Acórdão nº 360/20.7TXEVR-E.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelJOÃO AMARO
Data da Resolução25 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO

O recluso NB encontra-se a cumprir a pena de 2 (dois) anos e 3 (três) meses de prisão, pela autoria de um crime de violência doméstica

Apreciada a situação prisional do recluso decorrido o cumprimento de metade da pena, por decisão proferida no processo de concessão de liberdade condicional nº 360/20.7TXEVR, do Tribunal de Execução de Penas de Évora (Juiz 2), foi-lhe negada a liberdade condicional

Inconformado com a decisão, dela recorreu o recluso, extraindo da respetiva motivação do recurso as seguintes (transcritas) conclusões: “A. Em primeiro lugar, impugna-se o juízo plasmado na decisão sobre a não concessão de liberdade condicional sobre a matéria de direito da mesma, a título de questão prejudicial, porque se entende que o juízo constante na decisão recorrida de não admitir prova testemunhal e de nem tão pouco considerar e valorar declarações dessas testemunhas constantes de prova documental constante de documento particular com assinatura reconhecida, incorre em manifesta violação do artigo que confere ao recluso e não ao tribunal a prerrogativa do juízo de conveniência da prova a apresentar

  1. Resultando da decisão ora recorrida uma limitação e desconsideração iníqua e ilegal ao direito do recluso de apresentar provas que ele entenda convenientes como expressamente prevê o artigo 176.º n.º 2 da Lei n.º 115/2009 de 12 de outubro (Código de Execução de Penas)

  2. Norma esta violada de forma flagrante pela decisão ora recorrida, porque se entende que o que subjaz ao previsto no artigo 176.º n.º 2 da Lei n.º 115/2009 de 12 de outubro (Código de Execução de Penas), é conferir ao recluso o direito a exercer um critério de conveniência e oportunidade na decisão de apresentar de prova. Contudo, tal juízo de conveniência e oportunidade é vedado ao tribunal pela letra deste n.º 2 do artigo 176.º da Lei n.º 115/2009 de 12 de outubro (Código de Execução de Penas), porquanto o tribunal está norteado pelo principio da legalidade que preside ao critério de admissibilidade de provas do poder/dever conferido ao tribunal recorrido pelo n.º 3 deste artigo 176.º da Lei n.º 115/2009 de 12 de outubro (Código de Execução de Penas)

  3. Ora sendo legal o meio legalmente admissível o meio de prova requerido ou apresentado, então o tribunal que o recusa ou não o considera, como ocorre nos presentes autos, viola o previsto no artigo 176.º n.º 2 da Lei n.º 115/2009 de 12 de Outubro (Código de Execução de Penas), constata-se que a decisão recorrida devia ter sido instruída com a inquirição das testemunhas nos termos requeridos, e mais ainda quando até dizia respeito às declarações de própria vítima do crime de violência doméstica e portadora dos bens jurídicos em causa, e às declarações de quem sempre esteve ao lado do recluso, o seu patrão de há duas décadas. A recusa em ouvir a vítima do crime pelo qual o ora recorrente vem expiando a pena contraria toda orientação para esta questão jurídica no direito comparado

  4. Logo a decisão ora recorrida, ao não ter sido instruída pela inquirição das testemunhas indicadas pelo o ora recorrente, mormente a inquirição perante o tribunal da vitima do crime pelo qual o ora recorrente vem cumprindo pena de prisão, cujo o cumprimento cumpre decidir ser interrompido pela concessão de liberdade condicional, padece de ilegalidade por clara violação do disposto nos artigos 173.º n.º 1 alínea c) e 176.º n.º 2 do da Lei n.º 115/2009 de 12 de Outubro (Código de Execução de Penas), ao mesmo tempo a decisão ora recorrida declara expressamente também não considerou a prova documental decorrente dos dois documentos particulares com assinatura reconhecida de cada uma destas testemunhas, cuja a inquirição também não a pôde instruir porque não foi admissível

  5. Na decisão recorrida diz-se que não existiu garantias de contraditório e controlo judicial nos documentos particulares com assinatura reconhecida, pelo que não se se considera estes documentos, ora é preciso que se diga que não existiu garantias de contraditório e de controlo judicial sobre as declarações constantes destes documentos particulares, precisamente porque o tribunal ora recorrido que exige garantias e controlo judiciais e contraditório nas declarações das testemunhas, foi o mesmo que recusou a tomada de declarações dos declarantes na qualidade de testemunha, perante o referido tribunal, e com todas os controlos e garantias judiciais e do contraditório

