Acórdão nº 00853/09.7BELSB de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Agosto de 2010

Magistrado ResponsávelDrº Carlos Luís Medeiros de Carvalho
Data da Resolução11 de Agosto de 2010
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO “M…, LDA.”, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 12.01.2010, que julgou improcedente a acção administrativa de impugnação urgente [contencioso pré-contratual] pela mesma deduzida nos termos dos arts. 100.º e segs. do CPTA contra “MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA” e as contra-interessadas “L…, LDA.”, “A…”, “S…, LDA.” e o AGRUPAMENTO EMPRESAS “R… e A…, LDA.”, todos igualmente identificados nos autos, na qual peticionava a anulação do despacho de 06.03.2009, proferido pelo Sr. Secretário de Estado da Administração Interna, que procedeu a adjudicação ao acima referido agrupamento de empresas do concurso público n.º 2008-FCPI-073-DGIE [fornecimento de 32.000 a 50.000 coldres de cintura para porte de pistolas de calibre 9x19 mm com patilha de segurança pelo serviço policial uniformizado].

Formula a recorrente nas respectivas alegações (cfr. fls. 410 e segs. e fls. 619 e segs. na sequência de convite feito pelo despacho de fls. 614/615 - paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário) as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. Discorda-se da sentença, ora impugnada, que julgou improcedentes os vícios de violação de lei, por violação do disposto no n.º 1 do artigo 94.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho, e de forma por preterição de uma formalidade essencial no âmbito do procedimento concursal, ambos motivados pela omissão da definição da ponderação dos factores e subfactores a considerar para efeitos da adjudicação.

  2. A referida sentença confunde a consagração do modelo de avaliação no programa de procedimento e a previsão de testes técnicos - cuja existência a Recorrente nunca questionou - com a densificação dos conceitos aí plasmados e o estabelecimento de descritores concretos, adequados à diferenciação das propostas apresentadas em sede de atribuição de pontuações, os quais nunca foram definidos.

  3. O que está em causa, neste processo, é que não existiu uma definição prévia - a qual podia e devia ter ocorrido nos termos e prazos fixados no n.º 1 do artigo 94.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho - da forma e critérios mediante os quais se justificaria a atribuição dos diversos níveis quantitativos definidos para a avaliação dos factores em causa, bem como das características dos equipamentos que determinavam a atribuição das respectivas pontuações.

  4. Sendo que, não o tendo feito, o júri do procedimento concursal originou os vícios indicados e, consequentemente, não tendo apreciado esta questão e tendo julgado improcedentes os respectivos vícios a douta sentença incorreu num grave erro de julgamento e, consequentemente, numa clamorosa injustiça; isto porque, realizou uma referência inexacta dos factos ao direito e interpretou incorrectamente as normas jurídicas em questão, incorrendo, consequentemente, na sua violação.

  5. Também se discorda da sentença na parte em que julgou improcedente o vício de forma por falta de fundamentação, incorrendo, consequentemente, num claro erro de julgamento.

  6. De facto, o júri limitou-se a remeter a sua decisão para os resultados obtidos no âmbito dos testes técnicos, sustentando-a exclusivamente nos mesmos, sem qualquer fundamentação adicional, sendo incontestável que esses resultados não permitiram formar uma decisão clara, objectiva e justa.

  7. O programa de procedimento e a actividade do júri são completamente omissos em relação à descrição dos resultados factuais a que correspondem as classificações atribuídas, não sendo possível perceber a que defeitos dos equipamentos correspondem as pontuações mais baixas, ou que valias do bem determinaram a atribuição de uma pontuação superior.

  8. Do exposto, resulta claro que, por muito que a Entidade Demandada, bem como a sentença impugnada, afirmem o contrário, não se afigura possível a um destinatário normal compreender o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelos testadores e pelo júri, com vista à atribuição de uma pontuação e à graduação das propostas, especialmente porque não subjaz qualquer fundamentação à tabela classificativa em questão.

  9. Assim, considerando o disposto no n.º 2 do artigo 125.º do CPA, torna-se evidente que o relatório de avaliação das propostas padece de manifesta falta de fundamentação e, em consequência, o mesmo é anulável, afectando inevitavelmente a validade do acto de adjudicação subsequente.

  10. Portanto, ao julgar improcedente o vício de forma por falta de fundamentação a sentença incorreu num erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação das disposições legais aplicáveis e, bem assim, por ter operado uma referência inexacta dos factos ao direito, ignorando e violando o dever de fundamentação patente nos artigos 124.º e seguintes do CPA.

  11. Por mais uma vez se discorda da sentença, ora impugnada, porque julgou improcedente o vício de desvio de poder.

  12. Isto porque, a actividade avaliativa do júri, desconsiderou por completo o fim legal que determinou a atribuição do poder discricionário de avaliação, facto objectivamente comprovável pelas deficiências avaliativas patentes no presente procedimento, discriminadas nas alegações e conclusões antecedentes.

  13. Deficiências que, pela sua gravidade, não permitem a afirmação de que se encetou um procedimento tendente a encontrar a proposta economicamente mais vantajosa, ou seja, a prosseguir fim legal para o qual foi atribuído o poder discricionário. Portanto, é forçosa a conclusão de que o comportamento do júri foi tendente a beneficiar a proposta colocada em primeiro lugar. Pelo que, o procedimento adjudicatório padece de um vício de desvio de poder. Ao julgar improcedente a verificação do vício indicado a sentença incorreu num claro erro de julgamento.

  14. A sentença contém, igualmente, um julgamento errado ao decidir pela improcedência do invocado vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto.

  15. Isto porque, verificaram-se irregularidades no âmbito da realização dos testes técnicos que são susceptíveis de inquinar o procedimento concursal, justificando a anulação do acto de adjudicação e o contrato celebrado, por ter existido erro sobre os pressupostos de facto que conduziram à decisão final.

  16. Desde logo, porque as características dos coletes e dos coldres utilizados, aliadas às características físicas dos testadores, não permitiram a realização dos testes técnicos em condições adequadas à atribuição de pontuações reais e justas aos equipamentos avaliados.

  17. E também porque foram omitidas aos testadores informações relevantes sobre o funcionamento dos coldres, designadamente sobre as características e as funcionalidades específicas dos mesmos, sem as quais não seria possível atribuir pontuações que reflectissem as suas reais qualidades.

  18. Sendo que, o vício invocado não depende da prova das questões subjectivas invocadas na douta sentença, pelo contrário, a procedência do erro é determinada pela demonstração objectiva das irregularidades e deficiências que marcaram os testes mencionados.

  19. Em suma, a sentença ora impugnada incorreu num erro de julgamento ao julgar improcedente o vício de violação de lei por erro sobre os pressupostos de facto, determinado por uma incorrecta referência dos factos ao direito, bem como por uma interpretação errada do direito aplicável.

  20. Para além do que, a sentença, incorre em outro erro de julgamento, ao considerar que não foi violado o princípio da prossecução do interesse público; violação que fica claramente comprovada por todas as ilegalidades demonstradas, nas alegações e conclusões antecedentes, bem como pela informação superveniente carreada para o processo.

  21. A sentença, ora impugnada, andou mal, ao julgar improcedente a invocada violação do princípio da imparcialidade, decidindo que «não [resulta] da matéria de facto que o júri tenha tido uma actuação parcial».

  22. Este juízo padece de um grave erro de julgamento, na medida em que interpreta e aplica de forma errada o princípio (critério de decisão) invocado, manifestando do mesmo uma visão redutora.

  23. Na verdade, ficou demonstrado que o princípio da imparcialidade foi violado no procedimento concursal em crise, nomeadamente, na sua vertente procedimental, originando cumulativamente os seguintes vícios: vício de ponderação e vício de défice material de ponderação.

  24. Pelo que, o acto de adjudicação que resultou deste procedimento é ilegal. Sendo que, ao julgar improcedente, de forma errada, a violação invocada, a sentença incorreu num erro de julgamento, por violação do principio de imparcialidade, consagrado, entre outros, no artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho.

  25. Mal andou, ainda, a sentença impugnada ao considerar improcedente a violação do principio da transparência.

  26. Isto porque, é manifesto que o procedimento concursal não cumpriu com as exigências impostas por este princípio, nomeadamente: um dever de publicitação adequada da intenção de contratar, publicação adequada das regras de cada procedimento, definição clara e precisa das regras das principais decisões procedimentais.

  27. À luz de quanto se expôs, o procedimento concursal e o acto de adjudicação que dele resultou e, bem assim, o contrato entretanto celebrado são ilegais por violarem o princípio da transparência. Em consequência, ao não avaliar e interpretar correctamente o princípio em causa, bem como, ao fazer uma subsunção inexacta dos factos a este princípio, a sentença ora impugnada incorporou um erro de julgamento, por violação do principio da transparência, consagrado, entre outros, no artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 197/99, de 8 de Junho.

  28. O Tribunal a quo, incorreu, ainda num erro de julgamento ao considerar improcedente a violação dos restantes princípios da contratação pública invocados. Os princípios da contratação pública invocados podem...

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