Acórdão nº 694/17.8T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelANA PESSOA
Data da Resolução13 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora, I. RELATÓRIO.

BB , instaurou a presente ação declarativa de condenação sob a forma comum contra FUNDO DE GARANTIA AUTOMÓVEL, pedindo que o réu seja condenado a pagar ao autor a quantia de €355.443,90 acrescida da correção monetária de 2% ao ano, bem como de juros moratórios à taxa legal, a partir da citação e até integral pagamento.

Alegou, em síntese, ter sido vítima de um acidente de viação ocorrido no dia 13/8/2011, nas circunstâncias de tempo, modo e local que melhor descreveu, o qual foi provocado por uma viatura que não foi possível identificar, sendo que do referido sinistro resultaram danos não patrimoniais e patrimoniais, melhor descritos na petição inicial, que o réu deve ressarcir nos termos previstos no Decreto-Lei nº291/2007, de 21 de Agosto.

O Réu contestou, impugnando a factualidade alegada pelo Autor e pugnando, consequentemente, pela improcedência da ação.

*** Com fundamento no mesmo sinistro, AA propôs ação autónoma, posteriormente apensada aos presentes autos, na qual peticionou a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de €187.224,23, acrescida da correção monetária de 2% ao ano, bem como de juros moratórios à taxa legal, a partir da citação e até integral pagamento.

Também esta ação o réu contestou, impugnando os factos alegados pela autora e sustentando que já indemnizou extrajudicialmente a mesma pelos danos decorrentes do sinistro, sendo que continua a suportar as respetivas despesas médico-medicamentosas.

*** CC, menor representada pelos seus progenitores e ora autores AA e BB, deduziu incidente de intervenção espontânea, oportunamente admitido, peticionando, também com fundamento no sinistro em discussão nos autos, que o réu seja condenado a pagar-lhe uma quantia não inferior a €15.000,00, bem como os tratamentos futuros, com nexo causal com o acidente, que se venham a mostrar necessários à sua recuperação integral.

Uma vez mais, o Réu contestou o pedido formulado pela interveniente, reiterando o teor da contestação já apresentada nos autos em relação ao autor BB.

*** Procedeu-se à identificação do objeto do litígio e à enunciação dos temas de prova, os autos prosseguiram os seus ulteriores termos, com realização dos competentes exames periciais, a que se seguiu audiência de julgamento, no âmbito da qual o Autor BB e o Réu transigiram relativamente ao objeto do litígio em causa na ação por esse Autor proposta, prosseguindo os autos no que concerne à autora AA e à interveniente CC.

Ainda nessa sede, a interveniente CC, com fundamento no relatório de avaliação do dano corporal, requereu a ampliação do pedido para o montante de €35.000,00, ampliação que foi contestada pelo Réu, por entender que não se justifica, face ao referido relatório, o valor peticionado.

Nessa sequência, o Réu confessou a dinâmica do acidente, nos termos que resultam alegados na petição inicial, bem como o teor dos relatórios do INML referentes à autora e à interveniente.

* Após foi proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo: “Nestes termos, julgo a presente ação parcialmente procedente e, em consequência, decido: a) Absolver o réu do pedido formulado pela autora AA; b) Condenar o réu a pagar à Interveniente CC a quantia de 35.000,00 (trinta e cinco mil euros), a título de indemnização global por todos os danos discriminados nesta sentença, acrescida de juros de mora, à taxa legal, calculados desde a citação até integral pagamento, e das quantias referentes a tratamentos futuros, com nexo causal com o acidente, que se venham a mostrar necessários à sua recuperação integral;(…)”.

* Inconformada, recorreu a Autora AA, formulando, após alegações, as seguintes conclusões: A) A sentença recorrida, assenta a decisão de absolvição na base de que, com o recebimento da indemnização a recorrente declarou-se totalmente ressarcida em consequência do acidente; B) Tal ato, significando uma transação extrajudicial (um contrato) teria colocado a autora na impossibilidade de reclamar uma indemnização de valor superior à que lhe foi paga em 2013; C) A reclamação de um valor superior só teria lugar caso tivessem surgido novos danos não previstos (conhecidos?) à data do pagamento; D) Ora salvo o devido respeito, a recorrente entende que esses factos novos existem efetivamente e foram alegados e provados documentalmente. Vejamos, E) A data da aceitação e pagamento da indemnização foi em 21.03.

2013; e F) Os relatórios de avaliação do dano corporal[2] efetuados pelo INML fixam como a data da estabilização médico-legal o dia 13.08.213 (5 meses mais tarde); G) A recorrente foi submetida a uma cirurgia para colocação de uma prótese total da anca esquerda em 30.

06.

2014 (1 ano e 3 meses mais tarde); H) A indemnização paga pelo réu e aceite pela ora recorrente, foi calculada na base da avaliação feita no relatório efetuado pelo próprio reu, com data de 20.02.2013; I) Este relatório atribuiu à Recorrente uma desvalorização de 11,56 pontos; enquanto J) O relatório efetuado pelo INML atribui-lhe em 18.06.2020 uma desvalorização superior (16 pontos); K) A recorrente foi reformada por invalidez a partir de 30.07.

