Acórdão nº 03074/10.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução10 de Setembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. A Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferia no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 15.03.2016, pela qual foi julgada parcialmente procedente a oposição deduzida por H.

e C.

contra a execução fiscal n.º 3190200401033662, contra eles revertida, na parte respeitante às coimas e ao IVA dos meses de maio de 2003 e maio de 2005.

1.2. A Recorrente terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: “A. Para julgar a presente oposição procedente “no que tange às quantias de IVA de Maio de 2003 e Maio de 2005 a que alude o ponto 05) do probatório, improcedendo quanto ao demais”, B. O Tribunal a quo considerou que os factos provados dão notícia que, “entre 2003 e 2005, o TOC da sociedade executada () foi constituído arguido e acusado em 2010 por se ter apropriado de verbas destinadas ao pagamento de impostos, designadamente IVA de Maio de 2003 e Maio de 2005 e IRC de 2004”, C.

Decidindo, assim, no que tange a estas quantias de IVA de Maio de 2003 e Maio de 2005, “que os oponentes lograram afastar a sua culpa, pois que o não pagamento se deveu a uma actuação não da sua gestão mas imputável ao TOC que foi acusado por se ter apropriado de verbas destinadas ao pagamento de tributos ali referidos”.

D.

Ora, resulta dos autos que os oponentes eram gerentes e geriam a sociedade devedora originária, facto provado – alínea 2) da factualidade assente -, o que, aliás, nunca foi contestado pelos oponentes.

E.

Contra o TOC da sociedade executada, foi por esta apresentada uma queixa crime por abuso de confiança, em 2007, que culminou com a acusação daquele por abuso de confiança fiscal em 21.04.2010.

F.

O despacho de acusação é a peça processual em que formalmente se imputam a uma pessoa os factos que integram um ou mais crimes, aquando do encerramento do Inquérito (podendo ser ainda requerida a abertura de Instrução); G.

O Inquérito é uma fase processual da competência do Ministério Público em que se pretende investigar a existência de um crime, determinar os seus agentes, a responsabilidade dos mesmos, descobrir e recolher as provas, tudo com a finalidade de submeter (ou não) o arguido ou o suspeito a julgamento.

H.

Ao Ministério Público não compete definir o Direito ao caso, porque é uma actividade própria dos Tribunais.

I.

O Ministério Público actua através de indícios que o levam a convencer-se de que uma pessoa teria cometido um crime. Não precisa de ter uma certeza; convence-se de que o arguido cometeu o crime, e, mesmo que tenha dúvidas quanto à prática desse crime, como não poderá funcionar, por analogia, o princípio in dubio pro reo, então deve acusar.

J.

O arguido tem, constitucionalmente, direito a todas as garantias de defesa. Com especial relevância para o caso sub judice, tem direito à Presunção de inocência até trânsito em julgado de decisão de condenação.

K.

Tal significa que, no processo, não podem considerar-se como provados os factos integradores da acusação, independentemente da atitude do arguido, sem que os mesmos resultem da prova fixada e consolidada em sentença condenatória transitada em julgado.

L.

Erra a sentença recorrida ao considerar que “os oponentes lograram afastar a sua culpa pois que o não pagamento se deveu a uma actuação não da sua gestão mas imputável ao TOC que foi acusado por se ter apropriado de verbas destinadas ao pagamento de tributos ali referidos”.

M. Erra o Tribunal a quo em tal julgamento, pois que forma a sua convicção com base num documento – o despacho de acusação - que não tem, sequer, a virtualidade de permitir extrair uma presunção de veracidade quanto à conduta que imputa ao arguido, presumido inocente, e, ao fazê-lo, viola o princípio da Presunção de inocência do arguido até trânsito em julgado da decisão de condenação.

N.

Não consta do probatório fixado que exista decisão de condenação do TOC, transitada em julgado, no sentido apontado pelo despacho de acusação em que se estriba o Tribunal a quo para desresponsabilizar os oponentes. Não consta sequer qualquer referência a eventual julgamento em processo penal.

O.

Em qualquer caso, “I - A lei não atribui relevância em processo de oposição fiscal ao caso julgado () formado em processo penal. II - Apenas se consubstancia num elemento de prova, que pode ser valorado de acordo com o princípio da livre apreciação da prova...” - Acórdão do Colendo Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 08-10-2014 no processo nº 01930/13.

P.

O exame crítico dos documentos juntos aos autos, conjugado com as regras da experiência comum, conduz a uma diferente decisão da matéria de facto e subsequente julgamento de Direito.

Q.

Quanto ao IVA de Maio de 2003, a dívida, no montante de € 18.347,76, deriva de declaração periódica entregue pelo contribuinte sem o respectivo meio de pagamento, que deveria ter sido entregue nos cofres do Estado até 10-07-2003, e não foi.

R.

Consta do probatório fixado que os cheques, supostamente entregues pelos oponentes ao TOC para pagamento do IVA de Maio de 2003, totalizam o valor de €23.201,01. Portanto, não há identidade de valores.

S.

Consta igualmente que tais cheques estão datados de 24-07-2003, 19-07-2004, 11-10-2004, 17-12-2004 e 12-07-2005. Portanto, dos cinco, quatro cheques têm data de mais de um ano após a data limite de pagamento voluntário (10-07-2003), e, três desses cheques, têm data posterior à emissão da certidão de dívida e instauração do processo execução fiscal. Portanto, não há identidade temporal entre a data de cumprimento voluntário da obrigação e as datas dos alegados meios de pagamento.

T.

Quanto ao IVA de Maio de 2005, a dívida, no montante de € 3.613,32, deriva de declaração periódica entregue pelo contribuinte sem o respectivo meio de pagamento, que deveria ter sido entregue nos cofres do Estado até 11-07-2005, e não foi.

U.

Consta do probatório fixado que o cheque, supostamente entregue pelos oponentes ao TOC para pagamento do IVA...

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