Acórdão nº 00531/20.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Setembro de 2020

Data18 Setembro 2020
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* *I – RELATÓRIO N., S.A.

, devidamente identificada nos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da (i) SENTENÇA e do (ii) DESPACHO INTERCALAR do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 18.05.2020, ambos promanados no âmbito da presente Providência Cautelar de Intimação de Abstenção de Comportamento por si intentada contra o MUNICÍPIO DE (...) e o BANCO S., S.

A, igualmente identificados nos autos, que, respetivamente, (i) indeferiu “(…) os pedidos de adoção de providência cautelar de intimação de abstenção do acionamento e pagamento das garantias bancárias n.º 962300488020834 e n.º 962300488023876, prestadas no âmbito do contrato de empreitada de obras públicas designado “Antiga Garagem L. - Obra - Ref.ª CP006/16” (…)” e (ii) “(…) julgou “desnecessária a realização de qualquer diligência probatória adicional” indeferindo assim a produção de prova adicional (…)”.

Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) 1. No dia 19-03-2020, a Recorrente foi notificada da apresentação da oposição por parte do Município Recorrido. (cf. notificação com a refª. 007377747).

2. Na referida oposição, o Município Recorrido invocou exceções, entre elas a exceção de caducidade do direito de a Recorrente intentar ação tendente à anulação do ato de aplicação de sanção contratual aplicado pelo Município Recorrido e que se projetaria na apreciação da verificação dos pressupostos para o decretamento das providências requeridas pela Recorrente.

3. Não estando prevista na Lei a apresentação de articulado posterior à oposição, a Recorrente aguardou que o tribunal a quo lhe concedesse a oportunidade de se pronunciar, sendo notificada e através de articulado para o efeito, sobre as exceções invocadas pelo Município Recorrido na oposição ou, não lhe sendo concedida essa possibilidade, que o pudesse fazer em sede de audiência de julgamento.

4. Contudo, o tribunal a quo decidiu a causa sem a realização da audiência final e sem notificar a Recorrente para exercer o contraditório quanto às exceções invocadas pelo Município Recorrido na oposição.

5. Ora, tal facto constitui como uma violação do princípio do contraditório que tem influência na boa decisão da causa.

6. Assim, a falta de concessão à Recorrente de oportunidade de exercer contraditório sobre as exceções invocadas pelo Município Recorrido na oposição constitui a omissão de uma formalidade que a lei prescreve e que pode influir na decisão da causa, sendo cominada com o vício de nulidade processual, o que aqui expressamente se argui para os devidos efeitos legais.

7. Pelo que, o Tribunal recorrido violou o disposto no artigo 3.°, n.° 3 e 195.°, n.° 1, ambos do CCP.

8. No dia 13-05-2020, o Município Recorrido deu entrada de um requerimento, com a refª. 007396537, no qual, alegando impossibilidade de o fazer através de via eletrónica pelo tamanho do processo administrativo, requereu a sua junção aos autos através da sua disponibilização em plataforma One Drive por si controlada e externa ao tribunal, fornecendo, para o efeito, uma password.

9. Em nome, mais uma vez, do princípio do contraditório, a Recorrente tinha o direito de se pronunciar sobre os documentos constantes do processo instrutor constantes da plataforma One Drive, podendo, até, nos termos do disposto nos artigos 444.° e 446.° do CPC, impugnar a sua genuinidade e/ou força probatória, no prazo de 10 dias, de acordo com o disposto nos artigos 149.°, n.° 1, e 444.°, n.° 1, ambos do CPC.

10. A Recorrente considerou-se notificada do Requerimento apresentado pelo Município Recorrido com a refª. 007396537 no dia 18-05-2020 (art. 255.° do CPC).

11. Pelo que o último dia de prazo para que a Recorrente se pudesse pronunciar sobre os documentos do processo administrativo era o dia 28-05-2020.

11. Contudo, o tribunal a quo proferiu sentença no dia 18-05-2020, antes de decorrido o prazo de que a Recorrente dispunha para se pronunciar sobre os documentos, tendo afirmado na sentença (pg. 27) que “A convicção do Tribunal quanto a todos os factos vertidos formou-se se com base na posição expressa pelas partes nos respetivos articulados e na análise do teor dos documentos pontualmente invocados, seja os juntos com os articulados, seja os constantes do processo administrativo armazenado em plataforma One Drive, ao qual o Requerido concedeu acesso através do fornecimento de password (cfr. fls. 1068-1070 dos autos), que não foram impugnados e, por isso, se mostram mais que suficientes para a análise perfunctória que se exige nestes autos.” 12. Concluindo, o direito da Recorrente ao contraditório em relação aos documentos do processo instrutor não foi observado, o que pode influir na decisão da causa e, assim determina a existência de uma nulidade processual, nos termos do disposto no artigo 195.°, n.° 1, do CPC.

13. Pelo que, o Tribunal recorrido violou o disposto no artigo 3.°, n.° 3, 195.°, n.° 1, 415.°, n.° 1, 444.°, n.° 1 e 446.°, n.° 1, todos do CCP.

