Acórdão nº 01139/13.8BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Setembro de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução18 de Setembro de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO G.

(devidamente identificado nos autos) autor na ação administrativa especial que instaurou em 24/06/2013 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga contra o INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP (igualmente devidamente identificado nos autos) inconformado com o despacho-saneador datado de 12/04/2019 (fls. 219 SITAF) pelo qual a Mmª Juíza do Tribunal a quo, julgando procedentes as exceções de caducidade do direito de ação referente ao ato administrativo datado de 14/12/2011 e de inimpugnabilidade do ato administrativo datado de 13/03/2013, absolveu o réu da instância, dele interpôs o presente recurso de apelação (fls. 236 SITAF), pugnando pela não verificação da exceção de inimpugnabilidade do ato administrativo datado de 13/03/2013 e pela consequente revogação da decisão recorrida, com prosseguimento dos autos, formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos: 1 – A decisão recorrida incorreu em erro, tendo violado o disposto nos artigos51º, 52º e 54ºdo C.P.T.A. e no artigo 268º n.º 4 e 5 da C.R.P., ao julgar procedente a exceção da inimpugnabilidade do ato administrativo de 13-03-2013, devendo por isso ser revogada.

2- O Tribunal “a quo” baseou-se em pressupostos de direito errados e insuficientes, para chegar à decisão recorrida e incorreu em erro de julgamento, o que é gerador da nulidade da sentença proferida.

3 - O acto administrativo (como a própria sentença assim o apelida) que ordenou a restituição de valores alegadamente pagos de forma indevida ao recorrente a título de subsídio de desemprego, possui características de lesividade autónoma e imediata, desencadeando directamente na esfera jurídica do recorrente, as consequências que concretamente constam daquele próprio ato.

4 – O despacho em causa é impugnável, dado que, lesando fortemente o património do recorrente, tornou-se igualmente definitivo e executório, através da concretização da dedução mensal da quantia de € 56,66 à sua já parca pensão de reforma no valor mensal de € 339,96, apenas podendo ser impugnado judicialmente, como forma do recorrente contra ele reagir.

5 - O Tribunal recorrido não valorou, nem tão pouco se pronunciou – ainda que minimamente - quanto à existência do referido critério da lesão dos direitos do recorrente, sendo tal sentença igualmente nula por falta de fundamentação e omissão de pronuncia (art.º 615º n.º 1 al. “b” e “d” do CPCP) 6 – O ato em causa datado de 13-03-2013, não se pode qualificar como mero ato de execução de uma decisão final anterior, que em nada inova, tanto que, não consta da referida nota a que ato/despacho a mesma se reporta, precisamente porque essa decisão final não existiu, nem foi notificada ao autor no seguimento do recurso hierárquico por si interposto.

(cfr. facto provado n.º 10) 7 - Após a dedução do recurso hierárquico pelo recorrente (cfr. fato provado n.º 10) nenhuma outra notificação foi por este recebida, à exceção da decisão de restituição das prestações “indevidamente” pagas, inserta na Nota de Reposição de 13-03-2013, a qual, pelo seu conteúdo, deve consubstanciar a decisão final da ré e o indeferimento expresso daquele recurso hierárquico, pois somente com a notificação de tal ato, é que o recorrente tomou conhecimento da decisão daquela entidade, quanto à obrigatoriedade de restituir as prestações “indevidamente” recebidas.

8 - Trata-se de um verdadeiro ato, com conteúdo decisório! 9 - Mal andou assim o Tribunal “a quo” ao não interpretar o art.º 51º do CPTA no sentido em que, com a dedução do recurso hierárquico pelo recorrente, o acto lesivo dos seus direitos deixou de ser o despacho de 14/12/2011 (notificado pelo ofício n.º 345755 de 19/12/2011) para passar a ser a nota de reposição n.º 8107879 de 22/03/2013.

10 - Resultou ainda de tal ato, a “novidade” relativa à fixação das consequências do não cumprimento de tal decisão, concedendo-se prazo para pagamento, o que se traduz numa ameaça de execução forçada, consubstanciada na “dedução mensal nas prestações a que tenha direito ou à respetiva cobrança coerciva em processo de execução fiscal”, sendo que, “A dedução só será feita na parte que exceda o valor mensal da pensão social…”.

11 - Mal andou a sentença proferida, cuja decisão consubstancia uma destruição retroativa de atos autónomos e posteriores face ao ato declarativo, o que acarreta uma retroatividade extrema, com violação da segurança e confiança jurídicas de que beneficia o Recorrente.

12 – O próprio ato em causa, é claro no sentido de conceder ao recorrente a possibilidade de o impugnar contenciosamente num prazo de 3 meses, sob pena de, na falta de qualquer resposta àquela decisão, a mesma, tornar-se definitiva passando a produzir os seus efeitos jurídicos no primeiro dia útil ao termo dos prazos concedidos.

