Acórdão nº 00003/02.0BUPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Outubro de 2018

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução03 de Outubro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório HCV, Lda.

, NIF n.º 5…59, com sede na Rua C…, em Vila Nova de Gaia, interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 28/01/2016, na parte em que julgou improcedente a Impugnação Judicial deduzida contra a liquidação fiscal aduaneira n.º 900.060, de 26/06/2002, no montante de €27.995,46, relativa a imposto sobre o álcool e as bebidas alcoólicas (IABA), efectuada pela Direcção Regional de Contencioso e Controlo Aduaneiro do Porto no âmbito do processo de cobrança a posteriori DCA/CA/1-68/02.

*A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “1.ª – O objecto do recurso é, pois, a errada interpretação e aplicação da lei – dos artigos 35º, 6, al. b) do CIEC (DL566/99, de 22/12); 5º, 55º, 58º, 59º, 1, 72º, 73º, 74º, 2, 75º, 1, 99º, 1, da LGT; 100º, 1 e 115º do CPPT; e 20º, 4 e 266º, e 2, da CRP – operada pela douta sentença recorrida relativamente às 3 (três) situações em que não foi anulada a liquidação, a saber: a) “Expedição de 378 garrafas de brandy C... para M... Portugal, sediada na Alemanha” (ponto 2 a pp 27 da sentença); b) “Expedição de 6 garrafas de brandy C... para a embaixada de Portugal em Manila” (ponto 3 a pp 28 da sentença); c) “Expedição de 9120 garrafas de brandy C... para SGP” (ponto 4 a pp 28 e 29 da sentença).

  1. A questão a decidir é a de saber se o apuramento dos regimes de suspensão (circulação) de produtos sujeitos a IEC de cada uma das 3 situações em causa pode ser provado pelo expedidor com base noutros meios de prova em Direito permitidos, quando não recepcionou o exemplar 3 do DAA (exemplar de reenvio) previsto no artigo 35º, 6, al. b), do CIEC (DL 566/99, de 22/12).

  2. Os pontos comuns às 3 situações e relevantes para a boa / justa decisão da causa são: (i) a existência de basta prova documental (excepto na 2ª situação), não impugnada não contestada nem impugnada, que provam com segurança e certeza bem razoáveis a realização das operações comerciais em causa; (ii) a verificação da efectiva intervenção de autoridades aduaneiras e do próprio Instituto do Vinho e da Vinha (IVV) na 1ª e 3ª situações; (iii) e ainda o facto de em todas as 3 situações existirem documentos comerciais, fiscais e contabilísticos idóneos que, conjugadamente, revelam com segurança e certeza a verificação do facto de nas operações descritas dever considerar-se apurado o regime de circulação.

  3. Relativamente às declarações e outros elementos dos contribuintes, bem como os dados e apuramentos inscritos na sua contabilidade, a lei determina que se devam presumir de verdadeiras e de boa-fé (art. 75º, 1 da LGT).

  4. Aliás, a factura não se limita a provar a facturação (como se diz na douta sentença recorrida no início de fls. 28), pois em termos económicos, é um documento emitido pelo vendedor, do qual constam as condições gerais da transacção (isto é, a relação dos artigos compreendidos numa operação comercial) e o apuramento do valor a pagar pelo comprador. Trata-se da conta detalhada destas operações, compreendendo factores como a quantidade, o peso, a medida e o preço.

