Acórdão nº 01966/15.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Setembro de 2020

Data18 Setembro 2020
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo do Norte: I-RELATÓRIO 1.1.

L., S.A.

, propôs a presente ação administrativa contra A. – AUTO-ESTRADAS DO GRANDE PORTO, S.A.

, na qual figura como Interveniente a A. Sucursal em Portugal na qual formulou o pedido de condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 5.411,52, acrescida de juros de mora vincendos desde a data da citação até efetivo e integral pagamento, correspondente ao montante que pagou à sua segurada, “G., Lda” quantia alegadamente devida a título de ressarcimento dos danos sofridos em acidente ocorrido com o veículo segurado quando este circulava na autoestrada A41, a 600metros do início da mesma, em Perafita, Matosinhos e colidiu com uma peça metálica na faixa de rodagem que se veio a verificar tratar-se de peça de fixação dos contentores nos semi-reboques, não sinalizada.

Alegou, para tanto, em síntese, que a responsabilidade pelo sinistro é imputável à Ré, enquanto concessionária da autoestrada, por violação do dever de manutenção e fiscalização da segurança da via, que sobre esta impende nos termos do contrato de concessão celebrado com o Estado e por força do regime de responsabilidade consagrado no Decreto-Lei n.º 24/2007, de 18.7, designadamente o seu artigo 12.º.

1.2.

Citada a Ré contestou, alegando, em síntese, não terem sido descuradas ou negligenciadas, ainda que minimamente, as obrigações que impendem sobre si, enquanto concessionária da via, sustentando que aquilo que lhe é exigido são patrulhamentos permanentes e regulares, manutenção e conservação das estruturas da via, bem como, no caso de serem detetados objetos nas vias, removê-los o mais rapidamente possível, o que cumpre na íntegra e que cumpriu no dia do sinistro.

Invocou ainda que nesse dia, os seus funcionários efetuaram diversos patrulhamentos a toda a extensão da concessão, os quais se processam em regime de turnos durante 24h, e que passaram por diversas vezes no local apontado como tendo sido o da ocorrência do sinistro, não tendo aí detetado qualquer objeto.

Conclui que procedeu com toda a diligência e cuidado que lhe seria exigível, não lhe podendo, por isso, ser assacada qualquer responsabilidade na produção do acidente, pois não é viável que os patrulhamentos da via sejam efetuados a cada instante em toda a via nem que sejam seguidos permanentemente todos os veículos que eventualmente deixem cair ou abandonem objetos na via para os remover e/ou sinalizar.

Termina, requerendo a intervenção principal provocada da “A. – Sucursal em Portugal, S.A.” para quem transferiu a responsabilidade civil decorrente de sinistros desta natureza, e pugnou pela total improcedência da acção, com a consequente absolvição do pedido.

1.3. Admitida a intervenção da “A. – Sucursal em Portugal, S.A.”, foi a mesma citada para, querendo, contestar a ação, o que fez, pugnando pela improcedência da ação.

1.4. Realizou-se audiência de discussão e julgamento.

1.5.

Em 30 de julho de 2019, proferiu-se sentença em que se julgou a presente ação totalmente procedente e se condenou a Ré pedido formulado, a qual consta da seguinte parte dispositiva: «Nos termos e com os fundamentos expostos, julga-se a presente ação procedente, condenando-se a Ré no pagamento à Autora da quantia de € 5411,52, acrescida de juros moratórios desde a citação até efetivo e integral pagamento.

Custas a cargo da Ré.» 1.6.

Inconformado com o assim decidido, a Ré interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: «I.

Não é possível perceber por que razão o tribunal a quo nada disse (e nada decidiu em termos de matéria de facto) acerca da velocidade a que circulava o veículo seguro na A. no momento da colisão narrada no petitório, sabendo-se, ainda para mais, que a velocidade é seguramente um dos elementos mais importantes para se analisar a eclosão de um acidente de viação que, como sabido, tem uma causa de pedir complexa; II.

Ora, não terá sido certamente por falta de “matéria-prima” (leia-se: prova) para tal, dado que o motorista do veículo, na primeira pessoa, por assim dizer, e, aliás, em mais que uma “intervenção probatória”, fez até “saber” aos autos de uma forma espontânea (antes que alguém lhe perguntasse) que o veículo rodava “no máximo a 60km/h” nessa altura ou então “entre 50 (kms/h) e 70 (kms/h)”, o que vem dar praticamente no mesmo, tal como resulta do seu depoimento transcrito na primeira parte deste recurso; III.

Por outro lado, também não se logra perceber o motivo pelo qual não atendeu (e mais uma vez disse nada) a sentença ao documento (participação de acidente de viação junto pela A.) da qual consta que a velocidade máxima instantânea permitida no local era, nessa data do sinistro, de 50 kms/h; IV.

