Acórdão nº 02773/11.6BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Janeiro de 2018

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução26 de Janeiro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO QM, Lda., pessoa colectiva nº ….., com sede na Rua ….., freguesia de Lordelo do Ouro, 4150 -228 Porto, instaurou acção administrativa especial contra o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I.P., pessoa colectiva nº 508 136 644, com sede na Rua Castilho, 45/51, 1269-164 Lisboa, pedindo a anulação da decisão deste identificada no artº 2º da petição inicial.

Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada procedente a acção e anulado o acto impugnado.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Réu formulou as seguintes conclusões: A. Por sentença proferida em 12/7/2017, pelo Tribunal foi julgada procedente a ação administrativa interposta pela sociedade QM, Lda e em consequência anulada a decisão proferida pelo IFAP, I.P. a decisão final IFAP, I.P., consubstanciada no ofício com a referência 19534/2011, no entendimento que ”o ato é, assim, ilegal por a entidade demandada ter interpretado erradamente as disposições em matéria de elegibilidade de despesas, designadamente por ter considerado o simples desconto do cheque como momento relevante de pagamento efetivo da fatura”.

B. Salvo melhor opinião, o Tribunal a quo não faz uma correta interpretação dos factos e aplicação do direito, pois a razão das ajudas pagas no âmbito do Programa Agro é reembolsar as despesas efetivamente realizadas e não financiar ab initio a execução de um projeto.

C. Na situação em apreço nos autos, conforme consta de relatório nº 28327 (Cfr. Doc. de págs. 261 a 267 do PA – documento que não consta da matéria de facto dada como), em sede de controlo foi constatada uma irregularidade, que se traduziu em não ter existido um efetivo pagamento da despesa antes da apresentação ao IFAP, I.P. do respetivo comprovativo de pagamento da despesa, pois como resulta do teor da sentença (pág. 13) que “… o referido cheque, datado de 08.08.2005, apenas veio a ser efetivamente descontado (ainda segundo o IFAP) em 15.12.2006, ou seja, após ter sido processada a autorização de pagamento”.

D. Entende o Tribunal a quo (pág. 16 da sentença recorrida) que, na situação em apreço, não há violação da regra da elegibilidade da despesa pelo pois “…não importa qual o momento em concreto em que o cheque foi descontado pelo fornecedor. Tendo o cheque sido emitido, e quitada a dívida pela emissão do recibo, não se pode fazer depender o pagamento efetivo do momento em que o fornecedor, no seu livre arbítrio, decide descontar o cheque.” E. Este entendimento não parece correto, pois as regras de elegibilidade estabelecidas nos termos da regulamentação comunitária (Regulamento (CE) n.º 1685/2000) estipulam que a despesa apenas é elegível quando efetivamente foi paga em data anterior ao pedido de pagamento.

F. Despesa efetivamente paga corresponde a um efetivo e real pagamento por parte dos beneficiários, sendo verificado através da análise das datas dos documentos de despesa e dos modos de pagamento, datas essas que constam da documentação a apresentar.

G. A demonstração do efetivo pagamento antes de apresentar o respetivo pedido de pagamento da despesa é condição sine qua non para a elegibilidade das despesas.

H. Relativamente à regra da elegibilidade das despesas, importa salientar a jurisprudência tem tido um entendimento unânime em considerar que a ratio das ajudas pagas no âmbito do programa agro é reembolsar as despesas efectivamente realizadas e não financiar ab initio a execução de um projeto, pelo que o pagamento da despesa deve ser contemporâneo do financiamento. (Neste sentido vide os acórdãos, proferidos pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 14/09/2012, 13/01/2011 e 20/03/2015, no âmbito do proc.s nºs 00033/10.9BEMDL, 01450/06.4BEVIS e 00660/10.4BEPNF) I. In casu, como resulta do teor da sentença (pág. 13) o “… o referido cheque, datado de 08.08.2005, apenas veio a ser efetivamente descontado (ainda segundo o IFAP) em 15.12.2006, ou seja, após ter sido processada a autorização de pagamento”.

J. Caso se considerasse que era suficiente a entrega dos cheques pela ora recorrida aos fornecedores, para a despesa se encontrar efetivamente realizada, tal entendimento desvirtuava por completo a natureza da ajuda.

K. Com efeito, aceitar-se que um beneficiário de uma ajuda no âmbito do Programa AGRO, possa entregar como comprovativo um cheque que na realidade só será descontado em momento posterior ao pagamento da ajuda (no caso concreto mais de um ano), é aceitar-se tudo aquilo que o legislador pretendeu evitar, nomeadamente, que o beneficiário da ajuda receba primeiro a ajuda e só em momento posterior proceda à entrega desse montante ao fornecedor.

L. Ou seja, é estar a aceitar-se o financiamento ab initio da execução de um projeto.

M. Para efeitos de ajudas comunitárias, uma despesa só pode ser considerada como efetivamente realizada quando haja o pagamento efetivo, nomeadamente a transferência de determinada quantia da conta do beneficiário para a conta do fornecedor.

N. Caso contrário, tal conduta, quer por parte do beneficiário da ajuda bem como do fornecedor (que emite a fatura), mais do que a prática de uma irregularidade administrativa, poderá mesmo configurar um verdadeiro ilícito criminal.

O. Aliás, tal conduta por parte do beneficiário da ajuda bem como do fornecedor, mais do que a prática de uma irregularidade administrativa, poderá configurar um verdadeiro ilícito criminal. (Neste sentido vide acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora em 18/06/2013, no âmbito do Proc. nº 9/10.6TDEVR.E1) P. Face ao exposto, verifica-se que houve por parte da recorrida a violação da regra da elegibilidade, pois não houve um efetivo pagamento da despesa antes da apresentação ao IFAP, I.P. do respetivo comprovativo de pagamento da despesa, pois como resulta do ponto 4) da matéria de facto dada como por provada pelo Tribunal a quo.

Q. Razão pela qual, salvo melhor opinião, a decisão do Tribunal em anular a decisão final, não parece ter sido correta, pelo que, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado e em consequência ser proferido acórdão revogando a sentença ora impugnada.

Termos em que deve o presente recurso ser admitido e julgado procedente por provado e em consequência ser proferido acórdão revogando a decisão recorrida, considerando-se válida a decisão final proferida pelo IFAP-IP, assim se fazendo JUSTIÇA! A Autora contra-alegou, sem conclusões, terminando deste modo: Nestes termos, deve o recurso ser julgado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida.

O MP não emitiu parecer.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1. A aqui Autora apresentou uma candidatura ao Programa Operacional de Agricultura e Desenvolvimento Rural, que tomou a designação de Agro Medida 1, à qual foi atribuído o número de projeto 2003110012709 – cf. documento de fls. 18 a 43 do processo administrativo apenso aos autos; 2. Na sequência da aprovação dessa candidatura, a Autora e o então Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas, I. P., outorgaram um contrato intitulado “De atribuição de ajuda ao abrigo do programa Agro – Medida 1: Modernização, Reconversão e Diversificação das Explorações Agrícolas”, pelo qual foi concedido à Autora o montante de € 29.536,20, a título de incentivo financeiro ao investimento, não reembolsável – cf. documento de fls. 134 a 138 do processo administrativo apenso aos autos; 3. No âmbito da execução do projeto aprovado a que vem de referir-se, foi realizada ação de inspeção pelos serviços do então Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas, I. P. (doravante, IFADAP) – cf. documento de fls. 228 do processo administrativo apenso aos autos; 4.

Por ofício datado de 26.01.2007, de referência 123/UI-Porto/2007, expedido por carta registada com aviso de receção que a Autora recebeu em 30.01.2007, os serviços do IFADAP comunicaram-lhe o seguinte: “(…) Na sequência da acção de verificação que se encontra em curso, incidente sobre a candidatura acima identificada, constatamos o seguinte.

- O cheque n.º ….. no valor de 53.782,05 euros emitido em 08.08.05, apenas foi movimentado no Banco em 15.12.06, isto é, depois do crédito em conta do subsídio, situação que equivale à existência de recibos de favor e pode conduzir à inelegibilidade desta despesa.

Atendendo ao referido, tem V. Exa(s) o prazo de 10 (dez) dias úteis, a contar da recepção desta carta, para nos informar(em) para a morada abaixo indicada sobre o que tiver(em) por conveniente sobre o assunto.

(…)”; Cf. documentos de fls. 246 e 247 do processo administrativo apenso aos autos; 5. A Autora respondeu por carta datada de 09.02.2007 – cf. documento de fls. 257 e 258 do processo administrativo apenso aos autos; 6. Em 04.10.2007, os serviços da entidade demandada elaboraram informação de referência n.º 328/DINV/SAG/2007, da qual consta, na parte que aos autos releva, o seguinte: “(…) No que se refere à acção de acompanhamento propriamente dita e quanto à execução física, o relatório refere que os investimentos se encontravam implementados de acordo com o aprovado, com excepção do muro de vedação em que só foi confirmada a construção de 425 metros dos 450 metros aprovados e comprovados. Embora a rubrica de investimentos referente à plantação da vinha não tenha ainda sido comprovada, verificou-se a instalação de 6,5 há de vinha, quando estava inicialmente previsto a plantação de 6,895 ha. Deste modo, e uma vez que no âmbito do Programa VITIS foram pagas ajudas para 5,625 ha, concorda-se com o proposto pelo serviço regional em considerar apenas elegível para efeitos deste projecto a plantação de 0,875 ha de vinha.

Relativamente à verificação contabilística o relatório conclui pela irregularidade do projecto devido à existência de um recibo de favor.

A factura n.º 62 no montante de 53.782,05€ (com IVA), emitida por “F, S. A.”...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT