Acórdão nº 03207/09.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução26 de Outubro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

RELATÓRIO Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: SFUHSJ – SF, LDA., com sede no HSJ, Alameda P…, Porto, instaurou acção administrativa especial de impugnação dos actos da autoria do Conselho de Administração do HSJ, E.P.E., constantes da Deliberação de 10/09/2009, no âmbito da qual se decidiu a caducidade da adjudicação (à Autora) do contrato de concessão de serviço público objecto do Concurso Público nº 31000807 - “Instalação, abertura e funcionamento de Farmácia de dispensa de medicamentos ao público, no HSJ, EPE” e a adjudicação do mesmo contrato à Contrainteressada, e o consequente contrato celebrado entre a Entidade Demandada e a Contrainteressada, contra o HSJ, E.P.E., identificando como Contrainteressada a empresa SCFH - SCFH, S.A., com sede na Rua D…, 3260 - 424, Figueiró dos Vinhos.

Pediu a procedência da acção e, em consequência, que os actos impugnados sejam: i) Anulados por vício de forma, atenta a ofensa de norma procedimental imperativa (cfr. art. 100º do CPA); Ou, se assim não se entender, ii) Anulados por vício de violação de lei, atenta a ofensa do disposto nos artigos 5º/2 e 6º-A do CPA; Ou, se assim não se entender, iii) Anulados por vício de violação de lei por erro nos pressupostos de direito, atenta a errada interpretação do artº 105º/1/1ª parte do CCP; Em todos estes casos, deverá ser anulado o contrato de concessão celebrado com a Contrainteressada, atenta a invalidade consequencial deste contrato (artº 185º/ 1 do CPA). Para o caso de assim não se entender, pediu a anulação do contrato celebrado com a Contrainteressada por vício de violação de lei, atenta a ofensa do artº 104º/1/a) em concatenação com o artº 77º/1, ambos do CCP.

O TAF do Porto decidiu assim: julga-se a presente acção administrativa especial totalmente procedente, anulando-se a Deliberação de 10.09.2009 do Conselho de Administração do HSJ, E.P.E., na qual se decidiu a caducidade da adjudicação (à Autora) do contrato de concessão de serviço público objecto do Concurso Público n.º 31000807 – “Instalação, abertura e funcionamento de Farmácia de dispensa de medicamentos ao público, no HSJ, EPE” (adiante “Concurso”) e a adjudicação do mesmo contrato à Contrainteressada, anulando-se, ainda, o consequente Contrato n.º 17/2009 celebrado entre a Entidade Demandada e a Contrainteressada.

Deste acórdão vêm interpostos recurso.

A entidade Demandada recorre ainda da decisão proferida em sede de despacho saneador no segmento em que declarou improcedente a excepção de caducidade e considerou não ser necessário abrir um período de produção de prova.

*Alegando, o HSJ, E.P.E. formulou as seguintes conclusões: 1- A matéria factual vertida nos artigos 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 10º, 15º, 16º, 17º, 21º, 22º, 23º, 48º, 52º, 118º, 119º, 121º e 122º, da contestação de fls….é matéria controvertida que o Tribunal “a quo” não incluiu (e devia ter incluído) na selecção da matéria de facto de fls., bem como a necessidade e essencialidade da produção da demais prova requerida e a realização da respectiva inquirição de testemunhas.

2- Há factos controvertidos que carecem de produção de prova, pelo que terá que se abrir o necessário e respectivo período de instrução, sob pena de os factos alegados pelo Recorrente e as várias soluções plausíveis para as várias questões de direito que se levantam, ficarem prejudicadas, o que é uma violação insuportável do direito constitucional e comunitário à tutela jurisdicional efectiva, 3- A decisão recorrida de fls. deve ser revogada e substituída por outra que ordene a produção de prova, procedendo-se à selecção da matéria de facto controvertida e se dê lugar à apreciação e admissão dos respectivos requerimentos probatórios, sob pena de violação dos artigos 20º CRP, 2º, 7º, 8º, 87º, nº 1, c), 90º do CPTA e 513º, 514º, 515º, 516º, 545º, 655º, nº 2659, nº 3 e 668º do CPC e do princípio da tutela jurisdicional efectiva consagrado na Constituição da República Portuguesa, mas também, no plano internacional, da Convenção Europeia de Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, vulgo Convenção Europeia dos Direitos do Homem, do Tratado da União Europeia, da Carta Europeia dos Direitos do Homem e da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça da União Europeia.

4- O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem já afirmou, em múltiplos acórdãos, que, por força do direito fundamental dos particulares a um processo equitativo, “… o tribunal tem a obrigação de proceder a um exame efectivo dos meios, argumentos e elementos de prova oferecidas pelas partes”, não sendo admissível que desconsidere liminarmente, por entender desnecessária, in casu, a prova testemunhal, ainda antes de a mesma se realizar, privando a parte de recorrer a todas as armas que tem à sua disposição e violando, também, a própria estrutura do processo administrativo enquanto processo de partes e onde vigora o princípio do dispositivo (cfr. Acórdão do TEDH, Kraska, de 19 de Abril de 1993, A 254-B, pág. 49, § 30; Decisão de 20 de Maio de 1996, Queixa nº 24.667/94, Déc. Rap. 85-A, pág. 103; e IRINEU CABRAL BARRETO, ob. cit., pág. 165).

