Acórdão nº 00422/10.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Março de 2011

Magistrado ResponsávelAna Paula Soares Leite Martins Portela
Data da Resolução18 de Março de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

O MINISTÉRIO PÚBLICO [MP] vem interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo TAF de Viseu em 31/12/2010, que julgou improcedente a Acção Administrativa para Perda de Mandato por si interposta contra J…, J… e l….

Igualmente inconformados com a decisão relativa ao segmento da sentença que julgou improcedentes as excepções suscitadas pelos RR., vieram os mesmos dela interpor recurso subordinado.

Para tanto, o MP alega em conclusão: “1.° A Câmara Municipal de Moimenta da Beira nos finais de 2008 e inicio de 2009 encontrava-se numa situação de desequilíbrio financeiro pelo que na reunião da Câmara Municipal de 14 de Janeiro de 2009 foi deliberado propor-se à Assembleia Municipal a proposta de adesão ao Programa de Regularização Extraordinária de Dividas do Estado e a proposta de contratação de um empréstimo que se cifrou em 4.778.861,01€.

  1. Não se concorda com a douta sentença recorrida quando refere que o desequilíbrio financeiro conjuntural em que se encontrava obrigava o município a contrair empréstimos para saneamento financeiro.

  2. Com efeito ninguém e muito menos a câmara municipal de Moimenta da Beira é obrigada a contrair o empréstimo previsto no artigo 3.° e 8.° do D.Lei n.°38/2008 de 7 de Março.

  3. Tal empréstimo é uma faculdade que a Câmara Municipal tem, dado que a Lei n.°27/96 é uma Lei especial e, o empréstimo não pode servir como justificação do facto.

  4. Senão, qualquer Câmara Municipal justificaria a ultrapassagem dos limites legais de endividamento previstos nos artigos 37º e 39.° ambos da Lei n.°2/2007 de 15/1 com a contratação de empréstimos.

  5. Os artigos 3.° e 8.° do D.Lei n.°38/2008 apenas regulam e tão só as condições de acesso aos empréstimos para saneamento financeiro, e, desde que não seja ultrapassado o limite legal de endividamento liquido previsto nos artigos 37.° conjugado com o n.°1 do artigo 40.° ambos da Lei n.°2/2007, conforme é referido na parte final do n.°1 do artigo 3.° do D.Lei n.°38/2008 de 7 de Março.

  6. Ou seja, o empréstimo - PREDE - não é causa justificativa para efeitos de não aplicação da sanção tutelar de perda de mandato.

  7. A regularização do empréstimo se existiu, é apenas fundamento para não se aplicar sanção de responsabilidade financeira sancionatória e não o afastamento da sanção de perda de mandato, que existe, face aos pressupostos legais do artigo 9.° alínea g) da Lei n.°27/96.

  8. Ou seja, os artigos 3.° e 8.º do D.Lei n.°38/2008 diploma este que disciplina o regime de saneamento financeiro das autarquias, apenas regulam e tão só as condições premissórias de acesso aos empréstimos para saneamento financeiro das autarquias, contudo, tais empréstimos no momento da sua contratação não podem exceder os limites legais do endividamento liquido conforme é definido categoricamente na parte final do n.°1 do artigo 3º, conjugado com o n.°1 do artigo 40.°, ambos da Lei n.°2/2007 de 15/1.

  9. O empréstimo - PREDE - não é causa justificativa para efeitos de não aplicação de sanção tutelar de perda de mandato prevista na alínea g) do artigo 9.° da Lei n.°27/96 de 1/8.

  10. A possível regularização do empréstimo à posteriori é apenas fundamento e tão só para não se aplicar sanção de responsabilidade financeira sancionatória aos autarcas em questão, nos termos do artigo 65.° n.°1 alínea f) da Lei n.°98/97 e não, para se excluir a culpa no âmbito dos pressupostos legais da Lei n.°27/96 de 1/8 (Lei da Tutela).

