Acórdão nº 226/18.0T8BJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelANABELA LUNA DE CARVALHO
Data da Resolução13 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de ÉvoraIA..., com residência habitual na Venezuela e com os demais sinais dos autos, intentou ação de reivindicação contra B…, residente em Loures, com os demais sinais dos autos, pedindo o seguinte: a) Declarar-se a Autora dona e legítima proprietária do terreno correspondente ao quintal localizado nas traseiras do seu imóvel, condenando-se o Réu a reconhecer a Autora o direito de propriedade sobre esse terreno; b) Condenar-se o Réu a restituir à Autora a parte do imóvel (terreno-quintal), que ilicitamente ocupa, entregando-lhe livre de pessoas e coisas; c) Condenar-se o Réu a demolir o muro que edificou ao longo do terreno / quintal da Autora que confina com a via pública; d) Condenar-se o Réu numa sanção pecuniária compulsória de € 50,00/dia, após a citação e entrega efetiva do terreno à Autora.

Invocou para tanto, beneficiar da presunção de propriedade de determinado prédio, prédio esse que confina com o prédio do Réu, tendo ambos área coberta e descoberta; o seu prédio tem e sempre teve dois quintais (um pequeno em frente à casa, atravessado pela via pública e um outro maior situado nas traseiras) à semelhança das restantes casas da rua. Os quintais traseiros da Autora e do Réu encontravam-se delimitados. A Autora por razões de segurança, uma vez que não vive em Portugal mandou colocar tijolos à frente da porta traseira que dá para o quintal traseiro. O Réu adquiriu o imóvel em 2010 e, em 2015 procedeu à demolição de parte do muro que separava ambos os quintais ocupando a área integral do quintal traseiro do prédio da Autora. E edificou um muro ao longo do seu quintal que confina com a via pública e, ao longo do quintal da Autora, com um portão a que apenas o Réu acede, para fazer crer que tudo lhe pertencia, o que fez de forma ilegítima e de má fé, contra a sua vontade (tendo disso participado ao Ministério Público); inexiste título que legitime a alteração de áreas constantes do registo predial que o Réu efetuou com acréscimo da área do seu prédio.

O Réu contestou.

Alegou que o prédio da Autora não possui qualquer área (quintal) nas traseiras; não existe ou existia muro a separar as indicadas áreas; até à sua intervenção toda a área de logradouro estava em completo abandono; o Réu procedeu à limpeza da aludida área (terreno) e construiu um muro e portão; foi elaborado um levantamento topográfico com vista à retificação de áreas e, a área reivindicada pertence-lhe.

E deduziu pedido reconvencional, com vista ao reconhecimento do direito de propriedade do Réu sobre o prédio descrito na Conservatória de Registo predial de Beja sob o n.º 44 da freguesia de Cabeça Gorda, com a área de 471,25m2.

A A.

replicou impugnando que o Réu reconvinte seja proprietário da área de 471,25m2. O prédio do R. até 09.09.2013 tinha uma área total de apenas 288m2, sendo a área descoberta 181m2. Foi esta a área que adquiriu ao Banco Santander em 2010. Posteriormente à compra, mais concretamente em 2013 solicitou uma alteração de área e passou a ter registada uma área aumentada em 185,23 m2. Não tem, contudo, qualquer título que o legitime a beneficiar deste acréscimo. Tal aumento de área sacrificou em igual medida a área do prédio da Autora. A área da A. encontra-se registada desde 2000 e, a do Réu apenas desde 2013, prevalecendo aquela face à antiguidade. Pede, por fim seja julgado improcedente o pedido reconvencional.

Realizado o probatório e o julgamento, o Tribunal a quo proferiu sentença julgando: a) A ação improcedente e, em consequência, absolveu o Réu dos pedidos.

b) O pedido reconvencional procedente e, em consequência, condenou a Autora/Reconvinda a reconhecer o direito de propriedade do Reconvinte, sobre o prédio descrito na Conservatória de Registo Predial de Beja sob o n.º 44 da freguesia de Cabeça Gorda, com a área de 471, 25m2.

Inconformada com tal decisão veio a Autora recorrer concluindo do seguinte modo as suas alegações de recurso: 1 - O prédio da Autora foi adquirido por sucessão hereditária, no ano de 2000, e já nessa data tinha registada a área coberta de 80 m2 e uma área descoberta de 215m2, o que perfaz uma área total de 295 m2.

2 - Por seu turno, o Réu adquiriu o seu prédio no ano de 2010, e nessa data o prédio tinha registada uma área descoberta de 181m2. , sendo a área total de 288m2.

3 - A partir de 2013, ou seja, 3 anos após o Réu ter adquirido o prédio, requereu uma alteração do registo, acrescentando assim ao seu prédio mais 183,25.

4 - Em consequência da alteração, pedida pelo R., passou a ter uma área total de 471,25m2, sendo 107m2 de área coberta e 364,25 de área descoberta.

4 - Não deixa de ser curioso e esclarecedor que nenhum dos anteriores proprietários do prédio do Réu o tivesse feito.