2015, por incapacidade efetiva de desempenho das funções profissionais a partir da referida data.

L) Esta realidade é confirmada (parcial e contraditoriamente) pelos relatórios periciais do INML; M) Estes relatórios referem que, ao nível funcional a recorrente tem “dificuldadeempermanecer mais de20minutos depéemais de15minutos sentada, necessitando de se deitar para alívio da dor na anca e coxa esquerdas” N) A condição física da recorrente não lhe permite encontrar uma entidade empregadora que lhe dê emprego; O) A decisão da passagem a reforma por invalidez foi mais adequada e interpretou melhor a situação laboral da recorrente; P) Os relatórios pronunciam-se que “é de perspetivar a existência de dano futuro (…) que pode obrigar a uma futura revisão do caso”; e que, Q) A recorrente vai necessitar de “ajudas medicamentosas e acompanhamento médico regular”, nomeadamente na área psiquiátrica; na verdade, R) A recorrente “é portadora de um quadro clínico de perturbação de adaptação, com sintomas ansiosos”; S) Este facto e outros foram conhecidos da recorrente ou desenvolvidos em momento posterior ao pagamento da indemnização. Acresce ainda que, T) A recorrente não mais teve relações sexuais desde o acidente, nem as terá no futuro; porquanto U) O marido, e também Autor, encontra-se afetado permanentemente de disfunção erétil, com “repercussão permanente na atividade sexual fixável no grau 7/7”, conforme relatório pericial de avaliação pelo INL de 17.05.2019; V) Toda a matéria do teor dos relatórios do INML, relativa à Recorrente, está confessada, conforme ata da audiência final.

W) Não tem, pois, razão a sentença recorrida quando afirma “que não foi invocado - nem demonstrado – um motivo válido que determine o recebimento de um montante indemnizatório superior, como seria o caso de terem surgido novos danos, não previstos à data em que foi celebrado o acordo”.

X) Os danos descritos foram posteriores ou conhecidos em momento posterior ao pagamento da indemnização; Y) A douta sentença recorrida faz errada interpretação da lei para fundamentar a impossibilidade legal de a recorrente ser, adequadamente, indemnizada pelos sofridos; Z) Os danos são de uma extensão impossível de conhecer no momento da aceitação da indemnização; AA) O conhecimento de alguns danos (os psiquiátricos e os futuros) são matéria de avaliação médico-legal; BB) Os contratos devem ser pontualmente cumpridos, mas eles devem ser celebrados de forma esclarecida e livre e sem pressões; CC) No presente caso o contrato foi celebrado sem conhecimento dos novos factos e da verdadeira extensão dos danos; DD) A aceitação da parte da recorrente teve mais a ver com as dificuldades financeiras da recorrente naquele período; EE) A matéria dada como provada nos pontos 13, 15 (os dois últimos items); 16; 21, parte final; 39.º, não é impeditiva do recálculo da indemnização.

FF)Deve ser dado como provado que antes do acidente a recorrente tinha uma vida sexual saudável com o marido e que desde então não voltou a ter relações sexuais, facto que a entristece e a torna infeliz (art.º 39.

º da PI; e que, GG)O facto referido decorre de o marido ter ficado afetado de disfunção erétil devido ao acidente; HH) Deve ser dada como provada a matéria dos art.ºs 16.º, 27.

º, 29º, 30.

º e 33.º da PI, como decorre da documentação existente nos autos, designadamente dos relatórios periciais de avaliação do dano.

II) A prova pericial sendo fixada livremente pelo tribunal, em caso de divergência com o relatório a posição deve ser fundamentada, com enunciação das razões da divergência; JJ)No presente caso a prova pericial junta aos autos não foi adequadamente interpretada pelo Tribunal; KK) A douta sentença recorrida violou, nomeadamente, o disposto, nos art.ºs 483.

º, n.º 1, 341.º, 382.º e 388.º, do Código Civil e 496.º, CPC Termos em que, sempre com o douto suprimento de Vossa Excelência deve o presente recurso ser julgado procedente e a douta sentença recorrida ser alterada, condenando-se a Ré no valor peticionado, assim se fazendo, justiça.

* O Réu contra-alegou, formulando, por seu turno, as seguintes conclusões: 1. Pretende a Autora ver ampliada a indemnização que aceitou, recebeu e da qual deu a competente quitação.

2. Foi invocada pelo FGA a exceção perentória do cumprimento, que extinguiu o direito da Autora.

3. Alega a Autora que ocorreu um agravamento dos danos posterior ao acordo indemnizatório, mas tal não resultou provado.

4. A Autora assenta as suas alegações na invocação de matéria de facto que foi por si alegada, mas que não resultou provada! 5. Ainda, em falsas referências a danos decorrentes das lesões sofridas por seu marido, que a Autora trata como se fossem danos próprios – sendo certo que se trata de danos que extravasam o âmbito dos presentes autos.

6. A douta decisão de fls. não violou quaisquer...

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