Acórdão nº 02029/17.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Julho de 2018

Magistrado ResponsávelHélder Vieira
Data da Resolução12 de Julho de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I — RELATÓRIO Recorrente: AGPF e outros Recorrido: OSAE Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que julgou improcedente o processo cautelar no qual era pedido fosse decretado, designadamente: “1. Alínea d): autorização provisória para os Requerentes prosseguirem, mesmo após 31 de dezembro de 2017, as respetivas atividades profissionais como até então, ou seja, o exercício das funções de Agente de Execução em cumulação com o mandato judicial, que a profissão da Advocacia os habilita, por ser esse um direito adquirido e consolidado à luz da legislação anterior e por ser inconstitucional a norma do artigo 3.º, n.º 13, da Lei n.º 154/2015 (lida em conjugação com o artigo 165.º, n.º 1, alínea a), do Estatuto), por violação do núcleo essencial do direito de liberdade de escolha e acesso à profissão de Advogado (ou de Agente de Execução), previsto no n.º 1 do artigo 47.º da Constituição, e por violação dos princípios da proteção da confiança e da segurança jurídica, ínsitos no artigo 2.º da Constituição, bem como da proporcionalidade e da proibição do retrocesso; 2. Alínea i): intimação da OSAE a não aplicar, a partir de 31 de dezembro de 2017, quanto aos Requerentes, na qualidade de Agentes de Execução e Advogados, a norma do artigo 3.º, n.º 13, da Lei n.º 154/2015 (lida em conjugação com o artigo 165.º, n.º 1, alínea a) do Estatuto), pelas mesmas razões; 3. Alínea i): intimação da OSAE a não iniciar, ao invés do ameaçado, qualquer processo disciplinar contra os Requerentes, que, como até hoje, continuem a exercer depois de 31 de dezembro de 2017, em cumulação e na sua plenitude, a função de Agentes de Execução e a profissão de Advogados (com mandato judicial)”.

Conclusões dos Recorrentes, que delimitam o objecto do recurso: “1) Pelo caso análogo apresentado no início deste recurso se percebe que, com o devido respeito (que é muito), o Exmo. Senhor Juiz a quo “adultera” a questão objeto de litígio, quer porque interpreta erradamente a matéria de facto, quer porque interpreta e aplica erradamente a lei.

2) Tais imperfeições redundam num prejuízo terrível e irreparável para todos e cada um dos Requerentes, mas também para o interesse público, num caso de Justiça e da Justiça, pois em causa estão profissões judiciárias.

3) A mera “suspensão” do seu exercício ou a sua “proibição” (ainda que por apenas alguns – muitos - anos) corresponde a uma “expropriação” de profissão (facto consumado) e a um prejuízo irreparável, insuscetível de qualquer reconstituição...

4) O não exercício de uma profissão judiciária – como in casu, o mandato judicial pelos Advogados ou as funções de Agente de Execução –, por longos anos, como acontecerá na hipótese de não decretamento da providência, será, inegavelmente, um facto consumado, até pela natureza da própria profissão, o interesse público a ela inerente e o facto de se tratar de Agentes de Justiça.

5) E um facto consumado que gera prejuízos absolutamente evidentes à luz da experiência comum (perda de clientela, da confiança, etc.).

6) E se dúvidas existisse, pela eventual singeleza da matéria de facto (o que não se concede, como demonstrado neste recurso), tinha o Exmo. Senhor Juiz a quo a obrigação de conhecer, “melhor do que ninguém”, os prejuízos resultantes desse não exercício ou da proibição desse exercício – este é o facto nuclear, que gera prejuízos notórios e do conhecimento comum.

7) Mais, se for necessário, para “fazer Justiça”, existem também as presunções judiciais, dado que, com todo o respeito, é por demais evidente que, mesmo que o vertido na sentença quanto à ausência de “certos factos” fosse correto – e não é – o resultado, mesmo assim, nunca poderia ser o que foi, pois foram dados como provados factos que demonstram que os Requerentes alteraram por completo as suas vidas pessoais e profissionais (ver factos provados II a WW) para poderem exercer ambas as profissões, o que “indicia” que as exercem efetivamente, como, aliás, solicitaram expressamente à OSAE.

8) Bastaria, portanto, ao Exmo. Senhor Juiz a quo extrair as ilações evidentes e notórias dos factos que deu como provados, à luz da experiência comum, da lógica corrente e por via da própria intuição humana...

9) Neste momento, portanto, sem a tutela cautelar requerida – e devida – os Requerentes encontram-se sem exercer uma das profissões (facto consumado) e com todos os prejuízos notórios e inerentes por se tratar de profissão judiciária (são, portanto, prejuízos dos próprios profissionais, dos clientes e potenciais clientes e da própria Justiça).

10) Há uma errada interpretação dos factos alegados e provados, mas sobretudo uma contradição entre estes e o fundamento da decisão, que considera não ter sido alegado (erradamente, como se comprovou) e provado (contraditoriamente, como demonstrado) que os Requerentes “exerciam ambas as profissões”, pelo que, neste segmento, manifesta-se uma nulidade da sentença [artigo 615.º, n.º 1 alínea c) do CPC, aplicável ex vi artigo 1.º do CPTA], que a inquina.

