Acórdão nº 02484/09.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 29 de Abril de 2010

Data29 Abril 2010
Órgãohttp://vlex.com/desc1/1998_01

SOCIEDADE FARMÁCIAS…, LDA.

, com sede na Alameda…, Porto, vem interpor recurso jurisdicional da Sentença proferida pelo TAF DO PORTO em 31/12/2009, que julgou improcedente a providência Cautelar requerida contra o HOSPITAL DE S. JOÃO. E.P.E., (e a contra-interessada S…, S.A.

) em que peticionava: “ (i) Determinada a suspensão do acto da entidade requerida, consubstanciado na deliberação do respectivo Conselho de Administração, datada de 10.09.2009, de declaração de caducidade da adjudicação (à requerente) do contrato de concessão de serviço público objecto do Concurso Público n.º 31000807.

(ii) Determinada a suspensão do acto da entidade requerida, consubstanciado na deliberação do respectivo Conselho de Administração, datada de 10.09.2009, de adjudicação à contra-interessada do contrato de concessão de serviço público objecto do Concurso Público n.º 31000807.

(iii) Subsidiariamente, caso a entidade requerida já tenha celebrado com a contra-interessada o contrato de concessão de serviço público objecto do Concurso Público n.º 31000807, deverá ser determinada a suspensão da execução desse contrato.” Alegou, formulando as seguintes conclusões: “1. A Recorrida não dispõe de uma norma habilitante para declarar a caducidade da adjudicação à Recorrente e, subsequentemente, para praticar um novo acto de adjudicação a favor da contra-interessada.

  1. Com efeito, de acordo com o entendimento do ilustre Professor Doutor Paulo Otero, que se sufraga, o DL n.º 235/2006, de 6 de Dezembro, constitui a lei especial que rege a situação dos autos, sendo que tal diploma contém uma norma específica que regula a caducidade da adjudicação e não qual não se inscreve a situação dos autos em exame, ou seja, a falta de comparência da Recorrente na data da outorga do contrato de concessão.

  2. Em virtude da ausência de uma norma legal habilitante para que a Recorrida pudesse ter declarado a caducidade da adjudicação à Recorrente, com esteio no motivo invocado, é evidente que a deliberação daquela, de 10 de Setembro de 2009, é manifestamente ilegal, por óbvio erro de Direito.

  3. Ainda como decorrência directa da falta de norma legal habilitante para que a Recorrida pudesse ancorar a sua deliberação de caducidade da adjudicação à Recorrente, impunha-se o recurso a Tribunal para se obter tal declaração, dado que a Recorrida não goza aqui de auto-tutela declarativa.

  4. Como a Recorrida se substituiu, indevidamente, ao Tribunal competente para o efeito, a sua deliberação de caducidade padece de um vício de usurpação de poder, conducente à respectiva nulidade (cfr. art. 133º, n.º 2, alínea a. do CPA). Neste exacto sentido, veja-se o parecer Jurídico em anexo.

  5. Acresce que tal deliberação consubstancia ainda uma revogação implícita de um acto válido constitutivo de direitos, a saber, a adjudicação praticada inicialmente a favor da Recorrente; pelo que a predita deliberação é também por esta via inválida. Como refere a este propósito o Professor Doutor Paulo Otero, a conduta da Recorrida violou “um clássico princípio geral do Direito Administrativo português: a irrevogabilidade dos actos administrativos constitutivos de direitos válidos”.

  6. Admitindo, sem conceder, que são aplicáveis os dispositivos legais invocados pela Recorrida para sustentar a sua deliberação, flui de todos esses normativos que a adjudicação “fica sem efeito” ou que a adjudicação “caduca” quando o adjudicatário, realce-se, “por facto que lhe seja imputável”, não compareça na data fixada para a outorga do contrato.

  7. In casu, a Recorrente, não compareceu nessa data justificando antecipadamente por que razão não iria comparecer, sendo que esse motivo não lhe pode ser minimamente imputável porquanto se prende directamente com a falta de regulamentação legal de uma das obrigações que, assinando tal contrato, a Recorrente ficaria impossibilitada de cumprir logo desde o início da sua produção de efeitos (a saber: as cláusulas 5ª, n.º 2, alínea c. e 14ª do contrato de concessão em apreço). Saliente-se que este facto foi, e muito bem, dado como provado pelo Tribunal a quo (cfr. ponto 16 da matéria de facto da sentença recorrida).

  8. Acresce que a justificação da “falta” da Recorrente foi inteiramente compreendida pelos próprios serviços internos da Recorrida, pois junto ao Processo Instrutor consta uma exposição escrita onde se refere o seguinte: “(…) A inexistência de Portaria de Regulamentação da Dispensa de Medicamentes em dose individualizada, constitui efectivamente um obstáculo à celebração do contrato que tem por objectivo a instalação da farmácia no Hospital de São João”.

  9. Nestes termos, isto é atendendo aos fundamentos em que se estribou a Recorrida na deliberação de 10 de Setembro de 2009, é absolutamente evidente que esta incorreu num erro sobre os pressupostos de direito ao deliberar como deliberou, isto é, pela caducidade da adjudicação à Recorrente e pela adjudicação à Contra-interessada da concessão de serviço público em causa. É que a Recorrida estribou essa deliberação, erradamente, no art. 56º, n.º 1, alínea c). do DL n.º 197/99, quando a situação em exame não é aí claramente subsumível.

  10. Mesmo que se admitisse como possível que a Recorrida pudesse declarar unilateralmente a caducidade da adjudicação no caso sub iudice, isso só poderia acontecer após a audição da Recorrente em audiência prévia. Esta é (uma outra) conclusão que se alcança sem qualquer esforço.

  11. Em virtude da deliberação da Recorrida ter sido tomada sem que a Recorrente fosse ouvida, consubstanciando, portanto, uma “decisão surpresa, tal deliberação padece de um vício de forma por (absoluta) preterição do direito de audiência prévia da Recorrente, gerador da respectiva anulabilidade (cfr. arts. 100º e 135º e 136º do CPA).

  12. Esclareça-se, quanto a esta última conclusão, que teoria do aproveitamento do acto administrativo não é in casu aplicável, pela simples razão de que não estamos no domínio dos actos vinculados. Efectivamente, como bem se concluiu no Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 10 de Novembro de 2005, Proc. n.º 00248/02-Porto (Relator Dr. Aragão Seia), “a falta de audiência prévia do interessado consagrada nos arts. 100º e segs. do CPA só não determina a anulação do acto quando se esteja perante um acto vinculado, segundo o princípio do aproveitamento do acto”.

  13. Por todas estas ordens de razões, facilmente apreensíveis, impõe-se a conclusão de que o Mmo. Juiz a quo errou ao recusar a providência requerida de suspensão dos efeitos do contrato de concessão, declinando a aplicação ao caso vertente do disposto no art. 120º, n.º 1, alínea a). do CPTA. Este dispositivo não pode traduzir-se em “letra morta” da lei.

  14. Admitindo, sem também aqui conceder, que a suspensão do contrato de concessão não possa ser decretada ao abrigo do art. 120º, n.º 1, alínea a). do CPTA, cumpre referir que tal suspensão deveria, então, ter sido decretada com base nos critérios determinados pela alínea b)., do n.º 1, do art. 120º do CPTA, conjugado com o seu n.º 2.

  15. De facto, não é correcta a asserção constante da sentença recorrida de que “(…) aquando da instauração da presente providência cautelar já havia sido celebrado o contrato em causa entre a entidade requerida e a contra-interessada, pelo que a situação já estava consumada” (cfr. fls. da sentença recorrida).

  16. Na verdade, compulsando a doutrina e a jurisprudência relevantes para o caso vertente, constata-se uma convergência de orientações no sentido de que a celebração de um contrato não conduz forçosamente à conclusão de que o facto que se pretendia evitar foi consumado, logo, que o requisito do periculum in mora não está preenchido.

  17. Estando em causa, como está, um contrato de óbvia execução continuada, ou seja, um contrato de concessão com vigência prevista de 5 anos, não é o simples facto de este ter sido celebrado que torna inoperante o requisito do “periculum in mora”. Pelo contrário, é óbvio que os efeitos desse contrato, se não forem judicialmente suspensos, tornam muito difícil (“praticamente impossível” como se alegou no requerimento inicial) a reconstituição da situação in natura, no caso de a Recorrente obter vencimento de causa na acção principal.

  18. O balanço de interesses em causa é claramente favorável ao decretamento da providência cautelar que foi requerida no âmbito do processo cautelar que correu termos no Tribunal recorrido. Assim, também o comummente designado “requisito negativo” (ou “cláusula de salvaguarda”) encontra-se preenchido no caso em apreço (cfr. o disposto no n.º 2 do art. 120º do CPTA).

    Termos em que, Com o douto suprimento de V. Exas., deverá ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, nos termos e pelos fundamentos supra explicitados, ser revogada a sentença recorrida e decretada a suspensão de eficácia do contrato de concessão de serviço público celebrado entre a Recorrida e a Contra-interessada, com base na alínea a). do n.º 1 do art. 120º do CPTA, ou, caso assim não se entenda, com base na alínea b). do mesmo dispositivo legal.”*A contra-interessada S... apresentou contra-alegações, concluindo da seguinte forma: “1. A Sentença do douto Tribunal a quo aplicou correctamente o direito aos factos carreados para os autos.

  19. A Requerida dispõe de norma habilitante para declarar a caducidade da adjudicação à Recorrente e, consequentemente, para praticar um novo acto de adjudicação a favor da Contra-interessada.

  20. Na verdade, e ainda que admitindo, sem todavia conceder, a tese da Recorrente quanto à especialidade do disposto no Decreto-Lei n.º 235/2006, de 6 de Dezembro face ao Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho e ao Decreto-Lei n.º 59/99, de 2 de Março, as normas constantes do Caderno de Encargos do Concurso Público n.º 31000807 são, por sua vez, especiais face às disposições constantes do Decreto-Lei n.º 235/2006, de 6 de Dezembro que, segundo a Recorrente, alegadamente constitui a lei especial que rege a situação dos presentes autos.

  21. E o Caderno de Encargos...

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