Acórdão nº 00402/12.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Abril de 2018

Magistrado ResponsávelRogério Paulo da Costa Martins
Data da Resolução06 de Abril de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: O Município do Porto veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL do acórdão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, 28.10.2014, pelo qual foi julgada parcialmente procedente a acção que lhe moveu o Sindicato dos Trabalhadores da Administração Local – STAL, em representação do seu associado, ARB, com vista à impugnação do acto que lhe aplicou a pena disciplinar de um ano e dois meses de inactividade.

Invocou para tanto, em síntese, que a decisão recorrida não deveria ter anulado o acto de indeferimento do recurso hierárquico, cuja legalidade não resulta beliscada, mas sim deveria ter condenado o Réu, em sede de execução da pena, à prática de um acto de conversão da pena de um ano e dois meses de inactividade numa pena de suspensão ou à garantia dessa conversão em sede de execução da pena.

*O Autor, ora Recorrido, contra-alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida.

*O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1.

Vem o presente recurso interposto do acórdão proferido, em 28.10.2014, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que, dando como parcialmente provada a acção, a julgou procedente, anulando o acto impugnado, em virtude de a pena aplicada ser superior ao máximo legalmente admissível.

  1. Entendeu o Tribunal recorrido que o acto em apreço devia ter levado em consideração o novo Estatuto Disciplinar, aprovado pela Lei n.º 58/2008, de 09.09, convertendo a pena de inactividade proposta pelo referido conselho de administração, em 90 dias de suspensão, ao invés de simplesmente indeferir o recurso hierárquico interposto pelo arguido.

  2. Salvo o devido respeito, não pode o recorrente concordar com tal entendimento.

  3. Nos termos do disposto no artigo 19.º do estatuto disciplinar em vigor na data da prática da infracção disciplinar, a aplicação da decisão disciplinar ao funcionário em apreço, cabia, em exclusivo, ao conselho de administração dos Serviços Municipalizados de Águas e Saneamento.

  4. A Câmara Municipal do Porto, através da deliberação posta em crise na presente acção, limitou-se a determinar o indeferimento do recurso hierárquico interposto da decisão do conselho de administração dos Serviços de Águas e Saneamento, que aplicou, a ARB, a sanção disciplinar de um ano e dois meses de inactividade.

  5. O propósito da referida deliberação da Câmara Municipal, segundo as Instâncias Judiciais, o órgão competente para decidir o recurso hierárquico em apreço, era precisamente o de deferir ou indeferir o recurso da decisão tomada pelo conselho de administração dos Serviços Municipalizados de Águas e Saneamento, aquela em concreto e não outra.

  6. Tendo a Câmara Municipal entendido confirmar o acto recorrido, teria de o fazer nos seus exactos termos, como, de resto, fez.

  7. De todo o modo, contrariamente ao aventado pelo Tribunal recorrido, a conversão da pena de inactividade aplicada em pena de suspensão, de acordo com o prescrito na Lei n.º 58/2008, é automática, não implicando uma decisão expressa nesse sentido.

  8. Tal como expressamente decorre do disposto no n.º 5 da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, o qual preceitua que “ A pena de inactividade que se encontre proposta, aplicada ou em curso de execução é automaticamente convertida em pena de suspensão, pelo seu limite máximo”.

  9. É da letra da lei, e não da mera interpretação do Réu, aqui Recorrente, que decorre que a conversão da pena de inactividade em pena de suspensão é automática e pelo seu limite máximo.

  10. A interpretação do Tribunal a quo não tem, portanto, qualquer acolhimento na letra da lei, nem no espírito que está subjacente ao regime de aplicação da lei no tempo consagrado pelo diploma em apreço.

  11. A doutrina já formulada nesta matéria não suscita quaisquer dúvidas quanto ao automatismo na conversão da pena de inactividade em pena de suspensão.

  12. Veja-se, a título de exemplo, o que, em, anotação ao n.º 5 do artigo 4.º da Lei n.º 58/2008, refere Paulo Veiga e Moura, in “ Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores da Administração Pública - Anotado”, Coimbra Editora, 2.ª edição, 2011, pp. 21 e 22: “O terceiro segmento do artigo em anotação disciplina o destino e efeitos das penas propostas, aplicadas ou em curso de execução. Sabendo-se que o novo estatuto diminuiu o elenco das penas passíveis de ser aplicadas, os n.ºs 5 a 7 definem regras relativamente às penas que deixaram de ter expressa previsão legal a partir da data da entrada em vigor do presente diploma. Deste modo, as penas de inactividade que já tenham sido propostas (o que pressupõe que já foi elaborado o relatório final, embora a mesma solução se deva igualmente aplicar a todas as acusações já deduzidas) já tenham sido aplicadas ou estejam a ser executadas são ex vi legis convertidas na pena de suspensão pelo seu limite máximo, sendo este limite de 90 dias por cada infracção cometida pelo arguido e pela qual se pretende puni-lo ou já foi punido (o que significa que se o fundamento que justifica a proposta ou justificou a aplicação da pena foi apenas uma infracção, a pena a aplicar converte-se numa pena de suspensão pelo máximo de 90 dias(…).”.

