Acórdão nº 00430/14.0BEMDL-A de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Março de 2018
Magistrado Responsável | Joaquim Cruzeiro |
Data da Resolução | 16 de Março de 2018 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1 – RELATÓRIO C&C Lda.
vem interpor recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, datada de 16 de Maio de 2016, e que julgou improcedente a acção de execução intentada contra o Município de Ribeira de Pena, e onde se requeria que devia ser: “… a presente ação ser julgada procedente, por provada, e, em consequência, deve o Executado ser condenado a dar integral cumprimento e execução ao acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, transitada em julgado em 21.12.2015 e para tanto: a) Deve ser fixado um prazo para o Executado proceder à repetição do despacho de adjudicação da empreitada “Modernização e Recuperação da Piscina Municipal coberta de Ribeira de Pena”, nos termos definidos no supra citado acórdão (cfr. artigos 173.°, n.º 1 o 176.°, n.ºs 3 e 4 do CPTA), bem como deve ser determinada a aplicação de uma sanção pecuniária compulsória por cada dia de atraso (cfr. artigos 169.° e 176.°, n.º 4, 2ª parte do CPTA) …”*Em alegações a recorrente concluiu assim: 1 – A recorrente não pode concordar e aceitar o iter cognoscitivo trilhado pelo Tribunal a quo, na conclusão de que “(…) da leitura do acórdão parece resultar que se exige que o financiamento seja atual e não meramente que tenha existido a aprovação do financiamento no quadro da ON.2, que no caso ocorreu. É que, no caso em apreço, foi aprovado o financiamento da empreitada através de fundos comunitários, mas no momento em que foi proferido o acórdão do STA já não existia garantia do financiamento.”.
2 – O Tribunal a quo entendeu que o acórdão do STA condicionou, à data da sua prolação, a adjudicação da presente empreitada à aqui recorrente, condicionada à aprovação da candidatura apresentada à O... pelo Município e não à data da prática do ato ilegal e anulado.
3 - “O efeito direto da sentença de provimento do pedido de anulação é o efeito «constitutivo», que se traduz na invalidação do ato impugnado, eliminando-o desde o momento em que se verificou a ilegalidade, isto é, em regra, ressalvados os casos de ilegalidade superveniente, desde a sua prática – eficácia «ex tunc» da sentença.” “Salientou-se, por isso, na doutrina, por um lado, o dever, para a Administração, de executar a sentença, pondo a situação de facto de acordo com a situação de direito constituída pela decisão judicial de anulação – isto é, reconheceu-se e definiu-se a existência de um efeito “repristinatório” ou, mais amplamente, de um efeito reconstitutivo ou reconstrutivo da sentença, que impõe, na medida em que tal for necessário e possível (sem grave prejuízo para o interesse público), a reconstituição da situação que teria existido (deveria ter existido ou poderia ter existido) se não tivesse sido praticado o ato ilegal ou se o ato tivesse sido praticado sem a ilegalidade – princípio da reconstituição da situação hipotética atual.” 3 - Nesta esteira, vem o CPTA determinar em que consiste este dever de executar as sentenças de anulação de atos administrativos, vide art.º 173º nº 1 do CPTA, onde se afirma que “1 - Sem prejuízo do eventual poder de praticar novo ato administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado, a anulação de um ato administrativo constitui a Administração no dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado, bem como de dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento naquele ato, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter atuado.” Como consagração do princípio da execução efetiva pode impor-se à Administração, “(…) além da prática de atos com eficácia retroativa, para remediar os efeitos imediatos do ato anulado, o dever de remover, reformar ou substituir atos jurídicos e alterar situações de facto entretanto surgidas, cuja manutenção seja incompatível com a execução integral da sentença.” – art.º 173º nº 2 do CPTA.
4 - Por sua vez, tendo o STA, por acórdão que se deu à execução, anulado o ato administrativo de adjudicação da empreitada à concorrente TNG e condenado a Administração (Município de Ribeira de Pena) à adjudicação do concurso, à aqui recorrente, não pode vir esta recusar ou incumprir para com tal determinação.
5 - Foi esta a determinação do tribunal, proferida no quadro de competência próprio e em perfeito respeito pelo princípio da separação de poderes e não ingerência no quadro de competências próprias da Administração. Aliás, é este o entendimento do próprio STA quando verteu no seu Acórdão que “(…) nada obsta a que o tribunal pratique o ato devido que é o de determinar a adjudicação logo que seja aprovada a candidatura apresentada à O... independentemente da bondade da decisão anterior da adjudicação relativamente a este aspeto. A condenação na adjudicação do contrato ao único concorrente sobrante constante da decisão recorrida nos termos supra expostos não viola, pois, quer o princípio da separação de poderes quer o artigo 79º do CCP por tal não se traduzir em retirar à administração qualquer poder que só a ela competisse na adjudicação ou não do contrato.” 6 - Significa isto, que a Administração, em vez de invocar a existência e verificação de uma qualquer causa de não adjudicação ao abrigo do art.º 79º do CCP, como o fez em sede de contestação à execução, deveria ter executado o acórdão e praticado todos os atos que se mostrassem necessários a tal fim. Questão diversa é saber se uma eventual impossibilidade de executar o acórdão configura uma causa de não adjudicação ou, como se defende, uma causa legítima de inexecução.
7 - Porém, a Administração veio escudar-se no facto de o programa de procedimento condicionar a adjudicação à aprovação da candidatura aos fundos comunitários O..., para efeitos de comparticipação financeira na execução desta empreitada, e no alegado entendimento do Acórdão do STA que permitiria invocar uma causa de não adjudicação (art,º 79º nº 1 al. d) do CPTA). Foi, outrossim, esta tese defendida pelo Tribunal a quo, no que se não concede.
8 - Salvo devido respeito, andou mal o tribunal a quo, nesta matéria, pois, se é inegável que o STA, no seu acórdão de 7/12/2016, condicionou a adjudicação da empreitada à aqui Recorrente, à aprovação da candidatura apresentada à O... pelo Município, não deixa de ser verdade, que à data da prática do ato ilegal e do qual se obteve a respetiva anulação, o financiamento existia e foi objeto da competente contratação, a qual esteve válida até junho de 2015. Isto é, o efeito imediato da sentença/acórdão, mormente do pedido de anulação é a eliminação do ato e de todos atos e seus efeitos, desde o momento em que se verificou a ilegalidade.
9 - Assim, retroagindo os efeitos desta decisão à data dos factos, isto é a 22/08/2014, data da adjudicação, a aprovação da candidatura era um facto assente e o financiamento da obra em questão estava assegurado. Logo, a Administração está em condições de adjudicar a empreitada à aqui recorrente. Tanto mais que, à data dos factos a empreitada foi adjudicada, a candidatura apresentada pelo Município aos fundos da O... foram aceites e o financiamento foi objeto de contratação. Aliás, este financiamento este disponível e aplicável mesmo até prolação do acórdão do TCAN que decidiu pela anulação do ato administrativo e adjudicação da empreitada à recorrente. Tivesse o Município acatado a ordem do tribunal e teria condições para esta empreitada ser executada.
10 - No entanto, e num exercício de um direito legítimo recorreu para o STA. E, de outro modo, não poderia este tribunal condicionar a adjudicação da empreitada à aprovação da candidatura aos fundos da O... pois isso era uma das condições do caderno de encargos. Por esse motivo, e não configurando esta condição uma inovação ou condição superveniente, não se percebe como é que o Tribunal a quo perspetiva e interpreta o teor do acórdão dado à execução como exigindo a verificação dessa condição, não à data dos factos, mas sim à data da sua prolação.
11 - Veja-se que, de acordo com este entendimento, não haveria nenhuma “destruição” ou reconstituição da situação de facto, porque se salvaguardavam-se os efeitos de um ato ilegal.
12 - Entendeu o tribunal recorrido que o acórdão dado à execução tinha perspetivado a questão da sujeição da adjudicação da empreitada à aqui recorrente no sentido de que essa condição teria de ser verificada aquando da prolação do acórdão. Isto é, não interessa se o financiamento existia e estava garantido à data da adjudicação, mas sim à data da prolação do acórdão. Não importa acautelar e repristinar a situação de facto de acordo com a situação de direito, reconstruindo a situação sem a ilegalidade, mas sim, permite a manutenção dos efeitos de um ato ilegal e anulado.
13 - Tanto mais que é o próprio acórdão (do STA) e ignorado pelo Tribunal a quo, a considerar que a adjudicação foi efetuada e que por esse motivo a invocação de uma causa de não adjudicação se mostra ultrapassada. Não pode o Tribunal a quo aproveitar de uma faculdade que respeita ao procedimento anterior à adjudicação, para impedir a execução de um ato que resulta de uma adjudicação. Diga-se que se fosse esse o caso, o próprio STA ter-se-ia pronunciado nesse sentido. Mas não o fez.
14 - Aliás, refere-se a dado passo no acórdão aqui sob análise que “(…) decorre da fundamentação do acórdão do STA é admitida a possibilidade de existirem decisões de não adjudicação, entre as quais se conta a resultante da necessidade de reformular o projeto.
Os fundamentos invocados para anular o concurso reconduzem-se ao artigo 79º, nº 1 als. c) e d) do CCP, encontrando-se justificação legal bastante para a não adjudicação em causa (…).
(…) Face ao exposto, afigura-se que o acórdão do STA se encontra executado, já que o mesmo estava condicionado à existência de financiamento comunitário que no caso não existe por via da caducidade do mesmo, e consequente rescisão do...
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