Acórdão nº 02010/09.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução28 de Setembro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: EDP Distribuição - Energia, SA (Praça Marquês de Pombal, nº 12, 1250-162 Lisboa) interpõe recurso jurisdicional de acórdão proferido pelo TAF do Porto que julgou parcialmente procedente acção administrativa comum ordinária intentada por LAPM (R. A…, Porto) contra a agora recorrente e CCM (R. C…, 4000-145 Porto).

*Recurso no qual conclui: I. A sentença recorrida não conheceu da caducidade dos direitos da A, suscitada com base no Artº 48º do D.L. nº 322/90 ainda que incluída por lapso no capítulo da prescrição, o que constitui pronúncia omissão de pronúncia, fundamento de anulação (Artº 615º/1/d) do C.P.C.).

  1. Contrariamente ao decidido, o facto constitutivo dos direitos da A é o Estatuto da CCM, que os prevê abstracta e autonomamente, e não o Contrato de Concessão CMP/EDP que os não prevê e se limitou, na visão do STA citado na sentença, a transladar para a EDP a obrigação da CMP com a CCM.

  2. De qualquer modo, a transmissão da obrigação financeira da CMP/SMGE com a CCM constitui apenas modificação subjectiva/passiva dessa relação, não tendo a virtualidade de modificar os sujeitos dessoutra e diferente relação previdencial da CCM com os seus beneficiários. Em rigor, essa transmissão não altera sequer o conteúdo ou objecto da própria relação onde ocorre (cfr. os artigos 308º/2 e 300º do C.C.). Há pois erro na identificação da fonte.

  3. V. As prestações reclamadas pela Autora prescrevem no prazo de um ano a contar do seu vencimento (E.P.S. da função pública, DL nº 42/73, de 31-3, Artº 35º/1) ou, não se entendendo assim, prescrevem seguramente no prazo de cinco aos (Artº 310/g) do C.C.) e não o prazo geral de 20 anos.

  4. Após as decisões do STA, que a sentença adopta como paradigma, a questão geral ali quase exclusivamente tratada, da “sucessão” da EDP na posição passiva da relação CMP/SMGE-CCM passou a ser praticamente incontrovertida e a insistência da A nesse tema apenas tem por objecto e teve por efeito bem sucedido distrair da discussão dos seus invocados direitos em concreto.

  5. As listas de quase novecentos beneficiários da CCM, juntas por exigência da A, em comparação com os três diferendos restantes mostram que, contrariamente à imagem alarmista passada pela A, a EDP CCM nunca deixou de financiar a CCM.

  6. Os empregados dos SMGE, incluindo o pai da A, foram obrigatoriamente inscritos no MSE e na CGA (cfr DL nº 24.046, de 21-7-1934 e Decreto nº 31.095 de 31-12-1940), passando essas entidades a abonar-lhes a totalidade das pensões de aposentação e pensões de sobrevivência às suas viúvas e filhos menores [Artº 7º: “Em 1 de Janeiro de 1941 serão obrigatoriamente inscritos na Caixa Geral de Aposentações, com os direitos e os deveres respectivos, os funcionários abrangidos pelo artigo 29º do Decreto-Lei nº 27.424, de 31 de Dezembro de 1936, actualmente com direito à aposentação pelos corpos administrativos. Nos termos do artigo 10º daquele diploma “A Caixa Geral de Aposentações abonará pela totalidade as pensões dos funcionários dos corpos administrativos referidos nos artigos 7º e 9º…”.].

  7. Em consequência destes dispositivos, a CCM passou a ter natureza complementar e as suas prestações passaram a ser complementares das pensões de aposentação pagas pela CGA e das pensões se sobrevivência pagas pelo MSE.

  8. A partir dessa data, apenas os empregados dos SMGE aposentados antes de 1-1-1941 (não obviamente o pai da A falecido já 45 anos depois, em 1986) [Embora a A não diga as datas da aposentação do seu pai, nem da admissão nem da inscrição nos SMGE ou na CCM], continuaram a receber pensões únicas da CCM, chamadas supletivas, deixando aquela “oficialmente” de pagar pensões de sobrevivência às filhas maiores e solteiras, independentemente do seu comportamento.

  9. Visando os complementos de sobrevivência, cumulados com as prestações dos SME, assegurar 50% do último vencimento ou pensão do falecido (Artº 29º do Estatuto), como é próprio da sua função e natureza só variam para assegurar aquele valor. Outros factores ou critérios de cálculos praticados jurídico carecem de valor jurídico.

  10. A conclusão da douta sentença de que “Um dos principais objectivos da Caixa é a atribuição de pensão de aposentação extraordinária ou ordinária..., está desfasada da realidade há 73 anos.

  11. Tendo-se provado que a EDP não interveio “até hoje” na administração da CCM; a reformulação de pensões, pela atribuição de “... bases de remuneração dos trabalhadores activos da EDP a pensionistas da CCM”; a criação de “...uma retribuição por antiguidade para os pensionistas da Caixa”, só não admitindo o invocado incêndio por não se ter provado que ele tenha destruído todo o arquivo; com estas premissas, o digno tribunal a quo devia, pelo menos, manter na A o ónus da prova das bases do cálculo dos complementos reclamados, como o valor do último salário ou pensão de seu pai e datas de admissão e de saída dos SMGE, último valor da sua pensão da CGA.

  12. Os artigos 73º, 76º, 77º, 80º, 82º, 83º, 93º, 94º, 98º e 110º da contestação da R não foram considerados na condensação; referem-se aí outras irregularidades como a alteração do valor de referência dos complementos, o aumento de 50% para 53% do valor do último salário, factos atinentes ao património da A ou o número de diferendos – três - em relação ao número de beneficiários da CCM (874) que dão um retrato da realidade que a A conseguiu distorcer. Assim, ocorreu omissão de factos muito relevantes para o julgamento do mérito.

  13. Tendo-se provado que a A teve um filho e viveu maritalmente com o pai deste, pelo menos desde a data do seu registo - situação anódina hoje - preenche precisamente a previsão do “mau comportamento” que a norma estatutária estabeleceu como preclusivo do direito à prestação de sobrevivência.

  14. “A protecção dos direitos adquiridos e em formação pressupõe a existência de situações jurídicas estabilizadas em quadros normativos legais e estatutários, no respeito pela Constituição e pela lei.” XVI. O Estatuto da CCM é um regulamento administrativo da lei habilitante da sua aprovação, aplicável aos funcionários dos corpos administrativos incluindo os empregados dos SMGE.

  15. A revogação desta lei teve como consequência necessária a revogação das disposições daquele que contrariam a nova lei, neste caso o regime jurídico das pensões de sobrevivência.

  16. O regime jurídico da Segurança Social, cuja Lei de Bases (Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro) faz obedecer os regimes de segurança social ao princípio da igualdade (Artº 5º) e opõe-se frontalmente a normas que estabeleçam sexo privilégios em função do sexo.

  17. A douta sentença recorrida é omissa quanto à ilegalidade ordinária da norma (Artº 33º § 1º) do Estatuto, suscitada pela R no Artº 26º da contestação, sofrendo de nulidade por força do Artº 615º/1/d) do C.P.C. (pronúncia omissão de pronúncia).

  18. A mesma norma ofende os princípios constitucionais da igualdade de género e da não discriminação em função das opções sexuais, e a interpretação (normativa ou generalizante) dela feita na douta sentença ofende igualmente esses princípios.

  19. Não pode fazer-se da norma uma interpretação histórica para a A e actualista para a R, desvirtuando o teor da sua previsão, traindo o seu espírito e extraindo dela um sentido com o qual o legislador não podia contar.

  20. Na douta sentença recorrida fez-se errada interpretação e aplicação do Artº 70º/1/b) da Lei do Tribunal Constitucional (Lei nº 28/82, de 15-11, alterada pela leis nºs 143/85, 85/89, 88/95 e 13-A/98), pelo que deve julgar-se estatutária inaplicável a referida norma estatutária.

  21. A sentença adoptou, na maior parte da sua fundamentação, os precedentes (STA) apresentados pela A; porém, a demonstração dos seus direitos há-de resultar dos factos concretos que os geram, taxativa e abstractamente previstos no Estatuto, e que a A não demonstrou nem provou nem sequer invocou.

  22. Mas depois de adoptado o modelo, afigura-se que este deve ser seguido em todas as consequências da doutrina adoptada e não se ficar pela já ultrapassada questão da “sucessão” da EDP no financiamento da CCM.

  23. Sendo “não provado” que as prestações fossem actualizadas nem o seu modus; não sendo invocada, porque inexistente, qualquer norma legal ou estatutária que a suporte e, nesses termos, condenar-se a R a alterá-las revela absoluta falta de suporte de facto e de direito e constitui fundamento de nulidade da decisão [(C.P.C. Artº 615º/1/b)].

  24. A douta sentença recorrida omite igualmente em absoluto a fundamentação de facto e de direito da decisão de condenação da R a pagar à Autora 13ª e 14ª prestações, não previstas no Estatuto nem em qualquer lei para pessoas nas condições da A, pelo que deve ser declarada nula essa decisão, ao abrigo do disposto no Artº 615º/1/b) e c) do C.P.C..

*A recorrida contra-alegou, pugnando pela manutenção do decidido.

*O Exmº Magistrado do Mº Pº junto deste tribunal nada deu em parecer.

*Com dispensa dos vistos, vêm os autos a conferência, cumprindo decidir.

*Os factos : Considerou o tribunal a quo como provados os seguintes factos, que agora também se tomam em consideração: 1) A A. é filha de ARM, já falecido em 28 de Novembro de 1989 e de MCPM, já falecida, em 1 de Abril de 2001 – doc. 1 a 3 juntos com a p.i. que aqui se dão por integralmente reproduzidos para todos os efeitos legais.

2) A R. “Caixa” foi instituída pela Comissão Administrativa dos S.M.G.E., em 12 de Setembro de 1918 tendo os seus estatutos e a sua estrutura sido aprovada pelo Conselho de Administração dos SMGE de 02.05.1934 e, ainda, pela Comissão Administrativa da Câmara Municipal do Porto em 24.05.1934.

3) O Artº 4º dos estatutos da CCM (doravante “Caixa”) estabelece que as receitas da caixa eram financiadas, entre outros, através (i) do desconto de uma percentagem nos ordenados dos trabalhadores cujos limites eram definidos pela Comissão Administrativa dos SMGE, mas que não poderia ultrapassar o limite...

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