Acórdão nº 106997/21.3YIPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelTOMÉ DE CARVALHO
Data da Resolução13 de Julho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 106997/21.3YIPRT.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Local de Competência Cível de Faro – J1 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório: Na presente acção especial de cumprimento de obrigações pecuniárias emergente de contratos, que teve origem no requerimento de injunção apresentado por AA contra “H...Lda.", a Autora veio interpor recurso da decisão que considerou ser inepta a petição inicial e declarou existir erro na forma de processo.

* A Autora pedia a condenação da sociedade Ré no pagamento da quantia de € 6.150,00 (seis mil, cento e cinquenta euros), por incumprimento contratual e, bem assim, no montante de € 1.500,00 (mil e quinhentos euros), a título de danos não patrimoniais.

* O Tribunal a quo suscitou oficiosamente a questão da ineptidão do requerimento de injunção quanto ao primeiro pedido por falta da indicação da causa de pedir e de erro na forma do processo quanto à peticionada condenação a título de danos não patrimoniais.

* Em articulado autónomo, a Autora pugnou não existirem tais vícios.

* Na rubrica “Exposição dos factos que fundamentam a pretensão”, o requerimento inicial continha a seguinte matéria: «A requerente é uma pessoa singular.

A requerida é uma pessoa coletiva cujo objeto é social é entre outros a construção civil.

No âmbito de tal atividade foi contactada pela requerente a fim de realizar a edificação de um contrato de empreitada para a construção de uma vivenda sita em ....

Tal contrato estava dependente da aprovação da edificação por parte da Câmara Municipal ....

Porém, após a adjudicação e a transferência dos € 6.150,00 nunca mais veio a requerente a ser contactada ou a ser atendida pela requerida. Não tendo a requerida promovido qualquer acto para obter o licenciamento necessário em virtude de tal situação veio a requerente a ficar lesada no valor de € 6.150,00 os quais foram indevidamente obtidos, porquanto não foi realizado qualquer acto por parte da requerida.

Tendo, aliás, a requerente de ter página de Facebook e como se referiu de atender as tais chamadas.

A requerida teve despesas de deslocação até à loja que, entretanto, estava fechada, contactou diversas vezes e perdeu tempo a contactar sem sucesso a requerida, considerando que foi enganada. A requerente pretendia construir a casa para a sua jovem família e sentiu o seu sonho desmoronado. Ficou muito angustiada e em stress tendo crises de choro e ansiedade, tudo em virtude da atuação da requerida e cujos danos morais se cifram em cerca de € 1.500,00.

Termos em que deverá ser entregue de imediato o valor indevidamente apropriado pela requerida acrescido de juros vencidos e vincendos à taxa legal».

* Na parte que interessa para a justa resolução da causa a decisão recorrida afirma que: «Ora, de facto, o requerimento injuntivo contém um enunciado fáctico deficiente, por manifestamente insuficiente e impreciso, por conclusivo e equívoco, pois não se sabe, designadamente: a) quais as cláusulas contratuais que geram o crédito peticionado; b) quais as concretas obrigações assumidas pelos contraentes; c) qual a obrigação incumprida pela Requerida/Ré e em que data; d) conduta assumida pelo credor perante o incumprimento contratual e respectiva data; e) concretização da alegada condição a que se sujeitou o contrato; etc.

(…) Como a pretensão do requerente só é susceptível de derivar de um contrato ou de uma pluralidade de contratos, a causa de pedir, embora sintética, não pode deixar de envolver o conteúdo das respectivas declarações negociais e os factos negativos ou positivos consubstanciadores do seu incumprimento por parte do requerido. No caso, a indicação, pela Requerente/Autora, como causa de pedir, de “contrato de empreitada”, não passa de mera qualificação jurídica, pelo que não satisfaz o ónus de indicação da factualidade concreta que deve integrar a pertinente causa de pedir. Atente-se que a Requerente/Autora alega a realização da construção de uma vivenda como objecto do alegado contrato de empreitada assim como alega que tal contrato estava dependente da aprovação da edificação por parte da Câmara Municipal .... Ao mesmo tempo alega que a Requerida/Ré não promoveu qualquer acto para obter o licenciamento necessário.