5 - Quanto à prova testemunhal, o Tribunal a quo, considerou os depoimentos das testemunhas arroladas pela Autora, ambíguos e vagos.

6 - Testemunhas que residem na localidade de Cabeça Gorda há várias décadas, tendo uma delas sido presidente de junta de freguesia durante vários anos.

7 - Esta testemunha, José David Brincheiro, disse conhecer a Autora da localidade e exerceu anteriormente as funções de Presidente da Junta de Freguesia, 8 - Disse ainda existir um quintal nas traseiras do prédio da Autora, 9 - Quanto ao depoimento prestado pelas testemunhas arroladas pelo Réu dir-se-á o seguinte: 10 - Conforme resulta da sentença as testemunhas Jorge Raposo e Felipe Palma disseram “que nunca viram outra pessoa a usar aquela área sem ser o Réu, após ter adquirido o prédio” 11 - E se mais ninguém o fez, à exceção do Réu, tal significa também que a anterior proprietária do prédio, a Sra. Sónia Cristina Barbeiro Martins Ferreira - testemunha arrolada pela A. também não o fez.

12 - E se esta testemunha não o fez, quando esta testemunha diz que usava o terreno entre muros, como é obvio, não usando a parcela de terreno reivindicada pela Autora, (como foi dito pelas citadas testemunhas,) e fazendo referência a entre muros, só poderia ser o muro separador dos dois quintais, que a Autora sempre alegou existir, e que foi derrubado pelo R. e cujos vestígios ainda existem, como se sustenta adiante.

11 - Aliás , se atentarmos nos docs. juntos aos autos a Fls 78, que consiste na planta que faz parte dos docs. apresentados pelo A. com o pedido de registo da retificação das áreas do logradouro, verifica-se nessa plana a existência de um pequeno muro, o qual em sede de inspeção judicial o Réu disse ter re(contruído) para proteger uma pequena churrasqueira.

12 - O que não se duvida que tenha sido edificado pelo Réu, bastando para tal olhar atentamente a foto constante dos autos (a cores), foto E) do auto de Inspeção, para concluir que o reboco desse muro é relativamente recente, ou seja os seus elementos construtivos não remontam à época referida pela Autora, de quando os autores da herança habitavam a casa, há mais de 30 ou 40 anos.

13 - Um olhar atento à foto (a cores) permite verificar que esse muro foi construído sobre um pré existente, cujo reboco antigo é visível e se projeta para além da perpendicular da parede da cozinha da casa do Réu.

14 - E se comparamos essa mesma planta, com a planta ((fls 82) apresentada em 09/09/2013 com a declaração Mod. 1 de IMI, apresentada pelo Réu nessa data já na qualidade de proprietário do prédio há cerca de 3 anos, verifica-se a delimitação do quintal do Réu na parte que confronta com o quintal da Autora e por esta reivindicado, desde aquele mesmo ponto e até à rua Teixeira Gomes..

15 - Muro que se encontra assinalado nas plantas, nesta última ao longo de toda a linha divisória dos prédios da Autora e do Réu, que “nasce” junto ao canto da cozinha do prédio do Réu e se prolonga até à rua Teixeira Gomes.

16 - Documentos estes que não foram devidamente valorados pelo tribunal a quo e que com o devido respeito entendemos tratar-se de um erro notório na apreciação da prova.

17 -Um olhar atento às fotos (F) do auto de inspeção judicial, revela que existe uma uniformidade no estado da degradação da parede, inclusive em redor da porta (agora tapada pelo Réu) algo que não aconteceria se a porta tivesse sido aberta pela Autora, após a data de aquisição do prédio, pois nesse caso seria notória a diferença entre a superfície da parede já existente e o reboco de acabamento circundante da porta.

18 - O Tribunal a quo, entendeu que o Réu se encontra na posse da parcela de terreno em questão.

19 - E entendeu assim apenas porque as testemunhas arroladas pelo Réu assim o disseram.

20 - Devia no entanto, com todo o respeito, ter ido mais além para poder chegar a essa conclusão ou não.

21 - Desde logo, conforme resulta do auto de inspeção, fotos C) o muro que o Réu construiu, com um portão enorme e completamente fechado, devido à sua altura não permite ver nada a partir do exterior.

22 - Portanto se as testemunhas viram alguma atuação do Réu que se pudesse inserir no conceito de posse, teria de ser anteriormente à data da construção do referido muro, o que não foi referido por elas.

23 - Em todo o caso, o preenchimento do conceito de posse há-se ser muito mais que o derrube de um muro (divisório) existente e a construção de um outro com um portão( na rua Teixeira Gomes).

24 - Terá de haver pelo menos uma atuação da qual se possa depreender que determinada pessoa age em relação a uma determinada coisa como se seu proprietário fosse.

25 - Nomeadamente a forma como cuida e trata e mantém essa coisa.

26 - No caso dos autos e como ilustram as fotos D e E do auto de inspeção, é notória a diferença entre o estado de conservação da parte do prédio do Réu e a parte do prédio da Autora.

27 - Sendo evidente que o prédio do Réu apesar de não se encontrar em ótimo estado de conservação, mas, ainda assim faz uma grande diferença comparativamente à parte e...

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