  6. Sendo certo que a produção dos demais elementos que instruíram a decisão recorrida, a ser saber relatórios finais técnicos, pedidos e prestação de esclarecimento ao conselho técnico, não resultam da possibilidade de contraditório por parte do recorrente para solicitação de esclarecimentos e exercício de contraditório, pois o ora recorrente nem o seu mandatário não são sequer admitidos a estar presentes no dito conselho técnico, por isso como se quer exigir contraditório aos documentos particulares com assinatura reconhecida que reproduzem e que visam suprir a inquirição dos respetivos declarantes que fora requerida atempadamente e indeferida, quando ao ora recorrente, enquanto principal interessado, nem sequer pode estar presente nem pelo intermédio do seu mandatário para assistir e participar nos esclarecimentos que o tribunal recorrido? Salvo o devido respeito por opinião contrária, não se pode

  7. Em segundo lugar, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto acerca da consideração probatória dos pareceres prestados para efeitos de instrução da presente decisão sobre a concessão de liberdade condicional, quando os mesmos visaram uma janela temporal e foram elaborados e prestados em Conselho Técnico anterior à data de concessão da primeira licença de saída jurisdicional, que constitui momento probatório, preparatório e de diagnóstico, que não foi objeto de conhecimento pelos pareceres prestados para a decisão de não concessão de liberdade condicional

    I. Julgando-se não conceder a liberdade condicional, sustentando-se a decisão ora recorrida em pareceres prestados que não puderam conhecer, nem conheceram a posteriori dos resultados pessoais e sociais da primeira licença de saída jurisdicional, que se demonstraram contraditórios às conclusões de tais pareceres, porquanto o ora recorrente não registou qualquer ocorrência, desacato com a vitima, qualquer consumo de álcool e de estupefaciente e interagiu com normalidade e felicidade com a sua família e Comunidade

  8. Em terceiro lugar, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto de se ter dado como provado somente que: “a propósito do crime pelo qual cumpre pena, o recluso refere que o praticou, esclarecendo que o mesmo ocorreu em 2014 e que «consistiu numa discussão muito grave que teve com a companheira, bem como com violência psicológica, em que lhe chamou nomes»”, conforme resulta do ponto 3.1. dos Factos Provados da Fundamentação de Facto da decisão recorrida, e que deu como provado que: “apesar de demonstrar alguma consciência do desvalor das suas condutas, não se encontra em fase de interiorização do sentido da pena, não demonstrando um arrependimento genuíno” conforme resulta do ponto 3.2. dos Factos Provados da Fundamentação de Facto da decisão recorrida

  9. Da análise do conjunto das declarações do ora recorrente é claro e evidente o sentido critico da sua conduta, a consciência do desvalor da sua conduta e os fins jurídicos a serem acautelados pela criminalização do comportamento, a consciência dos efeitos da sua conduta na vitima, e os respetivos danos por ela sofridos, a consciência dos seus comportamentos aditivos como fator de risco para a saúde e para o bem-estar e integridade dos demais. Revelando assim o recorrente o fundamento do seu arrependimento expressado no presente processo, o qual foi sobejamente verbalizado perante o tribunal recorrido. E por isso se entende que existiu erro notório na apreciação da prova produzida pelas declarações prestadas pelo ora recorrente em sede da sua audição perante o tribunal recorrido

    L. Como o ora recorrente prestou declarações sinceras, espontâneas e cujo conteúdo se reconduz, de forma fundamentada, à expressão de arrependimento sincero, indiciado pelo facto de existirem em sete anos quaisquer incidentes com a vítima, mantendo com esta até uma relação cordial, que o ora recorrente não tem quaisquer veleidades ou intenção de transformar em nova relação amorosa, e finalmente como até a comunidade não sente qualquer rejeição à pessoa do ora recorrente, constata-se pelo erro notório na analise das declarações do ora recorrente, impugnando-se o juízo sobre a matéria de facto constante dos pontos 3.1. e 3.2 dos factos provados da Fundamentação de Facto da decisão recorrida

  10. Em quarto lugar, impugna-se a decisão sobre a matéria de facto e de direito, porque não se tomou em consideração as premissas fundamentais para a presente decisão, que, como acima se antecipou, são: o facto do ora recorrente ter sido condenado em pena suspensa, tendo a suspensão da pena sido julgada proporcional, adequada e suficiente; e o juízo de prognose da decisão condenatória, cuja pena o ora recorrente veio cumprindo, sem quaisquer incidentes, foi uma pena suspensa na sua execução, foi esse o juízo de prognose sobre a conformação do ora recorrente com a sua conduta, e foi esse o prognóstico de perigo de reincidência na prática no crime de violência doméstica; N. Juízo este que não se enganou, pois o ora recorrente não reincidiu na prática deste crime, durante sete anos, e a revogação deveu-se à incúria no cumprimento e assiduidade nas reuniões a que estava obrigado pelos termos da suspensão de pena; O. O facto do cumprimento da pena prisão ter sido posteriormente determinado não por reincidência, mas por falta de comparência nas reuniões com a técnica, determinadas no regime probatório, tendo a suspensão da pena sido julgada proporcional, adequada e suficiente, o que se confirmou, visto que em sete anos, nunca...

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