5- O artigo 47º, parágrafo segundo, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, cujo valor jurídico vinculativo é reconhecido no artigo 6º nº 1 do TUE, estabelece que “Toda a pessoa tem direito a que a sua causa seja julgada de forma equitativa…”, sendo que, como resulta do supra exposto, o direito a um processo equitativo é um corolário do princípio da tutela jurisdicional efectiva.

6- A jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia tem vindo a afirmar, desde a década de 60, o princípio da tutela jurisdicional efectiva, no seu sentido mais amplo.

7- O Tribunal deve ordenar, ao abrigo do artigo 267º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia, para a interpretação a dar ao artigo 6º do Tratado da União Europeia e ao artigo 47º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, questionando-o se aqueles artigos deverão ser interpretados no sentido de não admitir, sob pena de violação do direito fundamental a um processo equitativo, que os órgãos jurisdicionais não permitam, em sede de instrução, que as partes ofereçam e realizem a prova requerida. E, ainda, por outro lado, qual a interpretação daqueles mesmos artigos no caso de o Tribunal dispensar a fase de produção de prova quando há factos controvertidos e ainda quando os factos a provar sejam essenciais e/ou indispensáveis ao apuramento de factos alegados pelas partes e que ainda não se considerem provados pela prova realizada até essa fase processual.

8- A matéria referente à natureza do contrato é matéria de interpretação e direito e não matéria de facto e, por isso o Tribunal “a quo” apenas podia ter dado por assente a existência do referido contrato, do seu teor e de como o mesmo é denominado (é apenas neste sentido que se pode interpretar a matéria de facto dada por assente nas alíneas A), C), G), H), L), Q) a fls. 231, 232 e segs. do douto despacho recorrido).

9- Importa interpretar a natureza do contrato em causa e o âmbito de aplicação do artigo 100º do CPTA incluindo a Directiva 89/665/CEE de que o contencioso pré-contratual é transposição. Da análise das cláusulas que constituem o referido contrato resulta que o mesmo será um contrato misto onde predomina claramente matéria que permite determinar que se trata de um contrato de fornecimento de bens e prestação de serviços farmacêuticos, sendo aliás, esta última a sua actividade central. (cfr. doc. fls. 661/SA e segs. do p.a.; alíneas B) e C) (artigo 2º nº 2; artigo 15º, 26º) L) Q) e BB) (cláusula 7ª) da matéria de facto assente do douto acórdão recorrido de fls..

10- Não restam dúvidas quanto ao facto de se enquadrar no âmbito do artigo 100º do CPTA e da Directiva 89/665/CEE de que o contencioso pré-contratual é transposição. Assim, quando a acção foi instaurada já havia caducado o direito de acção atento o prazo do artigo 101º do CPTA. E ao entender o contrário o douto despacho recorrido violou o disposto no artigo 9º do C.C., 100º e segs. do CPTA mas também a Directiva Recursos (nº 89/665/CEE, do Conselho, de 21 de Dezembro e 92/13/CEE) e as Directivas nºs 92/50/CEE, do Conselho de 18 de Junho; 93/36/CEE e 93/37/CEE, do Conselho de 14 de Junho.

Acresce que, 11- No acórdão de fls., foi dada por assente matéria de facto que não havia sido dada por assente no despacho saneador de fls., sendo que, o Tribunal “a quo” deu por assente que o procedimento visava a celebração de um contrato de concessão, instalação, abertura e funcionamento da farmácia de dispensa de medicamentos ao público no HSJ. (cfr. matéria de facto dada por assente nas alíneas A), C), G), H), L), Q) do douto acórdão de fls.) 12- As datas dadas por assentes nas alíneas Y), Z), AA), BB) e CC) da matéria de facto, não têm qualquer correspondência com as datas reais e que constam dos próprios documentos, provavelmente qualquer lapso de escrita que importa rectificar.

13- Não se vislumbra qualquer razão para que o Tribunal “a quo” não tenha dado por assente a matéria factual vertida no artigo 18º, 19º e 20º da contestação. Pelo menos, devia ter dado por assente que a Autora instaurou neste Tribunal a acção de contencioso pré-contratual que corre termos sob o nº 2362/07.0BEPRT dando-se por reproduzida a respectiva p.i. onde a Autora peticiona a anulação do acto de adjudicação do contrato à também aqui Autora e a anulação da celebração do contrato com a Autora. (cfr. doc. 1) 14- O Tribunal “a quo” tinha ainda de levar ao questionário a matéria de facto controvertida que consta do artigos 14º, 15º, 16º, 17º, 21º e 22º da contestação de fls., por se tratar de matéria de facto relevante para a decisão da causa que não depende exclusivamente de produção de prova documental e que só através do recurso à prova pericial e testemunhal é que é possível dar como assente.

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