Acórdão nº 01675/17.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Junho de 2018

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução28 de Junho de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO AC & Filhos, SA, NIPC 5…32 deduziu acção administrativa de contencioso pré contratual contra a Administração Regional de Saúde do Norte, IP (ARSNorte), indicando como Contra Interessada FGS, Lda., todas melhor identificadas nos autos, insurgindo-se contra o acto que determinou a caducidade da adjudicação que lhe foi notificado em 28/08/2017, no âmbito do concurso público para adjudicação da empreitada do “Centro de respostas integradas de Braga - Adaptação e Remodelação das Instalações”.

Formulou o seguinte pedido: “(…) a) Ser anulado o ato administrativo de caducidade da adjudicação da proposta apresentada pela Autora e, em consequência, manter a adjudicação da proposta apresentada pela Autora; b) Ser anulado o ato final de adjudicação da proposta apresentada pelo concorrente FGS, Lda; c) Ser a Ré condenada a excluir a proposta da FGS, Lda, com as demais consequências de acordo com os fundamentos expostos supra”.

Por sentença proferida pelo TAF de Braga foi julgada improcedente a acção.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Autora concluiu: I.

Vem o presente Recurso interposto da, aliás, douta decisão que julgou improcedente o pedido da Recorrente; II.

Por mais respeito que o Tribunal recorrido nos mereça - que é, de facto, muito -, entendemos que, nos presentes autos, fez uma menos boa interpretação da factualidade e uma incorreta aplicação do direito; III.

As questões centrais que a Recorrente pretende ver esclarecidas por este Venerando Tribunal são, essencialmente, quatro: - A condenação da Recorrente e do seu Administrador pela prática do crime de abuso de confiança fiscal, é suscetível de configurar um crime que afete a honorabilidade profissional constituindo impedimento à participação em procedimentos de contratação pública, nos termos e para os efeitos do artigo 55.º, al. b), do CCP? - Considerando a Entidade competente para o efeito (IMPIC) que a Recorrente Preenche todos os requisitos de idoneidade/honorabilidade profissional para o acesso e permanência na atividade de construção e execução de empreitadas de obra pública, é legítimo à Recorrida decidir pelo contrário? - Por via da condenação pela prática do crime de abuso de confiança fiscal pode, ope legis e sem que lhe tenha sido aplicada como pena acessória a proibição do exercício da profissão em causa, ser a Recorrente impedida de participar em procedimentos de contratação pública? Subsidiariamente: - Um Concorrente que apresente documentos de submissão obrigatória (artigo 9.º, n.º 1., al. h), do Programa de Procedimento) contendo termos ou condições que violam aspetos da execução do contrato não submetidos à concorrência pelo Caderno de Encargos (Cláusula 41.ª, do Caderno de Encargos), tem de ser excluído? Vejamos, IV.

in casu o Tribunal o que entendeu que, o crime de abuso de confiança fiscal consubstancia um crime que afeta a honorabilidade profissional do Operador Económico, aqui Recorrente e, por via disso, decorre automaticamente (ope legis) do CCP a proibição da Recorrente celebrar contratos públicos; V.

Há erro de julgamento porque não decorre da lei ou de qualquer princípio jurídico que o crime de abuso de confiança fiscal consubstancie um crime contra a honorabilidade profissional, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 55.º, al. b), do CCP e no artigo 9.º, da lei 41/2015, de 03 de junho; VI.

O elenco dos crimes suscetíveis de afetar a idoneidade/honorabilidade profissional são aqueles que constam do artigo 9.º, da Lei n.º 41/20/5, de 03 de junho, sendo que, em parte alguma vêm referidos crimes tributários e fiscais, pelo que, o crime de abuso de confiança fiscal não é um crime suscetível de afetar a honorabilidade profissional, ao ponto de consubstanciar um impedimento à celebração de contratos públicos, nos termos do disposto no artigo 9.º, da lei n.º 41/2015, de 03 de junho e da alínea b), do n.º 1, do artigo 55.º, do CCP; VII.

Uma interpretação atualista da lei tendo em conta os elementos gramatical, histórico, sistemático e teleológico quando integrada num ordenamento vivo e, muito em especial, enquanto harmonicamente integrada na "unidade do sistema jurídico", aponta no sentido, claro e inequívoco, de que o crime de abuso de confiança fiscal não é um crime que afeta a honorabilidade profissional, suscetível de, por si só, constituir um impedimento à celebração de contratos públicos, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 55.º, n.º 1, al. b), do CCP; VIII.

Na interpretação do conceito de crimes que afetem a honorabilidade profissional deve atentar-se na natureza estritamente jurídica deste conceito, deve considerar-se excluído qualquer espaço de discricionariedade administrativa, uma vez que, não estamos num campo de juízos morais, referenciados em geral à honra ou honorabilidade da pessoa; IX.

