Acórdão nº 266/20.0T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 24 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO SOUSA E FARO
Data da Resolução24 de Março de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora
  1. RELATÓRIO 1. P.T.R.

    intentou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra XL INSURANCE COMPANY SE, SUCURSAL EN ESPANÃ, pedindo que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia global de € 45.979,05, acrescida de juros de mora legais, contados desde a citação até integral e efetivo pagamento.

    Em síntese, alegou para tanto que S.M.M.F., advogado, foi condenado, além do mais, no âmbito da acção declarativa comum que, com o processo n.º 1628/17.5T8STR, correu termos pelo Juízo Central Cível de Santarém – Juiz 3, a pagar-lhe a quantia de € 45.979,05 a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo Autor em consequência de atos praticados por aquele no exercício da advocacia. Mais invocou que a responsabilidade civil pelos atos em causa se acha transferida para a Ré ao abrigo de contrato de seguro de responsabilidade civil profissional obrigatório celebrado entre a demandada e a Ordem dos Advogados.

    Regularmente citada, a Ré contestou, excepcionando (a) a ineficácia, quanto a si, do caso julgado das sentenças em que o segurado foi condenado pela prática dos atos descritos; (b) a verificação de causas de exclusão da cobertura da apólice; e (c) a prescrição.

    Porque se entendeu que o estado dos autos comportava o conhecimento do mérito no saneador, foi proferida decisão que, julgando improcedentes as excepções deduzidas, condenou a Ré a pagar ao Autor o montante de € 45.979,05 a título de indemnização (sendo € 35.979,05 por danos patrimoniais e € 10.000,00 por danos não patrimoniais), acrescido de juros moratórios, computados à taxa supletiva legal, vencidos desde a data da citação (06.02.2020) até efectivo e integral pagamento.

    2. É desta decisão que, desaprazida, recorre a Ré, formulando, na sua apelação as seguintes conclusões: a. O douto Tribunal a quo assentou, essencialmente, a douta Decisão Condenatória na prova documental, entre a qual se conta “As Condições especiais e gerais do seguro de responsabilidade civil”, conforme foram juntas sob Doc. 1 com a contestação da ora Ré Recorrente e em vigor no ano de 2019.

    1. Com todo o devido e merecido respeito, deveria o Douto Tribunal a quo ter considerado também as outras apólices e suas condições gerais e especiais, especificamente, aquela em vigor no ano de 2013 e que se juntou no requerimento apresentado pela Ré em 14.12.2020 sob a referência 37459519.

    2. Ou seja, tratando-se o Seguro previsto no Estatuto da Ordem dos Advogados de várias apólices sucessivas no tempo (anual ou bianual) cujas coberturas funcionam com base de reclamação (e não da verificação do dano), considera-se que a data da primeira reclamação define o âmbito objetivo de aplicação da apólice; d. Também, resulta no Ponto 12 do Artigo 1º das Condições Especiais da Apólice, considera-se “Reclamação: qualquer procedimento judicial ou administrativo iniciado contra qualquer segurado (…) como suposto responsável de um dano abrangido pelas coberturas da apólice”.

    3. Considerando a apólice vigente em 2013, como “Reclamação”, a existência de procedimento judicial ou administrativo contra um segurado, neste caso o Dr. S.M.M.F.; f. Uma vez que, nos termos dessa apólice, já teria existido uma reclamação, enquanto procedimento judicial (ação crime e cível) ou administrativo (procedimento disciplinar junto da Ordem dos Advogados).

    4. Portanto, não se compreende o motivo pelo qual não consta na matéria de facto provada o clausulado respeitante à apólice em vigor no ano de 2013, tendo sido tal factualidade alegada pela Ré Recorrente em 1 a 31 da sua contestação.

    5. Nem porque não consta no ponto 9 da matéria de facto provada a referência ao período temporal da apólice nº ES00013615EO19A, pelo que deverá ser modificado o Ponto 9 da Matéria de facto provada e adicionado um novo ponto 21: nos termos infra em i) e j); i. Ponto 9 - A Ordem dos Advogados celebrou com a Ré um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional através da apólice n.º AO – ES00013615EO19A, tendo por objeto o risco decorrente de ação ou omissão dos atos e omissões praticados pelos advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados, no exercício da sua profissão, com um limite de € 150.000,00 por sinistro (sem limite por anuidade) e sem prejuízo da cumulação com os valores de gastos de defesa e fianças civis e penais e nos termos do Ponto 10 das Condições Particulares da apólice em causa, sob a epígrafe PERÍODO DE COBERTURA, a apólice em causa vigora pelo período de 12 meses, com data de início de 01.01.2019 às 00h e vencimento às 00h de 01.01.2020 (negrito e sublinhado nossos); j. Ponto 21. A Ordem dos Advogados celebrou com a seguradora Companhia de Seguros Tranquilidade S.A. agora Generali Seguros S.A. um contrato de seguro de responsabilidade civil profissional através da apólice n.º 002866129, tendo por objeto o risco decorrente de ação ou omissão dos atos e omissões praticados pelos advogados com inscrição em vigor na Ordem dos Advogados, no exercício da sua profissão, com um limite de € 150.000,00 por sinistro (sem limite por anuidade) e sem prejuízo da cumulação com os valores de gastos de defesa e fianças civis e penais e nos termos do Ponto 10 das Condições Particulares da apólice em causa, sob a epígrafe PERÍODO DE COBERTURA, a apólice em causa vigora pelo período de 12 meses, com data de início de 01.01.2012 às 00h e vencimento às 00h de 01.01.2014.

