Acórdão nº 00344/08.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Fevereiro de 2011

Magistrado ResponsávelLino José Baptista Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2011
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – O Município do Porto interpõe recurso jurisdicional do acórdão proferido em 04/02/2010 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou procedente a acção administrativa especial interposta pelo Sindicato… (S…), em representação do seu associado F…, melhor identificado nos autos, anulando a pena disciplinar de suspensão e condenando o Município a pagar ao representado os vencimentos de 121 dias de suspensão, acrescidos de juros de mora, à taxa legal, contados sobre cada vencimento não pago e até integral pagamento, a computar a antiguidade, para todos os efeitos legais referente aos 120 dias de suspensão e a conceder férias e respectivo subsídio vencidas em 1/1/2008.

Nas alegações, concluiu o seguinte:

  1. Recorre-se do Acórdão que anulou o acto praticado pelo Vereador dos Recursos Humanos em 07/11/2007, que aplicou ao Autor a pena disciplinar de 121 dias de suspensão; b) Na óptica do Tribunal a quo, os factos provados, embora legitimem a punição numa pena de suspensão por aplicação da cláusula geral prevista no nº 1 do art. 24º, no caso concreto, tal não deveria ter acontecido porque o Réu não teria demonstrado a negligência grave e/ou o grave desinteresse pelo cumprimento dos deveres profissionais; c) Insurge-se o Réu contra este entendimento, pois, por um lado, perante a factualidade apurada, não se poderia ter aplicado ao Autor uma outra pena, estando a pena de multa afastada do leque de penas potencialmente aplicáveis àqueles factos; d) Os factos consubstanciam a violação do dever de correcção. Foram dadas como provadas condutas que demonstram gravidade e desrespeito pelos colegas de profissão e pela dignidade do trabalho desenvolvido, porque praticadas no local de trabalho, por funcionário com bastantes anos de casa, por motivo fútil (conforme se demonstra das declarações das testemunhas) e sem que sequer o Autor tenha presenciado directamente os factos que constituíram a motivação para a prática do ilícito disciplinar; e) Tais condutas assumem, inclusive, uma gravidade e ilicitude de natureza criminal. Podendo integrar a prática de um crime de ofensa à integridade física ou de ameaça e praticadas a título de dolo e não de negligência; f) Os factos dados como provados, não representando a violação de um dever profissional de funcionário de diminuta gravidade ou ilicitude, afastam a aplicação de pena de multa pois o artigo 23º do Estatuto Disciplinar, embora integrando hipótese em que se mostra violado o dever de correcção, não dispensa que a violação do dever do funcionário resulte apenas de comportamento negligente, conforme se retira da leitura do nº 1 do preceito; g) E a violação do dever de correcção que legitima a aplicação de pena de multa é aquela que, decorrendo de comportamento negligente, não assume uma especial importância ou relevância no sentido de afectar o bom funcionamento do serviço.

h) Porém, nos autos, o comportamento do Autor, conforme explanado no Relatório Final, assume uma considerável gravidade e grau de culpa, tendo sido praticado a título doloso, apenas podendo se subsumir ao art. 24º, nº 1 do ED, que nos fala de negligência grave. E que por maioria de razão, integra o dolo; i) Podendo, inclusive, as condutas fundamentarem a aplicação de aposentação compulsiva, por verificação da hipótese prevista no nº 1, 2º, al. a) do artigo 25º do ED; j) Assim sendo, entende o Recorrente que, perante a matéria de facto apurada, e nunca integrando o caso a possibilidade de aplicação de pena de multa, cai por terra a necessidade de demonstrar a necessidade de aplicação da pena de suspensão; k) Inexistindo, por conseguinte, o vício que o Tribunal recorrido imputa à decisão disciplinar; e ao não assim decidir, incorreu o Acórdão recorrido em erro de julgamento, por violação dos arts 11º, 23º, 24º e 28º do Estatuto Disciplinar; l) Por outro lado, sempre se julga demonstrado que no Relatório Final se mostram explicitadas as razões para a opção pela pena de suspensão, a qual se configura como a mais proporcional à gravidade dos factos; comprovando-se a negligência grave do agente; m) Dos factos apurados decorre suficientemente esclarecida a considerável culpa do agente e correspondente ilicitude, que afaste a aplicação da pena de multa e legitime a pena de suspensão; n) Do Relatório Final percebe-se o porquê da opção pela pena de suspensão atenta a gravidade da conduta e o desrespeito pelos colegas e pelo próprio serviço em si; o) Nenhum vício se pode assacar à actuação do Réu, incorrendo o Acórdão em erro de julgamento por violação das normas substantivas (art.s 11º, 23º, 24º e 28º do Estatuto Disciplinar); p) Por último, a decisão tomada pelo Réu insere-se no âmbito dos seus poderes discricionários, sem possibilidade de sindicância pelos Tribunais, com excepção dos casos de desvio de poder, erro sobre os pressupostos, “erro grosseiro e manifesto”, violação dos princípios da justiça e da proporcionalidade; q) O que não foi alegado pelo Autor nem manifestamente se verifica no caso concreto, atenta toda a matéria constante do processo.