    Trata-se, pois, de um documento da maior relevância nas transacções comerciais e que goza de presunção de veracidade (vd., v.g. na LGT os arts 75º (presunção de veracidade) e 72º (meio de prova)); e em termos fiscais, as facturas constituem também documentos da maior importância jurídica. Na verdade, a entidade transmitente dos bens está obrigada a emitir uma factura relativamente a cada transmissão de bens, qualquer que seja a qualidade do respectivo adquirente (vd., art. 29º, 1, al) b) do CIVA). Também de acordo com o disposto em normas tributárias, a factura deve obedecer a determinada forma, detalhadamente regulada nos artigos 36º do CIVA e 5º do DL nº 198/90, de 19/06. De resto, é com base neste documento (factura) emitido pelo fornecedor dos bens que o adquirente, quando se trate de um operador económico, irá deduzir o IVA a que tenha direito (vd., art. 19º, 2, do CIVA). E é com base na facturação emitida que o fornecedor dos bens deverá contabilizar os respectivos rendimentos, conforme decorre do disposto na alínea b) do nº 2 do artigo 123º do CIRC. Portanto, desde que emitidas na forma legal e constituam elementos de suporte dos lançamentos contabilísticos em contabilidade organizada de acordo com a legislação comercial e fiscal, os dados que delas constem são abrangidos pela presunção de veracidade a que se refere o artigo 75º, 1, da LGT. Daí que não possa deixar de se considerar que as mesmas podem e devem constituir, só por si, prova bastante das transmissões invocadas pela recorrente! 6ª Na 1ª e na 3ª situações, o IVV (Instituto do Vinho e da Vinha) exerceu a sua estatutária acção de controlo, consistente – esclareça-se – na validação (prévia) do sistema de expedições e exportações dos vinhos de mesa e dos brandis por parte das empresas sediadas em território nacional (o IVP funciona equivalentemente para os vinhos do Porto), devendo as empresas, quando do processamento de DAU ou de DAA enviar uma cópia para o IVV (cópia do exemplar 1-A dos DAA). Portanto, o IVV acompanhava, deste modo, os fluxos de saída ou de movimento deste tipo de produtos das empresas sob seu controlo, para além de poder fazer auditorias de acordo com o seu planeamento de acção.

  5. E em relação a estas 1ª e 3ª situações existiu ainda intervenção das próprias autoridades aduaneiras, designadamente da alfândega de controlo (Leixões)! Com efeito, Na 1ª situação, a alfândega alemã devolveu directamente à alfândega portuguesa (Leixões) os exemplares 2 a 4 do DAA (vd. docs 12 a 14 da PI), o que torna incompreensível a conclusão da sentença recorrida; Na 3ª situação, estamos a referirmo-nos a movimentos entre entrepostos do mesmo Grupo (SGP), ambos controlados pela mesma estância aduaneira (Leixões).

    E neste particular, para além dos registos contabilísticos das empresas e dos respectivos entrepostos fiscais em causa, a verdade é que os exemplares 4 dos DAA (destinados à estância aduaneira de destino, no caso, a mesma, Leixões) foram entregues e registados no Livro de Protocolo desta alfândega, como se comprovará também documentalmente).

  6. Acresce que na 3ª situação nem houve entrada dos produtos em consumo (circularam entre entrepostos fiscais), ou seja, nem sequer se verificou o movimento de exigibilidade do imposto (artº 7º do CIEC).

  7. A douta sentença recorrida errou na interpretação e aplicação da lei, na medida em que desprezou em absoluto a basta e idónea (e não impugnada na sua genuinidade) prova documental junta os autos, o valor comercial e fiscal das facturas e da restante documentação contabilística e fiscal da recorrente e ainda a prova documental produzida.

  8. Ao interpretar-se a norma do artigo 35º, 6, al. b) do CIEC (DL 566/99, de 22/12) de forma literal, restritiva e desconsiderando-se as restantes normas e princípios jurídicos de relevância legal e constitucional ao caso aplicáveis, a sentença recorrida enferma ainda de inconstitucionalidade, por violação dos artigos 20º, 4 e 266º, 1 e 2 da CRP e dos princípios aí consignados, como os do processo equitativo, da proporcionalidade e da justiça (material) e da legalidade.

  9. Na douta sentença recorrida foram, pois, violados, para além do artigo 35º, 6, al.) b), do CIEC (DL 566/99, de 22/12), normas e princípios jurídicos que enformam o direito fiscal aplicável, designadamente, os arts. , 55º, 58º, 59º, 1, 72º, 73º, 75º, 1, 99º, 1, da LGT; 100º, 1 e 115º do CPPT; e 20º nº 4 e 266º, 1 e 2 da CRP: Termos em que o presente recurso deverá ser julgado procedente e, em consequência, revogada a sentença recorrida e a mesma substituída por acórdão que declare anulada a liquidação também relativamente às 2ª, 3ª e 4ª situações em recurso.

    *Não houve contra-alegações.

    *O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso.

    *Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

    *II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa analisar se a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao decidir que, em três situações em causa, os produtos terão sido introduzidos no consumo devido à falta de apresentação dos documentos oficiais legalmente previstos, estando em apreço saber se o apuramento dos regimes de suspensão (circulação) de cada uma das três situações pode ser provado pelo expedidor com base em outros meios de prova, por não ter recepcionado o exemplar 3 do DAA (exemplar de reenvio), previsto no artigo 35.º, n.º 6, alínea b) do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo (CIEC).

    1. Fundamentação 1. Matéria de facto Na sentença prolatada em primeira instância foi proferida decisão da matéria de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT