Acórdão nº 02349/06.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução26 de Janeiro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

NS – GPSSVI, S.A.

, id. nos autos, interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF do Porto, que julgou improcedente acção comum ordinária por si intentada contra o Estado Português.

A recorrente remata o seu recurso com as seguintes conclusões: 1ª - A sentença recorrida julgou como não provados os quesitos 12º, 25º, 29º, 30º, 31º e 32º da base instrutória.

  1. - A sentença recorrida deu como provado o quesito 10º da base instrutória, mas em termos mais restritos do que os enunciados no mesmo, sendo que não se encontra na sentença qualquer fundamentação para a restrição à matéria provada, não podendo deixar de se refutar tal entendimento face à abundante prova testemunhal e documental constante dos autos quanto a esta matéria, devendo a resposta ao quesito 10º da base instrutória ser integralmente positiva, nos seguintes termos “esta via de comercialização [indústria farmacêutica] ficou vedada à Autora, porquanto a indústria farmacêutica visava atingir o mesmo universo de médicos que o Ministério da Saúde”.

  2. - Julgou a sentença recorrida como não provada a matéria de facto descrita no artigo 12º da base instrutória, nos termos do qual se indagava se: “Foi o Ministério da Saúde a impor que fosse o Saúde XXI (e não qualquer outra fonte de financiamento – nomeadamente o PIDDAC) a suportar o projecto, porque ele, à data da decisão – primeiro trimestre de 2003 -, se encontrava em sub-execução e, portanto, não só com verbas amplamente disponíveis para o efeito, mas até com necessidade de a ele serem alocados projectos, sob pena de perda, pelo Estado Português, dos recursos disponibilizados?”, sendo várias e abundantes as referências documentais e testemunhais constantes dos autos quanto ao facto de ter sido o Ministério da Saúde a escolher o programa operacional Saúde XXI como fonte do financiamento do projecto em causa, não podendo ser outra a decisão que não seja a de dar por integralmente provado aquele quesito.

  3. - A sentença recorrida julgou ainda como não provada a matéria constante do quesito 25º da base instrutória, onde se questionava se a execução das diligências descritas no quesito 24º havia significado encargos não inferiores a 7.500.000 €, sendo que importava neste quesito saber se a execução das diligências descritas no quesito 24º da Base Instrutória haviam ou não gerado encargos para a Autora, e quanto a este particular aspecto existe claro erro de julgamento da matéria de facto por parte da sentença recorrida, pois ainda que se conceda em não ter sido feita prova cabal do valor do prejuízo de 7.500.000 €, é irrefutável que ficaram demonstrados avultados prejuízos nesta sede.

    5º - A mesma argumentação aplica-se in totum à decisão de dar como não provado o quesito constante do artigo 29º da base instrutória, nos termos do qual se perguntava se o desenvolvimento da tecnologia caneta e papel digital representou “um investimento na ordem dos 500.000 €”, sendo que ficou provado que os encargos da Recorrente com aquele desenvolvimento da tecnologia de caneta e papel digital ascenderam a 500.000 € - ou pelo menos concluir, e dar por provado, que a Recorrente efectivamente teve encargos com a execução daquela tecnologia.

  4. - Quanto à matéria constante do quesito 30º, igualmente dada como não provada pela sentença recorrida, a Recorrente igualmente não se conforma com tal entendimento, sendo que há que concluir que o quesito em causa deverá ser dado como integralmente provado, na medida em que a prova produzida efectivamente aponta para que a motivação da Recorrente para suportar os encargos decorrentes dos desenvolvimentos realizados assentou na sua forte convicção, induzida pelo comportamento do Recorrido, quanto à efectivação dos compromissos a que se vinculou no Protocolo.

  5. - A sentença recorrida erra ao dar como não provada a matéria constante do artigo 31º da base instrutória, em que se perguntava se “A autora sofreu um lucro cessante mínimo estimado em 53.935.000,00 €, acrescido de IVA e IRS?”, pois nunca se poderia deixar de admitir como certa a ocorrência de lucros cessantes, em caso de ruptura das negociações, bem como, quanto à quantificação dos lucros cessantes preconizada pelo Estudo e peticionada pela Recorrente, sempre se afirme que o montante em causa deve igualmente ser dado por provado, deixando apenas a liquidação do valor dos prejuízos em causa para posterior execução de sentença, caso não seja possível apurar nesta sede.

  6. - O estudo de lucros cessantes foi realizado por um académico reconhecido, com larga experiência e especializado precisamente neste tipo de exercícios, pautando-se todos os pressupostos utilizados por critérios de elegibilidade razoáveis e até conservadores, sendo que a sentença recorrida não refuta nenhum dos critérios ou elementos utilizados para a calcular a estimativa de lucros cessantes caso o contrato final tivesse sido executado, com excepção de um: o prazo do contrato, assumido pelo estudo como de 5 anos.