14. Do supra transcrito excerto da decisão proferida pelo tribunal a quo resulta que este admitiu a apresentação do procedimento administrativo através de plataforma One Drive.

15. o processo instrutor deve ser junto aos autos através de via eletrónica pela plataforma SITAF.

16. De acordo com o disposto no artigo 24.°, n.° 5 e n.° 6, do CPTA, no caso de ser impossível, pela ocorrência de justo impedimento, a prática de atos pela via eletrónica através da plataforma Sitaf, a mesma deverá ser efetuada por uma das seguintes formas: “a) Entrega na secretaria judicial, valendo como data da prática do ato a da respetiva entrega; b) Remessa por correio, sob registo, valendo como data da prática do ato a da respetiva expedição; c) Envio através de telecópia, valendo como data da prática do ato a da expedição; d) Entrega por via eletrónica, nos termos a definir por portaria do membro do Governo responsável pela área da Justiça.” 17. O Município Recorrido não procedeu sequer à junção aos autos do processo administrativo, uma vez que este se localiza numa plataforma One Drive externa e totalmente alheia ao controlo do tribunal. Mas mesmo que assim não se entendesse, o que apenas se pondera sem conceder 18. O Município Recorrido, alegando justo impedimento em virtude do alegado tamanho do processo administrativo, sempre teria de proceder ao seu envio através das formas previstas no n.° 5 do artigo 24.°, do CPTA, o que não aconteceu.

19. Pelo que, o tribunal a quo não deveria ter admitido a apresentação do processo administrativo instrutor através de plataforma One Drive, por não existir previsão legal para o efeito, tendo violado o disposto nos artigos 24.°, n.° 2, n.° 5 e n.° 6, do CPTA e 5.°, n.° 1, al. c), da Portaria n.° 380/2017, de 19 de dezembro, o que consubstancia uma nulidade, pela prática de um ato que a lei não admite e que tem influência na decisão da causa.

20. O grau de probabilidade de procedência da pretensão formulada no processo principal foi analisado essencialmente em função do ato administrativo aí sindicado de aplicação de sanção contratual (multa de 18/04- doc. 10 junto com o Requerimento Inicial); 21. Mas, na ação principal já apresentada, pede-se mais do que isso, havendo vários créditos em discussão, pelo que a análise, para a procedência da providência, deve ser feita em função da procedência global de todos os pedidos da ação principal, até porque se discutem, essencialmente, créditos pecuniários que, no final, constituirão saldo positivo a favor da Recorrente; 22. Afirma o tribunal a quo que “Aqui, não é o Requerido Banco que opõe ao Requerido uma atuação abusiva, mas sim, a própria Requerente, circunstância que, desde logo, obriga a uma interpretação, ainda, mais restritiva daqueles entendimentos doutrinais e jurisprudenciais”; 23. Contudo nada aponta nesse sentido, porquanto, para este efeito, desde logo, não há diferença entre o banco garante e a outra parte no contrato base; 24. A má fé ou abuso do direito do beneficiário da garantia bancária deve ser aferida, face ao Requerente, em função dos atos praticados e dos pressupostos subjacentes ao pedido de pagamento no âmbito do contrato base de empreitada e não em função “de manifesto erro de vontade na formação do contrato da garantia bancária, devido ou não a fraude”; 25. O contrato de garantia bancária é uma relação beneficiário - banco; o que se discute nos autos é a relação base, de empreitada, entre dono da obra e empreiteiro, com uma cláusula acessória de garantia que o dono da obra está a usar contra o empreiteiro. O recurso a terceiro (banco garante) não altera o ângulo de análise: empreiteiro - dono da obra.

26. No âmbito da empreitada, a Recorrente sempre se insurgiu contra a efetiva aplicação de qualquer multa ou dívida ao Município Recorrido ou compensação de créditos, bem como às comunicações enviadas por este. As respostas da Recorrente estão juntas aos autos e as condutas e comunicações do Município Recorrido não correspondem ao que foi acordado entre as partes. É exatamente a relevância desta questão que a Recorrente alega no Requerimento Inicial, bem como a consequente má-fé do Município Recorrido ao acionar as garantias bancárias e atuar contra o que acordava com aquela; 27. Assim, a “existência de fraude manifesta ou abuso evidente do beneficiário” não deve ser avaliada em função apenas da impugnabilidade da multa ou do contrato de garantia, mas sim em função de todos os pedidos formulados na ação principal e da conduta do Município Recorrido no contrato de empreitada, no âmbito do qual, essencialmente, acordou com a Recorrente não acionar as garantias bancárias nem aplicar efetivamente multas ou compensar créditos (como alegado no artigo 57.° do Requerimento Inicial), mas fez o contrário; 28. Pelo que, deveria o tribunal a quo, quanto muito, proferir sentença a deferir as providências requeridas pela Recorrente, por estarem...

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