R) Deve ser anulado o Acórdão Recorrido e mantido acto praticado pelo Vereador dos Recursos Humanos em 07/11/2007, que aplicou ao Autor a pena disciplinar de 121 dias de suspensão.

O Sindicato… contra-alegou ampliando o objecto do recurso, concluindo da seguinte forma: 1ª Conclusão – Foi dado como provado que: “O arguido encontrava-se incompatibilizado com o M…, por razões profissionais, entrou no vestiário, empurrou-o contra um armário, pôs a sua mão no ombro do M…, com agressividade. Encostou-se ao Colega, de frente, num tom ameaçador e disse-lhe: “que seja a última vez que me andas a vigiar, porque se não eu caço-te cá fora e fodo-te os cornos”.

Embora, esteja tal matéria concentrada num único artigo, o certo é que contem vários factos: h) Que o arguido se encontrava incompatibilizado com o M…; i) Por razões profissionais; j) Empurrou-o contra um armário; k) Pôs a sua mão no ombro; l) Com agressividade; m) Disse-lhe num tom ameaçador; n) Que seja a última vez que me andas a vigiar, porque se não eu caço-te cá fora e fodo-te os cornos.

  1. Conclusão – Não obstante, não existiu qualquer testemunha presencial da ocorrência, o recorrido negou os comportamentos e os superiores hierárquicos apenas referiram que o eventual ameaçado se apresentava assustado, stressado e incomodado e que este perante colegas se dirigiu ao recorrido dizendo “estás-me a ameaçar”, “queres bater-me, bate”, “podes me matar”.

  2. Conclusão – Tais depoimentos são manifestamente insuficientes, existindo um non liquet que não permite serem dados como provados os factos constantes no artigo 4º da Acusação que foram integralmente dados como provados! 4ª Conclusão – Face à inexistência de prova segura de todos os factos deveriam os mesmos terem sido considerados como não provados e a douta decisão ao assim não entender errou de Direito.

  3. Conclusão – Quanto ao recurso, a ser doutamente entendido que tais factos devem ser dados como provados, a douta sentença não enferma de erro de Direito, porquanto, e como foi doutamente decidido não se encontra demonstrado, nem provado que o recorrido tenha agido com negligência grave ou grave desinteresse do cumprimento dos deveres profissionais, pressupostos de aplicação da pena de suspensão.

O Ministério Público junto deste tribunal, notificado nos termos e para os efeitos do art.º 146º, nº 1 do CPTA, não se pronunciou.

  1. O aresto recorrido deu como provado os seguintes factos: 1. O representado do Autor, é funcionário do Município do Porto, tendo sido alvo de processo disciplinar, no qual foi punido com a pena de suspensão de 121 dias por decisão do Vereador dos Recursos Humanos tomada em 07/11/2007.

  2. O Relatório Final do instrutor deu como provados os seguintes factos: A) Resultante de um processo de averiguações, por despacho do Senhora Directora do Departamento Jurídico Contencioso, de 28 de Maio último, foi determinada a instauração de processo disciplinar contra o funcionário F…, Fiscal Municipal, com o n.º mecanográfico …, tendo sido nomeado instrutor o ora signatário, no mesmo despacho.

    B) Está junta a fls. 13 a ficha disciplinar do arguido.

    A fls. 32 e ss. deduziu-se a seguinte acusação contra o arguido F… indiciam os autos que: O funcionário F…, com o n.º mecanográfico …, exerce pelo menos desde 1 de Janeiro de 2007 as funções de Fiscal Municipal, nos Serviços de Fiscalização da Divisão Municipal de Trânsito, instalados no Palácio Visconde Balsemão, sito à Praça Carlos Alberto, 71, nesta cidade.

    O arguido, em 2/Abril de 2007, encontrava-se nas mencionadas instalações da Divisão de Trânsito, por volta das 14 h, onde ia iniciar o turno da tarde.

    Àquela hora e no dito dia, 2 de Abril, por sua vez, o colega M…, Fiscal Municipal, tinha terminado o turno da manhã e encontrava-se no vestiário dos Fiscais a despir a sua farda de trabalho.

    O arguido, encontrando-se incompatibilizado com o M…, por razões profissionais, entrou no vestiário, empurrou-o contra um armário, pôs a sua mão no ombro do M…, com agressividade. Encostou-se ao Colega, de frente, num tom ameaçador e disse-lhe: "que seja a última vez que me andas a vigiar, porque se não eu caço-te lá fora e fodo-te os cornos".

    Com o comportamento do arguido, o M… ficou assustado, stressado, incomodado e indignado, pelo que saiu do Gabinete logo que pôde e conforme pôde, pedindo apoio ao seu Coordenador A… e Colega N…, os quais arrastaram o M… para a sala do primeiro.

    O comportamento do arguido teve a intenção de provocar medo e ofender a integridade moral do Colega M….

    O arguido sabia que estava nas instalações desta Câmara, seu local de trabalho, quando praticou os factos descritos nos artigos anteriores.

    Apesar disso, agiu de forma livre e consciente e tinha conhecimento que a sua conduta não lhe...

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