    6. Ainda, considera o douto Tribunal a quo que “a alínea a) do artigo 3.º das Condições Especiais da apólice não é oponível ao Autor enquanto terceiro lesado, beneficiário do seguro obrigatório, podendo ser acionada a apólice n.ºAO – ES00013615EO19A à primeira reclamação junto da aqui Ré, apesar de os factos geradores dos danos terem tido lugar em momento anterior, ainda que o segurado ou o tomador do seguro tenham tido conhecimento anterior de tais factos”.

    7. Sendo que, encontrando-se o âmbito de cobertura temporal da referida apólice delimitado nos termos previstos no artigo 4.º das Condições Especiais, será a referida apólice de seguro “competente exclusivamente para as reclamações que sejam pela primeira vez apresentadas no âmbito da presente apólice: a) Contra o segurado e notificados ao segurador; b) Contra o segurador em exercício de ação direta; c) Durante o período de seguro, ou durante o período de descoberto, com fundamento em dolo, erro, omissão ou negligência profissional cometidos pelo segurado, após a data retroativa”(cfr. apólice) m. Efetivamente, o que releva para efeitos de aplicação da referida cláusula de delimitação de cobertura, é o facto e/ou circunstância que, sendo razoavelmente conhecido do segurado à data de início do período seguro, possa, razoavelmente, vir a gerar uma reclamação.

    8. Prevendo, contudo, expressamente, o aludido artigo 44.º, n.º 4 da Lei do Contrato de Seguro (D.L. n.º 72/2008 de 16 de abril), que “O segurador não cobre sinistros anteriores à data da celebração do contrato quando o tomador do seguro ou o segurado deles tivesse conhecimento nessa data”.(negrito e sublinhado nossos).

    9. A referida cláusula contratual, pese embora se encontre inserida num capítulo da apólice de seguro dedicado às Exclusões, assume a natureza de disposição delimitadora do objeto da apólice.

    10. Por outro lado, e como se tem por inequívoco, não poderá a exclusão em causa ser reconduzida a um incumprimento de uma obrigação (quer por parte do segurado, quer pelo tomador de seguro), quando o facto consubstanciador da exclusão é prévio à própria fonte das obrigações assumidas pelas partes, in casu, à própria celebração do contrato de seguro.

    11. Âmbito esse que, como se tem por manifesto, não engloba a exclusão prevista na alínea a) do artigo 3.º das condições das apólices apresentadas nos autos, as quais regulam os “sinistros” conhecidos pelo Segurado em data anterior ao início do período seguro, não impondo ao segurado ou lesado (como, em face do seu objeto, não poderia impor), qualquer ónus de participação do sinistro.

    12. De facto, a evidência do distinto âmbito de aplicação das disposições em apreço, resulta, desde logo, da constatação de que, mesmo que os factos e circunstâncias conhecidos do segurado e que já tivessem ou pudessem vir a gerar reclamação, fossem comunicados à seguradora na data do início do período seguro, o sinistro em causa encontrar-se-ia sempre excluído da cobertura da apólice, porque pré-conhecido pelo seu segurado (e neste caso, até pelo tomador do seguro, a Ordem dos Advogados).

    13. Entendimento que, tem pleno respaldo no Regime Jurídico Contrato de Seguro (D.L. n.º 72/2008 de 16 de Abril), nomeadamente, na norma prevista no citado artigo 44.º, n.º 2.

    14. A verdade é que, à data de início do período de seguro do contrato em 01.01.2019, o R. Advogado, Dr. S.M.M.F., tinha já conhecimento dos factos que, potencialmente, poderiam vir a gerar a sua responsabilização e que constituem causa de pedir nos presentes autos.

    15. Nomeadamente, na sua participação no processo penal, iniciado em 2013, ou caso assim não se entenda, com a notificação das sentenças nos referidos processos, em 2016 e 2017, conforme resulta das respetivas certidões juntas aos autos de fls. 225 a 239 e 246 a 264; v. Bem como do despacho acusatório proferido no âmbito do processo disciplinar, desencadeado pelo A. junto da Ordem dos Advogados, em 2013 e notificado às partes em 2017.

    16. Pelo que, encontra-se o alegado sinistro excluído das coberturas e garantias previstas na apólice n.º, nos termos expressamente previstos no artigo 3.º, alínea a) das Condições Especiais do DOC. 1 junto com a contestação da aqui Recorrente.

    17. Conforme se explicitou supra, o clausulado entre apólices contratadas com a Ordem dos Advogados, nos termos do art. 104º do Estatuto da Ordem dosAdvogados, contém uma provisão idêntica no seu Ponto 7 das Condições Especiais; y. Provisão esta que considera “Reclamação” como “qualquer procedimento judicial ou administrativo iniciado contra qualquer segurado (…) como suposto responsável de um dano abrangido...

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