Acórdão nº 1738/20.1T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Janeiro de 2022
Magistrado Responsável | PAULA DO PAÇO |
Data da Resolução | 13 de Janeiro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório Na presente ação declarativa, com processo comum, que A… move contra JMR – Prestação de serviços para distribuição, S.A.
, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, em conformidade com as disposições legais e fundamentos citados, julgo parcialmente procedente a presente ação e, em consequência: a) DECLARO VÁLIDA E LÍCITA A RESOLUÇÃO DO CONTRATO POR INCIATIVA DO AUTOR A… COM FUNDAMENTO EM JUSTA CAUSA; b) CONDENO A RÉ JMR – PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS PARA DISTRIBUIÇÃO, S.A. A PAGAR AO AUTOR A QUANTIA DE 24.149,04€ (vinte e quatro mil cento e quarenta e nove euros e quatro cêntimos) por conta da indemnização prevista no art.º 396.º, n.º 1 e n.º 2 do Código de Trabalho, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde a data de citação; c) CONDENO A RÉ A PAGAR AO AUTOR A QUANTIA DE 17.666,00€ (dezassete mil seiscentos e sessenta e seis euros) a título da retribuição relativa aos meses de junho, julho, agosto de 2019, e 16 dias de trabalho de setembro de 2019, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde 31 de outubro de 2019; d) CONDENO A RÉ A PAGAR AO AUTOR A QUANTIA DE 10.000,00€ (dez mil euros) a título de retribuição por férias não gozadas de 2019 e subsídio de férias de 2019, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde 31 de outubro de 2019; e) CONDENO A RÉ A PAGAR AO AUTOR A QUANTIA DE 3.863,63€ (três mil oitocentos e sessenta e três euros e sessenta e três cêntimos) a título de retribuição por férias de janeiro a 16 de setembro de 2019, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde 31 de outubro de 2019; f) CONDENO A RÉ A PAGAR AO AUTOR A QUANTIA DE 3.863,63€ (três mil oitocentos e sessenta e três euros e sessenta e três cêntimos) a título de proporcional de subsídio de férias devido de janeiro a 16 de setembro de 2019, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde 31 de outubro de 2019; g) CONDENO A RÉ A PAGAR AO AUTOR A QUANTIA DE 3.534,25€ (três mil quinhentos e trinta e quatro euros e vinte e cinco cêntimos) a título de proporcional de subsídio de natal devido de janeiro a 16 de setembro de 2019, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde 31 de outubro de 2019.
h) ABSOLVO A RÉ DO DEMAIS PETICIONADO PELO AUTOR.» Não se conformando com a decidido, veio a Ré interpor recurso para este tribunal, tendo apresentado alegações das quais extraiu as seguintes conclusões: «1ª. A Apelante recorre da sentença de fls., quanto às decisões de facto e de Direito.
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O recurso da decisão de facto tem por objeto a reapreciação de prova gravada, sem prejuízo de assentar igualmente em outros meios de prova, designadamente prova documental.
Quanto ao recurso da decisão de facto: 3ª. A Apelante pretende ver modificada a redação do facto provado sob o número 16, por forma a nele se incluir i) referência a que os factos sob investigação no processo-crime aí identificado respeitam ao Apelado e ii) referência a que tais factos afetaram o bom nome da Apelante e a concorrência no ramo, em conformidade com o teor integral da certidão do processo-crime junta aos autos por requerimento da Recorrente de 26 de Janeiro de 2021 (Ref. Citius 37843125), certidão essa que apenas foi parcialmente transcrita pelo Tribunal a quo no ponto 16 da decisão da matéria de facto.
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Estas referências – omitidas no facto número 16 – afiguram-se relevante para a apreciação do objeto da ação, designadamente do direito do Recorrido a resolver o contrato de trabalho com justa causa e para efeitos de eventual fixação da indemnização devida.
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Com base na prova documental identificada na 3.ª Conclusão (e tal como melhor explicitado nos §7 a §10 das alegações de recurso), o facto declarado sob o número 16 deve ser aditado, passando a ter a seguinte redação: “Corre termos no DIAP – 7.ª Secção de Loures, sob o n.º 8152/17.4JFLSB, processo-crime no qual se investiga, no que tange ao Autor, o eventual recebimento de quantias monetárias dos fornecedores do grupo Jerónimo Martins, de forma a favorece-los nas vendas do grupo, em detrimento de outros, afetando desse modo o bom nome da empresa e a concorrência no ramo, e no qual o Autor assume a qualidade processual de arguido, enquanto gestor de negócios para aquisição de frutas e legumes, nas instalações de Vila Nova da Rainha”.
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O Tribunal a quo ignorou parte significativa da factualidade alegada pela Recorrente na sua Contestação, designadamente nos artigos 27.º, 28.º, 30.º, 32.º a 34.º, 38.º a 41.º e 47.º, não procedendo à sua inclusão na decisão da matéria de facto.
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A aludida factualidade afigura-se relevante para a decisão da causa, uma vez que respeita ao contexto específico e particular em que ocorreram os factos que o Recorrido alega para fundamentar a resolução do seu contrato de trabalho com alegação de justa causa – i.e., a não disponibilização pela Apelante ao Apelado das retribuições relativas aos meses de junho, julho e agosto de 2019.
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Em concreto, o contexto e circunstancialismo específicos, descritos pela Recorrente nos artigos 27.º, 28.º, 30.º, 32.º a 34.º, 38.º a 41.º e 47.º da Contestação, não declarados na sentença recorrida, relevam para apurar i) se a Recorrente atuou de forma ilícita e culposa e ii) se essa conduta constituía justa causa para a resolução do contrato de trabalho, bem como – ainda que assim se entendesse, o que apenas por mero dever de patrocínio se concebe – para determinar o valor da indemnização devida em virtude dessa resolução (conforme melhor explicitado nos §12 a §15 das alegações de recurso).
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Atenta a sua relevância para a decisão da causa e a prova produzida nos autos, abaixo identificada, deveriam os aludidos factos alegados na Contestação ter sido considerados provados.
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Quanto à factualidade constante do artigo 27.º da Contestação, a mesma complementa os pontos 6 e 7 da decisão da matéria de facto constante da sentença recorrida, aludindo à circunstância de o Apelado ocupar cargo de elevada responsabilidade no seio da Recorrente, com poder de decisão quanto aos fornecedores e aos termos da contratação, 11ª. O que releva para se compreender, por um lado, a gravidade das suspeitas que recaem – e recaíam à data – sobre o Apelado e que estavam (e estão) sob investigação criminal, e que levaram à instauração de procedimento prévio de inquérito e à sua suspensão preventiva, bem como o impacto que essas suspeitas tiveram na Recorrente e os potenciais prejuízos que decorrem para esta dos alegados factos praticados pelo Apelado.
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Esta factualidade resultou demonstrada da prova testemunhal produzida nos autos, designadamente dos depoimentos das seguintes testemunhas: (i) (…) (prestado na sessão de 12 de Janeiro de 2021 da audiência de julgamento, gravado no ficheiro número 20210112101235_2908944_2871709, entre 00:02:29 e 00:03:26 de registo sonoro); (ii) (…) (prestado na sessão de 12 de Janeiro de 2021 da audiência de julgamento, gravado no ficheiro número 20210112102045_2908944_2871709, entre 00:01:15 e 00:03:05 de registo sonoro); (iii) (…) (prestado na sessão de 12 de Janeiro de 2021 da audiência de julgamento, gravado no ficheiro número 20210112102820_2908944_2871709, entre 00:01:02 e 00:02:23 de registo sonoro); (iv) (…) (prestado na sessão de 12 de Janeiro de 2021 da audiência de julgamento, gravado no ficheiro número 20210112103508_2908944_2871709, entre 00:02:26 e 00:04:45 de registo sonoro); (v) (…) (prestado na sessão de 26 de Março de 2021 da audiência de julgamento, ficheiro número 20210326100512_2908944_2871709, entre 00:05:35 e 00:06:45 de registo sonoro).
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Pelas razões supra expostas (e melhor explicitadas nos §17 a §24 das alegações de recurso), deve ser aditado à matéria de facto provada o facto alegado no artigo 27.º da Contestação, propondo-se a seguinte redação: “O Autor assumia um cargo de elevada responsabilidade no seio da Ré, tendo contacto direto com os fornecedores do Grupo Jerónimo Martins e poder de decisão quanto à escolha dos mesmos e à definição dos termos da sua contratação”.
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Quanto aos factos alegados nos artigos 28.º e 30.º da Contestação, os mesmos permitem compreender o exato contexto em que ocorreram os factos em causa nos autos, designadamente a suspensão preventiva do Apelado e a omissão de pagamento das retribuições de junho, julho e agosto de 2019 por parte da Apelante, 15ª. Sendo que essa factualidade resultou evidenciada nos autos, designadamente a partir dos seguintes meios de prova: a) Prova documental (i.e., da certidão do processo-crime junta aos autos por requerimento da Apelante de 26 de janeiro de 2021 – Ref. Citius 37843125); b) Prova testemunhal, designadamente por via dos depoimentos das seguintes testemunhas: (i) (…) (prestado na sessão de 12 de Janeiro de 2021 da audiência de julgamento, gravado no ficheiro número 20210112095753_2908944_2871709, entre 00:03:33 e 00:07:56 do registo sonoro), (ii) (…) (prestado na sessão de 12 de Janeiro de 2021 da audiência de julgamento, gravado no ficheiro número 20210112102045_2908944_2871709, entre 00:03:05 e 00:04:30 de registo sonoro) e (iii) (…) (prestado na sessão de 26 de Março de 2021 da audiência de julgamento, gravado no ficheiro número 20210326100512_2908944_2871709, entre 00:02:09 e 00:04:26 de registo sonoro).
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Da aludida prova resulta que, em Junho de 2019, existiam fundadas suspeitas – materializadas quer nas buscas realizadas às instalações da Recorrente onde o Recorrido prestava funções, quer na sua constituição como arguido no aludido processo-crime, e posteriormente nas diligências de investigação levadas a cabo pela Recorrente – de que o Apelado teria aproveitado as suas funções como Coordenador de Perecíveis da Recorrente para obter benefícios próprios indevidos de fornecedores da mesma, em contrapartida de os favorecer na relação com a Recorrente, 17ª...
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