  13. Segundo estes autos “a conversão automática das penas de inactividade impede que subsistam ou sejam aplicados quaisquer efeitos que a lei agora não associe à pena de suspensão (…), para além de implicar a cessação imediata da pena se já tiver sido cumprido ou quando seja atingido o período máximo de 90 ou 240 dias previsto para a convertida pena de suspensão”.

  14. In casu, e contrariamente ao que considerou o Tribunal recorrido, à data da entrada em vigor do novo Estatuto Disciplinar (Lei n.º 58/2008) a pena já estava proposta pelo conselho de administração dos Serviços Municipalizados de Águas e Saneamento do Porto.

  15. Tanto que foi passível de ser objecto de recurso hierárquico por parte do arguido, cujo objeto era precisamente a pena proposta.

  16. Assim sendo, e aplicando o entendimento do Tribunal a quo de que só nos casos em que a pena estivesse proposta, aplicada ou em curso, é que seria de aplicar automaticamente o novo quadro legal, - entendimento com o qual de resto não concordamos - então sempre teria de se considerar a ser a situação dos autos subsumível à aplicação imediata do novo Estatuto instituída pelo aludido diploma e à conversão automática da pena de inactividade em pena de suspensão, conversão essa que decorre expressa e taxativamente do n.º 5 do artigo 4.º desse diploma.

  17. Acresce que não cabia sequer ponderar a moldura de aplicação da pena como propõe o Tribunal recorrido, no intervalo entre 20 e 90 dias.

  18. Pois que é a própria lei que determina, sem mais, essa conversão, por um lado, e, por outro, que a mesma se faça pelo limite máximo.

  19. O acto impugnado, que se circunscrevia necessariamente ao deferimento ou ao indeferimento do recurso hierárquico, não enferma de qualquer vício, no que toca à sua legalidade, na medida em que não tinha de – nem sequer podia - determinar expressamente a conversão da pena de inactividade aplicada em pena de suspensão.

  20. Questão diversa é da concreta execução da pena, a qual em face no novo Estatuto e à aludida conversão automática, implica, forçosamente, que, nessa sede, o arguido cumpra um máximo de 90 dias de suspensão.

  21. Tal questão não põe, de modo algum, em crise a prática do acto de indeferimento, pela Câmara Municipal, do recurso hierárquico apresentado, em conformidade com o respectivo procedimento disciplinar e com a pena proposta, no âmbito do mesmo, o qual deverá, assim, ser mantido na ordem jurídica.

  22. Assim não se entendendo, o que não se concede e apenas se formula por mera hipótese de raciocínio, considerando-se que, efectivamente, deverá existir um acto expresso de conversão da pena de inactividade em pena de suspensão, tal acto sempre consubstanciará um mero acto de execução – do verdadeiro acto administrativo impugnável que é o de indeferimento de recurso hierárquico e do acto de aplicação da pena que lhe subjaz.

  23. Sendo que, nesse caso, caberá decidir não pela anulação do acto de indeferimento cuja legalidade não resulta, face ao exposto, beliscada, mas sim pela mera condenação do Réu, em sede de execução da pena, à prática de acto de conversão desta numa pena de suspensão ou à garantia dessa conversão em sede de execução da pena.

    *II – Matéria de facto.

    Ficaram provados os seguintes factos na decisão recorrida que não mereceram qualquer reparo por qualquer uma das partes:

    1. O representado do Autor, é funcionário dos «Serviços Municipalizados de Águas e Saneamento» do Porto, tendo sido alvo de processo disciplinar, no qual, mediante deliberação do conselho de administração dos Serviços Municipalizados de Águas e Saneamento, de 13.09.2006, lhe foi aplicada a pena de um ano e dois meses de suspensão, com base no relatório final da instrução, do qual se destaca o seguinte: «1.º - Em Abril de 2006, o arguido encontrava-se a executar obras de reparação da ligação da rede predial de saneamento do prédio sito à Rua T…, 78, à rede...

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