De modo que, mais não fosse porque a A., conclusivamente, é certo, alega que a circulação do veículo se processava “em cumprimento de todas as regras estradais”, é nítido o erro da sentença, motivo pelo qual a resposta àquele ponto nº 9 deve ser alterada e passar a ter a seguinte redacção: - O veículo IO circulava no sentido Aeroporto/Matosinhos, na via da direita, a uma velocidade entre 50 Kms/h e 70 kms/h, quando ao descrever a curva para a esquerda, o condutor do veículo se apercebeu da existência de um objecto na via onde seguia, a cerca de 10 metros de distância (resposta que defendemos para o ponto 9 dos factos provados); V.

Do mesmo modo, e com base nomeadamente no disposto no artigo 413º do Cód. Proc. Civil (que, aliás, foi violado pela sentença), e de harmonia com a participação de acidente junta aos autos pela A., era mister, tanto pela perspectiva da defesa da R., como por aqueloutra (e fundamental) da boa decisão da causa, que o tribunal a quo se tivesse pronunciado (e não o fez) sobre a velocidade máxima instantânea permitida no local, o que até pode gerar nulidade por omissão de pronúncia; VI.

Ora, considerando aquela prova, essa pronúncia só podia ser no seguinte sentido: - A velocidade máxima instantânea permitida no local do sinistro era, à data da eclosão deste, de 50 Kms/h (facto este que, face ao princípio da aquisição processual das provas – cfr. participação de acidente – deverá ser acrescentado ao rol dos factos provados); VII.

De resto, esta matéria de facto (tanto a respeitante à velocidade de circulação do veículo, como aqueloutra relativa à velocidade máxima permitida no local do sinistro), face ao que resulta da instrução da causa, devia constar do rol de factos provados, atendendo ao que prescreve o disposto no artigo 5º nº 2, alíneas a) e b) do C. P. C., aplicável a estes autos.

Por outro lado, VIII.

Também não andou bem a sentença, e pelos mesmos motivos (violação do disposto no artigo 5º nº 2 alíneas a) e b) do C. P. C.), mas igualmente porque a condenação da R. assentou numa presunção de culpa que se diz presente no artigo 12º da Lei nº 24/2007, de 18 de Julho, quando, uma vez mais, nada disse (e mormente no que tange à matéria de facto) sobre a circunstância (factual) de ter havido ou não verificação das causas do acidente no local de deflagração deste; IX.

Ora, tomando em linha de conta as parcialmente contraditórias versões apresentadas pelo agente policial participante e pelo motorista do veículo (apenas quanto à questão de saber se o objecto alegadamente causador do sinistro ainda se encontrava no local aquando da chegada ali da autoridade policial, já que em relação à presença do veículo naquele local essas versões são coincidentes), entende a R. que a versão mais consistente é a do motorista do veículo e, por isso, devia ter sido (e deve ainda) ser acrescentada ao acervo de matéria de facto provada a seguinte factualidade: - provado que a autoridade policial chegou ao local de eclosão do sinistro pelo menos cerca de duas horas depois do acidente ter deflagrado; - provado que quando a autoridade policial chegou ao referido local já ali não se encontrava o veículo interveniente no sinistro nem o objecto a que se alude em 12) dos factos provados pela circunstância de esse veículo ter antes sido retirado daquele local de reboque com o dito objecto no seu interior.

Segue-se que X.

É indiscutível que sempre que o lesado (motorista do veículo seguro na A.) contribui culposamente para a produção ou agravamento dos danos o tribunal, com base na gravidade das culpas de ambas as partes, nomeadamente, deve decidir se a indemnização deve ser concedida na totalidade, reduzida ou até excluída (cfr. Cód. Civil, artigo 570 nº 1); XI.

Porém, já assim não sucede quando a responsabilidade se basear (como é o caso – e a sentença do Tribunal a quo di-lo de forma absolutamente indiscutível) numa presunção de culpa/incumprimento, pois então a culpa do lesado exclui muito claramente o dever de indemnizar (vide Cód. Civil, artigo 570º nº 2 e igualmente o disposto no artigo 4º do RRCEEP); XII.

Ora, neste caso, e lembrando o sempre actual Antunes Varela - (in Das Obrigações em Geral, Vol. II, 4ª edição, Almedina, Coimbra, 1990, pág. 92: “Agir com culpa significa actuar, por forma a que, a conduta do agente, seja pessoalmente censurável ou responsável e o juízo de censura ou de reprovação dessa conduta só se pode apoiar no reconhecimento, perante as circunstâncias concretas do caso, de que o obrigado não só devia, como podia ter agido de outro modo.” (itálico nosso) -, é absolutamente indiscutível que existe culpa daquele motorista na produção do sinistro dos autos, seja porque rodava em excesso de velocidade, seja porque transitava com velocidade excessiva para a condições meteorológicas inequivocamente vigentes; XIII.

De sorte que, verificando-se, por um lado, a culpa efectiva do condutor do veículo seguro na A. na produção do sinistro (com base na regra geral presente no artigo 487º do mesmo Cód. Civil) como acontece neste caso, e, por outro, ocorrendo a responsabilização da R. apoiada numa presunção de culpa (o que a douta sentença defende inequivocamente), dúvidas não restam que a única solução possível é exactamente a exclusão de...

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