A identificação sobre o que seja um crime que afete a honorabilidade profissional não pode deixar de exigir uma ligação íntima entre a conduta criminal e o exercício de uma profissão; terá de ser um crime relacionado com a conduta profissional e abrange, apenas, os delitos que se traduzem na violação de regras específicas de uma profissão, nomeadamente, os que se relacionam com a violação das leis de emprego, da saúde e da segurança no local de trabalho, com exigências ambientais relativas à empresa ou com a igualdade de acesso ao emprego; X.

Pelo que, o crime de abuso de confiança fiscal não consubstancia um crime que afete a idoneidade/honorabilidade profissional, nos termos e para os efeitos do disposto na alínea b), do artigo 55.º, do CCP; XI.

Resulta idas disposições conjugadas contidas no artigo 17.º, do Decreto-Lei n.º 11/2014; de 22 de janeiro e no artigo 3.º, do Decreto-Lei n.º 232/2015, de 13 de outubro, que a competência exclusiva para regular e fiscalizar o setor da construção, para atribuir os títulos habilitantes para o exercício das diversas atividades do setor da construção e das empreitadas de obra pública e para verificar as respetivas condições de permanência na atividade compete ao IMPIC; XII.

Tendo o IMPIC conhecimento da situação em que se encontra a Recorrente considerou que esta detinha a necessária idoneidade/honorabilidade para o exercício da profissão, para a participação em procedimentos de contratação pública e para a celebração de contratos públicos, sendo ilegítimo à Recorrida considerar o contrário; XIII.

Há erro de julgamento porque a proibição de participação, ao contrário do que a norma ínsita na al. b), do artigo 55.º, do CCP aparenta, não pode decorrer automaticamente da lei, sendo necessário que haja sido aplicada ao impedido, como pena acessória, a proibição do exercício da profissão em causa; XIV.

O entendimento propugnado pela Recorrida e pelo Tribunal a quo, no sentido de que proibição do exercício da profissão decorre automaticamente do CCP (ope legis) é inconstitucional, por violação do artigo 30.º, n.º 4, da CRP; XV.

A norma ínsita na alínea b), do artigo 55.º, do CCP, é materialmente inconstitucional, por violação do artigo 30.º, n.º 4, da CRP, por impor de forma automática, mecânica, independentemente de decisão judicial, por efeito direto da lei (ope legis), uma pena de perda de direitos profissionais, que tanto pode querer significar perda definitiva, como incapacidade ou Impossibilidade temporária de os exercer, isto porque, nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais, ou políticos; XVI.

Inconstitucionalidade que expressamente se Invoca; XVII.

E é só isto quanto interessa para o bom julgamento do presente recurso, uma vez que, no caso, foi declarada a caducidade da adjudicação a favor da Recorrente em virtude de esta, e o seu Administrador, terem sido condenados pela prática de crimes de abuso de confiança fiscal, tendo o Recorrido considerado a Recorrente como "impedida" de celebrar contratos públicos, sem que, (i) decorra da lei que o crime de abuso de confiança fiscal integra o elenco dos crimes referidos na alínea b), do artigo 55.º, do CCP e do artigo 9.º, da lei 41/2015, sem que, (ii) o IMPIC assim o considere e, sem quer, (iii) tenha sido aplicada, pelo Tribunal, qualquer sanção acessória de proibição de exercício da profissão; Sem prescindir e SUBSIDIARIAMENTE, DA EXCLUSÃO DA PROPOSTA DA CI; XVIII.

O artigo 9.º, n.º 1, al. h) do Programa de Procedimento, sob a epígrafe "Documentos que instruem a proposta" estabelece que: "1- A proposta deve ser constituída pelos seguintes documentos: h) Declaração do concorrente com indicação dos responsáveis pela orientação da obra, acompanhada dos respetivos certificados de habilitações literárias e profissionais, designadamente dos: Diretor técnico da empreitada;" XIX.

O único elemento submetido à concorrência é o preço, logo a referida declaração, acompanhada dos respetivos certificados de habilitações, era um documento da proposta que contém termos ou condições, nos termos das disposições conjugadas do artigo 57.º, n.º1, al. c), do CCP; X.

As exigências a que devia obedecer esse documento (os seus termos e condições) encontravam-se previstas na Cláusula 41ª do Caderno de Encargos; XXI.

De acordo com o disposto na Cláusula 41ª do Caderno de Encargos, durante a execução do Contrato, o empreiteiro é representado por um Diretor Técnico da Empreitada, com a qualificação mínima de Engenheiro Civil; XXII.

Tendo a CI instruído a sua proposta com uma declaração onde refere que o Diretor Técnico da Empreitada seria um "Técnico Superior Construção Civil", a proposta viola termos e condições do Caderno de Encargos, sendo tal violação culminada com a sanção de exclusão (vide artigo 70.º, n.º 2, al. b), do CCP); DO NÃO AFASTAMENTO DO EFEITO ANULATÓRIO: XXIII.

O Tribunal a quo considerou que, ainda que se verificasse a invalidade da adjudicação à CI por dever ser excluída, tal ilegalidade/invalidade/anulação não traz qualquer vantagem para a Autora...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT