Acórdão nº 166/21.6T8LGA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28 de Abril de 2022

Data28 Abril 2022

Acordam os juízes nesta Relação: O credor reclamante “Instituto da Segurança Social, IP – Centro Distrital da Segurança Social de Faro”, com sede na Rua Pintor Carlos Porfírio, n.º 35, em Faro, vem interpor recurso da douta sentença proferida a 14 de Fevereiro de 2022 (ora a fls. 371 a 372), nestes autos de processo especial de revitalização, a correr seus termos no Juízo de Comércio de Lagoa-Juiz 1 (a que se apresentou a Requerente “Windland II, Unipessoal, Lda.

”, com sede na Garrafeira Palma, Estrada de Santa Eulália, Apartamento F, em Albufeira) – que veio a homologar o Plano de Revitalização apresentado e fora aprovado pela maioria dos credores (com o fundamento aduzido na douta sentença de que “não ocorre violação não negligenciável de normas procedimentais ou aplicáveis ao conteúdo do plano que impeçam a sua homologação, não prevendo este quaisquer condições suspensivas ou quaisquer atos ou medidas que devam preceder a homologação: artigo 215.º do CIRE, aplicável ex vi do artigo 17.º-F, n.º 7, in fine, do mesmo diploma”) – ora intentando a sua revogação, que tal plano venha a ser declarado ineficaz, na parte em que vincula os créditos da recorrente, e apresentando as suas alegações que remata com a formulação das seguintes Conclusões: A.

A proposta de plano ora homologado implica a modificação dos créditos da Segurança Social sem que esta tenha dado o seu consentimento.

B.

O voto do aqui credor não foi tido em consideração na votação apresentada pela Sra. Administradora Judicial Provisória.

C.

O plano de revitalização agora em apreço não se harmoniza com o grau de disponibilidade dos créditos públicos, violando, por isso, as normas aplicáveis em matéria de regularização de dívida ao Estado, bem como contraria o disposto no artigo 190.º do Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social (adiante designado por CRCSPSS).

D.

Quer a doutrina, quer a jurisprudência, têm vindo a entender que as contribuições devidas à Segurança Social devem considerar-se como verdadeiros impostos. Logo as dívidas provenientes de contribuições para a Segurança Social assumem natureza tributária e como tal é-lhes também aplicável a Lei Geral Tributária para todos os efeitos que não se encontrem regulados por lei especial, de acordo com o disposto no seu artigo 3.º, n.º 3.

E.

Com efeito, o artigo 30.º, nº 2, da Lei Geral Tributária dispõe: “O crédito tributário é indisponível, só podendo fixar-se condições para a sua redução ou extinção com respeito ao princípio da igualdade e da legalidade tributária”.

F.

O artigo 125.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, que remete para o nº 3 do artigo 30.º da LGT, veio, por fim, estipular que o crédito tributário é também indisponível no âmbito dos processos de insolvência, o que será também aplicável aos processos de revitalização por força do preceituado no artigo 17.º-F, n.º 5, do CIRE, no que respeita a regras vigentes em matéria de aprovação e homologação do plano de insolvência previstas no título IX.

G.

O n.º 3 do artigo 30.º da LGT, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, realça e reforça, assim, a natureza indisponível dos créditos tributários ao referir que tal indisponibilidade prevalece sobre qualquer legislação especial.

H.

Nos termos do artigo 36.º da LGT, na redacção introduzida pelo diploma citado: “a administração não pode conceder moratórias no pagamento das obrigações tributárias, salvo nos casos expressamente previsto na lei”.

I.

Verifica-se, pois, em conjugação com o artigo 190.º do CRSPSS, que possibilidade do pagamento da dívida em prestações não deixa de ter carácter de excepcionalidade, aplicável somente nos casos previstos na lei e requer sempre autorização, conforme plasmado no n.º 6 do mesmo artigo.

J.

Ora, no plano em apreço prevê-se o pagamento integral da dívida, contudo ao plano ora homologado não foi concedida autorização nos termos e para os efeitos do artigo 190.º do CRCSPSS.

K.

Deste modo, ao ser homologado um plano sem o consentimento do recorrente, verifica-se que o mesmo é nulo em relação ao mesmo, sendo ilegal a decisão que o homologou, por violação de normas imperativas.

L.

O ora recorrente não consentiu na forma de pagamento dos seus créditos, nem emitiu qualquer autorização expressa para se iniciar o pagamento da dívida em prestações.

M.

Pelo que a homologação do plano sem o consentimento do recorrente é ilegal por violação da norma que exige o consentimento do credor (cfr. 2ª parte do n.º 2 do artigo 192.º do Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas).

N.

Por outro lado, se interpretarmos o artigo 192.º do CIRE por forma a permitir a disponibilidade de créditos fiscais, isto é, deixar-se ao livre arbítrio dos credores presentes numa assembleia a decisão sobre o modo de pagamento de créditos tributários, que nem sequer são partes na relação jurídico-tributária, tal enquadramento legal é organicamente inconstitucional por violação directa do princípio de reserva absoluta de lei formal, consagrado no artigo 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição da República Portuguesa.

O.

Do mesmo modo, as normas constante do Título IX do CIRE, designadamente os artigos 194.º, n.º 1, 195.º, n.º 1 e 2, 106.º, n.º 1, alíneas a) e d) e 197.º, se forem interpretadas no sentido de permitirem que os credores aprovem um plano de revitalização que defina os prazos de pagamento dos créditos fiscais e alterem as respectivas condições de cobrança, sem o consentimento do órgão competente para o efeito, são organicamente inconstitucionais por violação do princípio da legalidade tributária e indisponibilidade dos créditos fiscais e de normas constitucionais.

P.

A sentença que homologou o plano de revitalização violou o disposto no n.º 3 do artigo 30.º da Lei Geral Tributária, o artigo 125.º da Lei n.º 55-A/2010, de 31/12, e o artigo 190.º, n.º 1 e n.º 2, alínea a) e n.º 6, do CRCSPSS.

Q.

Assim, a homologação do plano de revitalização é ilegal, porque, para tal, foram aplicadas normas que conduzem a uma interpretação inconstitucional, pois que, de acordo com a interpretação que serviu de base à...

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