, obtêm as licenças de construção/ utilização, pagam as taxas urbanísticas e suportam os custos com os projectos, tudo para poderem construir legalmente.

  3. O Tribunal tem apenas que apreciar e julgar a questão jurídica relativa à legalidade do acto administrativo de demolição das construções ilegais praticado pelo Recorrido, mas já não a questão pessoal relativa à motivação para a edificação das construções.

  4. O facto em si é perfeitamente instrumental, acessório, inócuo e sem qualquer relevância ou interesse para a apreciação da legalidade do acto de demolição praticado pelo Recorrido e em causa nos autos, não tendo o Tribunal que se pronunciar sobre o mesmo; VI. E, ainda que o Tribunal a quo se tivesse, porventura, pronunciado sobre as motivações do Recorrente para a realização das obras ilegais, ainda assim, tendo sido feita prova cabal quanto à ilegalidade e insusceptibilidade de legalização das mesmas, o Tribunal sempre teria que ter decidido pela legalidade do acto administrativo sindicado, ou seja, sempre teria que ter decidido no mesmo sentido em que o fez.

  5. O Recorrente não fez prova da data da edificação das construções nem da legalidade das mesmas, sendo que, quanto à remodelação das construções o Recorrente confessou no processo que são ilegais, justamente porque contendem com o regime da RAN, motivo pelo qual solicitou à ERRAN a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT