Acórdão nº 00562/15.8BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelJoaquim Cruzeiro
Data da Resolução02 de Março de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO M51-A51 e AAAB vêm interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, datada de 24-06-2016, e que absolveu da instância, por falta legitimidade activa no âmbito da acção administrativa especial (por convolação - despacho de 9 de Fevereiro de 2015), intentada contra o Município de Ponte de Lima e onde era solicitado que:… C) Se digne considerar a matéria de facto e de direito aqui contidas e ordenar à requerida que proceda de imediato à criação do Conselho Municipal de Juventude, nos termos dos artigos 23º, 24º, 25º, 26º e 27º todos do Regime jurídico dos Conselhos Municipais da Juventude; D) Se digne ordenar ao Ministério Público a conduta da Requerida para os efeitos tidos por convenientes; E) E se digne fixar um prazo para a Ré proceder ao cumprimento dos actos legalmente impostos para a criação do Conselho Municipal da Juventude, nos termos legalmente previstos.

F) Se Digne Fixar o valor para sanção pecuniária compulsória ( cfr. artigos 44º e 169º do CPTA), a fixar segundo o critério do douto Julgador, por cada dia no atraso do cumprimento… .

Os recorrentes nas suas alegações de recurso apresentaram as seguintes conclusões: I.

Na petição inicial dos presentes autos a 1ª Autora apresentou-se como uma associação denominada por M51-A51, tendo identificado os seus estatutos.

II.

Se por um lado o 2º Autor é um membro eleito local do órgão deliberativo do Réu desde as eleições autarquias de 2013, a 1ª Autora é uma associação privada sem fins lucrativos com objecto social político e respectivo cae 94920, tendo sido constituída em 14-04-2014, por escritura pública e trinta outorgantes, naturais, recenseados e residentes no concelho de Ponte de Lima, III.

Na resposta, a Ré veio invocar nos itens iniciais a ilegitimidade dos Autores, porém, ambos os Autores têm legitimidade processual nestes autos de processo principal porque tinham para a acção popular também instaurada, ao abrigo do direito de acção popular, considerando e além disso a escritura pública e o respectivo cae 94920, IV.

… enquanto o 2º Autor, AAAB, é eleito local e membro da Assembleia Municipal do Réu, desde as eleições autárquicas de 2013.

V.

Ora, para serem partes legítimas é preciso antes de mais que tenham tido o poder de dirigir a pretensão deduzida em juízo, sendo que o pressuposto de legitimidade é que a posição das partes e a relação com a pretensão em juízo.

VI.

Nos termos do art.º 9.º, n.º 2, do CPTA independentemente de ter interesse pessoal na demanda, qualquer pessoa, bem como as associações e fundações defensoras dos interesses em causa, as autarquias locais e o Ministério Público têm legitimidade para propor e intervir, nos termos previstos na lei, em processos principais e cautelares destinados à defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos, como a saúde pública, o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território, a qualidade de vida, o património cultural e os bens do Estado, das Regiões Autónomas e das autarquias locais.

VII.

Sendo que os presentes autos, bem como os autos de processo de acção principal foram instaurados nos termos dos art.ºs 51.º e 52.º da Constituição da República Portuguesa, VIII.

Pois claro, dispõe o art.º 52.º, n.º 3, da CRP que: É conferido a todos, pessoalmente ou através de associações de defesa dos interesses em causa, o direito de acção popular nos casos e termos previstos na lei, incluindo o direito de requerer para o lesado ou lesados a correspondente indemnização, nomeadamente para: a) Promover a prevenção, a cessação ou a perseguição judicial das infracções contra a saúde pública, os direitos dos consumidores, a qualidade de vida e a preservação do ambiente e do património cultural; b) Assegurar a defesa dos bens do Estado, das regiões autónomas e das autarquias locais.

IX.

E que, ainda, dispõe o artigo 12º da Lei n.º 83/95, de 31 de Agosto que: A acção popular administrativa compreende a acção para defesa dos interesses referidos no artigo 1.º e o recurso contencioso com fundamento em ilegalidade contra quaisquer actos administrativos lesivos dos mesmos interesses.

X.

Todas estas normas foram expressamente violadas pela douta sentença.

XI.

Na verdade, salvo o devido respeito, errou a douta sentença na abordagem concreta da questão, pois, sublinha-se que a enumeração dos interesses difusos protegidos por lei (art.º 1.º, n.º 2, da LAP) é meramente exemplificativa e não taxativa.

XII.

E, além disso, é bom de ver que nos seus estatutos a ora Recorrente associação prevê no seu objecto social que: a) ser uma associação cívica, independente, de serviço imparcial e permanente; b) contribuir para a participação cívica e abertura à sociedade civil, no âmbito local, distrital, regional e nacional; c) promover a cidadania, a liberdade, a democracia; d) apoiar e defender a família; e) desenvolver e concorrer, com legitimidade activa e passiva, com candidaturas aos órgãos eleitorais, de âmbito local, distrital, regional e nacional; f) exercer toda a sua actividade “do povo, pelo povo e para o povo"; g) defender a dignidade da pessoa humana e os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos; h) promover a transparência, democracia, informação, legalidade das entidades públicas e seus actos e competências; i) cooperar com entidades públicas e privadas, podendo criar protocolos com entidades terceiras, em tudo o que se torne necessário para prosseguir os seus objectivos de serviço de todos os cidadãos.

XIII.

Pelo que dos estatutos da Recorrente associação não se pode encontrar qualquer controvérsia quanto à aplicação devida da al. b) do art.º 3.º da LAP que refere que constituem requisitos de legitimidade activa da associações e fundações o incluírem expressamente nas suas atribuições ou nos seus objectivos estatutários a defesa dos interesses em causa no tipo de acção de que se trate.

XIV.

Decorre da Lei que a defesa dos interesses em causa deve estar expressamente contida nas atribuições ou nos estatutos, porém, não decorre da norma legal que essa definição tem de ser minuciosa ao ponto de identificar os interesses difusos em pormenor.

XV.

Tal interpretação retiraria, de resto, a substância do direito previsto no art.º 2.º da LAP, vedando às diversas associações a defesa dos interesses difusos pertencentes ao círculo normal da sua acção estatutária.

XVI.

Pelo que, analisados os estatutos da associação recorrente e o objecto dos presentes autos, é bom de ver que tem interesse directo em demandar.

XVII.

É aqui mais uma vez pertinente acrescentar que, apesar de se tratar de uma formulação genérica, a redacção dos estatutos da Recorrente não é uma vaga referência aos princípios da legalidade e do Estado de Direito, que poderiam esvaziar de sentido concreto as exigências do art.º 3.º, al. a), da LAP.

XVII.

Pelo que deverá ser revogada a douta sentença e substituída por outra que julgue improcedente a excepção de ilegitimidade activa da Recorrente associação, prosseguindo os autos os demais trâmites até final.

Por outro lado, XIX.

Deveria em qualquer caso ser reconhecido, ad minus, o interesse indirecto da Recorrente na demanda, conforme o art.º 2.º, n.º 1, da LAP, que não obriga que a lesão seja directa.

XX.

Pois sempre seriam titulares do direito de acção quaisquer cidadãos no gozo dos seus direitos civis e políticos e as associações e fundações defensoras dos interesses previstos, independentemente de terem ou não interesse directo na demanda.

XXI.

Nesse sentido os estatutos da recorrente associação previram nos seus objectivos estatutários a defesa dos direitos dos cidadãos eleitores face aos partidos políticos: a) ser uma associação cívica, independente, de serviço imparcial e permanente; b) contribuir para a participação cívica e abertura à sociedade civil, no âmbito local, distrital, regional e nacional; c) promover a cidadania, a liberdade, a democracia; d) apoiar e defender a família; e) desenvolver e concorrer, com legitimidade activa e passiva, com candidaturas aos órgãos eleitorais, de âmbito local, distrital, regional e nacional; f) exercer toda a sua actividade “do povo, pelo povo e para o povo"; g) defender a dignidade da pessoa humana e os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos; h) promover a transparência, democracia, informação, legalidade das entidades públicas e seus actos e competências; i) cooperar com entidades públicas e privadas, podendo criar protocolos com entidades terceiras, em tudo o que se torne necessário para prosseguir os seus objectivos de serviço de todos os cidadãos.

XXI.

Assim deveria decidir-se cumprida a exigência legal quanto ao requisite de “no gozo dos seus direitos civis e políticos, as associações e fundações defensoras dos interesses em causa” – cfr. Art.º 2.º, n.º 1, da LAP.

XXIII.

O valor prosseguido na presente acção enquadra-se na noção de interesse difuso, pois, como se refere na douta sentença, a alegação dos Recorrentes era a seguinte: Pese embora interpelado por requerimento escrito, o Réu não procedeu à criação do “conselho municipal da juventude de Ponte de Lima”, nos termos do artigo 27.º, n.º 2, do Regime Jurídico dos Conselhos Municipais da Juventude.

Ora, a criação desse conselho municipal deveria ter ocorrido no prazo de seis meses desde 11/02/2012, apresentando-se como fundamental para direccionar as sinergias de diversas entidades em prol da protecção dos direitos consagrados nos artigos 64.º (direito à saúde) e 70.º (direito à juventude) da CRP.

XXIV.

Pelo que deverá ser revogada a douta sentença e substituída por outra que julgue improcedente a excepção de ilegitimidade activa da Recorrente associação, prosseguindo os autos os demais trâmites até final.

Por último, XXV.

O Recorrido terá cometido uma patente ofensa aos referidos princípios com um anúncio da prática duma ilegalidade e com este meio tenciona-se evitar a prática dessa ilegalidade, que é certa se não for travada e...

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