Acórdão nº 03073/12.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução15 de Junho de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: MFCO (R. F…, 4410-339 Vila Nova de Gaia), interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto, que julgou totalmente improcedente acção administrativa especial intentada contra o Ministério da Saúde (Avª João Crisóstomo, nº 9 1049-062 Lisboa), peticionando anulação de acto do Ministro da Saúde, de 27/07/2012, acto que determinou cessação de comissão de serviço, e bem assim formulando pedidos de pagamento de quantias.

Remata o recurso com as seguintes conclusões: 1 - A Recorrente mantém a sua invocação inicial, constante da petição, segundo a qual inexiste, pura e simplesmente, qualquer prova material consistente dos factos que o ato impugnado considerou apurados e com base nos quais veio a ser proferido.

2 - Assim como mantém que o que falta, nos referidos inquérito e relatório, de comprovação inequívoca e isenta dos comportamentos imputados à Recorrente, sobra em juízos de valor e de intenção, bem como em considerações estritamente conclusivas.

3 - Estando em causa decisão de extrema gravidade, que fez cessar, com alegado motivo jusrificarivo, a função que a Recorrente exercia como diretora do CSC, era e é estritamente exigível que a prova material dos comportamentos imputados fosse inequívoca, objetiva e consistente.

4 - Mas não o é, o que naturalmente invalida, por erro nos pressupostos de facto, o próprio ato impugnado.

5 - Afetando a respetiva fundamentação, por incongruência desta, em violação com o disposto nos artigos 124° e 125° do CPA.

6 - A Recorrente não pode concordar nem aceitar a decisão consubstanciada na sentença recorrida a este respeito, no sentido de existir défice de alegação, por parte da Recorrente, a tal propósito.

7 - Desde logo, porque a Recorrente invocou a inexistência, pura e simples, de qualquer prova material consistente dos factos que o ato impugnado considerou provados.

8 - Não se vê como poderia a Recorrente ter melhor definido, concretizado ou alegado, quando se invoca que não existe prova material.

9 - A Recorrente também não pode aceitar a posição assumida pela sentença recorrida na página 40, ao referir que "a Autora não logra apresentar qualquer argumento sustentado que descredibilize os concretos elementos probatório nos quais se baseou o acto impugnado".

10 - Tal perspetiva e asserção tem como pressuposto uma verdadeira presunção de culpa da Recorrente.

11 - A Recorrente, em matéria de natureza disciplinar como é a presente, beneficia de uma presunção de inocência, cabendo à decisão sancionatória, diversamente, sustentar os seus próprios fundamentos.

12 - Não cabe à Recorrente ilidir qualquer presunção de culpa que sobre ela impenda, ao contrário daquilo que parece resultar da sentença recorrida.

13 - O relato transcrito pela sentença recorrida nas páginas 41 a 43, corresponde apenas à listagem de diligências efetuadas, não correspondendo, nem pouco mais ou menos e ao contrário da conclusão da sentença recorrida, a qualquer prova material no sentido pretendido pela entidade demandada.

14 - As "conclusões" também transcritas pela sentença recorrida nas páginas 43 e 44 são também, e apenas, isso mesmo, ou seja, conclusões, sem que se alcancem OS factos que as sustentem.

15 - Percorrido este segmento da sentença recorrida, também se fica sem saber qual é concretamente a prova material dos factos que o ato impugnado considerou apurados e com base nos quais veio a ser proferido.

16 - A sentença recorrida considera que ela existe, mas o que refere para sustentar tal asserção configura apenas listagem de diligências e considerações conclusivas.

17 - A Recorrente mantém igualmente que o ato impugnado, ao integrar os factos em causa nas normas que constituem o artigo 3°, n.° 4 (alíneas a) e d)), n.° 5 e n.° 8 do Estatuto Disciplinar aprovado pelo DL 24/84, então vigente, qualificando-os como atentatórios da dignidade e prestígio da função, bem como nas normas que constituem o artigo 8°, n.° 4, alínea e), do DL 60/2003, de 1/4, na redação em vigor em 13/5/2005, procedeu a uma errada qualificação jurídica dos factos reais.

18 - E isto precisamente porque os factos objetivamente apurados - que não os factos que a sentença recorrida assume como apurados - são insuscetíveis de tal enquadramento jurídico.

19 - De tudo resulta, portanto, que não há, verdadeiramente, fundamentação jurídica para a decisão impugnada.

20 - Também sempre se verificando uma errada integração jurídica dos factos em causa na previsão das normas invocadas.

21 - Não há pois qualquer fundamentação fáctica ou jurídica, desde logo, para a imputação que visa a Recorrente e que sustenta o ato impugnado.

22 - Não se podendo aceitar, a tal propósito, o que a sentença recorrida apura e conclui nas páginas 47 e 48, uma vez que se estão a assumir como assentes, ou até como apenas indiciados, factos relativamente aos quais, concretamente, não existe qualquer prova material, nem a sentença recorrida a identifica.

23 - A sentença recorrida assume as conclusões da entidade demandada mas sem sindicar os respetivos pressupostos, sendo certo que a Recorrente colocou em causa, logo a partir da petição inicial, precisamente os pressupostos das conclusões da entidade demandada, os quais conduziram e sustentaram o ato impugnado.

24 - No que diz respeito à invocação da violação material, por parte do ato impugnado, do direito de audiência prévia, a Recorrente não pode aceitar a linha decisória propugnada pela sentença recorrida.

25 - É inequívoco que o ato impugnado não teve em conta, nem considerou, minimamente que fosse e de um modo substantivo, as alegações da Recorrente em sede de audiência prévia.

26 - Neste sentido e para comprovação do que aqui se alega, basta comparar a fundamentação do ato impugnado com o documento n.° 4 junto com a petição inicial e que corresponde precisamente à pronúncia da Recorrente em sede de audiência prévia.

27 - Não sendo mesmo possível alegar mais do que isto, uma vez que a constatação é clara e direta no sentido aqui alegado.

28 - A audiência prévia pode ser inconsequente para a decisão final mas não pode nunca ser irrelevante.

29 - Mas no caso foi e, assim sendo, mostra-se materialmente violado o próprio direito de audiência prévia, à data consagrado nos artigos 100° e seguintes do CPA.

30 - Assim como se mostra igualmente violado o dever de fundamentação, uma vez que verdadeiramente não se mostram considerados todos os elementos relevantes para a decisão.

31 - Conforme resulta do teor do documento n.° 4 junto com a petição inicial, a Recorrente rebateu e discutiu, de forma específica, todos e cada um dos pontos do relatório, todas e cada uma das imputações que lhe foram dirigidas.

32 - A essa posição substantiva o ato impugnado disse absolutamente nada, ignorando pura e simplesmente, de forma portanto manifestamente ilegal.

33 - Não se podendo aceitar a posição expressa pela sentença recorrida, a este propósito, nas páginas 54 a 57, uma vez que os excertos considerados e transcritos pela sentença recorrida não suportam coisa diversa daquilo que a Recorrente invoca.

34 - Pelo contrário: tais excertos apenas demonstram que o ato impugnado desconsiderou materialmente a pronúncia da Recorrente em sede de audiência prévia, uma vez que apenas constituem descrição formal de diligências e de conclusões.

35 - A Recorrente entende que o seu pedido de ressarcimento de danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos constantes da petição inicial, não se mostra prejudicado, devendo ser considerado nos seus precisos termos.

36 - A sentença recorrida, ao manter o ato impugnado, mostra-se também ferida dos vícios resultantes da falta de fundamentação legal da decisão; da falta de fundamentação fáctica e jurídica da imputação formulada contra a Recorrente; da falta de prova material; de erro no enquadramento jurídico dos factos reais; de erro de integração jurídica dos factos em causa na previsão das normas invocadas na decisão impugnada; da falta de fundamentação, por manifesta incongruência e patente insuficiência da invocada; de desrespeito substantivo pelo direito de audiência prévia da Recorrente enquanto interessada na decisão final.

37 - Mostrando-se concretamente violadas pela sentença recorrida as normas invocadas nas presentes alegações.

*O recorrido contra-alegou, terminando assim: «(…) 12.

A recorrente limita-se a discordar de alguns juízos de valor formulados na sentença recorrida, expressas sobre a fundamentação do acto impugnado, contidas na sentença mormente na página 40, nas páginas 41 a 43, a discordar do afirmado nas paginas 47 e 48, da sentença, e a páginas 54 a 57.

  1. Contudo, não assaca diretamente a cada uma dessas discordâncias ou alegações vicias concretos que afetem irremediavelmente, a sentença recorrida, ou exijam a sua alteração.

  2. Aliás, na formulação das conclusões apresentadas nas alegações de recurso jurisdicional, a recorrente não indica as normas jurídicas violadas na sentença, nem o sentido com que, no entender da recorrente, as normas que que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ser interpretadas e aplicadas (cfr. n.º2 do artigo 639 do CPC).

  3. Nesse contexto, há que considerar que a sentença recorrida especifica os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, os fundamentos respetivos estão de acordo com a decisão, e o tribunal pronunciou-se sobre todas as questões que deveria ter apreciado, pelo que nada impõe a alteração da decisão recorrida e da sua fundamentação, não tendo sido invocada qualquer nulidade que a afetasse e importasse conhecer (na aceção do artigo 668.º do CPC -antigo; 615CPCnovo).

    (…)»*O Exmª Procurador-Geral Adjunto junto deste tribunal não emitiu parecer.

    *Dispensando vistos, vêm os autos a conferência, cumprindo decidir.

    *Os factos, tidos com provados na decisão recorrida: 1) A Autora é médica de profissão, exercendo, à data de 13.05.2005, as funções de Directora do CSC e de Chefe do...

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