Acórdão nº 00746/15.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelFrederico Macedo Branco
Data da Resolução15 de Junho de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em Conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I Relatório JMPS, devidamente identificado nos autos, no âmbito de Ação Administrativa que intentou contra a Polícia de Segurança Pública, tendente a impugnar o Despacho de 25/10/2013 que rejeitou a qualificação como acidente de trabalho, relativamente a acidente que sofreu em 05/10/2013, inconformado com a Sentença proferida em 30 de setembro de 2016 no TAF do Porto, que decidiu absolver o Réu da Instância em resultado da verificada caducidade do direito de Ação, veio, em 2 de novembro de 2016, recorrer da Sentença, na qual concluiu (Cfr. fls. 110v a 113 Procº físico): “a) Com o devido respeito, que é muito, entende o Recorrente que esteve mal o Mm° Juiz do Tribunal ad quo ao decidir nos moldes em que o fez, falhando na qualificação jurídica dos factos e no direito aplicável, razão pela qual, deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente, por provado, revogando-se a decisão recorrida e, em consequência, substituindo-se a mesma por outra que, em conformidade, julgue procedente a ação administrativa apresentada a juízo pelo aqui Recorrente. Vejamos, b) A impugnação judicial do Recorrente, teve por base um despacho do Comandante do Comando Metropolitano do Porto, de 25.10.2013 que, na esteira de Informação/Proposta, decidiu negar a organização de processo de sanidade ao Recorrente, negando-lhe, por conseguinte, a qualificação de acidente de serviço ao evento por aquele sofrido em 05.10.2013.

  1. Ora, o Recorrente no dia 05.10.2013, estava no interior da Esquadra onde habitualmente presta serviço, ia vestir a sua farda policial em ordem a iniciar o seu turno das 19 horas às 24 horas.

  2. Quando se uniformizava para iniciar o seu serviço — sendo este um ato relacionado com o serviço policial — em resultado de um jeito decorrente de um movimento mais repentino sentiu o Recorrente uma forte dor na seu ombro esquerdo, e) dores essas que foram direta e necessariamente decorrentes do movimento levado a cabo para vestir a sua camisa, causando-se súbita, violenta e inesperada incapacidade, ficando quase tolhido nos movimentos desse seu ombro/braço esquerdo.

  3. O Recorrente sentiu necessidade de se deslocar ao Hospital, tendo de imediato entrado de baixa por incapacidade temporária para o serviço, situação em que se manteve por longo período, quanto se saiba, que ainda hoje se mantém.

  4. Nenhumas dúvidas nos assistem de que o referido evento de 05.10.2013, tendo ocorrido em tempo de serviço, no local de trabalho e havendo claro nexo causal entre o evento em causa e a lesão, só pode preencher o conceito de acidente em serviço nos precisos termos em que a lei assim o qualifica.

  5. Porém, viria o Recorrente a ser notificado do teor do despacho de 25.10.2013, que negou o pedido de abertura de processo de sanidade, aparentemente por se entender que o Recorrente "foi simplesmente acometido de doença súbita e natural", i) Se o Recorrente se encontrava a fardar, para iniciar o turno de serviço, encontrando-se no interior das instalações policiais, ao que se soma o facto de as lesões apresentadas disporem de nexo causal em face do evento participado, então, parece poder concluir-se de que a situação sub judice é subsumível naquilo que a lei tipifica como acidente em serviço.

  6. Por isso, a decisão pelo Sr. Comandante de 25.10.2013, e, para o que importa aqui, a sentença recorrida, enquadram mal os factos do ponto de vista jurídico, cristalizando-se no ordenamento jurídico aquele que foi um ato administrativo ilegal, com o desvalor jurídico de nulidade, k) que, ao ser negada a organização de processo de sanidade ao Recorrente, sendo negada também, por efeito reflexo, a qualificação do evento de infortúnio por aquele sofrido em 05.10.2013 quando se encontrava ao serviço, acabam por ser violados grosseiramente direitos fundamentais do Recorrente, l) que se vê privado da possibilidade de vir a ser ressarcido de todos os valores já despendidos com o evento de infortúnio que sofreu em 05.10.2013.

  7. Contrariamente ao entendimento do Mm° Juiz do Tribunal ad quo entende o Recorrente que o despacho de 25.10.2013 é um ato administrativo nulo, nos termos dos artigos 133.°, n.º 1 e n.º 2, al. d) do CPA (hoje, artigo 161.°, n.º 1 e n.º 2, al. d) do CPA).

  8. O despacho de 25.10.2013, fere de morte o conteúdo essencial de um direito fundamental do Recorrente, ferindo o núcleo essencial do previsto no artigo 59.°, n.º 1, al. f) da CRP, o) com a cominação prevista no artigo 286.° do Código Civil, artigo 134.°, n.º 2 do CPA, e artigo 58.°, n.º 1 do CPTA.

  9. Além disso, o referido despacho viola, entre outros, o disposto nos artigos 4.°, 5.° e 7.° do Decreto-Lei n.º 503/99, de 20.11, que estabelece o regime jurídico dos acidentes de trabalho e das doenças profissionais ocorridos ao serviço de entidades empregadoras públicas, assim como do disposto nos artigos 8.°, n.º 1 e n.º 2, e 10.° da Lei n.º 98/2009, de 04.09, que fixa o regime jurídico dos acidentes de trabalho e de doenças profissionais.

  10. Basta, pois, no caso em apreço, que se desvende se o conteúdo essencial de direito fundamental previsto na Constituição foi, ou não, ferido no seu "núcleo duro".

  11. Entende o Recorrente que no caso sub judice foi claramente violado o conteúdo essencial de um direito fundamental seu, muito simplesmente porque no seu local e tempo de trabalho, enquanto se fardava — e por ai em ato relacionado com o serviço policial — foi acometido por evento súbito, violento, inesperado e de ordem exterior ao próprio lesado, que lhe causou lesão que derivou em incapacidade para o trabalho, com todos os prejuízos dai advenientes, s) razão pela qual deveria ter sido aberto processo de sanidade que, por certo, pelas razões aduzidas iria ter de concluir tratar-se de um acidente de serviço e, por ai, ser o Recorrente reembolsado de todas as despesas que teve (e ainda continua a ter) em virtude de evento de infortúnio ocorrido no tempo e local de trabalho, t) muito mal andando a sentença recorrida quando não reconhece a violação do preceito constitucional vertido no artigo 59.°, n.º 1, al. f) da CRP, onde o núcleo essencial do que ai se prevê é precisamente o direito à reparação em caso de acidente em trabalho, mas que no caso em apreço não ocorreu.

  12. O artigo 59.°, n.º 1, al. f) da CRP é aquela "concreta norma" que foi violada pela Polícia de Segurança Pública, o que faz quando não reconhece o evento sofrido pelo Recorrente em 05.10.2013 como sendo um acidente em serviço, com consequente não reparação dos prejuízos por aquele suportados.

  13. Muito mal andou a sentença recorrida quando segue o entendimento trazido aos autos pelo R., ora Recorrido, de que em causa não estará a nulidade de ato administrativo, w) quando ao cabo, ressalta à evidência de que foi ferido de morte o conteúdo essencial de um direito fundamental do Recorrente, nomeadamente o previsto no artigo 59.°, n.º 1, al. O da CRP, x) fazendo com que o ato administrativo impugnado não padeça de desvalor de anulabilidade, mas...

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