Os factos jurídicos concretos que integram a causa de pedir não fazem compreender o requerido/pedido pela Requerente/Autora.

Fazendo um esforço de interpretação/compreensão, segundo a Requerente / Autora, a Requerida / Ré obrigara-se a construir uma vivenda, porém, tal só se verificaria se e quando a Câmara Municipal ... aprovasse a edificação da vivenda. O que significa, ou assim parece, que a obrigação de construção pela Requerida / Ré se encontrava suspensa até se verificar a tal aprovação por parte da Câmara Municipal. Será? Alega a Requerente / Autora não ter sido obtida qualquer licenciamento.

Que aprovação se trata? Que licenciamento se trata? A quem competia diligenciar por tal licenciamento? Seria uma das cláusulas do acordo entre as partes? Uma condição? De que tipo? Qual a conduta assumida pela Requerente / Autora que permita a subsunção dos factos ao direito, designadamente o disposto pelo artigo 798.º do Código Civil? Quando o requerimento injuntivo não expressa os factos integrantes da causa de pedir de que depende o pedido formulado, como acontece, sem dúvida, no presente caso, o requerente corre o risco, na eventual apreciação jurisdicional subsequente, seja na acção declarativa de condenação com processo especial, seja nos embargos de executado, de ser confrontado com uma decisão desfavorável, isto é, não lograr êxito na sua pretensão. Aplicando-se em sede de procedimento de injunção os comandos contidos nos artigos 5.º, n.º 1 e 552.º, n.º 1, alínea d), do CPC, dúvidas inexistem de que o requerente deve expor no requerimento, no local a tal destinado e por forma necessariamente sucinta, os factos que servem de fundamento à sua pretensão, quais sejam os que, em regra, se afiguram constitutivos do seu direito».

(…) Não satisfaz, evidentemente, a exigência legal de afirmação dos factos consubstanciadores da causa de pedir, a utilização da expressão «contrato de empreitada», a referência a apenas uma data de celebração do contrato, omitindo-se a(s) data(s) da ocorrência dos restantes factos e os prazos acordados para o efeito e as obrigações concretamente assumidas pelas partes, e o concreto objecto do acordado.

No requerimento injuntivo a Requerente / Autora omite o conteúdo do acordado, não deixa inteligível a compatibilização entre “construção de uma vivenda” e “obtenção de aprovação ou licenciamento”, limitando-se às generalidades e conclusões. Neste caso, existe uma ausência de conteúdo, um “vazio”, que não foi preenchido pela Requerente / Autora, como era seu ónus, e que não é passível de sanação.

* Relativamente à pretensão indemnizatória, a Meritíssima Juíza de Direito avança que: «ocorre o vício processual de erro na forma de processo quando a pretensão não seja deduzida segundo a forma geral ou especial de processo legalmente previstas.

A sanação do vício faz-se por via da convolação para a forma de processo correcta, importando, unicamente, a anulação dos actos que não possam ser aproveitados e a prática dos que forem estritamente necessários para que o processo se aproxime, tanto quanto possível, da forma estabelecida na lei.

Assim, tal vício só determinará a anulação de todo o processo (como excepção dilatória) e a absolvição do réu da instância, nos casos em que a própria petição inicial não possa ser aproveitada para a forma de processo adequada – cfr. artigos 193.º, 278.º, n.º 1, alínea b), 576.º, n.º 2 e 577.º, alínea b), todos do CPC.

No caso, a Requerente / Autora utilizou o procedimento de injunção não para exigir uma obrigação pecuniária emergente de um contrato, mas sim para exigir uma compensação por danos não patrimoniais, por alegada angústia, stress e ansiedade, em virtude da actuação da Requerida / Ré.

A extrema simplicidade da injunção, aponta para um procedimento de fácil e imediata compreensão quanto ao objecto do litígio. Concretização disso mesmo é a “fórmula” usada pelo legislador no artigo 10.º, n.º 1, alínea e), do DL n.º 269/98, de 01.09: o requerente deve formular o pedido, com...

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