13 - Tendo o recorrente, precisamente em cumprimento do ali plasmado, impugnado judicialmente o despacho de 13-03-2013 (cfr. art.º 1 e 2 da p. i.) de forma tempestiva (talqualmente verificado pelo Tribunal “a quo”) não podia por sua vez aquele Tribunal considerar que a decisão em causa “ nada inova em relação àquele ato de 14.12.2011, limitando-se a dar execução à estatuição definida no ato exequendo”, pois se foi a própria recorrida, que em tal ato, concedeu ao recorrente, o direito de impugnar contenciosamente a decisão ali contida, quanto à restituição das prestações de desemprego, não pode este ser agora penalizado, no sentido de que afinal tal ato era inimpugnável, decisão que se considera ser inconstitucional, por violadora dos princípios da segurança e confiança jurídica consagrados no art.º 2 da CRP.

14 - De igual forma, mal andou a sentença recorrida, na medida em que, ainda que se tenha o ato impugnado, como ato executório, os n.ºs 2 e 3 do art.º 52º do C.P.T.A, têm de ser lidos em conjugação com o art.º53.º e o n.º 2 do art.º 54º do mesmo diploma, introduzindo estes, desvios ou exceções à regra tradicional de que não são suscetíveis de impugnação os atos que se limitem a confirmar definições jurídicas introduzidas por anteriores atos administrativos, pelo que, são estes, como “in casu” sindicáveis jurisdicionalmente.

O recorrido INSTITUTO DE SEGURANÇA SOCIAL, IP. contra-alegou (fls. 259 SITAF) pugnando pela improcedência do recurso com manutenção da decisão recorrida, formulando o seguinte quadro conclusivo: A - O Recorrente não se conforma com a decisão judicial na parte respeitante à inimpugnabilidade do acto administrativo de 13/03/2013, porém, repare-se que, na sequência de despacho o mesmo veio aos autos esclarecer qual ou quais o(s) acto(s) que pretendia impugnar, informando que pretendeu impugnar o despacho de 14 de Dezembro de 2011, da Directora do NGR, que determinou a anulação da classificação deste, como trabalhador por conta de outrem, no período de 02/01/2009 a 02/05/2010, e que lhe foi notificado em 22 de Dezembro de 2011, bem como, pretendeu impugnar a nota de reposição n.º 8107679, que diz ter recebido a 22 de Março de 2013, na consequência desse mesmo despacho.

Não lhe assistindo razão, vejamos: B - No que diz respeito à impugnabilidade dos actos, não obstante a redacção do artigo 51º do CPTA ter sofrido alterações desde a versão em vigor à data dos factos, ao lermos o nº1 daquele artigo, naquela redacção, apercebemo-nos que o “pressuposto base” para que o acto administrativo possa ser impugnado, é os seus efeitos ou conteúdo terem eficácia externa (jurídica), caindo o pressuposto “antigo” de que o acto tinha que ser definitivo.

C - Trata-se de um tema onde se devem coordenar questões teóricas com questões práticas, traduzindo-se estas últimas na necessidade de protecção judicial. O determinar quais os actos administrativos impugnáveis ter-se-á que fazer sempre, sem prejuízo injustificado do demandante, em concordância com o princípio pro actione presente no art.º 7º do CPTA havendo ainda necessidade de uma interpretação aberta do artigo 51º n.º 1, para que não seja excluída qualquer situação que deva ter tutela efectiva.

D - O artigo 51º do CPTA, com a epígrafe “Princípio Geral”, identifica os actos administrativos que, possuindo algumas características são impugnáveis judicialmente, até mesmo certos actos, considerados administrativos por um critério material, uma vez que podem ser emanados de entidades privadas (artigo 51º, nº 2).

E – O referido nº1 do artigo 51º, começava por mostrar, de uma forma mais ou menos clara, a existência da ideia de que a decisão final de qualquer procedimento que objectiva a prática de actos administrativos ou que decida sobre determinada situação com base na lei, definindo de uma forma autoritária a posição jurídico-administrativa da Administração, é uma decisão final impugnável.

F - Decisivo, significará que para que o acto possa ser impugnável, os efeitos que o acto introduzirá na ordem jurídica serão susceptíveis de se projectarem na esfera jurídica de qualquer entidade (seja pública ou privada), numa realidade em que haja um efeito útil, com o desaparecimento do acto da ordem jurídica (resultado da pretensão com a impugnação).

G - Sendo impugnável o acto, que mesmo inserido num determinado procedimento administrativo tem repercussão na esfera jurídica de determinado sujeito, tem que ter, como constava expressamente do artigo 51º, nº1, eficácia externa.

H - Inseridos num procedimento, a impugnabilidade não será considerada a partir da designada definitividade horizontal ou procedimental, mas sim, da eficácia externa do acto. Quer isto dizer que não é relevante a que fase do procedimento à qual pertence o acto para que este seja impugnável, relevante será, a natureza dos seus efeitos. Assim, se for considerado como mero acto interno, por norma não será impugnável (salvo nas situações de diferendos inter ou intraorgânicos), por sua vez se os efeitos forem externos, será naturalmente impugnável.

I - A eficácia externa, em relação ao procedimento, significará que o...

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