  7. - A fixação da duração do contrato em 5 anos decorreu de uma imposição expressa do programa operacional Saúde XXI relacionada com um prazo mínimo de afectação do investimento, sendo que a Recorrente respondeu aceitando passar a considerar o package NTM com prazo de 5 anos, tal como solicitado pelo programa Saúde XXI.

  8. - Mesmo que se entendesse não ser possível quantificar nesta sede o valor concreto dos lucros cessantes, então manda o artigo 609º, n.º2 do CPC que se após a produção de prova o Tribunal vier a entender que não foi feita prova dos montantes quesitados, então deverá remeter a sua liquidação para execução de sentença.

  9. -A sentença recorrida dá como não provados os factos quesitados no artigo 32º da base instrutória, sendo o erro de julgamento quanto a este quesito é claro e flagrante.

  10. - No que respeita à alínea a) do mesmo, não há como ignorar a prova abundante no processo quanto aos danos infligidos à Recorrente para além dos lucros cessantes, a começar pelos encargos que esta suportou para proceder aos desenvolvimentos necessários no produto NTM em decorrência das obrigações que assumiu no Protocolo celebrado com o Recorrido.

  11. - Acresce que decorre extensamente na matéria de facto assente da sentença recorrida que a Recorrente, por força da actuação do Recorrido, sofreu danos relativos à perda de chance de celebração de outros contratos, devendo ainda ficar igualmente provado que o acesso à indústria farmacêutica ficou vedado.

  12. - Acresce que, ficou ainda provado no ponto 46 da matéria de facto assente que a empresa MS & D Lda. representava uma oportunidade de negócio para um alvo de 4.000 a 5.000 médicos.” e que a MG solicitou a revogação de um contrato já celebrado no valor de 467.856,00 € (ponto 3 da matéria de facto assente da sentença recorrida), pelo que tudo obriga a que se conclua que a Recorrente sofreu outros danos patrimoniais, conforme alegado na al. a) do quesito 32º da base instrutória.

    15º - O Recorrido, ao arrepio e afronta do seu mais elementar dever de boa-fé negocial, procedeu a uma ruptura totalmente injustificada da relação negocial existente, na medida em que as negociações em causa já tinham alcançado um desenvolvimento material e até formal que permitiam e justificavam que a Recorrente se pudesse julgar, com toda a legitimidade, autorizada a confiar na conclusão do contrato, ou contratos, que se seguiriam.

  13. - De uma atenta e cuidadosa análise do teor do protocolo celebrado entre as partes, bem como das subsequentes posições negociais e manifestações publicamente assumidas pelo Recorrido, decorre que o mesmo esgotou definitivamente a sua liberdade contratual à celebração do contrato negociado, bem como induziu a Recorrente à legítima confiança de que o mesmo nunca se deixaria de celebrar por falta de vontade do Recorrido.

  14. - Ao contrário do que sustenta a sentença recorrida, é precisamente por uma mudança de vontade (política, diga-se) do Recorrido, que se consuma o incumprimento, e consequente ruptura, de todo o processo negocial encetado entre as partes.

  15. – Os diversos actos praticados pelo Recorrido incutiram na Recorrente uma confiança plena e justificada na concretização do negócio.

  16. - Tendo mudado os actores políticos, mudaram igualmente as vontades políticas, sendo que a partir de então, este processo negocial que era assumido como uma prioridade, deixou imediatamente de o ser, tornando absolutamente claro o abandono a que foi votado o projecto pelo novo executivo, que nele não via interesse e nem o considerava prioritário.

  17. – É de sufragar o entendimento do parecer oportunamente junto da autoria do Professor Doutor Mário Aroso de Almeida, nos termos do qual, e com a devida reserva quanto à complexidade da questão, se conclui por aquilo a que a doutrina vulgarmente designa por “acordo de princípio”, e de que existe “uma clara instrumentalidade dos compromissos assumidos pela NS nos termos do protocolo em relação aos contratos a celebrar, no futuro, com as ARS’s – funcionando o compromisso que, na mesma sede, é assumido pelo Ministério da Saúde como o indispensável elo de ligação entre os dois elementos”.

  18. - “A doutrina é unânime no reconhecimento da relevância jurídica dos compromissos que, neste âmbito, são assumidos, designadamente para o efeito de reconhecer que a sua violação pode ser fonte de responsabilidade civil pelos danos daí resultantes. Não havendo contrato, não há, naturalmente, responsabilidade contratual. Mas há responsabilidade pré-contratual, fundada na violação do principio da boa fé – principio ao qual, de resto, as partes, na cláusula sexta, submeteram expressamente o protocolo aqui em análise.” 22º - O Ministério da Saúde se obrigou a “apoiar” a candidatura da ARS’s ao programa de incentivos comunitários “Saúde XXI”, sendo que apoiar, neste contexto particular, significa que o Ministério da Saúde contraiu um verdadeiro dever de zelo pela apresentação, tramitação e desfecho daquela candidatura enquanto instrumento de financiamento do NTM.

  19. - Isto é, o Ministério da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT