Acórdão nº 5389/19.5T8STB-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução13 de Julho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO Caixa Geral de Depósitos, S.A.

instaurou, em 24.08.2019, execução para pagamento de quantia certa contra A…, B… e C…, para haver deles a quantia de € 56.405,67, titulada por contrato de mútuo com hipoteca celebrado em 29.09.2000.

O executado A… deduziu embargos, alegando, entre outras, a exceção de prescrição do direito exequendo, pelo decurso do prazo de 5 anos desde a data do incumprimento – 28.02.2002 – e em face do disposto nos artigos 307º e 310º, alíneas d) e e) do Código Civil[1], concluindo pela extinção da execução.

Contestou a exequente, dizendo, na parte que interessa considerar, que o não pagamento pontual de uma prestação implicou o imediato vencimento das restantes, pelo que, tratando-se de uma obrigação única com prestações fracionadas, o prazo de prescrição aplicável é o do artigo 309º do CC.

Concluiu pugnando pela improcedência dos embargos e requereu a condenação do embargante como litigante de má-fé.

Foi proferido despacho a determinar a notificação das partes para se pronunciarem quanto à dispensa da realização de audiência prévia e, bem assim, a usarem por escrito da faculdade prevista na alínea b) do n.º 1 do art. 591º do CPC. Do mesmo passo, determinou-se a notificação do embargante para se pronunciar sobre o pedido de condenação por litigância de má-fé deduzido pela exequente.

Na sequência da notificação do referido despacho, as partes vieram expressar a sua não oposição à dispensa de realização de audiência prévia, pronunciando-se sobre o mérito da causa e reiterando as posições anteriormente assumidas nos articulados. O embargante respondeu ainda ao pedido de condenação por litigância de má-fé, pugnando pela sua improcedência.

Foi então proferido saneador-sentença, em cujo dispositivo se consignou: «Por tudo o que vem de ser exposto, considerando verificada a exceção da prescrição, julgo os presentes embargos procedentes e, por consequência, determino a extinção da execução relativamente ao embargante.

Julgo improcedente o pedido de condenação do embargante por litigância de má-fé.

» Inconformada, a exequente/embargada apelou do assim decidido, finalizando a respetiva alegação com a formulação das conclusões que a seguir se transcrevem.

A) O pressuposto específico de atuação da alínea e) do artigo 310º reside na circunstância de o pagamento das frações ou quotas de capital se processar conjuntamente com os juros; B) Uma vez destruído o plano de pagamentos, deixam de existir quotas de amortização de capital ou, quanto muito, deixam de poder ser exigidos os correspondentes juros remuneratórios; C) A prestação períódica está intimamente ligada ao fator tempo, que deixa de existir; D) Não havendo juros, deixa de se verificar a parte final da previsão normativa do art. 310º, al. e) do C. Civil; E) O elemento literal da lei leva à conclusão inevitável de que as quotas de amortização de capital aí referidas estão intimamente ligadas à existência de juros remuneratórios; F) Como denunciam os trabalhos preparatórios do Código Civil de 1966, da autoria de VAZ SERRA, adotou-se a solução na altura consagrada no B.G.B.: com os juros devem prescrever as quotas de amortização, se deverem ser pagas como adjunção aos juros (Código alemão § 197), pois, se assim não fosse, poderia dar-se uma acumulação de quotas ruinosa para o devedor, apesar de, com a estipulação de quotas de amortização, se ter pretendido suavizar o reembolso do capital e tratá-lo como juros. Também o elemento histórico vem ao encontro do elemento literal, pois se pretendeu apenas que as quotas de amortização de capital só prescrevam enquanto componente de uma prestação híbrida de capital e juros; G) Da leitura das restantes previsões do art. 310º do C. Civil extrai-se que o prazo quinquenal é aplicável a rendas, foros (com pouco interesse prático, em virtude da abolição da figura da enfiteuse), pensões e, genericamente, a prestações periodicamente renováveis. Daqui decorre que todas aquelas previsões se reportam a obrigações renováveis ao longo do tempo. O fator tempo cessa de existir em função da destruição do plano de pagamentos, inexistem mais prestações com datas de vencimento e montantes específicos; H) A interpretação dada pela douta decisão recorrida trata de forma desigual o capital mutuado apenas por terem sido convencionados juros e apesar de estes passarem a ser inexigíveis; I) O elemento sistemático da norma em apreciação vem ao encontro da interpretação defendida pela recorrente; J) O argumento da ruína do devedor só colheria se o devedor fosse confrontado com o pagamento da totalidade das prestações (capital e juros) no termo do contrato. O credor já ficou limitado à partida pela impossibilidade de cobrança de juros remuneratórios do capital de que continuou desapossado. Por outro lado, o devedor não ficará prejudicado se o prazo de prescrição do capital for de 20 anos. Nem se pode dizer que o devedor seja apanhado de surpresa, pois já sabe à partida que beneficiou de um determinado montante em capital e que tem que o restituir, seja cumprindo – situação que deve ser a regra – ou, incumprindo, sujeitando-se à necessidade de reembolso da totalidade do capital; K) Também o elemento teleológico da lei suporta a interpretação da recorrente, que, de resto, coincide com o sentido literal; L) O prazo no mútuo oneroso destina-se apenas a proteger o mutuário no sentido de impedir o credor de cobrar a totalidade da dívida enquanto o plano estiver sendo cumprido. Não o sendo, assiste ao credor o direito de resolver o contrato, tornando imediatamente exigíveis as prestações vencidas e não pagas, bem como a totalidade do capital vincendo; M) É inconciliável considerar, a propósito da inexigibilidade de juros remuneratórios, que a obrigação de pagamento do capital tem por objecto uma só prestação inicialmente estipulada e, a propósito da prescrição que, afinal, o vencimento não altera a natureza prestacional do reembolso, como se, vencido o crédito ainda subsistissem prestações; N) A prestação de obrigação periódica, quer na formação, quer na determinação do respetivo objeto, anda ligada ao fator tempo, de que depende; O) A Caixa concedeu um empréstimo de um montante determinado, pagável em prestações, cujo montante é calculado, mensalmente, em função do prazo, capital e taxa de juro, pressupondo o cumprimento das obrigações de pagamento. Por esse motivo, os credores bancários mantêm nos seus livros o registo do capital vincendo e não x prestações de capital e juros. É também por isso que são reportados ao BdP os valores em dívida de capital a todo o tempo; P) É a própria realidade ou, se quisermos, os usos ou costumes, que afasta a tese de que persistem prestações ou quotas de amortização de capital após o vencimento. Existe sim, a obrigação única de restituição do capital em dívida inicialmente estipulada no contrato; Q) Após o vencimento, os valores em divida voltam a assumir em pleno a sua natureza original de capital e de juros, ficando o capital sujeito ao prazo ordinário de 20 anos e os juros ao de cinco anos, conforme defende o Prof. Dr. Menezes Cordeiro; R) É também esse o entendimento dos Ac. do TRG, de 16.03.2017, Processo n.º 589/15.0T8VNF-A.G1 e Ac. do TRC, de 26.04.2016, Processo n.º 525/14.0TBMGR-A.C1; S) A entender-se como decidido na Douta Sentença Recorrida, o vencimento de uma operação de crédito representaria sempre uma limitação exagerada dos direitos do credor, pois, fruto dessa opção, deixa de poder exigir juros remuneratórios e, por outro lado, fica sujeito ao prazo prescricional de cinco anos, ainda que o prazo de amortização do empréstimo ainda durasse mais 30 anos; T) Seguindo a tese da aplicabilidade do prazo de prescrição de cinco anos, num caso em que a execução esteja pendente há mais de cinco anos e ocorra a deserção, a prescrição ocorre de imediato. Basta o extravio de uma simples notificação ou omissão de algum ato e a instância fica deserta em seis meses, automaticamente e sem qualquer decisão judicial; U) Verifica-se inconstitucionalidade...

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