11) O não exercício de uma profissão judiciária é, de per se, irrecuperável, insuscetível de reconstituição, sendo um facto notório, sem necessidade de “prova adicional”, 12) Embora os Requerentes tenham designadamente (alegaram bem mais) demonstrado (ver página 27 da sentença recorrida) que “qualquer interrupção da sua situação profissional – ainda que provisória – tornar-se-á irreversível, tendo todos os clientes de mudar de profissional”, o que “implicará prejuízos derivados da perda de clientes, da alteração da organização e estrutura profissionais e da transformação da vida pessoal e familiar”, pois “ficarão paralisados no exercício e no percurso profissional”...

13) Ora, com o devido respeito, estes são também prejuízos concretos e geradores de presunções judiciais e naturais.

14) Os presentes autos têm a ver com o reconhecimento de um direito profissional: poderem exercer ou continuar a exercer mandato judicial como Advogados, enquanto (simultaneamente) Agentes de Execução, e não com qualquer pedido indemnizatório: aqui sim, a alegação e prova seria outra.

15) Estando perante uma providência conservatória, basta provar o direito e a ameaça de lesão desse direito, e esse tem a ver com a impossibilidade de exercer (ou continuar a exercer), pois a expropriação de uma profissão é um facto consumado, e é, ela própria, um prejuízo irreparável.

16) E dos factos dados como provados, insiste-se, tal é evidente, pelo que deles decorre o facto consumado e a impossibilidade de reconstituição e reintegração da esfera jurídica destes profissionais.

17) Mais, de todos estes factos e correspondentes e inerentes “presunções naturais”, parece evidente, ao invés do decidido (ver páginas 28 e 29 da sentença recorrida), que para além de inscritos nas duas Ordens profissionais (e só estão inscritos, com pagamentos avultados de quotas e Caixa de Previdência, quem exerce ou pretende exercer a profissão), os Requerentes exercem efetivamente ambas as profissões (como, aliás, foi expressamente alegado várias vezes em todo o R.I.).

18) “A intensidade e frequência desse exercício” é, com o devido respeito, e salvo melhor opinião, totalmente irrelevante para a tutela aqui em causa, pois, insiste-se, não é a “quantidade” mas a “qualidade” que está em equação: deixar de poder exercer ou de exercer uma profissão.

19) Daí que, no pedido à OSAE, que foi dado como provado (pois o facto provado XX deu como reproduzido o teor dos documentos que integram os autos), os Requerentes, cada um deles, tenha assumido que (e pedido autorização para) “continuará a exercer, como até aqui, as funções em simultâneo de Agente de Execução e Advogado (de poderes plenos)...” 20) Assim, deveria ter concluído a sentença judicial que os Requerentes exercem (exerciam) as duas profissões, o que foi nomeadamente invocado nos artigos 150.º e ss do R.I. (ao invés do estranhamente referido na decisão recorrida).

21) Portanto, ao contrário do que expressa na página 30, o Exmo. Senhor Juiz a quo conhece (ou deveria conhecer) que os Requerentes exercem simultaneamente a Advocacia (mandato judicial) e a função de Agente de Execução, tal como resulta dos documentos cujo conteúdo deu como integralmente reproduzidos (ver facto provado XX); 22) Que tal exercício simultâneo é proibido desde 31-12-2017; 23) Que, ao invés do que estranhamente afirma, não são apenas os mandatos judiciais já constituídos após a entrada em vigor da incompatibilidade que são afetados, mas todos aqueles que, no exercício normal da profissão, pudessem ser constituídos para o futuro; 24) Que o impacto de cada uma das profissões é irrelevante, pois em causa não está qualquer pedido indemnizatório; 25) Que esse impacto é irrelevante também porque não está em causa o “passado” mas o “futuro”, pelo que a incompatibilidade, afetando estes profissionais que o Estado “chamou”, impede-os no futuro de exercer a sua profissão – é isso que está em discussão e não, insiste-se, qualquer pedido indemnizatório 26) Que os Requerentes, para “alterarem” as suas vidas (ver factos provados II a WW), de modo a abraçar, a partir de 2011, data em que todos já eram há muito Advogados, as funções de Agente de Execução, tiveram despesas e gastos avultadíssimos - ver artigos 109.º a 143.º do R.I. e respetivos docs. 4 a 15 que se deram como reproduzidos no facto provado XX, sendo que alguns inclusivamente compraram novos escritório ou alteraram significativamente os de advocacia então existentes.

27) E, sobretudo, que os prejuízos irreparáveis em causa nos autos nada têm a ver com os gastos e investimentos realizados pelos Requerentes (que foram invocados e demonstrados apenas exemplificativamente, como várias vezes referido no R.I., e para prova da confiança depositada no Estado e no sistema).

28) Em suma, permita-se, com todo o respeito (que é muito e sincero), o Exmo. Senhor...

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