Acórdão nº 01457/13.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução26 de Setembro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO JMVBP... intentou providência cautelar contra o Instituto da Segurança Social, I.P, (I.S.S., I.P.), ambos melhor identificados nos autos, pedindo a suspensão da eficácia, com decretamento provisório, da decisão proferida pelo Senhor Director do Centro Distrital do Porto, datada de 30 de Maio de 2013, que determinou o seu regresso ao serviço no primeiro dia útil seguinte ao dia do 12º aniversário da sua filha FI....

Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada improcedente a providência solicitada.

Desta decisão vem interposto recurso.

Em alegação o Recorrente concluiu assim: 1.ª O recorrente não concorda com o entendimento do tribunal recorrido que julgou improcedente a providência cautelar de suspensão de eficácia por não ter dado por verificada in casu a previsão da alínea a), do n.º 1, do art. 120.º do CPTA e pelo alegado não-preenchimento do requisito do “periculum in mora” consagrado na alínea b) do n.º1 do art. 120.º do mesmo Código.

  1. Por outro lado, o acórdão em exame enferma de erro quanto à matéria de facto assente por omissão de factos alegados pela recorrente, e por omissão de pronúncia, dado que não apreciou o requisito da ponderação dos interesses públicos e privados, previsto no n.º 2 do art. 120.º do CPTA.

  2. Entende o Recorrente que foi sobejamente sublinhado o caráter manifesto das invalidades de que padece o ato suspendendo, incorrendo a decisão do Tribunal recorrido em erro de julgamento, uma vez que é evidente a procedência da pretensão da ação principal, nos termos da alínea a) do nº 1 do artigo 120º do CPTA.

  3. Se relativamente a alguns dos vícios invocados que afetam o ato suspendendo se pode eventualmente admitir que exigirão uma apreciação mais cuidada da legislação em vigor, é manifesto que outros são (mais que) evidentes e exigem tutela cautelar, visto que (i) respeitam à proteção de direitos fundamentais (mais especificamente direitos, liberdades e garantias) e que (ii) consubstanciam violação crassa de lei (art. 52.º do CT).

  4. Resulta de forma evidente – dos articulados e dos elementos documentais juntos aos Autos – a flagrante violação de direitos fundamentais consagrados nos arts. 36, n.ºs 1 e 5, 59.º, n.º1, alínea b), 67.º, n.º 2, alínea h) e 68.º, n.º 4 e bem assim, do artigo 266.º da CRP 6.ª Os referidos direitos fundamentais (à família e à parentalidade) exigem uma superior proteção por parte do julgador, que não pode permitir que qualquer lesão desses direitos se verifique quando está em causa o superior interesse de uma criança, o que justificava só por si a adoção da providência requerida com base na alínea a), do n.º 1, do art. 120.º do CPTA.

  5. O texto da norma legal em causa (52.º do CT), que concretiza a proteção constitucional do direito à família e à parentalidade, não prevê qualquer limite etário do filho menor para o gozo pelo pai da licença de parentalidade (designadamente o dos 12 anos de idade), 8.ª Estriba-se a posição do Requerido num entendimento que restringe consideravelmente o direito atribuído/reconhecido por tal norma legal – um direito, note-se bem, que se reconduz ao supra mencionado direito fundamental.

  6. O requerido afasta a interpretação literal da norma legal concretizadora do direito fundamental à parentalidade, letra essa (da lei) que assegura por si só o mesmo direito ao seu titular sem lhe apor expressamente qualquer limite etário de prazo para o respetivo gozo (que não, claro, o limite – implícito – da maioridade, momento em que a criança o deixa legalmente de ser) … para lhe sobrepor uma (no mínimo) rebuscada (para não dizer implausível) interpretação, digamos, «sistemática» e «teleológica», com recurso à analogia (ou interpretação extensiva).

  7. Faz parte do «bê-á-bá» de qualquer jurista – mais do que isso, do primeiranista do curso de direito que já tenha feito as disciplinas de Introdução ao Direito e de Direito Constitucional – o conhecimento desta asserção: «h) Na dúvida, os direitos (liberdades e garantias) devem prevalecer sempre sobre as restrições (in dubio por libertate, como é quase lugar comum); e as leis restritivas devem ser interpretadas, senão restritivamente, pelo menos sem recurso à interpretação extensiva e à analogia” (Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Tomo IV (Direitos Fundamentais, Coimbra, 1988, pág. 308) 11.ª Não cabe ao intérprete das normas restringir o que a lei não restringe, ademais quando a lei em causa é uma lei restritiva-concretizadora do direito à família e à parentalidade.