  11. O afastamento dos eleitos locais que votaram favoravelmente o empréstimo admitido pela sentença não corresponde à verdade, dado que os edis ora Réus J…, J… e L… detêm mandatos na Câmara Municipal e Assembleia Municipal de Moimenta da Beira no actual mandato de 2009 /2013.

  12. A douta sentença violou assim o disposto nos artigos 3º e 8º do D.Lei n.°38/2008, de 7 de Março, 37º, 39º e 40° da Lei n.°2/2007 de 15/1 e artigo 9º alínea g) da Lei n°27/96 de 1 de Agosto.

  13. Termos em que deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida decretando-se a perda de mandato dos Réus J…, J… e L….”*Os recorridos, em sede de recurso subordinado, apresentaram alegações, concluindo da seguinte forma: “1ª Salvo o devido respeito, o recurso independente interposto pelo Ministério Público não tem qualquer fundamento, não enfermando o aresto em recurso dos erros de julgamento que lhe vêm assacados pelo mesmo.

    Na verdade, 2ª O Tribunal a quo julgou improcedente a acção de perda de mandato por entender que o empréstimo que determinou a ultrapassagem do limite do endividamento líquido era determinado por lei e pela situação de desequilíbrio financeiro em que se encontrava o Município, pelo que, destinando-se aquele empréstimo a fazer face a tal desequilíbrio, a pagar atempadamente as dívidas do Município e tendo sido aprovado pela Direcção-Geral do Tesouro e visado pelo Tribunal de Contas, ocorriam motivos justificativos da ultrapassagem daquele limite, não podendo como tal ocorrer a perda de mandato por força do estatuído na segunda parte da alínea g) do artº 9º da Lei nº 27/96, tanto mais que o excesso de endividamento estava a ser objecto de regularização superveniente.

    1. O Ministério Público discorda do decidido por entender que a contracção do empréstimo não era obrigatória e que a finalidade a que se destinava – evitar a ruptura financeira da Autarquia e assegurar o pagamento atempado de dívidas a fornecedores – não era motivo justificativo para a ultrapassagem dos limites do endividamento, assim como o facto de tal endividamento estar a ser regularizado não impedia a perda de mandato.

    Contudo, 4ª O primeiro pressuposto em que assenta o recurso do Ministério Público – a contracção do empréstimo não era obrigatória – é manifestamente errado, uma vez que, não estando provado que na data em que a proposta de contracção do empréstimo foi aprovada (14 de Janeiro) o limite do endividamento estava ultrapassado (e o Ministério Público não questiona o facto alegado no artº 37º da contestação), é por demais manifesto que a contracção do referido empréstimo era obrigatória face ao disposto no artº 3º do DL nº 38/2008 e na Resolução nº 191-A/2008 do Conselho de Ministros.

    Acresce que, 5ª O segundo pressuposto em que assenta o recurso do Ministério Público – inexistência de causa justificativa da ultrapassagem do limite do endividamento líquido – é manifestamente absurdo, pois prevendo a própria lei que a ultrapassagem daquele limite é inócua e irrelevante em termos de perda de mandato sempre que ocorra uma causa justificativa (v. artºs 9º/g) e 10º da Lei nº 27/96), seguramente se terá de considerar como causa legítima da ultrapassagem de tal limite a contracção de um empréstimo destinado a pagar, como impunha o Governo e os naturais direitos dos credores, dívidas atempadamente e a diminuir os custos suportados pelo erário público, sobretudo quando a alternativa era não contrair o empréstimo, não pagar as dívidas, deixar aumentar os encargos e comprometer o funcionamento do serviço público por ausência de recursos financeiros.

    Por fim, 6ª O terceiro pressuposto em que assenta o recurso do Ministério Público – a regularização superveniente do excesso de endividamento só releva para efeitos de isenção de responsabilidade financeira – é verdadeiramente caricato e totalmente desprovido de fundamento, pois se é a própria lei que disciplina a perda de mandato a determinar a que a regularização superveniente do excesso de endividamento constitui causa impeditiva da perda de mandato, seguramente só por uma espécie de milagre se poderá sustentar que aquela regularização só releva em sede de responsabilidade...

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