  8. A interpretação desfavorável e sem correspondência na norma do art. 52.º do CT em que se funda o ato suspendendo, ao fazer acrescer ao limite de duração da licença de 2 anos o limite de idade dos 12 anos – assim como a própria exigência da sentença recorrida de o requerente ter de alegar e comprovar necessidades específicas do menor para poder gozar da licença de parentalidade –, é manifestamente inconstitucional, por violação do direito fundamental à família e à parentalidade que aquela norma concretiza, consagrados nos arts. 36, n.ºs 1 e 5, 59.º, n.º1, alínea b), 67.º, n.º 2, alínea h) e 68.º, n.º 4 e bem assim, do artigo 266.º da CRP., o que ora se invoca para efeitos do art. 280.º da CRP.

  9. Competia àquele Tribunal ter decidido no sentido de considerar a providência cautelar procedente, com base no disposto no artigo 120.º n.º 1 alínea a) do CPTA.

  10. Verificam-se ainda todos os pressupostos exigidos para o efeito no artigo 120.º n.º 1 alínea b), a saber: (i) o periculum in mora, (ii) o fumus boni iuris e (iii) a ponderação entre os interesses públicos e privados em presença (cfr. fls. 30 e 31 da decisão recorrida).

  11. Assim, e se quanto ao fumus boni iuris bem andou o Tribunal ao considerar esse requisito como verificado, já o mesmo não se pode dizer quanto ao periculum in mora (considerado como não verificado) ou quanto à ponderação entre os interesses públicos e privados em presença, que a decisão recorrida nem sequer apreciou 16.ª Mal andou a decisão recorrida ao não ter dado como verificado o requisito do periculum in mora, pois como é óbvio não é indiferente a idade do filho a que se presta assistência, nem são de todo iguais as necessidades de filho menor, com 12 anos de idade, relativamente às do filho menor que já tenha 15, 16 ou 17 anos! 17.ª Consubstancia, como tal, um facto de cariz psicofisiológico empírico mais do que notório que aos 12 anos o(a) menor necessita muito mais do apoio permanente do Requerente, principalmente na fase da adolescência em que se encontra e pelas abruptas transformações fisiológicas que se verificam e que reclamam um acompanhamento próximo e constante … necessidade de assistência que claramente decrescerá, ano após ano, com o aproximar da maioridade da menor … 18.ª O tempo não para, e nunca mais a menor do Requerente terá 12 anos, nem nunca mais a filha do Requerente, que hoje tem apenas 12 anos, exigirá, de forma tão premente, a presença constante do seu pai … o que constitui facto empírico e notório do conhecimento de qualquer cidadão comum que, por isso, não carece de qualquer prova, nem mesmo de alegação (Nesse sentido cfr. Ac. do TRC de 22.06.2010, no P. 1803/08.3TBVIS.C1, R. Carvalho Martins.), como aliás preceitua o artigo 514.º, n.º1, do CPC; pelo que não se impunha ao Requerente alegar e provar mais do que o fez … 19.ª Cabendo ao Recorrente tão-só, em cumprimento do preceituado no art. 52.º do CT, alegar e provar a relação de parentalidade, a idade da descendente, a intenção de gozo ou prorrogação da licença, o início e terminus do período, a situação profissional da mãe da menor sem gozar da mesma licença e a comunhão de mesa e habitação (cfr. artigos 3.º, 8.º, 21.º, 22.º da petição inicial, correspondente aos factos B, E, K, L e M da decisão recorrida).

  12. Tendo procedido à referida alegação, cumpriu o Requerente todos os ditames legais para poder gozar da licença e, consequentemente, prestar toda a assistência que a sua filha neste momento necessita; o que claramente vai ser obstado pelo não decretamento da presente providência e pela produção de efeitos do ato suspendendo que impedirão o exercício dos direitos não só do Requerente como da sua filha.

  13. O decurso do tempo originará com toda a certeza a constituição de uma situação de facto consumada e prejuízos de impossível reparação.

  14. Por todo o exposto, mal andou o Tribunal recorrido ao decidir no sentido de considerar como não preenchido o requisito do periculum in mora previsto na alínea b) do n.º 1 do CPTA.

  15. Mal andou ainda o Tribunal quanto ao requisito da ponderação dos interesses públicos e privados, previsto no n.º 2 do artigo 120.º do CPTA -...

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